Insônia

Uma noite.

Longa.

Muito longa.

Um disco de blues ao fundo.

Um dos poucos que eu realmente conheço…

Algumas cervejas.

Um maço de cigarros.

Solidão.

Própria, pretendida e merecida.

E me pergunto…

De que são feitos os caminhos?

De pretensões, ilusões, iniciativas, sonhos. Caminhos são nossa eterna busca por aquilo que desconhecemos e, ainda assim, almejamos conquistar. Conseguir. Simplesmente chegar lá – onde quer que seja, quando quer que seja, onde quer que esteja, por onde quer que siga. Os caminhos não foram feitos para se chegar, pois são simplesmente um meio. O chegar não é o fim, o caminho sim. O que importa verdadeiramente é a viagem. Eles  nos levam ao ponto onde pretendemos chegar (ainda que não saibamos) para, de fato, começar um novo caminho. Os caminhos nos levam ao nosso destino.

O que é o destino?

É um sem-fim de possibilidades. Uma miríade de alternativas. E o curioso – como sempre digo – é que, ultrapassadas todas as encruzilhadas, todas as prováveis, possíveis e indefiníveis bifurcações, em algum momento olharemos para trás e veremos que existia apenas um caminho a ser trilhado. Ainda que não o enxergássemos. Mas o caminho era óbvio – depois de ultrapassado. Era o que tinha que ser. Era o destino.

O que é um blues?

É um sax rasgado. Um piano martelado. Um clarinete chorado. Uma corda arrebentada. Um interminável lamento. Uma nota dissonante na constância de nossas vidas que nos leva a um estado de espírito propenso a avaliar, reavaliar e novamente avaliar todos os caminhos trilhados. E chegar à incontestável conclusão que o caminho jamais termina, segue por incontáveis retornos, encruzilhadas e novos caminhos – cada vez mais distantes do pretenso fim que almejávamos, o qual cada vez mais também se torna distante, tal qual miragem que serpenteia na linha do horizonte, delineada, febril, palpável e inatingível.

E o que nos leva a teimar em trilhar esse serpentuoso caminho para este nosso pretendido destino sob os acordes de um blues que nos toca a alma?

Creio eu que, talvez, a esperança. A eterna esperança de que dias melhores virão. Que nossas pretensões serão atingidas, nossas ilusões se concretizarão, nossas iniciativas renderão frutos, nossos sonhos se tornarão realidade. E assim voltamos à motivação que nos leva ao caminho. Que nos leva ao destino. Que, por minha própria escolha, é trilhado no ritmo de um blues. E cujo combustível para se manter em movimento é a própria esperança.

Essa, talvez, seja a verdade que hoje – agora – me serve como explicação para o caminho que decidi trilhar. Incontáveis percalços e incompreensões fazem parte deste meu caminho. Provavelmente não seja o seu, do seu amigo, do seu vizinho, do seu parente – mas, até onde posso perceber, é o meu. Pela simples teimosia de tentar encontrar a miragem que sequer consigo delinear claramente com minha visão ou mesmo com minha mente. Mas é meu. E dele não abro mão.

Resta-me a certeza de estar certo segundo minhas próprias convicções, por mais absurdas que pareçam ao alheio olhar que teima em me julgar segundo suas próprias convicções. Não há certo nem errado. O que existe na realidade, além desse mundo de percepção onde preto e branco imperam – e muito além do cinza (mera nuance da mescla entre ambos) é um terceiro estado, uma terceira palavra, uma que não existe, além do que se define como certo, além do que se define como errado.

E é pra lá que vou.

E é isso que me atormenta.

E é isso que me conforta.

E sigo através de minha própria, pretendida e merecida solidão.

Com um maço de cigarros.

Algumas cervejas.

Com alguns dos poucos blues que conheço ao fundo.

Através de uma longa noite.

Da mais pura insônia…

2 thoughts on “Insônia

  1. A insônia faz com que vc analise bem algumas questões importantes da vida…pelo visto a cabeça não parou de funcionar a noite toda!

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