Tá.
Confesso que o título poderia ser mais criativo. Mas tô com preguiça, sem criatividade, com o nariz doendo e a lei é bastante objetiva – pois sequer precisou de decreto para regulamentá-la.
Resumo da ópera: se você gastar pelo menos dez vezes o valor da taxa de estacionamento de um shopping num prazo inferior a seis horas não precisa pagar nada.
Lei Estadual nº. 13.819, de 23.11.2009
Dispõe sobre a cobrança da taxa de estacionamento por “shopping centers”.
O PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA:
Faço saber que a Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo, nos termos do artigo 28, § 8º, da Constituição do Estado, a seguinte lei:
Artigo 1º – Ficam dispensados do pagamento das taxas referentes ao uso de estacionamento, cobradas por “shopping centers” instalados no Estado de São Paulo, os clientes que comprovarem despesa correspondente a pelo menos 10 (dez) vezes o valor da referida taxa.
§ 1º – A gratuidade a que se refere o “caput” só será efetivada mediante apresentação de notas fiscais que comprovem a despesa efetuada no estabelecimento.
§ 2º – As notas fiscais deverão, necessariamente, datar do mesmo dia em que o cliente fizer o pleito de gratuidade.
Artigo 2º – A permanência do veículo, por até 20 (vinte) minutos, no estacionamento dos estabelecimentos citados no artigo 1º deverá ser gratuita.
Artigo 3º – O benefício previsto nesta lei só poderá ser percebido pelo cliente que permanecer por, no máximo, 6 (seis) horas no interior do “shopping center”.
§ 1º – O tempo de permanência do cliente no interior do estabelecimento deverá ser comprovado por meio da emissão de um documento quando de sua entrada no respectivo estacionamento.
§ 2º – Caso o cliente ultrapasse o tempo previsto para a concessão da gratuidade, passará a vigorar a tabela de preços de estacionamento utilizada normalmente pelo estabelecimento.
Artigo 4º – Ficam os “shopping centers” obrigados a divulgar o conteúdo desta lei por meio da colocação de cartazes em suas dependências.
Artigo 5º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, aos 23 de novembro de 2009.
a) BARROS MUNHOZ – Presidente
Publicada na Secretaria da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, aos 23 de novembro de 2009.
a) Marcelo Souza Serpa – Secretário Geral Parlamentar
Emenda à Inicial: Alegria de pobre dura pouco. A Lei acima foi suspensa na tarde do dia 26/11/09 pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo atendendo a um pedido liminar em Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Associação Brasileira dos Shopping Centers (ABRASCE). Como parâmetro foram utilizadas decisões já existentes nas cidades de Jacareí, São José dos Campos e Campinas. Principal alegação: “somente a União pode legislar sobre propriedades privadas”.
Curioso.
Se eu parar meu carro no estacionamento de um shopping, tenho que pagar porque trata-se de propriedade privada.
Mas se eu acender um cigarro no mesmo local, tenho que apagar porque trata-se de uma área pública.
Alguém conseguiria me explicar a diferença?
Pagando para gastar
O estacionamento pago em lojas, shopping centers e supermercados deveria ser simplesmente proibido. Onde já se viu pagar a particulares por um serviço público e por uma responsabilidade que cabe exatamente àqueles que lucram com nossa presença?
Entretanto, já que o elitizado Judiciário tolera esse absurdo, condicionar a cobrança ao valor gasto pelo cliente representa, sim, interferência indevida em assunto privado. Que critérios serviram para o cálculo? Quanto lucra uma terceirizada que presta esse serviço? E ela tem obrigação de divulgar suas planilhas?
O estacionamento pago, além da tunga evidente, possui uma utilidade segregacionista que todos conhecem e secretamente comemoram. O povaréu fica relegado aos centros urbanos depreciados, enquanto os ricos se escondem nesses castelos arejados de bem-estar sorridente.
É interessante verificar que a Justiça e o governo José Serra repudiam a gratuidade com o mesmo argumento que os donos de bares tentaram usar contra a inconstitucional lei antifumo. Mas, sabemos, Serra pode tudo.
No fundo, o aborto de iniciativas regulatórias serve apenas para corroborar uma situação anterior, em si questionável: fingem mexer na cobrança, recuam e a cobrança permanece, mais forte que nunca.
Guilherme, apesar de também achar um absurdo essa cobrança, vamos por partes:
– o Executivo não queria a lei;
– o Legislativo passou por cima do Executivo e sancionou a lei à revelia deste;
– o Judiciário, por iniciativa de particulares, suspendeu a lei.
Na realidade o negócio é mais confuso que parece.
Mas, ainda assim, reitero meus argumentos ali da “Emenda à Inicial”…