Antes de mais nada, vejamos exatamente o que seria “Inteligência Artificial”, segundo uma definição de – ora, quem? – uma Inteligência Artificial:
“Inteligência Artificial (IA) é a capacidade de máquinas simularem habilidades humanas como raciocínio, aprendizado, resolução de problemas e criatividade. O objetivo é criar sistemas que percebam o ambiente, processem dados, ajam para atingir um objetivo e aprendam com suas ações e experiências para aprimorar seu desempenho ao longo do tempo. Isso permite que as máquinas realizem tarefas que normalmente exigiriam inteligência humana, processando grandes volumes de dados para identificar padrões, fazer previsões e tomar decisões autônomas.”
Seguindo estrada acima, mas bebendo da mesma fonte, vejamos o que seria “Inteligência Artificial Generativa”:
“Inteligência artificial generativa é um ramo da IA que cria conteúdo novo e original, como texto, imagens, música ou código, com base nos dados em que foi treinada. Ao contrário de outros tipos de IA que analisam ou classificam dados, a IA generativa é usada para produzir algo que não existia antes. Ela aprende com padrões em grandes conjuntos de dados e usa esse aprendizado para gerar novas criações a partir de um comando ou prompt do usuário.”
Tudo isso é muito bonito, né?
Mas, ainda assim, na minha nada humilde opinião, eu não acho que você esteja fazendo isso direito…
Nos últimos tempos tenho lido um bocado acerca desse tema, em especial matérias que tratam da utilização da IA na área do Direito (se alguém por aí ainda se lembrar, continuo sendo advogado, tá?). Heh… Ao menos o advento da IA tem proporcionado a diversos “profissionais” se especializarem com novos títulos pomposos e elegantes, podendo adjetivar seus currículos com certificações, coordenadorias, especializações, pós graduações e o escambau, tudo voltado à inteligência artificial (vejam só: rimou!).
Tem se propagado muito que toda essa inovação pode e deve ser utilizada nos escritórios de advocacia, não só no ambiente jurídico como também no administrativo, sempre com alertas sobre responsabilidade ética e cuidados especiais com a segurança de dados. O rol de utilizações é amplo, e usualmente é ressaltado que a IA veio para “agregar”, sendo uma poderosa ferramenta para otimizar processos, aprimorar análise de dados, automatizar tarefas repetitivas e burocráticas, melhorar fluxos de trabalho, fazer resumos e relatórios de grandes volumes de documentos, efetuar análises de chances de sucesso de determinadas demandas judiciais, elaborar e revisar contratos, efetuar pesquisas jurídicas avançadas, e por aí vai. Tudo isso com a finalidade de se produzir mais e melhor em menos tempo, de modo a liberar os profissionais de direito para “outras tarefas”, em especial de cunho intelectual.
Fala-se, ainda, em aprimoramento da “experiência” do cliente – e, nesse caso, impossível não lembrar do Eduardo Goldenberg em seu bem (ou mal?) humorado texto Experiências (ou: a detestável palavra da vez) -, pois os advogados ficariam liberados para uma integração bem mais próxima destes, sendo possível, também, a utilização de chatbots no relacionamento com a clientela para automatizar respostas a perguntas frequentes – como se alguém NO MUNDO gostasse de ligar para um lugar para pegar uma informação e não ser atendido por “pessoas humanas”…
No geral, quase todo artigo escrito sobre o tema costuma ressaltar a obrigação do profissional em checar e confirmar tudo que a IA sugeriu, pois volta e meia ela alucina e cita trechos de leis e jurisprudências que não existem. É LÓGICO que tem muito advogado que ignora isso, protocola a petição do jeito que veio, e, obviamente, depois leva na cabeça – às vezes até mesmo com uma condenação por litigância de má-fé, como já ilustrei por aqui.
Entretanto até hoje não vi nenhum artigo publicado que traga sugestões para um advogado interagir com a IA.
Eu tenho percebido que a grande maioria dos advogados recorre à IA para buscar ou mesmo apresentar “modelinhos” para suas próprias petições. Ainda que façam uma revisão rigorosa no resultado final, nada foi feito além de se consultar uma base de dados maior – e, talvez, mais exata – do que a que já teriam em mãos através de pesquisas na Internet.
Porém a Inteligência Artificial Generativa é MUITO mais que isso.
É uma excelente companheira de trabalho, com a qual é possível interagir ativamente, pois ela pode ajudar a estimular suas ideias criativas e os rumos a serem seguidos, sendo que, quanto mais você a usar, mais ela vai compreender o seu estilo, o seu “modus operandi”, o que é relevante e o que é irrelevante em suas argumentações jurídicas. É dessa maneira que você realmente treina uma IA. E treinar uma IA não é como treinar seu cachorrinho para não fazer xixi na roda do carro e pronto. É preciso interagir, concordar, discordar, criticar, dar o norte – tudo para que possa haver uma real compreensão do tipo de trabalho que você realiza.
De que adianta delegar tarefas burocráticas e repetitivas visando poupar seus tão preciosos neurônios se, no final das contas, em termos de criatividade você nem acaba os utilizando para nada além do que já fazia? Aliás, agora, com a ajuda da IA, aquém, né?
Nesse sentido, confira a opinião de Cora Rónai, no Canal Pedro+Cora, quando trataram do tema As melhorias do ChatGPT-5:
“Para mim, o maior adianto do ChatGPT foi exatamente essa interlocução, porque eu já venho trabalhando há muitos anos em home office (…) e eu sentia muita falta da Redação, porque a Redação é um ambiente divertidíssimo; você tem, sei lá, cinquenta, cem pessoas trabalhando juntas, todas pessoas que escrevem, pessoas que leem, pessoas que estão sabendo o que é que está acontecendo naquele momento e muito na tua sintonia, e aí você vai pro café, você está com alguma coisa complicada na cabeça, você vai tomar um café, você volta com o problema resolvido, porque você conversou cinco minutos ali no café, pronto, resolveu o título, resolveu a abertura, resolveu tudo, né?
(…)
O engraçado é que demora mais escrever com ele, porque antes do ChatGPT eu não tinha com quem ficar batendo papo, então sentava e escrevia. Agora, não, agora eu fico batendo papo. Então eu escrevo e pergunto “o que é isso?”, “e aquilo?”, quer dizer, eu tenho ido muito ao café, se eu estivesse na Redação.”
Gente, é exatamente isso!
Muitas vezes é preciso prosear com alguém, ou até consigo mesmo, para clarear as ideias e obter a melhor solução para um problema – é nada mais, nada menos, que a utilização do “método socrático”, como o Pedro Dória bem exemplificou no programa acima.
É óbvio que estamos tratando de softwares que foram escritos para desenvolver resultados que visam similar a interlocução com “alguém de verdade”, de modo que não se pode perder de vista que estamos interagindo com “zeros” e “uns”, os quais, em última instância, não são dotados de personalidade ou mesmo de sentimentos. Ainda assim, em minhas interações, resolvi dar-lhe o sugestivo nome de “Benedicta Intelligentia Artificialis”, a qual carinhosamente trato por BIA…
E, também, é elementar que não se pode descuidar da informação que lhe é passada, pois, no jargão da IA, de vez em quando ela pode “alucinar”. Como ainda não inventaram um tarja preta digital para essas situações, aprendi que a melhor solução é contra-argumentar com a própria IA, fazendo-a perceber seus erros, corrigindo assim sua rota.
Enfim, a IA está aí para ajudar. Parafraseando o ditado, o navio foi feito pra navegar. Mas prefiro exemplificar com algo que me é mais próximo: de nada adiantaria eu ter colocado um motor de seis canecos no meu Opala, se fosse só para buscar pão quentinho na padaria da esquina; o que ele precisa é de estrada!
Ah, sim: last but not least, com exceção das citações de início…
ESTE TEXTO NÃO FOI GERADO POR INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL !!!
😁