Escuta telefônica e interceptação de dados

( Publicado originalmente no e-zine CTRL-C nº 01, de novembro/99 )

ESCUTA TELEFÔNICA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS:
O DIREITO À INTERCEPTAÇÃO E A “INTERCEPTAÇÃO” DOS DIREITOS

Lenio Luiz Streck

Procurador de Justiça – RS
Doutor em Direito do Estado

1. A LEI NO CONTEXTO DA CRISE DO DIREITO E DAS INSTITUIÇÕES

Recentemente foi promulgada a Lei Federal n. 9.296, regulamentando a parte final do art. 5º, XII, da CF, instituindo a assim denominada “escuta telefônica”. À evidência, a nova Lei deve ser examinada com o máximo de cautela, mormente porque trata do estabelecimento de limites às liberdades e garantias individuais do cidadão, o que leva a seguinte indagação: em que medida pode o Estado ingressar na esfera da intimidade das pessoas? Quais os limites e qual o alcance dessa proporcionalidade estabelecida pela nova Lei?

Em face de tais questões e como premissa indispensável para o desenvolvimento destas reflexões, é necessário ressaltar, primeiramente, que o direito processual penal não deve ser, conforme bem lembra Hassemer, outra coisa senão direito constitucional aplicado; isto vale com mais ênfase, segundo ele, no tocante às medidas de força da investigação policial (1). Por isso, o debate sobre política criminal – e sobre a nova Lei da “escuta” – não deve ficar circunscrito à “impressão de que a solução do problema consiste em conferir às autoridades da segurança pública, de uma vez por todas, todos os meios e instrumentos necessários que sempre reivindicaram” (2), a fim de que possam “bem” combater a criminalidade.

Alerte-se, propedeuticamente, que, por estarmos cientes da precariedade do funcionamento de nossas instituições e não ser segredo o fato de que a crise do Direito é decorrência da crise estrutural da sociedade, a Lei 9.296 não deve ser vista como um bálsamo para aliviar o nosso pânico cotidiano. Esse pânico, não devemos esquecer, é também um pânico engendrado pelas elites, as quais, primeiro, criam o fantasma da criminalidade, para depois nos venderem a solução, mesmo que nesta esteja imbutida a violação de direitos fundamentais. Isso ocorre porque, segundo BOFF, citando L. MOSCATELLI (3), “a classe dominante consegue fazer esquecer que ela está assentada sobre uma violência originária, provocada por ela mesma. Encontra bodes expiatórios nos criminosos comuns. Daí a importância da vigilância, do controle e da repressão, com aparato e circunstância, sobre as populações periféricas ou marginais ao sistema.”

Não há dúvida que a Lei que autoriza a escuta telefônica aparece em um contexto no interior do qual o discurso sobre a lei e a ordem ganha força diariamente. No imaginário social, a repercussão do problema da criminalidade é superdimensionado e acaba por sustentar uma ideologia do repressivismo saneador representado por medidas de caráter meramente instrumentalizador(4). Há um pânico coletivo, surgido a partir da construção desse discurso. Dados mostram que 51,1% da população concorda com linchamentos; 77,6% concorda com blitz nas favelas; 53,7% concordam com a eliminação sumária de marginais pela policia; 43,8% concorda com os espancamentos e outros castigos aos presos; 75,7% é favorável ao aumentos das penas…(5) Ou seja, o discurso sobre o retorno ao autoritarismo repressivo ganha espaço dia a dia.

A violência do cotidiano, em especial a que ocorre nas grandes metrópoles do país, é um terreno fértil para a busca de soluções imediatistas. Na feliz observação de CERQUEIRA FILHO e NEDER(6), “Assistimos a população discursando sobre o tema, pronunciando-se na grande imprensa e nas pesquisas de opinião, exigindo a intensificação da repressão do Estado (colocar o Exército na rua) e a vigência do arbítrio (justiçamento de grupos de extermínio) para acabar com a violência e a insegurança. Assistimos nos horários nobres de uma televisão tão controlada pelo estado, as opiniões de populares, escolhidos aleatoriamente, postulando com clareza os argumentos do reforço das forças repressivas, numa sociedade já tão deprimida politicamente. Constatamos nesse processo, a eficácia dos setores dominantes da sociedade brasileira no sentido de construir sua hegemonia, tecida em torno deste debate, na medida em que todos os demais setores da sociedade se envolveram no clima criado em volta da referida questão da violência”. Por isso, não é difícil que ” a representação da idéia de violência e do aumento da criminalidade na sociedade brasileira ganha corações e mentes”(7). Com SODRÉ, pode-se dizer que esse processo se materializa graças aos meios de comunicação de massa, que são “os principais gestores do mito da catástrofe. Neles, a violência aparece como uma espécie de gênero catastrófico. A violência é um operador semiótico que permite hibridações ficcionais entre realidade e imaginário.”(8)

Tais observações se tornam absolutamente relevantes como auxílio à discussão acerca da crise do Direito e, em especial, do Direito Penal, das “criminologias” e das instituições encarregadas de combater a (essa) criminalidade. A relação/reação do establishment (com a) à criminalidade e ao discurso sobre a criminalidade – que é ao mesmo tempo instituído e instituinte – vem bem explicada por WINFRIED HASSEMER(9), para quem “há uma tendência do legislador em termos de política criminal moderna em utilizar uma reação simbólica, em adotar um Direito Penal simbólico. Quero dizer com isso que os peritos nessas questões sabem que os instrumentos utilizados não são aptos para lutar efetiva e eficientemente contra a criminalidade real. Isso quer dizer que os instrumentos utilizados pelo Direito Penal são ineptos para combater a realidade criminal. Por exemplo: aumentar as penas, não tem nenhum sentido empiricamente. O legislador – que sabe que a política adotada é ineficaz – faz de conta que está inquieto, preocupado e que reage imediatamente ao grande problema da criminalidade. É a isso que eu chamo de reação simbólica, que, em razão de sua ineficácia, com o tempo a população percebe que se trata de uma política desonesta, de uma reação puramente simbólica, que acaba se refletindo no próprio direito penal como meio de controle social”.

O discurso criminológico de cunho oficialista (dominante no imaginário social e dos juristas), preocupado com os problemas de varejo, esquece os problemas do atacado de nossa sociedade. Nesse contexto, a criminologia de cunho oficialista, acobertada e (auto)sustentada na funcionalidade de suas próprias ficções e fetiches, além de não questionar a aparição social de comportamentos desviantes, impede uma reflexão acerca da reação da sociedade (oculta(da) ou aparente). No dizer de VERA ANDRADE(10), a aporia desse tipo de criminologia “consiste em que ela se declara como uma ciência causal-explicativa da criminalidade, exclui a reação social de seu objeto (centrando-se na ação criminal) quando é dela inteiramente dependente; ao mesmo tempo em que se apóia, aprioristicamente, numa noção ontológica da criminalidade”.

A instrumentalização dessa problemática vai ocorrer no âmbito da dogmática jurídica, que, à evidência, na lúcida visão de WARAT, não deixa de experimentar os efeitos do sentido comum teórico, que vem a ser, no campo do Direito, a fonte receptora de um imenso leque de fatores e variáveis surgidos do saber acumulado e da experiência que conformam as estruturas cognoscitivas e os raciocínios lógico-demonstrativos do homem de ciência. A dogmática jurídica considera possível descrever, sem nenhuma referência ideológica, a ordem legal, bastando, para tanto, de um método adequado. A dogmática jurídica, ao servir de instrumento para a interpretação/sistematização/aplicação do Direito, vai aparecer como um conjunto de técnicas de “fazer crer” com as quais os juristas conseguem produzir a linguagem oficial do Direito que se integra com significados tranquilizadores, representações que têm como efeito o de impedir uma problematização e uma reflexão mais aprofundada sobre nossa realidade sócio-política.(11)

Isto nos traz inquietações, na medida em que, desse modo, o Direito acaba por (re)produzir as relações sociais de uma sociedade tão díspar como a nossa. Salta aos olhos, pois, que a dogmática jurídica, mergulhada na crise de paradigma, é co-instituinte da crise social e, por decorrência, para ficar na especificidade do tema em discussão, do discurso criminológico. Como ocorre essa crise de paradigma? Em primeiro lugar, partindo da premissa de que um paradigma implica em uma teoria fundamental reconhecida pela comunidade científica como delimitadora de campos de investigação pertinentes a determinada disciplina (KUHN), é possível dizer que o que fornece o status científico de uma ciência vai depender não tanto das teses defendidas pelos manuais científicos, mas sim do consenso da comunidade científica em torno dessas teses, conforme muito bem ensina CELSO CAMPILONGO(12). Agregue-se a isso o dizer de ZULETA PUCEIRO, para quem a dogmática jurídica define e controla a ciência jurídica, indicando, com o poder que o consenso da comunidade científica lhe confere, não só as soluções para seus problemas tradicionais, mas, principalmente, os tipos de problemas que devem fazer parte de suas investigações. Daí que a dogmática jurídica é um nítido exemplo de paradigma. Diz mais, o mestre argentino, que a crise da ciência do Direito é um capítulo da crise mais ampla da racionalidade política que ocorre nas sociedades avançadas.(13)

Nesse diapasão, é certo que, conforme lembra CAMPILONGO(14), preparado para resolver questões interindividuais, mas nunca as coletivas(15), o direito oficial não alcança os setores mais desfavorecidos, a não ser com o braço longo (e pesado) do Direito Penal, sendo a marginalização jurídica a que foram condenados esses setores nada mais do que o subproduto de sua marginalização social e econômica. Daí que existem, assevera o mesmo autor, mudanças sociais, politicas e econômicas que, processadas em ritmo acelerado, tornam obsoletos os standars estruturais das abordagens formalistas.

Parece, pois, que a dogmática jurídica não se importa com o fato de que seus significados perdem, dia-a-dia, a necessária densidade semântica(16) (sócio-histórica). Com muita propriedade, ZULETA PUCEIRO nos auxilia na busca de respostas, acentuando que o que define a ciência do direito é sua primazia hegemônica no sistema de regras e definições estipulativas a partir das quais se podem pensar as realidades sociais. Isto explica a pretensão exclusivista do paradigma dogmático e suas resistências aos processos de mudanças internas e externas.(17) Nesse sentido, conforme CAMPILONGO, embora uma sociedade possua várias estruturas de autoridades, a teoria positivista supõe a completude hermética do ordenamento jurídico, o que reduz todas as estruturas de autoridade possíveis a uma só: a prescrita em lei. A realidade social é construída pelas normas, e estas, segundo os paradigmas científicos da dogmática, são moldadas pela vontade dos representantes do povo. Daí que, aduz, a crítica e a inovação, dentro de um sistema completo e sem contradições com o ordenamento normativo, são vistas como disfuncionais à estrutura de distribuição de autoridade.(18)

2. A LEI 9.269/96 E A SUA INTERPRETAÇÃO

É neste contexto – crise de paradigma do Direito, da dogmática jurídica e do discurso criminológico, que devemos permear a nossa discussão acerca da lei que institucionaliza a interceptação das comunicações telefônicas no Brasil. É esse contexto que deve nortear o nosso processo hermenêutico. Temos que refletir acerca das condições de possibilidades que temos para a realização de um discurso que evite essa “transparência” típica do discurso da dogmática jurídica. Ou seja, pode-se dizer, apropriando-nos das lições de Sercovich, que o discurso dogmático é transparente porque as sequências discursivas remetem diretamente à “realidade”, ocultando as condições de produção do sentido do discurso.(19) Daí que o discurso dogmático se transforma em uma imagem, na tentativa (ilusória) de expressar a realidade social de forma imediata. No fundo o discurso jurídico transforma-se em um “texto sem sujeito”, para usar a terminologia de PIERRE LEGENDRE.

O processo de produção de sentido não pode, pois, ser guardado sob um hermético segredo, como se sua “holding” fosse uma abadia do medievo. Isto porque o que rege o processo de interpretação dos textos legais são as suas condições de produção, as quais, devidamente difusas e ocultadas, aparecem como se fossem feitas de um “não-lugar”, ou de um “lugar fundamental”. Por isso, a dogmática jurídica, ao elaborar um discurso interpretativo sobre uma norma, produz sentido, cujo efeito ideológico é, justamente, a negação de tê-lo feito.

Com tais advertências, fica claro que a lei em tela deve ser aplicada tendo em conta, primordialmente, os direitos fundamentais previstos na Lei Maior. A preocupação, assim, não é tanto com a lei, mas com o uso/interpretação que venha a ser dada à lei, até porque, abstratamente nada significa, sendo seu sentido atribuído dogmaticamente em um segundo momento. Por isso, já dentro do processo de produção de sentido(20), é preciso chamar a atenção para alguns pontos da lei:

I. As restrições à interceptação elencados no art. 2º merecem elogio. Com efeito, não cabe a “escuta”: (a) quando não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; (b) quando a prova puder ser feita por outros meios disponíveis, e (c) quando o fato investigado constituir infração punida apenas com detenção. Coerentemente, mais adiante, no art. 4º, exige a lei a comprovação da necessidade da interceptação para a apuração da infração.

II. Pela leitura do inciso III do art. 2º, depreende-se que, a não ser os delitos punidos no máximo com detenção, todos os demais poderão ser alcançados pela lei. Obviamente estão fora as contravenções penais e todos os delitos previstos em leis especiais cujas penas sejam de detenção, como alguns previstos no Código Militar.

Entretanto, cabe frisar que, restando dúvida sobre se determinada lei ou determinado delito está ou não sob o pálio da permissão da interceptação, a resposta deverá ser encontrada mediante uma interpretação teleológica da Lei 9.269/96. Isto porque seus fins se destinam ao combate da criminalidade sofisticada. Há que se compreender, pois, que a nova lei constitui-se em um instrumento destinado a enfrentar, com eficácia, primordialmente, a “pós-modernidade” criminal, representada por crimes do tipo “colarinho branco” etc. Se assim não se entender, chegaremos a (triste) conclusão de que, mais uma vez, se pode dizer que no Brasil la ley es como la serpiente; sólo pica al que está descalzo(21). Ou, o que todo mundo já sabe, que há leis feitas para quem aparece na Revista Caras e leis que são feitas para quem aparece no jornal Notícias Populares…

Dito de outro modo, é por tais questões, que é perfeitamente razoável afirmarmos que “o legislador”(22), ao excluir apenas os crimes ou infrações penais apenados no máximo com detenção do alcance da Lei, expressou seu desejo – ainda que tardio – de combater a macro-criminalidade, como a sonegação de impostos(23), a corrupção etc, e não, cinicamente, à criminalidade de bagatela ou, melhor dizendo, à criminalidade descalça!

Assim, quero crer que estamos autorizados a afirmar, em termos hermenêuticos – utilizando-nos de métodos interpretativos correntes na dogmática stricto sensu – que a intenção(24) do legislador foi a de estabelecer o princípio da proporcionalidade por via de lei ordinária visando o combate às ações ilícitas lato sensu, excepcionando apenas as infrações punidas com pena máxima de detenção, alcançando, ipso facto, as demais.

Conclusão nesse sentido exsurge, aliás, com clareza, a partir da leitura do caput do art. 2º em conjunto com o inciso III. Com efeito, não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer “qualquer das seguintes hipóteses”, sendo uma delas “quando o fato investigado constituir infração penal punida, com no máximo, pena de detenção”. Refere a Lei, pois, a fato investigado. Agregue-se a isso, ademais, que as três hipóteses vedatórias devem ser lidas de forma disjuntiva e não conjuntiva, o que se depreende da expressão “qualquer” contida no caput do citado art. 2º. Sem olvidar que, já no art. 1º, consta que “a interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal…”. Em face de tais argumentos, e ousando discordar DE MIRABETE (25), não afastaria, desde já, a possibilidade da inclusão dos crimes de responsabilidade como passíveis de interceptação telefônica!

III. Surgirão dúvidas acerca do alcance das expressões “outros meios disponíveis” (art. 2º, II) e de quando a interceptação é “necessária” (art. 4º, caput). Creio que os conceitos exsurgirão de uma interpretação sistemática da lei imbricada com o devido sopesamento dos direitos fundamentais previstos na Carta Magna.

Assim, v.g., no art. 4º diz a lei que o pedido de interceptação conterá a demonstração de que sua realização é necessária à apuração da infração. Quer me parecer que melhor seria se o legislador – para um melhor resguardo dos direitos fundamentais da intimidade e privacidade – tivesse usado a expressão indispensável.

Aliás, se, pelo inciso II do art. 2º não se admite interceptação quando “a prova puder ser feita por outros meios disponíveis”, fica claro que o uso da escuta somente poderá ser deferido por exceção absoluta, é dizer, quando for conditio sine qua non para a apuração da infração. Disso se deduz, sistematicamente, que a interpretação da palavra “necessária” deve ser restritiva, para que não ocorra o que ZAFFARONI chama de “generosidade”(26) nas autorizações judiciais de escuta.

No mesmo diapasão de “deferimento por exceção”, é aconselhável que se evite a interpretação extensiva da parte final do inciso II do art. 2º, isto porque “outros meios disponíveis” não são os que, materialmente, a autoridade policial tenha à sua disposição, mas sim, os meios legais-processuais. Caso contrário, a simples alegação da polícia de que “não tem outros meios disponíveis” (p. ex. falta de peritos, etc), já será bastante para o deferimento da escuta, o que, convenhamos, viria a solapar a lei e a Constituição.

IV. Coerentemente na linha da preservação dos direitos fundamentais, o art. 5º da Lei deve ser lido em consonância com o art. 4º, vez que, se o juiz precisa fundamentar a sua decisão, à evidência deverá moldá-la à contenção legislativa contida no que se entenda por “necessidade da interceptação para à apuração da infração”, que, repito, deve ser entendida na acepção de indispensável.

A exigência da fundamentação – além de advir do comando do art. 93, IX da CF – decorre do fato de que, com a aprovação da lei, ficou estabelecido o princípio da proporcionalidade (Verhältnismässigkeitsprinzip no direito alemão e rasonableness no direito norte-americano) e suas condições de possibilidade no nosso ordenamento, em vista do norte representado pelo art. 5º, inciso LVI, que veda a utilização de provas obtidas por meios ilícitos. Ao juiz é que caberá, no caso concreto, dizer o que é razoável, confrontando o direito à intimidade – garantido pela Constituição – com o interesse público.(27)

Por isso não concordo, data venia, com a posição de ROGÉRIO SCHIETTI MACHADO CRUZ(28), segundo o qual “à falta de texto expresso, continuará a disputa doutrinário-jurisprudencial acerca da ilicitude do comportamento e do valor probatório da gravação assim obtida, havendo de vencer (…) a posição que se vale do critério da proporcionalidade oriundo do direito alemão, pelo qual, em situações excepcionais, deve prevalecer, na balança dos interesses em jogo, o valor da liberdade, em detrimento do valor da intimidade”. Penso que a proporcionalidade, em termos de interceptação telefônica, já foi feita pelo legislador ordinário, exatamente por delegação constitucional. Qualquer outra interceptação obtida fora do âmbito da lei que estabeleceu a proporcionalidade, será ilícita, a dizer, inconstitucional.

Daí ser possível afirmar, por exemplo, que a escuta telefônica de conversas entre presentes será absolutamente ilícita, pelo simples fato de que não foi incluída na proporcionalidade estabelecida pelo legislador federal. A proporcionalidade – que é numerus clausus – não poderá sofrer interpretação extensiva.

V. Preocupa, sobremodo, que somente à autoridade policial é conferida a possibilidade de executar a escuta, quando se sabe que o inquérito policial é peça dispensável e que não é vedado ao Ministério Público realizar investigações. Daí a pergunta: nos casos de corrupção de altas autoridades ou da própria polícia, ou ainda nos casos de sonegação fiscal, qual a razão de o legislador não ter conferido tal possibilidade também ao Ministério Público, ou – o que seria mais coerente – da possibilidade deste, como titular da ação penal, coordenar a interceptação?

Parece que demorará muito até que, em termos de eficaz combate à criminalidade – não de bagatela, mas da criminalidade “pós-moderna” – tenhamos mecanismos similares aos encontrados em países mais adiantados. Não é crível, p. ex., que em um caso de sonegação de impostos de enormes proporções sociais, o Ministério Público, que geralmente oferece a denúncia com base nos elementos fornecidos pelo fisco, tenha que depender, na busca de elementos para o cumprimento de seu munus, da condução da interceptação por parte da autoridade policial(29).

A incoerência da lei está justamente no fato de que, tanto a polícia como o Ministério Público podem requerer a realização da interceptação, mas só à polícia, cuja investigação, muitas vezes, não é indispensável ao oferecimento da denúncia, é conferido o poder de conduzí-la. Mesma preocupação vale para as hipóteses em que o Poder Judiciário (ou o Ministério Público) venha a investigar um dos seus membros. Ou seja, a previsão legislativa de que a condução da interceptação ficará a cargo da polícia só teria sentido se a investigação criminal fosse atividade privativa da autoridade policial, questão já resolvida de há muito pela doutrina e pela jurisprudência.

VI. No mesmo diapasão, registre-se a timidez (?) do legislador ao estabelecer que a autoridade policial, ao conduzir a interceptação, dará (apenas) ciência ao Ministério Público, o qual, “por generosidade” do legislador, poderá (sic) acompanhar a sua realização (art. 6º). Pelo que se pode depreender, embora o Ministério Público seja o destinatário da investigação, nada poderá determinar à autoridade policial… Tal paradoxo na Lei sob comento tem sua causa na ausência de regulamentação do controle externo da atividade policial (art. 129, VII, da CF), que, passados oito anos desde a promulgação da Constituição, continua letra morta na Lei Maior.

VII. O que se pode concluir, no mínimo, é que a falta de ciência ao órgão do Ministério Público, em qualquer circunstância, gerará a nulidade do procedimento.

VIII. Finalmente, como ficam os dados colhidos por “escuta” e que digam respeito a terceiros? Não nos deve impressionar a previsão do art. 9º dando conta de que a gravação que não interessa à prova “será inutilizada em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada”. De que forma os terceiros, não envolvidos na apuração, cujos dados de sua intimidade tenham sido colhidos, saberão de sua existência? Não esqueçamos que o art. 1º, caput, diz que a interceptação corre em “segredo de justiça”. Parece que o legislador brasileiro ainda acredita na lenda segundo a qual “os meios de coerção cogitados atinjam apenas ‘o criminoso’, como se houvesse uma linha demarcatória para tais coerções, capaz de excluir os bons cidadãos dos ‘outros'”.(30)

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por derradeiro, não devemos esquecer que o processo de interpretação e aplicação da lei sob comento deve, necessariamente, levar em conta o fato de que, como muito bem assinala MARIA LÚCIA KARAN, o vertiginoso desenvolvimento do progresso, com o simultâneo desequilíbrio econômico-social do capitalismo pós-industrial, a trazer a desmedida ampliação do poder do Estado de punir, encerra um interessante paradoxo, a curiosamente aproximar as formações sociais contemporâneas de suas ancestrais. A revolução científico-tecnológica convive e se identifica com antigas práticas: a interceptação de comunicações telefônicas, integrante da “grande escuta”, não está muito distante da sensação de vigilância de forças sobrenaturais que sustentou provas no processo penal de outras eras. Os avanços da ciência e da tecnologia acabam por se constituir no moderno meio de reconduzir o indivíduo ao controle de novos seres todo-poderosos, vigilantes e onipresentes – o Estado e seus agentes.(31)

Tudo se encaixa, pois, no contexto de um Estado que, de um lado, no plano econômico, embalado pelos ventos neoliberais, quer ser mínimo, e, por outro, quer o máximo em termos de controle da sociedade! Daí a advertência de HASSEMER, para quem o Estado investigador, com a desculpa do combate à criminalidade crescente, “invade a privacidade e a alma das pessoas”(32). Por tudo isso e pela relevância do tema – proporcionalidade entre o direito à intimidade/privacidade e o interesse público – o assunto requer uma série de cautelas.

Sem os devidos cuidados, o Estado investigador colonizará a nossa já tênue e devassada privacidade. Será um panóptico institucionalizado! Por isso, a necessária cautela. Afinal, estamos no Brasil, onde, na guerra contra o crime, quem (sempre) perde mais é a cidadania. Dai o acerto do jurista MARIO CHIAVARIO, para quem “o processo ideal é o que combate o crime e resguarda o cidadão”.

Notas:

1. FHASSEMER, WINFRIED. Três temas de direito penal. POA, Estudos MP n. 7, ESMP, p. 70.

2. Idem, p. 70.

3. BOFF, LEONARDO, A violência contra os oprimidos:seis tipos de análise. In Discursos sediciosos. Ano 1, n. 1. RJ, Relume-Dumará, 1996, p. 99.

4. Idem, idem.

5. Os dados são extraídos de pesquisa de Luciano Oliveira e Afonso Pereira sobre “A polícia na boca do povo e a percepção social do combate à violência”, realizada em recife em 1986. Apud Cappeler, op. cit.

6. CERQUEIRA FILHO, GISÁLIO e NEDER, GIZLENE. Brasil- Violência & conciliação no dia-a-dia. POA, Fabris, 1987, p. 60.

7. Idem.

8. SODRÉ, MUNIZ. A sedução dos fatos violentos. In Discursos sediciosos, op. cit., 211.

9. Ver HASSEMER, WINFRIED. Perspectivas de uma política criminal. In Três temas de direito penal. Porto Alegre, FESMP, 1993, p. 86.

10. Consultar ANDRADE, VERA R.P. Do paradigma etiológico ao paradigma da reação social: mudança e permanência de paradigmas criminológicas na ciência e no senso comum. Fpolis, Seqüência n. 30, UFSC, p. 34.

11. Ver, para tanto, WARAT, LUIS ALBERTO. Introdução geral ao Direito II. POA, Fabris, 1995, p. 37 e sges.

12. Ver CAMPILONGO, CELSO. Representação política e ordem jurídica:os dilemas da democracia liberal. São Paulo, 1982, p. 11 e segs.

13. Ver PUCEIRO, ENRIQUE ZULETA. in Teoria jurídica y crisis de legitimación. In Anuario de Filosofia Jurídica y Social. Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1982, p. 289.

14. Consultar CAMPILONGO, op. cit, p. 12 e segs.

15. Basta ver a dificuldade com que os juristas e as instituições lidam com os novos movimentos sociais e os conflitos decorrentes da questão fundiária e urbana. O Direito, calcado no modelo liberal-individualista, trabalha (ainda) com a hipótese, p. ex, de Caio invadir a propriedade de Tício… O problema surge quando Caio e algumas milhares de pessoa invadem as terras de Tício! O final da história todos conhecem…

16. A expressão é retirada de SERCOVICH, A. El discurso, el psiquismo y el registro imaginário. Buenos Aires, Nueva Vision, 1977.

17. Ver PUCEIRO, op cit., p. 297.

18. Cfe. CAMPILONGO, op. cit., p. 16.

19. Consultar Sercovich, A. El discurso, el psiquismo y el registro imaginário. Buenos Aires, Nueva Vision, 1977.

20. No sentido utilizado por VERON, ELISEU. In A produção de sentido. SP, Cultrix, 1980.

21. A expressão é de DE LA TORRE, J. In Apuntes para una introdución filosófica al derecho. México, Editorial Jus, 1992.

22. Quando falo na figura do “legislador”, estou ciente da problemática relacionada ao “mito do legislador racional” e suas “treze características”, muito bem enfocadas – e ironizadas – por SANTIAGO NINO e FERRAZ JR. VER FERRAZ JR, TÉRCIO. Consultar, para tanto, FERRAZ JR, TÉRCIO SAMPAIO. Introdução ao estudo do direito. São Paulo, Atlas, 1989, p. 254/5.

23. Não se olvide que o mesmo “legislador”, recentemente, estabeleceu uma benesse, na forma de um “regalo natalino”, aos sonegadores de impostos, mediante a previsão, no art. 34 da Lei 9.249, de 25 de dezembro de 1995, de que o pagamento do tributo ou da contribuição social, antes do recebimento da denúncia, extingue a punibilidade. Para esse mesmo “legislador”, ocorrendo a hipótese de alguém furtar uma galinha, mesmo que a res furtiva seja devolvida, haverá, no máximo, uma diminuição da pena, forte no art. 16 do Código Penal. São, enfim, as teratologias do sistema…

24. A dita “intenção do legislador” – de uso corrente no âmbito da dogmática jurídica – é vista e utilizada, aqui, com as devidas (e necessárias) reservas, é dizer, em um contexto eminentemente argumentativo/crítico, visando impedir determinadas redefinições que certamente ocorrerão no âmbito da dogmática jurídica.

25. Cfe. MIRABETE, J.F. A interceptação das conversações telefônicas e os ilícitos penais. In Enfoque Jurídico, Ed. 01, ago/96, TRF, 1ª Região, p. 3). Segundo o autor, os crimes de responsabilidade não são alcançados pela Lei porque são submetidos à sanção do “impeachment”.

26. ZAFFARONI, EUGENIO R. Crime organizado:uma categorização frustrada. In Discursos sediciosos. Ano 1, n. 1. RJ, Relume, p. 61.

27. No direito brasileiro, ADALBERTO J. CAMARGO ARANHA chama o princípio da proporcionalidade de “interesse preponderante”. in Prova no Processo Penal, SP, Saraiva, 1976.

28. CRUZ, ROGÉRIO S. MACHADO. Breve análise da Lei 9.296/96. In Enfoque Jurídico. Edição 01.Ago 96, p. 6

29. Melhor seria que o legislador tivesse colocado na lei a condução concorrente da interceptação, exatamente pela peculiaridade de determinados delitos. Ou seja, embora em grande parte o trabalho da polícia seja indispensável – além de relevante – há casos em que o próprio Ministério Público procede (e tem procedido) com sucesso a investigação. Para tanto, existem, em todo o país, Promotorias Especializadas e Coordenadorias de Promotorias Criminais.

30. Cfe. HASSEMER, op. cit. p. 79.

31. KARAN, MARIA LÚCIA. Interceptação de comunicação telefônica: o Estado máximo, vigilante e onipresente. In Enfoque Jurídico, op. cit, p. 5.

32. Cfe. HASSEMER, op. cit, p. 50.

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Internética

( Publicado originalmente em meu antigo domínio “ERGAOMNES”, em outubro/99 )

INTERNET – SOCIEDADE DE ADVOGADOS – PUBLICIDADE IMODERADA E OSTENSIVA – OFERTA DE SERVIÇOS COM EXALTAÇÃO DO ESCRITÓRIO E AUTOMERECIMENTO – PROPOSTA INSINCERA DE RESULTADOS – CAPTAÇÃO DE CAUSAS E CLIENTES – MERCANTILIZAÇÃO – CONCORRÊNCIA DESLEAL

Processo n. E-1.968/99
Relator – Dr. BENEDITO ÉDISON TRAMA
Revisor – Dr. BIASI ANTÔNIO RUGGIERO
Presidente – Dr. ROBISON BARONI
Julgamento – 12/10/99 – v.u.

EMENTA

INTERNET – SOCIEDADE DE ADVOGADOS – PUBLICIDADE IMODERADA E OSTENSIVA – OFERTA DE SERVIÇOS COM EXALTAÇÃO DO ESCRITÓRIO E AUTOMERECIMENTO – PROPOSTA INSINCERA DE RESULTADOS – CAPTAÇÃO DE CAUSAS E CLIENTES – MERCANTILIZAÇÃO – CONCORRÊNCIA DESLEAL – A propaganda divulgada em página da Internet, com exaltação da estrutura do escritório, da existência de filiais em pontos estratégicos e automerecimento, aventando resultados jurídicos insinceros, encontra-se inteiramente fora dos princípios éticos de conduta profissional que devem ser observados pela sociedade de advogados que a divulga e por seus componentes. Descaracteriza o exercício regular da profissão, estabelecendo relações com o cliente em desconformidade com as regras estabelecidas pelo CED. O uso de desenhos, símbolos, marcas, divulgação conjunta com atividades paralelas e dizeres incompatíveis com a dignidade da profissão, tal como concebido e apresentado, o anúncio afronta os preceitos da Lei n. 8.906/94, do CED, da Resolução n. 02/92 do TED-I e do Provimento n. 75/92 do Conselho Federal. Remessa às Turmas Disciplinares, com ciência à Comissão de Sociedade de Advogados. Ofício à respectiva Sociedade de Advogados para que se abstenha da divulgação referida, da forma como ora se apresenta (art. 48 do CED). Remessa de cópia ao provedor do site. Proc. E-1.968/99 – v.u. em 21/10/99 do parecer e voto do Rel. Dr. BENEDITO ÉDISON TRAMA – Rev. Dr. BIASI ANTÔNIO RUGGIERO – Presidente Dr. ROBISON BARONI.

Internética

( Publicado originalmente em meu antigo domínio “ERGAOMNES”, em setembro/99 )

INTERNET – REVISTA JURÍDICA PARA INFORMAÇÕES DE DADOS E PARA DEBATES E OPINIÕES JURÍDICAS

Processo n. E-1.967/99
Relator – Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE
Revisor – Dr. CARLOS AURÉLIO MOTA DE SOUZA
Presidente – Dr. ROBISON BARONI
Julgamento – 16/09/99 – v.u.

RELATÓRIO

Processo instaurado de ofício em consulta formulada pelo digno Presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas desta Seccional da OAB, DR. ALBERTO ROLLO.

Às fls. 2, o mencionado ofício datado de 29 de julho do corrente ano, sem protocolo, dirigido ao Digno Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina, que o despachou de próprio punho, dando-lhe o respectivo encaminhamento. Acompanhando o ofício, os documentos de fls. 3 a 16. Aos cinco dias de agosto fez-se a conclusão ao digno Vice-Presidente deste TED I, que determinou a distribuição a este relator, por semelhança com caso anterior recentemente julgado, proc. 1842/99, cuja cópia do parecer e ementa foram anexados, bem como ofícios dele decorrentes, tudo de fls. 18 a 36. Aberta vista a este relator aos 12 de agosto último.

O processo está instruído com peças acostadas, que assim se descrevem:

a) fls. 2: uma página branca, sem timbre, impressa, contendo www.advogados…;

b) fls. 3 a 14; modelos de páginas de site na Internet;

c) fls. 15: uma página amarela, impressa com os seguintes dizeres: Sr. Advogado www.advogados…., acompanhados de figura estilizada da deusa da Justiça.

d) um disquete contendo as mesmas páginas de fls. 3 a 14.

Os documentos de fls. 3 a 14 são páginas de site na Internet, em fase de elaboração por uma empresa de Comunicações Ltda., por encomenda da ADVOGADOS-….. Pelo que demonstra o disquete, bem como as próprias cópias de fls. 3 a 14, o site não está disponível para acesso aos interessados, via Internet. Todavia, tanto o disquete como as páginas impressas, dele tiradas, não asseguram, inequivocamente, que o programa realmente não esteja no ar, para ser acessado. Não há esclarecimento a respeito.

A primeira folha tem o mapa do Brasil, o endereço eletrônico e o índice de assuntos a serem clicados: Apresentação, Editorial, Especialidades, Cadastre-se, OAB, Tribunais, Legislação, Artigos Jurídicos, Procuradorias.

A segunda página contém: “Apresentação. Seja bem-vindo! Você chegou até a Advogados-Brasil informativo jurídico via Internet. Quando o projeto foi iniciado, a intenção era fazer dele um grande índice jurídico na Internet, a fim de facilitar a busca por assuntos pertinentes aos profissionais de direito e também àqueles que, por algum motivo, necessitavam de informações sobre o assunto. Ainda pretendemos oferecer, futuramente, uma revista eletrônica, destinada exclusivamente a advogados. Aguarde!.”

A terceira folha: “Editorial. Escrito exclusivamente por juizes, de várias alçadas, com texto semanal. Tema abordado exclusivamente e sem conflito político, onde há a total liberdade de expressão.” Segue uma foto de homem, engravatado, bem arrumado e ao lado nome e tema. Presume-se que o nome é fictício e, tal qual a foto, se figuram para exemplo da futura página.

A quarta folha tem: “Especialidades. Direito de Sucessões/Herança, Direito Administrativo, Direito Previdenciário …” São doze especialidades anunciadas, mas vê-se que existem outras, porque há espaço para rolagem da página.

Na quinta folha, outro exemplo, contendo a mesma fotografia anterior, com outro nome, acompanhado de títulos do jurista, exemplificando o perfil das pessoas que comporão o quadro de associados.

A sexta folha serve para a qualificação e identificação do interessado em se associar para ter acesso ao site. Pede nome, endereço, senha, profissão, n° OAB, unidade da Federação, data do nascimento etc.

A sétima folha traz outro exemplo de pessoa integrante do quadro de juristas associados, com nome e títulos de uma professora, sem fotografia, não se sabendo se é real ou apenas ficção para exemplo. Nessa folha vê-se claramente que se trata de parte de uma página, porque há dizeres abaixo que apresentam meia linha, ininteligíveis. A barra de rolagem vertical está no alto e, usando-se o disquete, ela não rola para baixo.

As páginas oito, nove, dez e onze, respectivamente, têm relações dos Tribunais Brasileiros, de Legislação para Consulta, de Artigos e Pesquisas Jurídicas, e Procuradorias Da mesma forma, mostram a barra de rolagem vertical no alto e o disquete não permite movimentação. É amostragem do site futuro. Cumpre salientar que a leitura do disquete efetuou-se na Secretaria deste Tribunal de Ética.

Em contato telefônico com este Relator, identificou-se a pessoa responsável pela área de marketing da empresa Ltda. e, gentilmente, se propôs a colaborar com informações e atos que fossem necessários ao bom andamento da consulta, no respeitante ao marketing, sem interferir na ética profissional. Foi orientado que toda ajuda por escrito, nos autos, seria devidamente apreciada e, quanto ao resultado, este Relator, isoladamente, nada poderia adiantar, porque a decisão é do Plenário deste Tribunal, na pauta da Sessão de setembro do corrente ano.

Esse é o relatório, pouco parciomonioso, mas que contribuirá sobremaneira para o parecer.

PARECER

Não fora a consulta ter sido formulada pelo digno DR. ALBERTO ROLLO, e instaurada de ofício, seria caso de não conhecimento, por se tratar de interesse de pessoa, física ou jurídica, estranha aos quadros da OAB, não sendo, também, autoridade. A ilegitimidade ativa estaria caracterizada e a incompetência deste Tribunal definida.

Todo o material constante do relatório acima veio aos autos acostado ao ofício de fls. 2 e revela inequívoco interesse em parecer do Tribunal de Ética, e assim também da Ordem dos Advogados do Brasil, sobre futuro site que se pretende lançar. Com efeito, afirma o digno oficiante de fls. 2 ao passar o material ao Tribunal de Ética “…tendo em vista que vários Conselheiros desta Seccional foram convidados para integrarem o site ali enfocado.”

Inexiste nos autos qualquer identificação e dados que permitam melhor conhecimento da constituição da www. Advogados….. Não se sabe quem são seus idealizadores e responsáveis. Quanto ao seu objeto, há clara explicação às fls. 5: informativo jurídico via Internet. Ainda pretendemos oferecer, futuramente, uma revista eletrônica, destinada exclusivamente a advogados. Aguarde!

Se tratar de revista eletrônica para dar informações e propiciar opiniões e debates jurídicos, sem que seu objeto e seus participantes venham a ferir o Código de Ética e Disciplina, O Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, bem como seu Regulamento Geral e dos Provimentos, pouco resta a este Tribunal para opinar, senão no sentido de que não lhe cabe se opor ou homologar. Caso semelhante, recentemente julgado, no processo E-1842/99, havia flagrante violação de dispositivos éticos e disciplinares consistentes em captação de clientela, de mercantilização, propaganda imoderada, nome fantasia. Aqui, uma revista jurídica na Internet dissociada da prática da Advocacia e prestando serviços à classe dos juristas, moldada à semelhança do praticado pela Associação dos Advogados de São Paulo, pelo site da OAB-SP, pelo Consultor Jurídico da provedora UOL, não configuram ilicitude ética ou disciplinar passível de apreciação por este Tribunal. Haverá, sim, no futuro, se advogados ou sociedades de advogados dela se valerem para ferir a ética, submetendo-se, assim, às sanções da lei, respondendo perante o Tribunal de Ética e Disciplina.

Aí é que começa o limite da conduta ética, vale dizer, depende do que for colocado nessa apresentação, sob o prisma da mercantilização, da captação, do sigilo, da atuação conjunta com outra atividade profissional. A inobservância, em especial, dos artigos 5°, 7°, 25 a 34 do Código de Ética, bem como da Resolução n° 02/92 deste Tribunal submeterão o infrator à sanções pertinentes. Mas somente o advogado infrator, não a Advogados….., que não é sociedade de advogados, que não é inscrita na OAB, que por isso não figura como sujeito passivo das sanções éticas da advocacia. Por isso que se impõe nítida diferenciação entre o empreendimento na Internet e os profissionais que dele participam. Para estes, as regras são as mesmas que as adotadas para o advogado ou escritório que crie, isoladamente, sua própria página na Internet regras essas tão bem delineadas em decisões deste Tribunal, como, por exemplo, nos processos E-1435/96, E- 1471/96, E-1640/98, E- 1684/98, E-1706/98, E- 1759/98, E-1795/98, E-1824/99, E-1747/99, E- 1877/99, todos publicados, na íntegra, no site da OAB-SP, link do Tribunal de Ética.

Por ora, a única restrição está no nome adotado pela “revista”: advogados….., como consta de seu endereço eletrônico: www.advogados……. Há muita semelhança com o nome ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, órgão oficial criado por lei que regulamenta e disciplina a profissão dos advogados. Essa parecença poderá levar pessoas menos avisadas, ou mal avisadas, a formar juízo de que a revista tem alguma ligação com a OAB. No já citado processo E-1842/99, a denunciada foi julgada irregular quanto ao seu nome, remetendo-se o caso a análise e decisão da douta Comissão de Prerrogativas. Ainda naquele processo, houve a recomendação de se submeter o caso ao Ministério Público ou à Polícia por crime contra o consumidor, vez que havia pagamento de mensalidade pelos associados, sem prévia constituição regular da empresa.

Finalmente, resta concluir que no caso vertente, pelo que dos autos consta, inexiste profissional ou sociedade de advogados identificados como infratores da Ética, que em tese uma revista jurídica não é empreendimento anti-ético, e que se vislumbra, somente, restrição quanto ao nome adotado, o que é, s.m.j., da competência da Douta Comissão de Prerrogativas.

É o parecer que submetemos ao augusto plenário deste Tribunal de Ética e Disciplina.

EMENTA

INTERNET – REVISTA JURÍDICA PARA INFORMAÇÕES DE DADOS E PARA DEBATES E OPINIÕES JURÍDICAS – A criação de revista jurídica na Internet não constitui matéria de competência do Tribunal de Ética. Entretanto, tal não ocorre se advogados inscritos no empreendimento se valerem do mesmo para publicidade imoderada, mercantilização, nome fantasia, captação de clientes e causas, inculca, anúncio concomitante com outra profissão, aviltamento de honorários, etc. A participação do advogado ou de escritórios de advogados, na Internet, isoladamente, ou através de revista eletrônica, deve obedecer às normas éticas e estatutárias já consagradas no Código de Ética, Estatuto e Resolução n. 02/92 deste Sodalício, bem como em assentada jurisprudência desta Casa. A utilização de nome semelhante ao da Ordem dos Advogados do Brasil, pode gerar confusão e constitui, em princípio, irregularidade a ser estudada pela douta Comissão de Prerrogativas. Proc. E-1.967/99 – v.u. em 16/09/99 do parecer e voto do Rel. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE – Rev. Dr. CARLOS AURÉLIO MOTA DE SOUZA – Presidente Dr. ROBISON BARONI.

Internética

( Publicado originalmente em meu antigo domínio “ERGAOMNES”, em setembro/99 )

INTERNET – ESCRITÓRIO DE ADVOGADO – CRIAÇÃO DE LINK – LISTA DE CLIENTES

Processo n. E-1.976/99
Relator – Dr. LUIZ CARLOS BRANCO
Revisor – Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE
Presidente – Dr. ROBISON BARONI
Julgamento – 16/09/99 – v.u.

RELATÓRIO

Trata-se em resumo, de denúncias e propostas formuladas por advogado regularmente inscrito nessa Seccional, cujo teor se resume no que segue:

1. Colocar à disposição dos advogados um setor específico para denúncia a respeito de ética profissional;

2. Criação pela CAASP de um setor específico onde os advogados possam adquirir acessórios para computadores a preços mais razoáveis, a exemplo do que acontece com os remédios. Cita como exemplo o alto preço dos cartuchos para HP, que no atacado custa em média trinta por cento a menos que no varejo;

3. Denuncia um “site” da internet onde um advogado indica seus clientes e faz um “link” de seu “site” para os clientes. Cita um cliente como exemplo. Pede providências; e

4. Por derradeiro, solicita que a OAB proponha uma ação direita de inconstitucionalidade, visando o enquadramento das sociedades de advogados no SIMPLES.

PARECER

Refoge à competência do Tribunal de Ética – Seção Deontológica – conhecer de matéria decorrente de fatos concretos já consumados, como é o caso da denúncia do “site” na internet. Opino pelo NÃO CONHECIMENTO, determinando-se seja expedido ofício ao advogado denunciado para que cesse de imediato a publicidade nos moldes formulados, sob pena de encaminhamento para a seção disciplinar para as providências de praxe.

Com referência aos demais pedidos e sugestões, deverão ser encaminhados às seções competentes para avaliação, tais como: Comissão Especial de Informática, CAASP e Comissão de sociedade de advogados.

Entretanto, com objetivos meramente didáticos e com o fim de oferecer subsídios à seção especializada, caso o ofício não seja atendido, esse Sodalício tem incansavelmente se manifestado a respeito das regras deontológicas fundamentais e da forma de publicidade nos mais variados e brilhantes julgados, sendo que não é demais lembrar que, “a advocacia tem papel relevante na administração da Justiça, o Código de Ética recomenda expressamente, que a prática advocacia não se compatibiliza com atividades que produzam ou vendam bens ou mercantilizem serviços”.

Entendo que o expediente utilizado pelo advogado denunciado já foi exaustivamente examinado nos julgados E-1.795/98 – Rel. Dr. José Roberto Botino, e E-1.824/99 – Rel. Dr. Cláudio Felipe Zalaf, dentre outros, todos no sentido de que:

“Em princípio não existe proibição para que os advogados mantenham as denominadas “home page”, na internet. Entretanto, recomendação que o façam com discrição e moderação, valendo, em tudo, as regras para publicações em jornais e revistas (…) ficando vedado as informações de serviços suscetíveis de implicar, direta ou indiretamente, captação de causa ou de clientes.” Proc. E-1.847/99 – Rel. Dr. Luiz Carlos Branco – Rev. Dr. Biasi Ruggiero.

No mesmo sentido “mutatis mutandis” a Ementa E-1.681/98, cujo Relator foi o Dr. Clodoaldo Ribeiro Machado:

“A oferta de serviços profissionais pelo advogado, endereçada a quem não seja cliente e mediante envio de correspondência com encarte chamativo e sem observância do estatuído nos arts. 5º, 7º, 28, 29, “caput”, e 31 do CED, configura mercantilização da profissão e induz captação de clientela, punível na forma do artigo 34, IV, do EAOAB.”

É o parecer.

DECLARAÇÃO DE VOTO CONVERGENTE DO REVISOR DR JOÃO TEIXEIRA GRANDE

PARECER

De ser confirmado integralmente o o judicioso parecer do ilustre Relator.

Propomos, tão somente, seja remetida cópia integral da decisão ao ilustre Presidente da Comissão de Informática, como sugestão para futuros eventos interligando a Ética e a Informática. Sobre a sugestão do Consulente em se criar no site da OAB um setor especial para denúncias sobre ética, parece-nos que tem sido suficiente o caminho já existente, utilizado pelo próprio Consulente, presidencia@oabsp.org.br, no link FALE CONOSCO. A Comissão de Informática, porém decidirá com a sabedoria costumeira, aliás porque já submetida a sugestão do Consulente a ela, por r. despacho da Presidência, às fls. 2.

É a nossa sugestão.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

RELATÓRIO

Trata-se em resumo, de pedido de esclarecimento feito pelos ilustres advogados, sob o fundamento de que na Ementa E-1.976/99 não ficou clara a posição desse Sodalício a respeito da inclusão ou não da página de nosso “site” com os nomes e “links” dos nossos clientes.

PARECER

No voto objeto da referida Ementa, foram citados os julgados nºs. E-1795/98, Rel. Dr. José Roberto Botino, e E-1824/99, Rel. Dr. Cláudio Felipe Zalaf, e no mesmo sentido, a Ementa E-1847/99, do Relator que a esta subscreve, tendo como Revisor o Dr. Biasi Ruggiero:

“Em princípio não existe proibição para que os advogados mantenham as denominadas “home page”, na internet. Entretanto, recomenda-se que façam com discrição e moderação, valendo, em tudo, as regras para publicações em jornais e revistas (…) ficando vedado as informações de serviços suscetíveis de implicar, direta ou indiretamente, captação de causas ou de clientes.”

É o parecer.

EMENTA

INTERNET – ESCRITÓRIO DE ADVOGADO – CRIAÇÃO DE LINK – LISTA DE CLIENTES – Em princípio não existe violação ética ao advogado que faz anúncio discreto e moderado, através da Internet, desde que em consonância com os arts. 28 e 31 do CED, 58,V, do EAOAB e Resolução n. 02/92 deste Sodalício. É vedada, no entanto, aos advogados e às sociedades de advogados, a divulgação de informações ou serviços suscetíveis de implicar, direta ou indiretamente, captação de causa ou de clientes, como a criação de “link” do escritório com lista de clientes para consultas de futuros clientes. Remessa para as Turmas Disciplinares e providências do art. 48 do CED. Proc. E-1.976/99 – v.u. em 16/09/99 do parecer e voto do Rel. Dr. LUIZ CARLOS BRANCO – Rev. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE – Presidente Dr. ROBISON BARONI.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – Ficam acolhidos os Embargos para que seja acrescentado na Ementa: “Entende-se que não existe proibição para que seja mantida “home page” na Internet. Não poderá, entretanto, nela serem incluídos dados como: referências a valores dos serviços, tabelas, gratuidade ou forma de pagamento, termos ou expressões que possam iludir ou confundir o público, informações de serviços jurídicos e listagem de clientes suscetíveis de implicar, direta ou indiretamente, captação de causas ou clientes, tudo em conformidade com a Resolução N. 02/92.” v.u. do parecer e ementa do Rel. Dr. LUIZ CARLOS BRANCO – Rev. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE – Presidente Dr. ROBISON BARONI – 17/02/2.000.

Internética

( Publicado originalmente em meu antigo domínio “ERGAOMNES”, em setembro/99 )

INTERNET – CENTRO DE INFORMAÇÃO PARA ADVOGADOS – BANCO DE DADOS – ENDEREÇOS ÚTEIS

Processo n. E-1.985/99
Relator – Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE
Revisor – Dr. CLODOALDO RIBEIRO MACHADO
Presidente – Dr. ROBISON BARONI
Julgamento – 16/09/99 – v.u.

RELATÓRIO

Advogada inscrita na OAB-SP, através correio eletrônico, comunica-se com esta entidade profissional através a página “atendimento e informação” para comunicar ter recebido mensagem, também dirigida a vários colegas, sem nenhum tipo de solicitação. Indaga se o procedimento da remetente não está a ferir a ética profissional. Remetente é a empresa que se identifica.

A questão levantada pela advogada tem o respaldo de mais duas outras subscrições, de advogados diferentes, que a apoiam integralmente. Esses três questionamentos sobre a conduta estão às fls. 2/5 dos autos. De fls. 06 a 20, estão a impressão do que na tela aparece no site da empresa. Impõe-se o exame dessas folhas, fazendo-se a transcrição dos trechos mais significativos, para o que a este processo interessa.

Advogado, o mundo quer te conhecer. Assina agora!.

Localizar Advogados e Escritórios. Através de nomes, cidades, estados, países, áreas de atuação, número da OAB, estado da OAB e palavras-chave. Cadastre-se. Se você é advogado cadastre-se no Lawyer Center!

Seque-se uma verdadeira lista de benefícios e apelos para adesão, bem como de órgãos governamentais de todo o País, de instituições não governamentais, enfim, um grande banco de dados. São 368 links jurídicos, tudo pelo preço de R$60,00 anuais, cobrados através boleto bancário por ocasião da inscrição.

É o relatório.

PARECER

O problema de sites sobre Advocacia na Internet está se tornando grave por duas razões: pela abrangência dos serviços oferecidos e pela freqüência com que estão aparecendo. Em março deste ano foi julgado o Processo E-1842/99. Para esta Sessão de hoje, setembro, são mais dois processos, o de n° 1967/99 e este ora relatado. Todos oferecendo variada gama de serviços e informações, variando, porém, quanto à maior ou menor incidência de infrações éticas e outras peculiaridades.

Neste caso, constata-se empreendimento de natureza comercial, a começar pela sua qualificação no endereço eletrônico: .com.br . Seu aspecto mercantil também se revela na forma de participação dos interessados, isto é, mediante inscrição paga por taxa anual, com cobrança bancária. Quanto aos serviços a serem prestados, constituem em pôr à disposição dos associados um verdadeiro banco de dados e assistência constante por telefone, fax, email. Não se trata de organização inscrita ou passível de ser inscrita na OAB e por isso não fica sujeita aos regramentos do Estatuto da Advocacia, do Código de Ética, do Regulamento Geral e de Provimentos ou Resoluções. A fiscalização de seu trabalho não é da competência da Ordem dos Advogados do Brasil. Seu propósito é abrir espaço para que advogados e escritórios de advocacia tenham dados e informações jurídicas, além de figurar na relação de assinantes, onde porá seu currículo.

Surgem, assim, duas situações a serem analisadas. A primeira é a questão do empreendimento frente ao Código de Ética e Disciplina. Se um advogado ou sociedade de advogados estiver se utilizando da prática acima descrita com a finalidade de captar causas e clientes, estará praticando mercantilização e publicidade imoderada. Da mesma forma, as infrações existem quando um advogado, ou escritório, isoladamente cria uma página na Internet e abusa quanto ao conteúdo, exagerando no anúncio, nas facilidades para pagamento de honorários, na isenção de preço para consultas, na cobrança bancária, no preço por mensalidade, no desconhecimento entre cliente e advogado, no descuido do sigilo profissional. Mas se um empreendimento na Internet como o ora em exame desenvolver sua prática sem o intuito de captar causas e clientes, não estará a infringir a ética profissional. A Associação dos Advogados de São Paulo, a OAB SP, o Consultor Jurídico da provedora UOL são bancos de dados e orientações aos inscritos. O pagamento condicionado a empresa, é opcional, é facultativo, é para os que se associarem livremente. Quem não quiser participar e não quiser pagar fica fora do empreendimento.

A segunda questão para análise está na forma de participação dos advogados e escritórios que se associarem. Podem se associar advogados e sociedades de advogados, impedidos os estudantes, embora esteja sendo preparada uma seção especialmente para eles, conforme fls. 09. Muito bem, os profissionais e sociedades é que pautarão suas próprias condutas naquela empresa e, aí sim poderão estar sob a vigilância ética e disciplinar se extrapolarem para a mercância, para a captação e para outras irregularidades, usando-a como veículo.

Diz a página inicial: Localizar advogados e escritórios. Através de nomes, cidades, estados, países, áreas de atuação, números da OAB, estado da OAB e palavras-chave. Como se vê, o profissional terá sua identificação e qualificação pela especialidade, títulos e outras atividades correlatas que desenvolver. Aí é que começa o limite da conduta ética, vale dizer, depende do que for colocado nessa apresentação, sob o prisma da mercantilização, da captação, do sigilo, da atuação conjunta com outra atividade profissional. A inobservância, em especial, dos artigos 5°, 7°, 25 a 34 do Código de Ética, bem como da Resolução n° 02/92 deste Tribunal submeterão o infrator à sanções pertinentes. Mas somente o advogado infrator, não a empresa, que não é sociedade de advogados, que não é inscrita na OAB, que por isso não figura como sujeito passivo das sanções éticas da advocacia. Por isso que se impõe nítida diferenciação entre o empreendimento na Internet e os profissionais que dele participam. Para estes, as regras são as mesmas que as adotadas para o advogado ou escritório que crie, isoladamente, sua própria página na Internet regras essas tão bem delineadas em decisões deste Tribunal, como, por exemplo, nos processos E-1435/96, E-1471/96, E-1640/98, E-1684/98, E-1706/98, E-1759/98, E-1795/98, E-1824/99, E-1747/99, E-1877/99, todos publicados, na íntegra, no site da OAB-SP, link do Tribunal de Ética.

Outra questão levantada pela consulente e os dois advogados que a acompanham, subscrevendo a dúvida sobre conduta ética, está na abordagem que a empresa faz ao seu público alvo. Diz a advogada: Recebi a mensagem anexa, como tantos outros advogados. Gostaria que me fosse informado se o procedimento da Lawyer Center não fere o nosso Código de Ética Profissional, pois vários colegas estão recebendo tal mensagem sem nenhum tipo de solicitação.

A mensagem é remetida a advogados sem que para tanto haja qualquer solicitação. Infelizmente, essa é uma prática do mundo moderno das mais mercantilistas e anti-éticas, agora não se falando em ética do advogado, mas a ética comum. É verdadeira invasão domiciliar praticada pelo empresário que quer vender seu produto mesmo fora do horário comercial, remetendo correspondência impressa ou provocando telefonemas por pessoas treinadas a serem insistentes, tudo após comprarem nomes, endereços e números de telefones de malas diretas que são vendidas indiscriminadamente por empresas que as obtêm sabe-se lá como! Sobre essa prática não pode este Tribunal decidir, apenas lamentar; e a cada um rejeitar.

É o nosso parecer.

EMENTA

INTERNET – CENTRO DE INFORMAÇÃO PARA ADVOGADOS – BANCO DE DADOS – ENDEREÇOS ÚTEIS – Empreendimento que vise criar página na Internet para proporcionar informações a advogados associados, mediante pagamento de taxa anual, por não ser associação de profissionais inscrita na OAB, conforme o EAOAB, não diz respeito ao Tribunal de Ética. Entretanto, existirá infração ética se advogados inscritos no empreendimento se valerem do mesmo para infrações éticas e disciplinares, tais como: publicidade imoderada, mercantilização, nome fantasia, captação de clientes e causas, inculca, anúncio concomitante com outra profissão, aviltamento de honorários, etc. A participação do advogado e escritórios de advocacia na Internet deve obedecer às normas éticas e estatutárias consagradas no Código de Ética, Estatuto e Resolução n. 02/92 deste Sodalício, bem como em assentada jurisprudência desta Casa. Precedentes E-1.967 e outros. Proc. 1.985/99 – v.u. em 16/09/99 do parecer e voto do Rel. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE – Rev. Dr. CLODOALDO RIBEIRO MACHADO – Presidente Dr. ROBISON BARONI.

Telefônica vai disputar domínio na Justiça

Taís Fuoco, do Infonews

Quinta-feira, 5 de agosto de 1999 – 15h26

O provedor de acesso à Web Greco Internet recebeu uma notificação extrajudicial da Telefônica exigindo que ele desative o site www.telefonica.com.br e o endereço eletrônico info@telefonica.com.br, sob pena de detenção de 3 meses a um ano.

A operadora de telefonia alega que depositou a marca Telefônica no INPI e que está defendendo sua marca no território nacional amparada pelo artigo 6º da Convenção da União de Paris.

O artigo afirma que a marca notoriamente conhecida é protegida independente de registro no País.

O site foi criado por Carlos Greco, diretor da Greco Internet, para reunir reclamações de usuários contra os serviços telefônicos prestados pela operadora.

Diante do impasse, Greco entrou com uma ação contra a Telefônica na 29ª Vara Cível, já que ele obteve registro do site na Fapesp em novembro passado e afirma que não há direito de marcas e patentes na Internet.

O juiz determinou hoje a data da audiência de conciliação entre as partes, que será no dia 30 de setembro.

A Telefônica informou, através de sua assessoria de imprensa, que acatará a decisão do juiz, mas que está analisando o site e que, se verificar que há condutas que denigrem a sua imagem, irá tomar as medidas cabíveis.

Por causa do site de Greco, o endereço oficial da Telefônica na Web teve que ser o www.telefonica.net.br.

(Publicado originalmente em algum dos sites gratuitos que armazenavam o e-zine CTRL-C)

Alguns comentários à Lei de Software

( Publicado originalmente no e-zine CTRL-C nº 00, de agosto/99 )

LEI Nº 9.609, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998.

Dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua comercialização no País, e dá outras providências.

O Presidente da República

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1º. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.

– Nada de novo aqui: simplesmente é a definição de software. Acho que poderia ter sido feita de maneira mais simples, algo como: software é a sequência de comandos logicamente organizados e ordens que fazem com que o computador, ou dispositivo nele baseado, execute as tarefas desejadas. Normalmente a legislação brasileira teima em pecar pelo excesso – vejam só: “suporte físico de qualquer natureza”, acaba por significar que os livros contendo descrições de programas também são softwares…

CAPÍTULO II

DA PROTEÇÃO AOS DIREITOS DE AUTOR E DO REGISTRO

Art. 2º. O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.

– É a Lei 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, uma colcha de retalhos tão grande que merece um número especial só para ela.

§ 1º. Não se aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais, ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa de computador e o direito do autor de opor-se a alterações não-autorizadas, quando estas impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de computador, que prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.

– Difícil… Esse parágrafo vai meio que contra o disposto no caput, ou seja, primeiro diz que a proteção dada aos programas de computador é a mesma da Lei de Direitos Autorais, depois exclui o tópico relativo aos Direitos Morais (art. 24 da Lei 9.610/98). Da mesma maneira que a mensuração de eventual dano moral é extremamente subjetiva, é complicado avaliar como a “honra” ou a “reputação” do autor foram afetadas por alguma alteração no código do programa.

§ 2º. Fica assegurada a tutela dos direitos relativos a programa de computador pelo prazo de cinquenta anos, contados a partir de 1º de janeiro do ano subsequente ao da sua publicação ou, na ausência desta, da sua criação.

– Acho que podemos entender a palavra “publicação” como “divulgação”, até porque é difícil para qualquer autor definir o momento da criação de um programa. Isso porque aquele pedacinho de código mágico que o torna exclusivo e, por isso mesmo, passível de proteção pela lei, pode ter sido elaborado em um rompante de criatividade, e todo o restante desenvolvido no decorrer de anos. Assim, se o programa não for divulgado, como se vai definir o momento em que foi criado? E também o prazo de proteção: cinquenta anos! Oras, gerações inteiras de computadores nasceram e morreram num período deste. Antes tivessem mantido o prazo definido na lei anterior – de vinte e cinco anos – que mesmo assim também considero exagerado. Uma vez mais acho que faltou um pouco de bom senso, pois após alguns anos de mercado (cinco? dez?) normalmente um programa acaba ficando obsoleto. Talvez fosse mais interessante definir que após um determinado tempo os programas obsoletos se tornassem de domínio público, prontos para serem “dissecados” pelas novas gerações de programadores, os quais poderiam aprender com os erros e acertos do original. Só para efeitos de comparação: se a obra literária de um renomado autor, como Júlio Verne, por exemplo, ainda ser considerada importante e render frutos após mais de um século de sua criação, com certeza o mesmo não poderá se dizer de um programa já obsoleto como o Sistema Operacional MS-DOS versão 3.30 (duvido que daqui a cinquenta anos alguém seria capaz de ainda utilizá-lo).

§ 3º. A proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro.

– Bem-vindo ao velho oeste: quem reclamar primeiro é dono ! Mas falando sério: esse artigo é um avanço, pois a lei anterior definia uma série de procedimentos para registro de programas, normalmente em órgãos que não duravam mais que uma gestão presidencial. Na prática, entretanto, numa eventual disputa judicial torna-se difícil comprovar a legitimidade da autoria, ficando praticamente a cargo do juiz aceitar ou não as provas apresentadas.

§ 4º. Os direitos atribuídos por esta Lei ficam assegurados aos estrangeiros domiciliados no exterior, desde que o país de origem do programa conceda, aos brasileiros e estrangeiros domiciliados no Brasil, direitos equivalentes.

– Resumindo: essa lei também protege os programas feitos lá fora, DESDE QUE o país de origem do programa também proteja os nossos.

§ 5º. Inclui-se dentre os direitos assegurados por esta Lei e pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País aquele direito exclusivo de autorizar ou proibir o aluguel comercial, não sendo esse direito exaurível pela venda, licença ou outra forma de transferência da cópia do programa.

– Ou seja, ninguém jamais é realmente dono do software, simplesmente adquire uma licença para uso próprio.

§ 6º. O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos casos em que o programa em si não seja objeto essencial do aluguel.

– Meio estranho. Acho que deve estar se referindo a aluguel de maquinário onde o software já esteja instalado.

Art. 3º. Os programas de computador poderão, a critério do titular, ser registrados em órgão ou entidade a ser designado por ato do Poder Executivo, por iniciativa do Ministério responsável pela política de ciência e tecnologia.

– Vide Decreto 2.556/98, logo abaixo, o qual acrescenta muito pouco ao que já foi definido, chegando mesmo a repetir seu conteúdo.

§ 1º. O pedido de registro estabelecido neste artigo deverá conter, pelo menos, as seguintes informações:

I – os dados referentes ao autor do programa de computador e ao titular, se distinto do autor, sejam pessoas físicas ou jurídicas;

II – a identificação e descrição funcional do programa de computador; e

III – os trechos do programa e outros dados que se considerar suficientes para identificá-lo e caracterizar sua originalidade, ressalvando-se os direitos de terceiros e a responsabilidade do Governo.

§ 2º. As informações referidas no inciso III do parágrafo anterior são de caráter sigiloso, não podendo ser reveladas, salvo por ordem judicial ou a requerimento do próprio titular.

Art. 4º. Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou, ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.

– Nada de novo aqui: se o indivíduo foi contratado para trabalhar na área de informática, seja no desenvolvimento ou não, o programa é da empresa.

§ 1º. Ressalvado ajuste em contrário, a compensação do trabalho ou serviço prestado limitar-se-á à remuneração ou ao salário convencionado.

– Se o programa estourar no mercado, o lucro é da empresa…

§ 2º. Pertencerão, com exclusividade, ao empregado, contratado de serviço ou servidor os direitos concernentes a programa de computador gerado sem relação com o contrato de trabalho, prestação de serviços ou vínculo estatutário, e sem a utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais e de negócios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, da empresa ou entidade com a qual o empregador mantenha contrato de prestação de serviços ou assemelhados, do contratante de serviços ou órgão público.

– O programa pertencerá ao indivíduo que o criou, desde que ele não tenha sido contratado para trabalhar na área de informática, nem para desenvolvimento de programas, sem utilizar equipamentos da empresa ou informações técnicas a ela vinculada. Que é que o indivíduo tá fazendo com essa pérola de programa dentro da empresa então? Vai trabalhar em casa, que dá menos dor de cabeça.

§ 3º. O tratamento previsto neste artigo será aplicado nos casos em que o programa de computador for desenvolvido por bolsistas, estagiários e assemelhados.

– Consulte em qualquer site de pesquisa: “os direitos do estagiário”.

Art. 5º. Os direitos sobre as derivações autorizadas pelo titular dos direitos de programa de computador, inclusive sua exploração econômica, pertencerão à pessoa autorizada que as fizer, salvo estipulação contratual em contrário.

– Se deixou mexer no programa, não queira ganhar em cima disso.

Art. 6º. Não constituem ofensa aos direitos do titular de programa de computador:

I – a reprodução, em um só exemplar, de cópia legitimamente adquirida, desde que se destine à cópia de salvaguarda ou armazenamento eletrônico, hipótese em que o exemplar original servirá de salvaguarda;

– É a famosa “cópia de backup”.

II – a citação parcial do programa, para fins didáticos, desde que identificados o programa e o titular dos direitos respectivos;

– Citação em quê? Entendo tratar-se da utilização de programas em cursinhos e aulas de computação.

III – a ocorrência de semelhança de programa a outro, preexistente, quando se der por força das características funcionais de sua aplicação, da observância de preceitos normativos e técnicos, ou de limitação de forma alternativa para a sua expressão;

– Se um programa foi desenvolvido para funcionar sob o ambiente do Windows 95, por exemplo, ele deve obedecer às regras de apresentação e lay-out definidos pela Microsoft, sob risco de ser incompatível com o sistema operacional.

IV – a integração de um programa, mantendo-se suas características essenciais, a um sistema aplicativo ou operacional, tecnicamente indispensável às necessidades do usuário, desde que para o uso exclusivo de quem a promoveu.

– Que inciso mais inócuo ! Para se alterar qualquer programa é necessário ter o código-fonte do mesmo (visto que engenharia reversa é proibida). Salvo os programas de código aberto, como o Linux, nenhum outro disponibiliza isso para o usuário. Então como é que o usuário final estaria capacitado a efetuar essa “integração” com o sistema operacional?

CAPÍTULO III

DAS GARANTIAS AOS USUÁRIOS DE PROGRAMA DE COMPUTADOR

Art. 7º. O contrato de licença de uso de programa de computador, o documento fiscal correspondente, os suportes físicos do programa ou as respectivas embalagens deverão consignar, de forma facilmente legível pelo usuário, o prazo de validade técnica da versão comercializada.

– “Prazo de validade técnica”? Então para que tutelar por cinquenta anos os direitos do autor?

Art. 8º. Aquele que comercializar programa de computador, quer seja titular dos direitos do programa, quer seja titular dos direitos de comercialização, fica obrigado, no território nacional, durante o prazo de validade técnica da respectiva versão, a assegurar aos respectivos usuários a prestação de serviços técnicos complementares relativos ao adequado funcionamento do programa, consideradas as suas especificações.

Parágrafo único. A obrigação persistirá no caso de retirada de circulação comercial do programa de computador durante o prazo de validade, salvo justa indenização de eventuais prejuízos causados a terceiros.

– Imagine a seguinte situação (não-hipotética): uma determinada loja monta computadores com o sistema operacional Windows 95 pré-instalado, tudo com manual, disco de instalação, etc; o indivíduo compra esse computador e logo depois a loja fecha de vez. Se houver problemas com o programa e ele tentar recorrer à Microsoft, vai receber a bem-educada mensagem de que ele deve pedir socorro ao vendedor do equipamento. Ou seja: não funciona. Se é o “prazo de validade técnica” que define a garantia ao usuário, então (só para falarmos da Microsoft) o Windows 3.11, Windows 95 e, em breve, o Windows 98, não são de responsabilidade de ninguém, visto que a cada nova versão, expira a garantia da velha.

CAPÍTULO IV

DOS CONTRATOS DE LICENÇA DE USO, DE COMERCIALIZAÇÃO E DE TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA

Art. 9º. O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.

Parágrafo único. Na hipótese de eventual inexistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso.

– Programas baixados pela Internet, então, nem pensar…

Art. 10. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior.

§ 1º. Serão nulas as cláusulas que:

I – limitem a produção, a distribuição ou a comercialização, em violação às disposições normativas em vigor;

– É óbvio: nenhum contrato pode ir contra a lei.

II – eximam qualquer dos contratantes das responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos de autor.

– Se o indivíduo comprar um software que foi adulterado no meio do caminho, poderá também responder em juízo pelo uso que der ao programa.

§ 2º. O remetente do correspondente valor em moeda estrangeira, em pagamento da remuneração de que se trata, conservará em seu poder, pelo prazo de cinco anos, todos os documentos necessários à comprovação da licitude das remessas e da sua conformidade ao caput deste artigo.

– Nesse caso não tenho autoridade nem conhecimento para comentários, mas fica uma curiosidade: as casas de software realmente remetem o valor correspondente aos direitos autorais para o exterior?

Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros.

Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.

– O curioso é que muitos programadores (competentes, inclusive) fazem o caminho inverso: depois de o programa pronte e rodando, é que eles voltam fazendo a documentação, fluxogramas, diagramas, etc.

CAPÍTULO V

DAS INFRAÇÕES E DAS PENALIDADES

Art. 12. Violar direitos de autor de programa de computador:

Pena – Detenção de seis meses a dois anos ou multa.

– “Detenção” é uma pena mais leve, é prisão em delegacia. Tanto é branda que pode ser substituída pelo pagamento de uma multa.

§ 1º. Se a violação consistir na reprodução, por qualquer meio, de programa de computador, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente:

Pena – Reclusão de um a quatro anos e multa.

– Opa ! Isso aí é pirataria ! Portanto temos a “reclusão”, que é uma pena severa, é prisão em penitenciária mesmo, podendo ser aplicada também uma multa em cima do infrator.

§ 2º. Na mesma pena do parágrafo anterior incorre quem vende, expõe à venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para fins de comércio, original ou cópia de programa de computador, produzido com violação de direito autoral.

– O simples fato de ter mais de uma cópia que não seja para salvaguardar os dados do original, já caracteriza a pirataria.

§ 3º. Nos crimes previstos neste artigo, somente se procede mediante queixa, salvo:

– Os processos judiciais normalmente se iniciam de duas formas: mediante queixa, ou mediante denúncia. No primeiro caso é necessário que um indivíduo qualquer “apresente queixa”, iniciando-se assim o processo de inquérito. Já o segundo caso se dá “de ofício” mediante denúncia do membro do Ministério Público (Promotor), o qual instaura o inquérito.

I – quando praticados em prejuízo de entidade de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo poder público;

II – quando, em decorrência de ato delituoso, resultar sonegação fiscal, perda de arrecadação tributária ou prática de quaisquer dos crimes contra a ordem tributária ou contra as relações de consumo.

§ 4º. No caso do inciso II do parágrafo anterior, a exigibilidade do tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, processar-se-á independentemente de representação.

Art. 13. A ação penal e as diligências preliminares de busca e apreensão, nos casos de violação de direito de autor de programa de computador, serão precedidas de vistoria, podendo o juiz ordenar a apreensão das cópias produzidas ou comercializadas com violação de direito de autor, suas versões e derivações, em poder do infrator ou de quem as esteja expondo, mantendo em depósito, reproduzindo ou comercializando.

– Vide o artigo “A ABES e a caça às bruxas“, nesse mesmo número.

Art. 14. Independentemente da ação penal, o prejudicado poderá intentar ação para proibir ao infrator a prática do ato incriminado, com cominação de pena pecuniária para o caso de transgressão do preceito.

– Ou seja, além da ação penal, cabe a reparação civil.

§ 1º. A ação de abstenção de prática de ato poderá ser cumulada com a de perdas e danos pelos prejuízos decorrentes da infração.

– Como eu já descrevi anteriormente, entendo que seria melhor descrito como “lucros cessantes” e não exatamente como prejuízo.

§ 2º. Independentemente de ação cautelar preparatória, o juiz poderá conceder medida liminar proibindo ao infrator a prática do ato incriminado, nos termos deste artigo.

§ 3º. Nos procedimentos cíveis, as medidas cautelares de busca e apreensão observarão o disposto no artigo anterior.

§ 4º. Na hipótese de serem apresentadas, em juízo, para a defesa dos interesses de quaisquer das partes, informações que se caracterizem como confidenciais, deverá o juiz determinar que o processo prossiga em segredo de justiça, vedado o uso de tais informações também à outra parte para outras finalidades.

– Bastante discutível tal atitude, visto que a decisão de que o processo prossiga em segredo de justiça caberá quase que exclusivamente ao entendimento subjetivo do juiz. Salvo raríssimas exceções, tal atitude afigura-se um tanto quanto agressiva ao devido processo legal hoje tão prestigiado pela Constituição.

§ 5º. Será responsabilizado por perdas e danos aquele que requerer e promover as medidas previstas neste e nos artigos 12 e 13, agindo de má-fé ou por espírito de emulação, capricho ou erro grosseiro, nos termos dos artigos 16, 17 e 18 do Código de Processo Civil.

– Além de perdas e danos, e da multa a ser estipulada pelo juiz (não superior a 1% do valor da causa), conforme for a dimensão dada ao caso, entendo ser passível de reparação por danos morais também.

CAPÍTULO VI

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 15. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 16. Fica revogada a Lei nº 7.646, de 18 de dezembro de 1987.

– Ainda bem que revogou a lei inteira, não perpetuando o fenômeno “colcha de retalhos”, tão comum em nossa legislação.

(DOU, Seção I, 20.02.1998, p. 01)

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DECRETO Nº 2.556, DE 20 DE ABRIL DE 1998.

Regulamenta o registro previsto no art. 3º da Lei n 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua comercialização no país, e dá outras providências.

O Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 3 da Lei n 9.609, de 19 de fevereiro de 1998,

DECRETA:

Art. 1º. Os programas de computador poderão, a critério do titular dos respectivos direitos, ser registrados no Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI.

§ 1º. O pedido de registro de que trata este artigo deverá conter, pelo menos, as seguintes informações:

I – os dados referentes ao autor do programa de computador e ao titular, se distinto do autor, sejam pessoas físicas ou jurídicas;

II – a identificação e descrição funcional do programa de computador; e

III – os trechos do programa e outros dados que se considerar suficientes para identificá-lo e caracterizar sua originalidade.

§ 2º. As informações referidas no inciso III do parágrafo anterior são de caráter sigiloso, não podendo ser reveladas, salvo por ordem judicial ou a requerimento do próprio titular.

Art. 2º. A veracidade das informações de que trata o artigo anterior são de inteira responsabilidade do requerente, não prejudicando eventuais direitos de terceiros nem acarretando qualquer responsabilidade do Governo.

Art. 3º. À cessão dos direitos de autor sobre programa de computador aplica-se o disposto no art. 50 da Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.

Art. 4º. Quando se tratar de programa de computador derivado de outro, nos termos do art. 5º da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, o requerente do registro deverá juntar o instrumento pelo qual lhe foi autorizada a realização da derivação.

Art. 5º. O INPI expedirá normas complementares regulamentando os procedimentos relativos ao registro e à guarda das informações de caráter sigiloso, bem como fixando os valores das retribuições que lhe serão devidas.

Art. 6º. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

– Comentário único: conheço o INPI como sendo um órgão extremamente burocrático, detalhista e apegado a minúcias. Em nenhum momento se destacou COMO deve ser apresentado o programa para registro. Através de listagem? De disquete, CD, ou similar? Telepatia? Isso é uma caracterização importante que deveria ser definida, mesmo que genericamente, no próprio decreto, visto que a regulamentação interna desse órgão tende a ser extremamente volátil.

(DOU, 22.04.1998)

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