Sogra

Fantástica essa crônica (mas… será mesmo uma crônica?…) vinda direta lá do Eneaotil por deduração do copoanheiro de plantão.

Virei sogra. Não estava preparada ainda. Eu sabia que um dia isso iria acontecer, mas achei que fosse ser em 2025, mais ou menos. Não com um filho de 8 anos.

Até então eu só tinha sido meio sogra. Só gra. Ou melhor: ogra. Porque o Lucas tinha namorado outras cem vezes, mas as meninas não. Ele namorava sozinho. Milenca, Giovana, Gabriela, Morgana. Elas nem imaginavam que já tinham tido o seu primeiro namorado.

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Não sei ser sogra. Já experimentei de vários tipos: nova, velha, palmeirense, corinthiana, descolada, reacionária, legal, chata, boa cozinheira, péssima cozinheira, que me fazia rir, que me fazia chorar, maldita, abençoada, mãezona, sogra sogra. Me dei bem com a maioria delas, mesmo quando tive que engolir uma sopa de couve ou um caldo de chuchu com macarrão integral. Ainda assim, perdoei.

Se eu tivesse feito um filho aos 30 e meu filho tivesse arrumado uma namorada aos 30, eu seria daquelas sogras com dupla personalidade, que faz um cachecol para a nora e em seguida envenena os bolinhos de chuva.

Se eu tivesse feito um filho aos 19 e meu filho tivesse arrumado uma namorada aos 15, eu seria daquelas sogras que dá o primeiro porre na nora e vai parar na cadeia depois de ser processada por oferecer bebida alcoólica para menor de idade.

Mas eu fiz um filho aos 19 anos e o dito cujo resolveu arranjar a sua primeira namorada aos 8 anos! Agora eu não posso nem dar um porre de cerveja na criança sem matá-la, muito menos envenenar bolinho de chuva. Porque eu não sei fazer bolinho de chuva!

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O Lucas sempre namorou sozinho até conhecer a Rebecca. Foi tudo muito rápido, uns dois dias depois de conhecer a Morgana. A Rebecca também é da escola nova do Lucas. E tenho que dizer, meninas, que a Rebecca podia fazer uma apostila de abordagem masculina porque venderia como água.

Acompanhe:

Na segunda-feira desta semana, a Rebecca se tornou amiga do Lucas. Na terça-feira, ela pediu seu MSN e telefone. Ligou 17 vezes durante a tarde, sem exagero. Lá pela 16ª vez, o Lucas já estava escondido de medo da Rebecca e não podia nem ouvir o telefone tocar que começava a tremer. Tive que mentir e dizer que ele havia saído, porque senão teríamos a madrugada toda de telefonemas. Na quarta-feira, ela deu uma sumida e o Lucas sentiu sua falta. Até que ela conectou no MSN de noite e apareceu na webcam para ele, com um monte de emoticons de coraçãozinho. Nesta altura do campeonato, a Morgana já tinha ido para o espaço. Hoje a mãe dela me cumprimentou na porta da escola e eu achei aquilo tudo muito estranho.

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Na volta da escola, o Lucas me contou:

– Mãe, acho que a Rebecca gosta de mim. Ela me olha a aula toda.

– Ih…

– Toda vez que eu olho, ela olha…

– Ih…

Aí chegamos em casa, não deu nem 5 minutos e a pentelha Rebecca ligou. Eu disse que ele ia almoçar e que ligasse depois. Vim trabalhar e minha mãe me contou via gtalk:

– O Lucas está há meia hora no telefone com a menininha, fechado no quarto.

E me mandou a seguinte conversa, que o Lucas deixou aberta no MSN:

Lucas diz:
porque na aula voce fica o tempo todo olhando para mim?

Rebecca diz:
eu não fico

Lucas diz:
fica sim
não minta

Rebecca diz:
eu não to mintindo

Lucas diz:
ta sim
fala a verdade

Rebecca diz:
não to

Lucas diz:
eu quero a verdade
vc gosta de min?
não tenha vergonha de falar a verdade
e ve se fala a verdade

Rebecca diz:
fala vc primeiro sinao eu não falo

Lucas diz:
eu não vou falar para niguem
isso e verdade

Rebecca diz:
senão eu não falo

Lucas diz:
ta eu falo

Rebecca diz:
fala

Lucas diz:
vc promete que não conta para nimguem

Rebecca diz:
sim eu juro

Lucas diz:
verdade

Lucas diz:
quer dizer que vc gosta de min?

Rebecca diz:
descubril
descubriu

Lucas diz:
liga para min

Rebecca diz:
ta

Lucas diz:
ta bom

Rebecca diz:
pera

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Não deu cinco minutos desta conversa com a minha mãe e ele me chamou no MSN:

Lucas diz:
mãe

Leonor Macedo diz:
oi amor

Lucas diz:
Não fala para niguem
eu vou te contar uma coisa

Leonor Macedo diz:
conta sim
pode contar
não vou falar pra ninguém

Lucas diz:
eu to namorando a Rebecca

Leonor Macedo diz:
tá namorando????

Lucas diz:
sim

Leonor Macedo diz:
você gosta dela???

Lucas diz:
sim e ela de min

Leonor Macedo diz:
mas como é namorar, Lu?
namoro de criança é diferente, né?

Lucas diz:
è
esse namoro è dar as mãos

Leonor Macedo diz:
só isso, né?

Lucas diz:
é sim

Leonor Macedo diz:
você é um fofo!

Lucas diz:
so sim

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Não deu cinco minutos, eu chamei minha mãe no gtalk, mas esqueci que quem estava usando o computador era o Lucas:

eu: MORRI

Rosemarí: porque

eu: ele tá namorando
pediu pra não contar pra ninguém
vou contar pro mundo já já
mas você não sabe, hein?

Rosemarí: sou eu mãe, no gtalk da vovó
e não conta para o mundo, purfavor

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Sou uma vaca de estar aqui dividindo isso com vocês.

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Parece que nesta conversa de meia hora pelo telefone que ele e a Rebecca tiveram, ela o pediu em namoro. E ele aceitou. Porque se convenceu de que ama a Rebecca.

“Foi um verdadeiro milagre alguém ter aceitado namorar comigo, mãe”, ele me disse pelo telefone. Lindo daquele jeito. Homem é tudo besta.

Então expliquei para ele que ele só tinha 8 anos e que era natural que nunca ninguém tivesse aceitado namorar com ele. Contei da corrente que acredita que a vida começa aos 40 e pedi para que ele pensasse nisso.

– Tá, tá… Quando eu posso chamá-la para vir em casa?

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Alguém sabe uma receita rápida de bolinho de chuva?

Qual parte… você não entendeu?

E eis que nosso anti-herói de plantão, mestre em desventuras como ele só, estava em sua lambreta Honda Biz, levando seu filhote de tenros 7 anos na parte da frente e carregando nos braços algumas famosas sacolinhas de compras.

O menino ali, feliz da vida, com uma mão em cada manopla junto com o papai.

E eis que as sacolinhas começaram a escorregar…

Vira daqui, pára dali, conseguiu arranjar um cantinho para estacionar.

Para melhor entender o que veio a seguir é importante explicar que essa lambreta moto possui somente acelerador, com mudanças de marcha automática – ou seja, sem embreagem. Algo como as antigas Mobylettes: basta acelerar que anda. E essa foi a frase dita ao filhote:

– Filho, o papai vai arrumar as sacolinhas aqui, tá bom? Não é para acelerar, tá bom?

– Tá.

E – é tanto lógico quanto óbvio – o que é que o pequeno petiz fez?

Isso mesmo.

Acelerou!

Rabeia daqui, rabeia dali, equilibra, desequilibra, freia de um jeito ou de outro e parou.

FILHO! Pôxa! O papai não falou que não era para fazer isso? Qual foi a parte do “não é para acelerar” que você não entendeu?

E ele, lambeta:

– O não

Trabalhando

Depois de um feriado prolongado, uma volta ao trabalho intercalada com um dia de molho por causa da garganta, eis que hoje – após as tão cobradas visitas ao médico – por volta da hora do almoço estava eu me preparando para sair.

De repente ouço uma bela duma algazarra no fundo de casa.

E não é que estava toda a criançada lá, sem aula, de sunga, brincando de guerra d’água no gramado com a mangueira?

Bateu uma baita duma vontade de ficar em casa…

What?

Esse negócio de “mundo globalizado” já tá começando a ficar meio que complicado…

Como se não bastasse a criançada agora, desde a mais tenra idade, já começar a aprender inglês na escola – pô, eu fui ter meus primeiros passos de inglês lá pela quinta série, com o malfadado Book One, bem no estilo “what is this? / this is a pencil / what is that? / that is a book / the book is on the table” e por aí afora.

E, além disso, onde outrora reinava o francês (ainda no tempo de meus irmãos mais velhos), temos também o espanhol, que cada vez mais foi ganhando seu espaço e garantindo sua presença nas salas de aula. O mais próximo que chego dessa língua é o famoso “uno pão com mortaduela e una cueca-cuela”

Ou seja, NADA.

Pois bem, agora a Dona Patroa entendeu que a criançada de casa, a famosíssima Tropinha de Elite, deve ter seu nível elevado a Pequenos Ninjas ou Mini Samurais ou Changeboys ou seja lá o raio que for.

Começou a ensinar japonês para eles.

Tudo bem que eu concordo em gênero, número e grau com essa decisão – afinal é uma herança cultural que eles têm todo o direito de possuir e quanto antes puderem aprender, melhor.

Mas nessa brincadeira quem ficou solitário perante os filhotes foi este velho lobo que vos escreve.

É um tal de onegaishimassu daqui, tadaimá dali, shirimassen numa geral, que, não demora muito, creio que não vou conseguir prosear nem mesmo com o caçulinha de cinco anos, ou seja, vou acabar ficando totalmente como um kitigai nessa história (ha!)…

Definitivamente.

O termo ultrapassado obsoleto acabou de ser elevado a um novo patamar…

High low tech?

Curioso como a criançada se acostuma tanto com determinadas “facilidades” que já acham que aquilo faz parte do dia-a-dia…

É que, transantontem, eu e toda a tropinha fomos até o shopping para uma merecida sessão cinema. Tá, na verdade eles foram junto com a Dona Patroa assistir o filme Uma noite no museu II (acho que é esse o nome) – o qual minha criançada adorou não só pelo filme em si mas como também em função de algumas referências ao Star Wars (bando de nerdzinhos…).

E eu?

Bem, eu fui para outra sala assistir Star Trek! 😀

E só não levei a patotinha junto para já ir doutrinando porque na única sala em exibição o filme era legendado…

Mas não é esse o ponto.

O ponto é que, pouco antes de adentrarmos nos recintos, fui com a tropinha para o banheiro (ter que sair no meio do filme – e sem pause – é um horror!). E então meu caçulinha, do alto de seus cinco anos, queria lavar as mãos. Parou em frente da torneira e esticou as mãozinhas. Nada. Agitou as mãos em frente da torneira. Nada. Apertou, de cima pra baixo, a dita torneira. Nada. Daí, finalmente, ele girou a torneira. Ah… Então veio a água!…

Ou seja, sem sensores, sem molas de controle, nem nada nesse sentido. Apenas uma boa e velha torneira tradicional.

Não pude deixar de lembrar uma cena em De volta para o futuro II, onde dois garotos menosprezam uma máquina de jogos porque só funcionava com as mãos. E, ainda, em Star Trek IV, quando, tendo voltado ao passado, o chefe de engenharia Scott tenta falar com um computador usando o mouse como microfone – ao descobrir que deveria utilizar o teclado disse algo como “Oh! Que original!”

Dúvida cruel

Sim, eu sei que o pó está acumulando pelos cantos aqui do blog e o pergaminho aí do fundo está até amarelando. Mas tô trabalhando paca, fazer o quê?…

Mas para que não passemos mais de uma semana totalmente em branco, convém contar um pequeno causo desta semana.

É que meu caçula, o Jean, com quase cinco anos, agora também passou a ter “tarefinhas” da escola. Na realidade algumas atividades lúdicas somente para contextualizar o caboclinho que também existem deveres na vida. Coisas como pintar uma casa, desenhar um gato, fazer as letrinhas do nome, etc.

Devidamente de banho tomado, a Dona Patroa disse-lhe:

– Muito bem. Agora vai lá pra sala com o seu irmão e faça sua tarefinha, tá bom?

– Tá.

Detalhe: quem já estava na sala era o segundo-dos-três, Erik, de sete anos, também cuidando de seus deveres.

E eis que, de longe, foi possível ouvir o seguinte diálogo:

– Oi, Jean. Arruma suas coisinhas aí, tá?

– Tá bom.

– Ah, e se você tiver alguma dúvida me avisa que eu ajudo, tá bom?

– Tá bom. Brigádu.

(Pequena pausa…)

– Erik?

– Oi, Jean?

– Quiquié “dúvida”?…