Sobre as idéias de propriedade

Estudando alguns textos acerca de Creative Commons, deparei-me com o seguinte trecho, muito elucidativo e surpreendentemente atual:

Se a natureza fez alguma coisa menos suscetível que outras de tornar-se propriedade exclusiva, é a ação do poder pensante chamado ‘uma idéia’ que um indivíduo pode possuir com exclusividade, enquanto a mantiver para si próprio; desde que essa idéia é divulgada, ela se torna posse de todos, e o receptor não pode despossuir-se dela. É característica peculiar dessa idéia, também, que ninguém a possui em parte porque qualquer outro a possui no todo. Aquele que recebe de mim uma idéia tem aumentada a sua instrução sem que eu tenha diminuída a minha. Como aquele que acende sua vela na minha recebe luz sem apagar a minha. Que as idéias passem livremente de uns aos outros no planeta, para a instrução moral e mútua dos homens e a melhoria de sua condição, parece ter sido algo peculiar e benevolentemente desenhado pela natureza ao criá-las, como o fogo, expansível no espaço, sem diminuir sua densidade em nenhum ponto. Como o ar que respiramos, movem-se incapazes de serem confinadas ou apropriadas com exclusividade. Invenções, portanto, não podem, na natureza, ser sujeitas à propriedade.

Thomas Jefferson

Ainda voltaremos a falar mais sobre isso por aqui…

“Mensagem para você”

Joselani SoaresEm mais um habitual copy & paste do Alfarrábio (juro que não é falta de criatividade!) temos uma mensagem recebida de uma amiga em comum, a repórter Jôse, que aproveitou uma noite de insônia e inspiração para um bom desabafo que pode render uma também boa reflexão.

Esta msg é para vc…

Esta msg é para vc que nunca gostou do Lula/PT ou que passou a não gostar depois desses quase quatro anos de governo, principalmente por tomar conhecimento de casos de corrupção trazidos à tona nesse período.

Esta msg específica não visa mudar seu voto. Vivemos em uma democracia (obtida a duras penas, vale dizer) e vc tem todo o direito de dizer que vai votar no Alckmin. Mas peço, por favor, que não justifique seu voto falando em “limpar” o Brasil de políticos corruptos, de resgatar a moralidade e a decência do país. Não, por favor.

Falar que vai votar no PSDB/PFL para “limpar o Brasil da ‘corja do PT'” é o mesmo que dizer que vai fazer faxina em sua casa utilizando excremento.

Por favor, pelo bem da moralidade e da decência, justifique seu voto no seguidor da Opus Dei, admitindo que não se importa com as privatizações que virão –o que, segundo Eduardo Galeano, significam a humilhação para a soberania de uma nação vendida a preço de banana.

Justifique seu voto admitindo que não se importa com o fato de a coligação PSDB/PFL pouco ou nada fazer para tentar diminuir a desigualdade social em nosso país (aliás, que se lixem os pobres, né não?).

Justifique seu voto admitindo que até podem ocorrer caso de corrupção, mas desde que a população não fique sabendo, afinal, é muito chato viver em um país com tantos escândalos, com tanta notícia de atos sujos em nossa política. Mas quanto a isso, realmente podem votar em paz, atos de corrupção não chegarão a ser chamados de “escândalos”, porque grandes veículos de imprensa são direta ou indiretamente ligados a grupos políticos como PSDB/PFL e por isso não terão interesse em divulgar (vide caso do dossiê: a origem do dinheiro é uma busca incessante, enquanto que o conteúdo do objeto de desejo de membros do PT não é sequer questionado. Estranho pensar que alguém pode querer pagar tanto por tão pouco…) e que políticos pagos (PSDB/PFL sabem o que é isso, pois souberam comprar a aprovação da reeleição para beneficiar FHC) não irão denunciar, e poucas (talvez nenhuma?) CPIs serão instaladas. Aliás, que tédio ver os telejornais mostrando aqueles depoimentos intermináveis no Congresso! Fora as notícias constantes de propinoduto, caminho do dinheiro sujo…

Enfim, para vc que não fez qualquer movimento pelo voto nulo (seria uma chance para vc tentar mudar o processo eleitoral e livrar o país de tantos escândalos) ou não optou por qualquer outro candidato/partido que não estivesse envolvido em casos de corrupção, não venha falar em limpeza/decência/moralidade na hora de justificar seu voto na coligação PSDB/PFL.

Como foi dito no início, essa msg não quer mudar seu voto, mas caso esteja em dúvida sobre qual o mal menor para o país, compare propostas (descubra quais são as do “desafiante”) e os números do atual governo com os oito anos comandados pela frente PSDB/PFL e faça o julgamento. Isso pode ajudar a obter novos e concretos argumentos para a justificativa do voto.

A não ser que queira falar como o senador Jorge Bornhausen (PFL) quando disse: “Vamos acabar com essa raça”, referindo-se ao PT. Dessa maneira simplista de “limpar” nosso país, não resgatamos valores como decência e moralidade e caímos em um discurso demagogo e vazio. Nada mais.

Joselani Soares

O passado bate à porta (II)

Irmãs Cajazeira1948. Seu Bento (vulgo Meu Pai) tinha, então, apenas onze anos de idade e veio do interior de Minas, juntamente com toda sua família, de trem, para o Vale do Paraíba, em São Paulo, onde seu pai (vulgo Meu Avô) resolveu tentar nova vida. Instalaram-se na zona rural de São José dos Campos, a família cresceu, fizeram amigos, conheceram o povo em geral. Pouco mais de dez anos depois seu Bento casou-se com Dona Dete (vulgo Minha Mãe) e instalaram-se na mesma cidade, no bairro de Santana (também conhecido como estância hidromineral – muita água em baixo e mais mineiro ainda em cima). Repetiu-se o ciclo, tiveram seus filhos e também eu nasci, sem saber que num futuro não muito distante teria a aparência física tão semelhante à de meu pai.

1988. Um ano que começou quente e abafado, com chuvas tão ligeiras que mal era possível se refrescar. Eu (vulgo Eu mesmo) havia me casado há pouco tempo e estava de mudança para uma casa nova, ainda em reforma, em Santana. Bairro antigo na cidade, onde a maioria dos moradores já remontava a outras épocas. Dentre estes, estavam as chamadas “Irmãs Cajazeira”. Quem se lembrar da antiga série “O Bem Amado”, com Odorico Paraguaçu, Zeca Diabo e outros personagens pra lá de caricatos também vai se lembrar dessas moçoilas.

Na vida real, lá em Santana, tratavam-se de três irmãs já idosas e solteironas convictas que moraram juntas a vida toda. Minha nova residência ficava a apenas algumas dezenas de metros da casa delas e, na época eu ainda não sabia, elas foram amigas de minha família e conheciam meu pai de longa data. Naquele entra e sai de mudança, organizando tudo, eu e a falecida (vulgo ex-esposa) estávamos a todo momento na calçada, sob a vistoria intrépida daquelas senhoras que tinham por missão particular de vida fiscalizar toda a vizinhança. E eis que entre elas surge o conversê (cujo teor só fiquei sabendo por elas mesmas, anos depois):

– Olha lá, vizinhos novos!

– Hmmm, parece casalzinho recém-casado…

– Já têm filho? Alguém viu algum bebê por ali?

– Não, não parece que têm não. Mas aquele rapaz ali até que é bem familiar, não é não?

– Agora que você falou, é sim. Quem será?

– Ah, não acredito que vocês não se lembram! É o Bentinho!

– Será?

– Ah, não pode ser!

– É sim!

– Mas tirou o bigode.

– E tá bem, não tá não?

– Tá sim. Bonitão, como sempre… E casado com aquela mocinha!

– Menininha de tudo!

– E a Detinha?

– Não sei não.

– Deve ter desquitado…

– Pouca vergonha.

– Puxa vida, mas que coisa. Como será que ele conseguiu ficar assim tão bem conservado – tanto que até casou de novo – e nós três aqui, ACABADAS!…

Fim De Semana

Nos sites por aí pela Internet vejo muita gente referir-se ao fim de semana como “FDS”. Não sei se é muita maldade em meu coração, mas foneticamente isso pra mim soa muito mais como “FoDa-Se”, do que como “Fim De Semana”. Mas, enfim, é exatamente sobre isso que gostaria de falar, sobre o fim de semana. Se bem que, pela conjuntura da coisa, poderia ter escrito FDS mesmo…

Tinha tudo pra ser um fim de semana extremamente tranquilo. Mas, já de véspera, fui alertado pela Dona Patroa que ela precisaria acompanhar seus pais (meu estimado sogro e minha… bem, a… tá, minha sogra) até o litoral, onde eles têm uma casa que havia sido locada e agora precisariam fazer uma vistoria, pois o inquilino havia saído. Como eles já são bem velhinhos, usualmente costuma sobrar pra caçula deles (ou seja, a Dona Patroa) “programas” desse tipo.

No meio da manhã de sábado lá fui eu fazer umas compritchas. Na volta ela me liga. O filhote mais velho estava com catapora. Sim, todos tinham sido vacinados, não, os outros não pegaram, sim, pensando melhor, acho que já pegaram – mas de forma bem leve, não, é catapora mesmo.

Celulares. Maravilhas do mundo moderno. Esqueçam aquele ditado de que notícias vão a galope; hoje o máximo que elas galopam são as microondas. Dez minutos depois e ainda ao volante (que nenhum marronzinho me leia essas linhas) já tinha resolvido toda a agenda de compromissos da semana.

Como ela iria descer somente no domingo, aproveitamos o sábado em casa. Toda a família, com destaque especial para meu joelho, que – óbvio – estava doendo. Somente entrando na faca mesmo pra reconstruir os ligamentos avariados, mas isso já é outra história. À noite resolvemos assistir um filminho pra descontrair: The weather man, incrivelmente “traduzido” como O Sol de cada manhã, um filme com Nicolas Cage e Michael Cane. Que me perdoem todos aqueles que conseguiram ver mensagens de esperança e significados ocultos, esotéricos e de auto-ajuda no filme. Particularmente achei horrível. Poderia ter falado fraco, previsível, modorrento e chato. Mas prefiro ficar somente com a palavra horrível – com o que compactua a Dona Patroa. Pra não dizer que foi uma perda total, a atuação de Michael Cane sempre é cativante e aprendi algo sobre arco-e-flecha, uma paixão secreta que um dia ainda realizarei. Salvo isso, repito, horrível.

Eis que chegou o domingo e lá foi a Dona Patroa fazer a maledetta vistoria, juntamente com meus sogros e 1/3 de nossos filhos. Fiquei em casa com os 2/3 restantes: o mais velho, com sete, e o caçula, com dois e meio. Com o quintal e um dia que nem decidia se chovia ou se ensolarava, até que tivemos com que nos ocupar.

No meio do caminho rolou um strees básico por telefone com a senhora minha mãe – por que é que toda mãe (pelo menos as da geração passada) já vem treinada em trabalhar com a culpa nos filhos? Desde pequeno já era assim. Ao invés de me dizer para lavar o alpendre (alguém ainda sabe o que é isso?), ficava por perto entonando o costumeiro mantra: “Ah, preciso lavar esse alpendre! Mas estou tão cansada… Ainda tenho que fazer almoço e cuidar do quintal. Mas o alpendre está tão empoeirado que precisa ser lavado…” e seguia por aí afora. É LÓGICO que a determinada altura da coisa eu era obrigado a tomar uma atitude: ou saía pra rua de vez ou lavava a porra do alpendre. Como eu sempre tentei ser bonzinho… bem, dá-lhe alpendre!

Mas, com o tempo, meio que me imunizei a esse tipo de ataque. Porém, de vez em quando ainda sou pego com a resistência baixa e acabo perdendo a paciência. Tudo bem. Faz parte do pacote e do nosso relacionamento.

Com o filhote cada vez mais cheio de brotoejas devido à catapora (ou varicela, ou, ainda, tatapora), bastou uma dipironazinha de leve (C13H16N3NaO4S) para trazê-lo de volta aos eixos. Aliás, quem tem filho sabe que nessas horas a gente fica muito mais permissivo, com um “dózinho” do doentinho, tentando atender seus mais ínfimos desejos e levantando um escudo protetor a sua volta. Apesar da surra que levei da última vez – a cantoria de “ganhei de dez a zero do papai” ainda ecoava em meus ouvidos – fomos jogar algumas novas partidas de Play 2. E não é que o desgramado me deu uma nova surra? Mas, pelo menos, dessa vez ganhei algumas das corridas! Imagino que se um carro de verdade tivesse um joystick ao invés de um volante eu bateria em cada árvore que encontrasse pelo caminho…

Pra fechar o dia com chave de ouro, um casal de amigos resolveu fazer um churrasco de última hora e nos ligou, convocando-nos. Eles têm dois filhos cujas idades regulam com as dos nossos mais velhos – o que sempre é uma boa pedida. Expliquei a situação precária em que me encontrava, sem a Dona Patroa ter voltado e com a catapora instalada em casa. Foi então que a mãe dos pequerruchos de lá, do outro lado da linha, me disse:

– Ah, mas não tem problema! Meus meninos já estão vacinados e se pegarem vai dar bem fraquinha. É até bom, porque daí já se livram disso de vez!

Não é ótimo ainda existirem pessoas assim, total e completamente desencanadas?

O passado bate à porta (I)

Dia de eleição. Como voto no mesmo lugar desde que tirei o título de eleitor, que, inclusive, é a escola estadual onde estudei da primeira à oitava série, é também uma oportunidade para rever velhos amigos e conhecidos.

Seção cheia, bem cheia. A fila dava volta no corredor. E eis que aquela moça simpática, a alguns metros de distância, sorri para mim e dá um tchauzinho…

Olho para a menina logo atrás de mim, a qual está absorta numa conversa com um rapaz – provavelmente namorado. Olho para a moça na minha frente, que, por sua vez, está examinando atentamente uma mancha formada no teto.

É. É comigo mesmo.

Sorrio e avanço alguns passos na direção da agora sorridente moça, a qual me disse:

– Olá! Tudo bem? Há quanto tempo, hein?

Aproveito – também sorrindo – para tomar-lhe da mão o título e examinar seu nome completo. Nada. Minha mente é um vazio. MUITO sem jeito, digo-lhe:

– Puxa, não fique brava, mas sinceramente não consigo me lembrar de você…

– COMO NÃO??? A gente estudou junto, tinha fulano, beltrano e sicrano na nossa classe! Lembro-me até de uma redação que você fez, que a cada frase você terminava com a frase “É claro”!

Sinto o coração encolher e um rubor subindo às faces. Diacho, do que é que ela está falando? Que raio de redação seria essa? Que terminava com “é claro”? Tem minha cara brincar com as palavras desse jeito, mas desde o ginásio?

– Olha, realmente NÃO me lembro, mesmo. Mas, também, né? Já faz mais de vinte e cinco anos, meus neurônios já estão numa fase de perder as sinapses…

Rimos um pouco e passamos a conversar sobre amenidades. Mas aquela sensação de mal estar permaneceu na pontinha do meu coração. Como diria uma amiga, “borboletas revoavam em meu estômago”…

Havia chegado a hora de ela votar, de modo que voltei para meu lugar na fila (que dava volta, lembram?) – ainda assim fiquei matutando. Foram necessários mais uns dez minutos, até que a lembrança me atingiu como uma bigorna!

– MAS É CLARO!

A moça que estava na minha frente olhou desconfiada para aquele sujeito grandalhão que estava falando sozinho.

Lembrei-me dela! Ainda não conseguia precisar o ano específico em que estudamos, mas a imagem me veio à mente: ela era bem magra, e na época já era meio que alta para a idade; seu cabelo era curto, preto e cheinho nas pontas (e não loiro como agora), e não consigo deixar de imaginá-la com uma blusa, se não me engano de tricô e de gola alta, feita com várias faixas coloridas – cada faixa, um fio de uma cor.

Lembrei-me mais com o coração do que com a mente, pois veio a sensação de que éramos bem mais que colegas de classe! Não, não namorados – até porque não namorei absolutamente ninguém da escola naquela época. Éramos amigos mesmo. Ademais, sempre tive muito mais facilidade de fazer amizades com as meninas que com os meninos. Em sua maioria, elas sempre tiveram bem mais o pé no chão que os demais rapazes, os quais só pensavam em futebol, bicicleta, etc, etc, etc.

Pena que não a encontrei pessoalmente para lhe pedir perdão (e não desculpas) pela memória cheia de buracos que tenho. Poderíamos ter relembrado com mais acuidade aqueles tempos. Mesmo assim consegui achá-la no Orkut, e pude fazer um mea culpa virtual Contudo, a respeito daquela redação, a do “é claro”, sinceramente não consegui me lembrar. Todo o material escolar que eu possuía daquela época já deve ter virado pó, e minha memória – que sequer conseguiu lembrar de pessoas queridas – deixou-me na mão também com relação a isso. Mas, dado o tempo decorrido, e as zilhões de situações pelas quais eu já passei desde então, era de se esperar uns lapsos desse jeito…

É claro.

“Lobato na web”

Caríssimos, sempre que falo em compartilhar a informação, é mais ou menos isso que tenho em mente…

Publicado na revista Nossa História nº 36, Editora Vera Cruz, em OUT/2006, p. 11.

Cartas, desenhos e fotos são alguns dos elementos da vida do escritor disponíveis em novo site.

Armazenada no Centro de Documentação Alexandre Eulálio, em Campinas, boa parte do acervo de Monteiro Lobato já pode ser consultada de várias regiões do país. O projeto “Monteiro Lobato (1882-1948) e outros modernismos brasileiros” teve financiamento de Fapesp, CNPq e Unicamp para organização, digitalização e interpretação de documentos. Agora, o endereço eletrônico http://www.unicamp.br/iel/monteirolobato abriga correspondência, fotos de família, árvore genealógica, bibliografia, desenhos e pinturas do escritor, e banco de teses sobre sua obra. Um complemento valioso ao que já estava disponível no site www.lobato.com.br.

“Digitalizamos uma parte do acervo e a idéia é ir alimentando o site com mais material de tempos em tempos”, explica Marisa Lajolo, coordenadora da equipe do Instituto dos Estudos de Linguagem da Unicamp, que conversou com NH sobre as possibilidades que a internet dá para a divulgação de arquivos:

Nossa HistóriaPor que ainda é raro vermos arquivos de grandes escritores ou personagens da história brasileira disponíveis na internet?

Marisa Lajolo – A interação com a internet requer uma certa aclimatação, mais do que aprendizagem. Há séculos, a dupla papel-e-tinta vem sendo vista como suporte mais adequado/privilegiado para o registro da história e não é de um dia para outro que – pacificamente – vai dividir espaço com o suporte eletrônico. Além disso, há alguns problemas com a impossibilidade de versões eletrônicas de documentos darem conta da materialidade deles: se se quer estudar questões ligadas a papéis e a tintas é preciso ter acesso aos documentos propriamente ditos e não a cópias digitalizadas.

NHHá uma desconfiança dos pesquisadores em relação ao potencial e à segurança na rede ou é apenas uma questão de tempo e de verba?

ML – A questão da segurança na web não me parece, essencialmente, distinta da segurança necessária para acervos tradicionais. A questão maior, em meu ponto de vista, é mesmo a “cultura” da área. Arquivos disponíveis na internet democratizam o acesso à documentação e quebram a situação de privilégio de só ter acesso a documentos quem tem condições de se locomover até a instituição que abriga este ou aquele arquivo. E, no varejo, a internet libera o interessado dos horários e eventuais limitações materiais das intituições que preservam documentos.

NHHá a perspectiva de que o site sobre a obra de Monteiro Lobato sirva de exemplo para outros trabalhos deste tipo?

ML – Algumas instituições brasileiras já disponibilizam documentos em sites. Mas a prática precisa se ampliar e as universidades podem cumprir um grande papel nisso. Trata-se de uma questão de política cultural. Discute-se muito se o brasileiro não tem memória, mas a experiência com o site de Monteiro Lobato sugere que não é bem assim: várias pessoas procuram a Unicamp para doar cartas ou livros raros de Lobato. O mais belo exemplo disso foi da professora Therezinha Antunes, de Pelotas. Logo que soube que a Unicamp tinha a guarda de documentos de Monteiro Lobato, ela nos doou oito cartas que recebeu dele entre 1946 e 1947, quando o escritor morava na Argentina. As cartas são documentos preciosos de um intelectual auto-exilado, extremamente crítico da situação brasileira da época. Temos todo o apoio da família de Monteiro Lobato, mas para divulgarmos as cartas é preciso ter autorização dos demais envolvidos. Na seção de correspondência do site, há uma lista de todos os remetentes e destinatários das cartas do Fundo Monteiro Lobato. Quem sabe sobrinhos, filhos, netos e bisnetos dessa gente toda se animem e permitam a reprodução? Acho que a disponibilização de arquivos torna a história – mesmo aquela com agá maiúsculo – mais próxima de todos.