Desenvolvimento predatório: há solução!

Sei que pode até parecer repeteco – mas distribuindo em mais de um ponto aumentamos a potencialidade do artigo!

E nada melhor que abrilhantar este nosso cantinho com tão ilustre presença…

Segue, pois, o artigo da amiga e eventual copoanheira Jose (já no aguardo de seus textos futuros):

A insustentável leveza do homem e do meio
Joselani Soares

O planejamento ambiental existe para lidar com os conflitos de interesses que opõem o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental. E é por conta do primeiro que existe fragilidade na aplicação do planejamento. Com um histórico de estagnação e de frustrações sobre melhores condições econômicas, o Brasil já deu mostras de querer o desenvolvimento a qualquer preço, ainda que para isso seja necessário colocar em risco um de seus maiores patrimônios: os recursos naturais.

A sanha desenvolvimentista, e ao mesmo tempo predatória, já deixou rastros em ocupações quase que totais de áreas de mananciais, de preservação ambiental. Em alguns casos sobrou pouco para recuperar. Isso significa que já não há o que preservar no Brasil? Não, ainda não. Ao longo do tempo, o País tem implementado medidas para colocar o meio ambiente e a sustentabilidade na ordem do dia. A legislação ambiental é abrangente, atual, há a Política Nacional de Unidade de Conservação (Snuc), Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei de Proteção de Mananciais, Zoneamento Ambiental, e ainda a Agenda 21, que visa proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.

A Política Nacional de Meio Ambiente, criada com a Lei 6.938/81, por exemplo, estabelece alguns passos visando a aplicação do conceito de sustentabilidade. A meta é garantir a adequação dos meios de exploração dos recursos às especificidades do meio ambiente. Com este viés, o planejamento demonstra que tem no conjunto de suas ferramentas legais e na força dos agentes sociais a sua grande potencialidade, caso de fato seja aplicado. É a chance de um país desenvolvido, mas com longevidade.

Em “A insustentável leveza do ser”, o escritor tcheco Milan Kundera fala sobre a condição humana e as fragilidades pelas quais esta é permeada. O romance político-filosófico descreve a oscilação do homem entre o peso e a leveza da vida, de acordo com seus próprios atos. A crônica pode se aplicar também à relação do homem com o meio ambiente. Ao mesmo tempo que cria instrumentos de controle, ele tem dificuldades para conciliar desenvolvimento e sustentabilidade. Entretanto, se a vida na Terra terá peso ou leveza caberá ao homem colocar em prática esta poderosa ferramenta que é o planejamento ambiental.

Joselani Soares é jornalista e pós-graduanda em Educação Ambiental.

Centenário de Guimarães Rosa

“Eu não sei quase nada, mas desconfio de muita coisa.

Cada palavra é, segundo a sua essência, um poema.

Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.

Infelicidade é questão de prefixo.

Na vida, o que aprendemos mesmo é a sempre fazer maiores perguntas.

Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muitos vivazes e claros, mas nas profundezas são tranquilos e escuros como o sofrimento dos homens.

Ah, não; amigo, para mim, é diferente. Não é um ajuste de um dar serviço ao outro, e receber, e saírem por este mundo, barganhando ajudas, ainda que sendo com o fazer a injustiça dos demais. Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é.

Viver é negócio muito perigoso.

Emenda à Inicial: Ah, se não fosse o puxão de orelha do amigo Bicarato… Quase esqueci de avisar! Justamente por inspiração de Guimarães Rosa é que surgiu um novíssimo blog: o Copoanheiros. Visite, deleite-se, comente e brinde a isso!

Exacerbando a competência

Um de meus hobbies é colecionar certas frases ou expressões utilizadas no dia-a-dia das pessoas e que afrontam totalmente a língua portuguesa. Sabendo disso até mesmo os amigos – e, frise-se, amigas – costumam trazer material para essa “coleção” – o que, por exemplo, já foi utilizado em larga escala por aqui. Entretanto, muitas vezes, utilizar corretamente o vernáculo faz com que até o mais banal dos pedidos possa se tornar algo próximo do imcompreensível.

Pois bem.

Neste último fim-de-semana, tirando o pó das catacumbas do meu computador, encontrei algumas anotações que fiz sobre um ofício encaminhado a mando de um delegado no qual ele solicitava estagiários. Deveria ser simples. Coisa de meia dúzia de linhas. Entretanto, vejam só como saiu:

Senhor (…),

Ao saudá-lo cordialmente, elevo à superna apreciação de Vossa Excelência o tema que tem suscitado, por iníquo, justos reclamos do Delegado (…), relativamente à carencia de funcionários, para assegurar a eficiência e a agilidade dos serviços.

(…)

Todavia, este subscritor não envidou esforços para tentar suprir os quadros funcionais, da referida (…), apesar da carência existente, o que não foi e não será possível acomodação pessoal.

Assim, impossível subtrair-se à conclusão de que, se não houver uma acomodação de pessoal à vista da inelutável prevalência dos interesses da comunidade local sobre quaisquer outro, não se quedando em plano inferior à das demais repartições.

Não é a irrefutabilidade do argumento, todavia, que nos anima a essa postulação, mas sim a fidúcia no elevado senso de que ambos concorrem com os elementos de que dispõe para a rápida e eficiência na administração dos trabalhos colocados à disposiçaõ desta comunidade.

Destarte, ao concitar Vossa Excelência à apreciação deste pleito, com a habitual serenidade e sapiência, adotamos, ademais, a liberdade de solicitar quatro (4) estagiários para prestar serviços na (…), daria cobro a injusta situação ora imperante e abriria as portas da continuidade dos serviços prestados com boa eficiência.

Sendo o que me oferecia e renovando protestos de respeito, firmo-me.

Se conseguiu os estagiários? Sinceramente não tenho nem idéia…

Todo prosa

Boa dica vinda do Pedro Doria: está de volta Sérgio Rodrigues.

Como?

Quem é esse tal de “Sérgio Rodrigues”?

Tudo bem. Eu também não sabia. Sérgio Ferreira Rodrigues Pereira, jornalista e escritor, autor dos livros O homem que matou o escritor (Objetiva, 2000), What língua is esta? (Ediouro, 2005) e As sementes de Flowerville (Objetiva, 2006). Começou no Rio de Janeiro como repórter da Folha, em 1984, daí em diante atuou nos mais diversos canais de comunicação, já tendo sido correspondente em Londres, repórter especial, subeditor, editor, chefe de redação na TV, editor executivo, etc. Isso tudo era só pra situar, mas os detalhes podem ser lidos nesta entrevista.

Pude perceber que sua postura é a de quem incentiva a todos (principalmente os blogueiros) a serem grandes leitores – até porque grandes escritores não se criam do dia para a noite, através da mera autopublicação e do aprendizado on-line da língua portuguesa.

Autor da interessante frase de que a Internet “ao seu modo caótico, ela está revigorando a palavra escrita em nossa cultura de uma forma que há pouco tempo seria impensável”, Sérgio Rodrigues está de volta com seu blog sobre literatura contemporânea: o Todoprosa.

Sua recomendação para quem quiser insistir em ser candidato a escritor?

“Ler muito, ler tudo, é o primeiro e mais óbvio dos mandamentos. Escrever, escrever e reescrever, o segundo.”

Boteco’s Bar

Mais uma vez, copiado descaradamente do site do jornalista e copoanheiro Bicarato, que postou lá outro dia. Eu diria que esse texto é e-xa-ta-men-te a minha cara… Afinal, adoro um Boteco’s Bar!

Bar ruim é lindo, bicho

Antonio Prata

Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso frequento bares meio ruins. Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de cento e cinquenta anos. (Deve ter alguma coisa de errado com uma vanguarda de mais de cento e cinquenta anos, mas tudo bem.)

No bar ruim que ando frequentando ultimamente o proletariado atende por Betão – é o garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas, acreditando resolver aí quinhentos anos de história.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos ficar “amigos” do garçom, com quem falamos sobre futebol enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de literatura.

– Ô Betão, traz mais uma pra a gente – eu digo, com os cotovelos apoiados na mesa bamba de lata, e me sinto parte dessa coisa linda que é o Brasil.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos fazer parte dessa coisa linda que é o Brasil, por isso vamos a bares ruins, que têm mais a cara do Brasil que os bares bons, onde se serve petit gâteau e não tem frango à passarinho ou carne-de-sol com macaxeira, que são os pratos tradicionais da nossa cozinha. Se bem que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, quando convidamos uma moça para sair pela primeira vez, atacamos mais de petit gâteau do que de frango à passarinho, porque a gente gosta do Brasil e tal, mas na hora do vamos ver uma europazinha bem que ajuda.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, gostamos do Brasil, mas muito bem diagramado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer bar ruim. Tem que ser um bar ruim autêntico, um boteco, com mesa de lata, copo americano e, se tiver porção de carne-de-sol, uma lágrima imediatamente desponta em nossos olhos, meio de canto, meio escondida. Quando um de nós, meio intelectual, meio de esquerda, descobre um novo bar ruim que nenhum outro dos meio intelectuais, meio de esquerda, frequenta, não nos contemos: ligamos pra turma inteira de meio intelectuais, meio de esquerda e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar ruim.

O problema é que aos poucos o bar ruim vai se tornando cult, vai sendo frequentado por vários meio intelectuais, meio de esquerda e universitárias mais ou menos gostosas. Até que uma hora sai na Vejinha como ponto frequentado por artistas, cineastas e universitários e, um belo dia, a gente chega no bar ruim e tá cheio de gente que não é nem meio intelectual nem meio de esquerda e foi lá para ver se tem mesmo artistas, cineastas e, principalmente, universitárias mais ou menos gostosas. Aí a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio intelectuais, meio de esquerda, as universitárias mais ou menos gostosas e uns velhos bêbados que jogavam dominó. Porque nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos dizer que frequentávamos o bar antes de ele ficar famoso, íamos a tal praia antes de ela encher de gente, ouvíamos a banda antes de tocar na MTV. Nós gostamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que sabem subir em coqueiro e usam sandália de couro, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, de Chevette e chinelo Rider. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina a Vejinha, abomina mesmo, acima de tudo.

Os donos dos bares ruins que a gente frequenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantêm o bar autenticamente ruim, chamam uns primos do cunhado para tocar samba de roda toda sexta-feira, introduzem bolinho de bacalhau no cardápio e aumentam cinquenta por cento o preço de tudo. (Eles sacam que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar caro por aquilo que tem cara de barato.) Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de lata por umas de fórmica imitando mármore, azulejam a parede e põem um som estéreo tocando reggae. Aí eles se dão mal, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa autêntica, tão Brasil, tão raiz.

Não pense que é fácil ser meio intelectual, meio de esquerda em nosso país. A cada dia está mais difícil encontrar bares ruins do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de chinelos Rider e a Vejinha sempre alerta, pronta para encher nossos bares ruins de gente jovem e bonita e a difundir o petit gâteau pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio intelectuais, meio de esquerda que, como eu, por questões ideológicas, preferem frango à passarinho e carne-de-sol com macaxeira (que é a mesma coisa que mandioca, mas é como se diz lá no Nordeste, e nós, meio intelectuais, meio de esquerda, achamos que o Nordeste é muito mais autêntico que o Sudeste e preferimos esse termo, macaxeira, que é bem mais assim Câmara Cascudo, saca?).

– Ô Betão, vê uma cachaça aqui pra mim. De Salinas quais que tem?

Brega Jurídico

Essa veio lá do blog Pepe ponto rede, que escreveu um post bem bacana sobre o que considera Brega Jurídico. Lembro-me que já comentei algo sobre isso por aqui… Em seu texto o autor destacou que “o brega é visceralmente democrático, não é próprio de nenhuma tribo específica da República dos Bacharéis, ele contagia todo mundo: juízes, promotores, advogados, funcionários judiciários, estudantes, estagiários e até peritos”.

Um de seus sintomas, para tentar um falso ar de neutralidade, é a larga utilização da fonte Times New Roman e, ainda da Courier New. Heh… Conheço alguns sujeitos que só se utilizam dessas (ainda bem que estou na Arial)…

E, após, num segundo post, o autor revelou que muita, mas muita gente mesmo, escreveu – ou até mesmo ligou – para reclamar contar que não sabiam que eram bregas. E é onde conclui: “Brega é pensar que sabe mais do que os outros; brega, enfim, é não ter cuidado com a sensibilidade alheia, inclusive com a sensibilidade linguística. Tentando arrancar, assim, a nossa carapuça, brega somos todos nós e essa nossa linguagem judiciária, que ricocheteia, perdida, entre a retórica e a equidade, sem saber por onde escapulir.”

E, lá em seu site (onde constam os devidos créditos), ele se incumbiu de fazer um dicionariozinho do brega jurídico, onde já constam as seguintes colaborações:

– A duas
– A uma
– Achega pretoriana
– Aresto Doméstico
– Arqui-sabido
– Autarquia ancilar
– Caderno Probatório
– Consideração postrema
– Consonar-se
– Contérminos Hieráticos
– Dar ensanchas
– Denota-se
– Desabrochar da operação cognitiva
– Digesto Obreiro
– Douto Louvado
– Em ressunta
– Entendimento turmário
– Entranhas Meritórias
– Ergástulo Público
– Escólio
– Exordial
– Frontear
– Grassar controvérsias
– Indigitado
– Juiz Autóctone
– Juiz de Piso
– Lado outro
– Matéria Abojada
– Meritíssima Vara
– Nada obstante
– Oferecer armês ao assuntado
– Ombrear
– Operador do direito
– Perfunctório
– Perlustrar os autos
– Peça Atrial
– Peça de Arranque
– Peça Gênese
– Peça Incoativa
– Peça Increpatória
– Peça Ovo
– Peça Primeva
– Peça Prodrômica
– Peça Pórtico
– Peça Umbilical
– Peça Vestibular
– Plano zetético
– Preexcelso Paracleto
– Pronunciamento Fósmeo
– Recurso Prepóstero
– Remédio heróico
– Renhidas porfias
– Repositório Adjetivo
– Sentença guerreada
– Sentença Vergastada
– Serôdio
– Sodalício
– Supedâneo
– Trazer à liça
– Tudo joeirado
– Ventre dos autos

Assim, se você usa ou já usou algumas das expressões acima, saiba que pode tranquilamente se considerar um integrante do mundo do Brega Jurídico.

Particularmente percebi que eu uso um monte… Merda!