A finalização das obras da avenida Teotonio Vilela (Fundo do Vale), embora represente o fim de um longo período de restrições ao trânsito na região, reflete a miopia da administração municipal. Num momento em que o mundo discute e reproduz iniciativas em prol da chamada “sustentabilidade”, ainda que tal conceito seja uma utopia dado o nível de consumo da sociedade global, é triste perceber que um município com economia pujante, de perfil tecnológico e vanguardista, como São José dos Campos, não tenha movido esforços para um real aumento da qualidade de vida dos seus cidadãos. Por qualidade de vida entenda-se um termo mais abrangente, que envolve: ar mais limpo, menor geração de resíduos, maior qualidade das águas, maior e melhor mobilidade urbana, dentre outros itens. O fato é que as obras na avenida Teotônio Vilela, que já duram mais de uma década, se consideradas todas as intervenções após a ligação com o anel viário, sempre estiveram associadas à contenção de enchentes, sem nunca conseguir resolver definitivamente este problema. E a causa é simples: trata-se de um ponto de relevo baixo – é bom lembrar que a avenida foi construída sobre o córrego Lavapés – que recebe, invariavelmente, o aporte de águas pluviais de todo o entorno impermeabilizado. Enquanto diversas cidades em países desenvolvidos têm procurado resolver tais questões com a renaturalização de rios urbanos, nosso município tem investido em soluções anacrônicas de engenharia, as quais, numa análise de longo prazo, se mostram apenas paliativas e onerosas ao erário público. E basta percorrer outras obras no próprio anel viário – o alargamento das vias e a ocupação das margens do ribeirão Vidoca, nas avenidas Jorge Zarur/Mário Covas e Eduardo Cury – para perceber os elementos desta visão curta e ultrapassada de administração municipal. Esta, ao invés de aproveitar a lição do embargo temporário da obra de duplicação destas vias alguns dias antes da sua inauguração oficial – por desrespeitar os limites mínimos de distância de cursos d’água – e promover usos públicos diferenciados nestas áreas, optou pela ocupação econômica limitando-se a estabelecer tamanhos mínimos para empreendimentos no local.
Por outro lado, o alargamento das vias reflete um compromisso com o transporte individual em detrimento de qualquer iniciativa de redução de emissões atmosféricas. Não se percebe nenhuma outra ação neste sentido: o sistema de semaforização não é inteligente, o município não investe em inspeção veicular – como já ocorre, por exemplo no Rio de Janeiro -, não há incentivos a outras modalidades de mobilidade, como a bicicleta – apesar de haver lei neste sentido, a administração insiste no conflito conceitual e implanta precariamente ciclofaixas, como se estas vias cumprissem o papel das ciclovias.
A lista se estende a outros aspectos ambientais: apesar de existir legislação anti-ruído, os esforços se reduzem ao atendimento protocolar de reclamações, sem qualquer pro-atividade; a cidade cresce sem uma adequação e controle da poluição visual. Embora a criação da Secretaria de Meio Ambiente tenha sido entendida como um alento, a mesma sofre de um ostracismo político no seio da administração e possui pouca ou nenhuma ingerência sobre o planejamento municipal. Enquanto isso, o município atinge o patamar dos 700.000 habitantes, já bem acima do que estudos acadêmicos nos EUA dos anos 90, apontavam como sendo o limiar dos benefícios da economia de escala para cidades daquele país, em torno de 500.000 habitantes. Atualmente já não é preciso um estudo científico metódico e rigoroso para perceber a relação dose-resposta do crescimento da cidade e de seu ônus socioambiental.
Curiosamente, o prefeito Eduardo Cury, em um de seus discursos após a posse do atual mandato, preconizava um número pictórico de 1 milhão de habitantes como meta para uma São José dos Campos sustentável. Não sei onde o prefeito, ou sua assessoria, levantou tal número, mas posso dizer que em hipótese alguma ele refletiria o tamanho de uma cidade “sustentável”. Há que chegar o momento – e São José dos Campos está carecendo disso – em que uma liderança política, imbuída de uma visão peculiar e visionária, apontará o cenário de uma cidade onde a qualidade de vida se torne, de fato, e em seu caráter mais abrangente, o objeto de trabalho da administração municipal. Nada impede, e, aliás, seria algo muito auspicioso, que a mudança de visão ocorresse já.
Wilson Cabral de Sousa Júnior é professor-adjunto do ITA
Publicado no jornal Valeparaibano de 11/12/2009