Hoje não, obrigado

Apesar de ser a emenda de um feriado “parcial” (Dia do Funcionário Público), ainda assim hoje tive que comparecer à repartição para colocar em dia parte do serviço.

Aproveitei e deixei o carro num mecânico especializado em Opalas, em Jacareí, recomendado por nada menos que um ex-opaleiro (será que isso existe?), sócio em algumas causas e amigo pessoal Dr. Lelis.

Gostei do caboclo. Um senhorzinho de cabelos brancos, com cara de bonachão que parece inspirar confiança…

Enfim, voltei à oficina no final do dia e o diagnóstico que eu havia feito se confirmou: de fato um dos cilindros estava falhando. Contudo a pergunta que não queria calar: por quê?

Segundo averiguado estava “subindo” óleo do motor na câmara de compressão – especificamente no sexto cilindro. Isso fazia com que a vela ficasse encharcada, compromentendo sua centelha. Limpou-se como pôde e trocou-se a vela por uma dos outros cilindros. Nesse momento ficou tudo ok.

– Mas e pra consertar isso de vez?

– Bão, se o óleo tá subindo é porque tá passando pelo anel. Então teria que trocar o anel. Pra trocar o anel tem que tirar a camisa. Então teria que trocar o kit de todos os outros cinco pistões também. Às vezes, quando a gente abre o motor, acaba descobrindo outras coisinhas e por aí vai.

– Tá. Mas e quanto sairia essa brincadeira?

– Ah, essa “brincadeira”, completinha, completinha, iria sair por pelo menos uns dois contos…

Não foi necessário mais do que alguns centésimos de segundos (ou menos) para eu concluir que daquele jeito estava bom – por enquanto – e que, provavelmente em janeiro, mais tardar fevereiro, eu acabaria tendo que fazer “algo” com relação ao motor. Provavelmente eu o tirarei e encostarei enquanto durar a reforma do 79 e daí já passaria o motor de quatro cilindros para o 76 (vulgo Titanic II). Daí eu arrumaria a documentação com o motor novo, venderia o carro e teria dinheiro suficiente não só para dar uma geral no motor de seis cilindros como avançar bem na reforma do 79. Tudo isso passou pela minha cabeça, como eu disse, em menos de um segundo – tempo mais que suficiente para engatar uma resposta até apressada depois do orçamento passado:

– Hoje não, obrigado!

Cansado

É isso.

Cansado.

Hoje, no caminho para o trabalho, o Titanic II passou a dar umas falhadas. Se meu ouvido não estiver ruim (e não está) nitidamente um dos cilindros parece que parou de funcionar.

Tirei cabo por cabo e testei faísca por faísca.

Detalhe: velas, cabos, etc – tudo novo.

Parece que tá tudo em ordem.

Mas o motor ainda aparenta estar falhando.

Tô ficando cansado…

Saindo do box

Sabem, começo a achar que esse negócio de “mecânico bom” não é nada mais nada menos que uma questão de .

Tipo… Se um cara acredita piamente que determinado santo (ou seu Deus de sua religião) vai atender suas preces – em função da força dessa crença, da emanada do indivíduo, creio que deva haver algum tipo de retroalimentação cármica universal que faz com que as coisas acabem acontecendo. E lá corre o caboclinho para acender sua vela de gratidão!

Só que, no meu caso, já estou ficando cansado de “acender velas” pro meu mecânico…

Acho que estou perdendo minha fé…

Depois de quase uma semana peguei novamente o carro. A hélice, mesmo faltando algumas lascas, continua a mesma. Não haveria necessidade de trocar. O radiador não está furado. Não há necessidade de mexer. O carro não ferveu. Não precisa abrir o motor.

No frigir dos ovos, como esse motor não é original desse carro e não tem o suporte de sustentação do radiador, ele havia colocado uma “travinha” na parte de cima para segurá-lo. Travinha essa que escapou e fez com que o radiador fodesse com a hélice. Agora ele colocou um parafuso na travinha. Só. Nem cobrou nada.

De fato, acho que minha fé está abalada…

No box

Mais uma vez lá vai o carro para o box…

Além da questão da hélice, parece-me que o motor continua falhando um pouco (ainda não tá beeeeeem redondo) e baixando muito rápido a água. Um litro por semana. Na minha concepção, inadmissível!

A recomendação que ficou para o mecânico: se não for imprescindível trocar, se não for absolutamente necessário, se não for caso de vida ou morte, então, pelamordeDeus, não troque!!!

Minhas finanças já chegaram bem perto da linha vermelha e não posso me dar ao luxo de fazer mais uma reforma dentro da reforma…

Esmigalhando

Dever cumprido.

Eleição encerrada.

Com mais de 95% do total de urnas apuradas o quadro se tornou pra lá de irreversível.

Apesar da tentação de ficar no boteco com todo o povo que deu o sangue na campanha para a comemoração final, o cansaço finalmente se fez presente, junto com uma imensa saudade do aconchego do lar, do carinho da Dona Patroa e da alegria onipresente dos meus três filhotes – não necessariamente nessa ordem…

Despedi-me de todos, fui até o bom e velho (talvez mais velho que bom) Titanic II e, sob uma fina garoa, dei a partida nos seis canecos, rumo ao lar, para o merecido descanso do guerreiro.

Coisa de umas três quadras depois, numa curva, ouço um barulho:

TRÉÉEC-TÉC-TÉC-TÉC-TRRRRRRÉC-TÉC…

O coração vem à boca!

Parei o carro.

Acelerei.

Tudo suave.

Acelerei fundo.

Tranquilo.

Ressabiado, engatei a primeira e segui caminho. Uns três quilômetros depois, novamente o barulho. Mais forte agora.

Encostei rapidamente o carro, abri o capô e, numa rápida inspeção visual, tudo parecia em ordem. Superaquecimento não poderia ser. Além de não fazer mais que poucos minutos que eu havia ligado o carro, tinha água suficiente no radiador e a noite estava fria e chuvosa. Direto pelo carburador acelerei fundo o carro. Nada. Tudo certo.

Diacho!

Novamente tomei o rumo de casa, dessa vez decidido a não parar.

Não demorou muito, e já na mal iluminada estrada velha (aquela sem acostamento, lembram?) voltou o maldito barulho com toda a força. Acelerei. O torque parecia normal. Mas aquele barulho horrível de esmigalhamento não cedia. Continuei.

Será que a desventura de ontem, com a fervura desse caldeirão, acabou deixando sequelas piores que as que eu podia imaginar? Na minha cabeça pensei em pedaços dos anéis se destroçando e esmigalhando todo o conjunto interno da mecânica, riscando a camisa e marcando o pistão.

Diminui a marcha e continuei firme.

Já tinha começado até a fazer planos – ainda que não fosse o momento – de tirar o motor quatro cilindros do 79 e passar para o Titanic II, enquanto deixaria o seis cilindros no chão da garagem aguardando tempo ($$$) para que fosse reconstruído. Certamente não sobraria uma peça inteira dentro dele quando eu chegasse em casa!

Quase na divisa das cidades, não aguentei mais toda aquela barulheira. Num dos raros pontos iluminados do caminho (na entrada de um super-hiper-ultra-mega-blaster-advanced-plus condomínio de luxo), parei o carro sob uma chuva torrencial e novamente levantei o capô. As gotas d’água ferviam qual ovo na chapa ao pingar no motor. Mais uma vez pelo carburador acelerei fundo o carro e descobri a causa do barulho!

O radiador havia se soltado e estava literalmente ralando a hélice!!!

Desliguei o carro e dei um jeito de travar o radiador de volta no lugar. Olhei o estado da hélice. Lastimável. Ainda estava inteira, mas com várias pontas quebradas e danificadas. Liguei o carro de novo e fui checar. Pelo menos não empenou.

Retomei o rumo de casa bem mais aliviado, sabendo que, pelo menos dessa vez, o conserto não ficaria tão caro.

Pelo menos é o que espero…

Carreata

Quatro de outubro.

Véspera das eleições.

Pra quem ainda não sabe trabalho no departamento jurídico de uma prefeitura no município vizinho ao da minha cidade, no interior de São Paulo. A disputa eleitoral, segundo as “pesquisas oficiais”, está bem acirrada (já falei o que penso sobre essa história de pesquisas bem aqui e aqui). O candidato do atual prefeito (que tem meu apoio) estaria “tecnicamente empatado” com o seu maior rival na disputa, havendo um terceiro candidato posicionado bem lá atrás e, ainda, um quarto, que, segundo penso, não deve conseguir votos suficientes nem pra se eleger vereador.

Daí, como forma de apoio, ficou agendado uma carreata para este sábado, logo depois do almoço.

Na parte da manhã resolvi dar um giro pela cidade com o Titanic II, até porque tem um adesivo do candidato que ocupa completamente o vidro traseiro do carro – daí já dá pra imaginar seu impacto visual. Se o Opalão 76 por si só já chama a atenção, com um adesivo do tamanho de uma semana então, nem se diga! Isso fora que este contador de causos que vos escreve ainda tem por costume o constante uso de chapéu – o que já me rendeu ser chamado desde Almir Sater até mesmo Indiana Jones e por aí afora.

Com um trânsito atravancado e cheio de bandeiraços espalhados pela cidade fui que fui queimando embreagem durante todo o percurso, sendo que, apesar de todos os vidros abaixados, estava passando por um calor infernal sob um sol de rachar coquinho. Parei no boteco’s bar de uma amiga pra uma cervejinha de praxe (não, não precisa “olhar” o carro não que já, já que eu volto) e depois segui meu caminho. Fui em alguns outros lugares e depois resolvi parar numa padaria pra um lanche, pouco antes do horário marcado pra carreata.

O carro estava meio amarrado e achei aquilo estranho.

Quando finalmente consegui parar resolvi dar uma olhada no motor. Apesar da tampa do radiador estar em seu devido lugar, esguichava água fervente pelo respiro e frestas (que não deveriam existir). O motor numa quentura só. E a porra do marcador de temperatua sem sair do lugar!!!

O “triste” é que nesse mesmo dia, logo pela manhã, eu havia telefonado pro mecânico para elogiá-lo, pois tudo estava funcionando bem. Que merda!

Deixei o capô aberto (pra refrescar) e fui tomar meu lanche.

Mais tarde, com o motor já melhorzinho, completei o nível d’água e fui para o ponto de encontro da carreata.

Muita conversa, bastante alegria, não demorou muito e lá fomos nós. Sem brincadeira nenhuma, com certeza mais de cem carros! O pior é que outros dois candidatos a prefeito tiveram a mesma ideia para o mesmo horário! Olha, a cidade que já não é lá muito grande (uns 140 mil eleitores) ficou tomada com aquelas serpentes de carros transitando cada qual para um lado.

Depois de mais ou menos uma hora, vítima das cervejas que havia consumido, já ficando meio verde pelo aperto, fui obrigado a fazer uma, digamos, “parada hidráulica”. Estacionei num posto de gasolina (com o motor já bem quente de novo) e fui pra casinha. Alguns bons minutos depois, já aliviado, voltei para o carro enquanto via os últimos veículos da carreata passarem, enquanto que vários outros carros do outro candidato tinham também parado no mesmo posto. Antevendo um ambiente não muito salutar à minha integridade física, baixei o capô, entrei no carro, apertei o cinto e… CADÊ A PORRA DA CHAVE???

Parei pra pensar.

Refiz meus passos – não só mentalmente como fisicamente – procurei nos bolsos, olhei dentro do carro, debaixo do carro, sob os tapetes, fui no banheiro, saí do banheiro, olhei num gramado, e NADA!

Foi aí que percebi os putos dos caboclos da outra carreata olhando pra mim e rindo a valer. Daí caiu a ficha. Sem perceber eu devo ter derrubado a chave e eles devem ter escondido. E agora José?

Munido mais de persistência que de conhecimento ou bom senso, no melhor estilo McGyver, saquei de meu canivete e um bom tempo depois, a custo de um tambor de ignição, consegui fazer o carro pegar.

Imaginem meu estado de espírito naquele momento. Imaginem o quanto eu estava suando. Imaginem o quanto eu estava puto da vida. Imaginem por quanto tempo os pneus de um Opala seis canecos podem queimar no asfalto e quanto um carro pode rabear numa fenomenal decolagem daquele maldito posto de gasolina, passando a centímetros dos carros estacionados e vendo o sorriso da cara daqueles chifrudos murcharem enquanto pulavam fora de meu caminho.

Acho que só voltei a raciocinar umas dez quadras depois.

Liguei para saber onde o povo estava. Literalmente do outro lado da cidade. Busquei mentalmente um ponto de interceptação em uma das ruas onde eles ainda fossem passar e fui pra lá. Levou mais uma meia hora, mas chegaram e ficaram com uma interrogação enorme querendo saber como foi que eu passei à frente de todo mundo sem que percebessem…

Melhor deixar pra lá.

Um dia, quem sabe, eu explico.

Refaroletando

Aproveitei que finalmente consegui chegar um pouco mais cedo em casa (apenas oito e meia da noite) e resolvi dar uma olhada naquele farol supostamente queimado.

Como tenho as peças do 79 todas bem guardadas na garagem, decidi que iria cometer um novo ato de antropofagia e trocar os faróis.

Primeiro passo: pela parte externa soltar a moldura quadrada de plástico. São apenas dois parafusos e um encaixe com ressalto na parte de baixo. Só tem um parafuso. Bem, depois eu acho um outro para colocar no lugar.

Segundo passo: soltar a moldura de metal redonda que efetivamente prende o farol. São três parafusos. Só tem dois. Ou seja, mais outro para procurar.

Terceiro passo: segure o farol pela parte de fora e, pela parte de dentro, desconecte o conector (redundante isso, não?). Basta puxar.

Pronto! O farol saiu na mão!

– Ué? – poderia perguntar alguém – Mas não era só a lâmpada do farol baixo que estava queimada?

Sim, intrépido leitor. Mas no Opala a lâmpada do farol baixo, do farol alto e o próprio conjunto do farol são uma coisa só! Ou troca tudo ou não troca nada. Dêem uma olhada no esqueminha aí embaixo, encontrado no Manual do Opala de 78 sob o título “Substituição da célula óptica” (bonito, não?), que dá pra ter uma boa ideia disso tudo que estou dizendo.

Aliás, a essa altura do campeonato surgiu na garagem meu filhote mais velho – nove anos – e resolveu “me ajudar”. E, olhem, ajudou mesmo! Nem que seja para procurar algum parafuso, pegar uma ferramenta ou meramente para segurar a lâmpada. Basta ter paciência no trato (afinal ele ainda é uma criança) que o caboclinho fica todo orgulhoso depois…

Bem, fui até a caixa onde estavam guardadas as peças de lanternas, setas e faróis. Tinham TRÊS faróis. Não entendi. Não me lembrava de nenhum terceiro farol… Paciência. Peguei o mais acessível, conectei no carro, liguei a chave e… nada.

Merda.

Isso já tá ficando recorrente.

Baixo, nada. Alto, nada. Só o da direita continuava funcionando.

Será que o conector estaria com algum mau contato? Mas, se fosse assim, nem o alto do anterior funcionaria. Coloquei de volta o velho. Baixo, nada. Alto, ok.

Hmmm…

De volta à caixa, peguei um outro farol.

Conectei.

Testei.

Baixo, ok. Alto, ok.

ÊBA!!!!

De tão feliz fui no embalo: liga de novo, desliga de novo, aperta, desaperta, baixo, alto, baixo, alto, clique, claque, clique, claque…

Bão, melhor parar antes que eu queime de novo essa merda…

Depois dessa foi só fechar tudo de novo – com os parafusos que faltavam, diligentemente encontrados pelo filhote na famosa “caixinha de parafusos velhos” existente em toda e qualquer garagem.

Só lamentei que, pelo avançado da hora, não deu tempo de dar uma partida no 79. Já tava tudo mais ou menos no esquema. Mas cansaço tem limite – e eu já estava bem próximo do meu…