Lagartixadas jurídicas

Antes de mais nada, vamos deixar bem claro uma coisa: com todo o respeito ao nível cultural de cada um que por aqui passa – e que pode até achar que este meu aviso seria alguma espécie de “exagero etimológico” -, o correto é LAGARTIXA, um carinhoso diminutivo da palavra LAGARTO, portanto não me venham largar nos meus ouvidos nenhuma LARGATIXA, ok?

Dito isto, numa das eternas faxinas que costumo fazer lá nas catacumbas de meu computador, encontrei uma sentença, que, com certeza, devo ter deixado de lado para oportunamente publicar aqui no blog, mas nem me lembro mais quando ou onde consegui cópia dessa pérola jurídica.

Sem mais delongas, ei-la:

Processo nº 082.11.000694-3

Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível/Juizado Especial Cível

Vistos, etc.

Trata-se de ação que dispensa a produção de outras provas, razão pela qual conheço diretamente do pedido.

A preliminar de complexidade da causa pela necessidade de perícia deve ser afastada, porquanto a matéria é singela e dispensa qualquer outra providência instrutória, como dito.

Gira a lide em torno de um acidente que vitimou uma lagartixa, que inadvertidamente entrou no compartimento do motor de um aparelho de ar condicionado tipo split e que causou a sua morte, infelizmente irrelevante neste mundo de homens, e a queima do motor do equipamento, que foi reparado pelo autor ao custo de R$ 664,00 (fl. 21), depois que a ré recusou-se a dar a cobertura de garantia.

É, portanto, indiscutido nos autos que a culpa foi da lagartixa, afinal, sempre se há de encontrar um culpado e no caso destes autos, até fotografado foi o cadáver mutilado do réptil que enfiou-se onde não devia (fl. 62), mas afinal, como ia ele saber se não havia barreira ou proteção que o fizesse refletir com seu pequeno cérebro se não seria melhor procurar refúgio em outra toca – eis aqui o cerne da questão, pois afinal uma lagartixa tem todo o direito de circular pelas paredes externas das casas à cata de mosquitos e outros pequenos insetos que constituem sua dieta alimentar. Todo mundo sabe disso e certamente também os engenheiros que projetam esses motores, que sabidamente se instalam do lado de fora da residência, área que legitimamente pertence às lagartixas. Neste particular, tem toda a razão o autor, se a ré não se preocupou em lacrar o motor externo do split, agiu com evidente culpa, pois era só o que faltava exigir que o autor ficasse caçando lagartixas pelas paredes de fora ao invés de se refrescar no interior de sua casa.

Por outro lado, falar o autor em dano moral é um exagero, somente se foi pela morte da lagartixa, do que certamente não se trata. Houve um debate acerca da questão e das condições da garantia, que não previam os danos causados por esses matadores de mosquitos. Além disso, o autor reparou o equipamento, tanto que pretende o ressarcimento do valor pago, no que tem razão. E é só. Além disso, é terreno de locupletamento ilícito à custa de outrem.

Diante do exposto, julgo parcialmente procedente a ação, para condenar a ré a ressarcir o autor da quantia de R$ 664,00 (seiscentos e sessenta e quatro reais), a ser acrescida de juros de mora de 1% desde a citação e correção monetária pelo INPC, desde o desembolso (fl. 62).

Sem custas e sem honorários.

P. R. I.

Florianópolis (SC), 22 de fevereiro de 2012.

Hélio David Vieira Figueira dos Santos
Juiz de Direito

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