Eu já passei da idade de ter um tipo físico de mulher ideal para eu me relacionar. Antes, só se fosse diferente (bem diferente). Tivesse um figurino único. Gostasse de minha companhia mais que tudo. Tivesse no mínimo cabelos longos (e, talvez, uma tatuagem). Soubesse andar de salto alto. Que fosse do tipo rebelde. E, lógico, portadora de um grande coração…
Uma coisa meio Angelina Jolie.
Hoje em dia eu continuo insistindo nos quesitos “gostar de minha companhia mais que tudo” e “portadora de um grande coração”, mas confesso que muita coisa mudou. É, pessoal, não tem jeito. Relacionamento a gente constrói. Dia após dia. Dosando paciência, silêncios e longas conversas. Engraçado que quando a gente pára de procurar o “amor da vida”, um amor pra vida da gente aparece. Sem o glamour da alma gêmea. Sem as promessas de ser pra sempre. Sem borboletas no estômago. Sem noites de insônia. É uma coisa simples do tipo: você conhece a menina. Começa, aos poucos, a admirá-la. A achá-la FODA. E, quando vê, você tá fazendo declarações açucaradas igual um pangaré. (E escrevendo textos no blog – ainda que através de indiretas – para que ela entenda uma coisa: dessa vez, caríssima, é DIFERENTE).
Adeus expectativas irreais, adeus sonhos de adolescente. Ela vai esquecer sempre aquilo que você já leu e comentou com ela, mas vai se lembrar sempre que você gosta do seu pão na chapa com muita manteiga (e aquele pingado com um pouquinho de leite frio). Ela não vai fazer declarações românticas e propor jantares à luz de velas, mas vai saber que você está estressado com o trabalho no primeiro “Oi”, te perdoando docemente de qualquer frase dita com mais rispidez.
Ah, gente, sei lá. Descobri que gosto mesmo é do tal amor. Da paixão, creio que não. Depois de anos escrevendo e insinuando sobre querer alguém que me tire o chão, que me roube o ar, venho humildemente me retificar. Eu quero alguém que divida o chão comigo. Quero alguém que me traga fôlego. Entenderam? Quero dormir abraçado sem susto. Quero acordar e ver que (aconteça o que acontecer), tudo vai estar em seu lugar. Sem ansiedades. Sem montanhas-russas.
Antes eu achava que, se não tivesse paixão, eu iria parar de escrever, minha inspiração iria acabar e me tornaria simplesmente mais um dos inumeráveis companheiros ranzinzas e conformados, prontos para deixar de viver aventuras em prol da estabilidade. Mas, caramba! Descobri que não é nada disso. Não existe nada mais contestador do que amar uma pessoa só. Amar é ser rebelde. É atravessar o escuro. É, talvez, mudar o conceito de tudo o que já pensei que pudesse ser amor. Não, antes era paixão. Antes era imaturidade. Antes era uma procura por mim mesmo que não tinha acontecido.
Sei que já falei muito sobre amor, acho que é o grande tema da vida da gente. Mas amor não é só poesia e refrões. Amor é reconstrução. É ritmo. Pausas. Desafinos. E desafios.
Demorei anos para conhecer direito e até mesmo concordar com o Cazuza: “eu quero um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida”.
Provavelmente antes, se ouvisse essa música, eu pensaria (e não diria): porra, que tédio!
Ah, Cazuza! Parece que ele sempre soube. Paixão é para os fracos. Mas amar – ah, o amor! – Amar é punk.
Esse texto foi recortado-e-colado-e-adaptado do originalíssimo da Fernanda Mello, que – na sua “versão feminina” – pode ser encontrado aqui. Mas, ainda assim, as garatujas acima são tão verdadeiras quanto o original…