(Ele é aquele velhinho, de barba branca, que fica lá em cima das nuvens e que nos ama mesmo quando aprontamos. Simples assim.)
Mais uma do livro Comer, Rezar, Amar e que – pasmem! – ainda não terminei de ler. Não que o livro não seja bom (porque é), não porque seja chato (e não é), nem porque eu esteja sem tempo (pois tenho). Mas na minha infindável correria diurna nos últimos tempos a jornada noturna invariavelmente tem sido um simples apagar de neurônios!
Mas, pela sua simplicidade e objetividade, o trecho a seguir me chamou a atenção (assim como muitos outros do livro). É uma daquelas histórias que eu sempre conheci ainda que nunca tenha a ouvido antes…
Os rituais religiosos muitas vezes nascem da experimentação mística. Algum corajoso explorador sai à procura de um novo caminho rumo ao divino, tem uma experiência transcendente e volta para casa profeta. Ele ou ela traz de volta para a comunidade histórias do paraíso e um mapa que ensina a chegar lá. Os outros repetem as palavras, as ações, as preces e os atos desse profeta de forma a passarem, eles também, para o outro lado. Algumas vezes conseguem – algumas vezes, a mesma conhecida combinação de sílabas e práticas de devoção, repetida ao longo das gerações, pode levar muitas pessoas para o outro lado. Algumas vezes, porém, isso não funciona. Inevitavelmente, até mesmo as idéias mais originais acabarão endurecendo e se transformando em dogma, ou pararão de funcionar para todo mundo.
Os indianos desta região repetem uma fábula de alerta sobre um grande santo que estava sempre cercado, em seu ashram, por devotos leais. Durante horas por dia, o santo e seus seguidores meditavam sobre Deus. O único problema era que o santo tinha um gato jovem, uma criatura irritante, que costumava atravessar o templo miando, ronronando e incomodando todo mundo durante a meditação. Então o santo, com toda sua sabedoria prática, ordenou que o gato fosse amarrado a um poste do lado de fora durante algumas horas por dia, apenas enquanto durasse a meditação, para não incomodar ninguém. Isso se tornou um hábito – amarrar o gato ao poste e, em seguida, meditar sobre Deus – mas, com o passar dos anos, o hábito se consolidou, transformando-se em um ritual religioso. Ninguém conseguia meditar a menos que o gato fosse amarrado ao poste primeiro. Então, um dia, o gato morreu. Os discípulos do santo entraram em pânico. Foi uma enorme crise religiosa – como poderiam meditar agora sem um gato para amarrar no poste? Como conseguiriam alcançar Deus? Em suas mentes, o gato tornara-se o meio.
Tomem cuidado, alerta essa história, para não se tornarem obcecados demais com o ritual religioso por si só. Sobretudo neste mundo dividido, onde o talibã e a coalizão cristã seguem travando sua guerra internacional de patentes para resolver quem detém os direitos em relação à palavra Deus, e quem tem os rituais adequados para alcançar esse Deus, pode ser útil lembrar que amarrar o gato ao poste nunca levou ninguém à transcendência, mas sim o desejo individual constante de um discípulo de vivenciar a eterna compaixão do divino. A flexibilidade é tão essencial para a divindade quanto a disciplina.