Estômago e bolso das togas

Revista Carta Capital nº 652, de 29/06/2011 – fls. 20

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – proclamado erroneamente como de controle externo, mas composto na sua maioria por magistrados – acaba de aprovar resolução a garantir aos juízes brasileiros em atividade dois benefícios: auxílio-alimentação e venda de férias trabalhadas.

A resolução do CNJ deveu-se a uma provocação feita pela Associação dos Juízes Federais (AJUFE). Com base na isonomia, equivalência, a associação pediu benefícios já percebidos por membros do Ministério Público. Convém lembrar que cada juiz federal vence, em média, 23 mil reais, ou seja, não se trata de remuneração famélica. Num Brasil de baixos salários, com um mínimo não ideal e com programas como o Bolsa Família para minimizar a miséria, o tal auxílio-alimentação aos bens nutridos juízes soa como escárnio, data venia.

Por outro lado, nada mais justo indenizar por férias trabalhadas. Só que a categoria goza de dois períodos anuais de descanso. E, pelo justificado há anos, os dois repousos seriam necessários em razão da atividade intelectual desgastante imposta aos magistrados, que, ainda, carecem de tratamento diferenciado para se aperfeiçoar. Só uma coisa soa estranha e gostaríamos de entender. Se, por necessidade e humanidade, dois meses de descanso ao ano são necessários, por que não obrigar os magistrados a gozarem as férias inteiras, em vez de autorizá-los a se eslfalfarem e ainda vendê-las?

Sim, os grifos acimas foram meus.

Não, não vou comentar mais nada.

Reciclar Você…

A Família Gangsters, uma banda paulistana “com influências nas raízes do reggae” (ridículo escrever isso) acabou de lançar esse novo clip (ainda não consigo escrever “clipe”) com a música Reciclar Você… Dica da amiga Paula Losada. Além da boa música, como as filmagens levaram em consideração a vida real do catador Marcelão, serve pra gente enfiar a arrogância no bolso, descer do pedestal e dar uma olhada de perto no que é ter um dia duro de verdade…

Indigna Ação

E então os bombeiros do Rio resolveram entrar em greve. Seria uma coisa “inadmissível”, não fossem as condições que somente vêm a público quando atingem um limite tal que se torna insustentável. E é o que parece ter acontecido naquelas plagas cariocas…

Mas daí, entre o direito constitucional de uma classe trabalhadora proliferar um movimento grevístico – resguardadas as condições mínimas de atendimento à população em situações emergenciais (o que também é uma exigência constitucional) – a compará-los a “vândalos”, bem, é uma distância abissal!

E, pior: utilizar-se do mesmo grupo especial da polícia que impõe terror às favelas do Rio, o BOPE (basta lembrar do veículo blindado carinhosamente apelidado de “Caveirão”), que no sábado instituiu um clima de guerra em pleno centro carioca impondo a força onde deveria haver diálogo, é, no mínimo, revoltante.

Nas palavras do (des)governador Sérgio Cabral Filho: “Esses 440 irresponsáveis vão responder a processos administrativa e criminalmente. A abertura do processo disciplinar já foi determinada, a criminal cabe ao Ministério Público.” Teria razão? Afinal de contas, por suas ordens diretas, esses “440 irresponsáveis” (aqueles mesmos que arriscam a própria vida para salvar as vidas de ilustres desconhecidos) foram presos, dentre outros motivos, por não estarem satisfeitos com o nababesco salário de R$950,00!!!

Difícil até mesmo argumentar. Mas é possível chegar a conclusões mais específicas através das palavras da deputada estadual Janira Rocha (PSOL-RJ), que estava lá quando da ação: “Foi terrível o que aconteceu lá dentro. O BOPE invadiu por trás, jogando bombas de gás e disparando balas de verdade. Tem carros dos bombeiros lá dentro arrebentados a bala. Se os bombeiros não estivessem em movimento pacífico e ordeiro poderia ter ocorrido uma tragédia. (…) Essas pessoas que estão sendo penalizadas são as mesmas que salvam vidas em incêndios e nas praias do Rio. Ganham o pior salário da categoria no Brasil. Quero saber se o governador Cabral, responsável por essa operação, consegue se alimentar em Paris com os R$950 que são pagos a esses homens e mulheres.”

É… Tempo ao tempo e vamos ver como tudo isso vai acabar. Se acabar…

Politicamente fascista

Marcelo Coelho
Folha de São Paulo

O comediante Danilo Gentili pediu desculpas pela piada antissemita que divulgou no Twitter. A saber, a de que os velhos de Higienópolis temem o metrô no bairro porque “a última vez que eles chegaram perto de um vagão foram parar em Auschwitz”.

Aceitar suas desculpas pode ser fácil ou difícil, conforme a disposição de cada um. O difícil é imaginar que, com isso, ele venha a dizer menos cretinices no futuro.

Não aguentei mais do que alguns minutos do programa “CQC”, na TV Bandeirantes, do qual é ele uma das estrelas mais festejadas.

Mas há um vídeo no YouTube, reproduzindo uma apresentação em Brasília do seu show “Politicamente Incorreto”, em outubro de 2010.

Dá para desculpar muita coisa, mas não a falta de graça. O nome oficial do Palácio do Planalto é Palácio dos Despachos, diz ele. “Deve ser por isso que tem tanto encosto lá.” Quem o construiu foi Oscar Niemeyer, continua o humorista. E construiu muitas outras coisas, como as pirâmides do Egito.

A plateia tenta rir, mas só fica feliz mesmo quando ouve que Lula é cachaceiro, ou que (rá, rá) o nome real de Sarney é Ribamar. Prossegue citando os políticos que Sarney apoiou; encerra a lista dizendo que ele só não apoiou o próprio câncer porque “o câncer era benigno”.

Os aplausos e risadas, pode-se acreditar, vêm menos da qualidade das piadas e mais da vontade de manifestação política do público.

Detestam-se, com razão, os abusos dos congressistas brasileiros. Só por isso, imagino, alguém ri quando Gentili diz preferir que a capital do país ficasse no Rio: “Lá pelo menos tem bala perdida para acertar deputado”.

Melhor parar antes que eu fique sem respiração de tanto rir. Como se vê, em todo caso, o título do show não é bem o que parece.

“Politicamente incorreto”, no caso, faz referência às coisas erradas feitas pelos políticos, mais do que ao que há de chocante em piadas sobre negros ou homossexuais.

A questão é que o rótulo vende. Ser “politicamente incorreto”, no Brasil de hoje, é motivo de orgulho. Todo pateta com pretensões à originalidade e à ironia toma a iniciativa de se dizer “incorreto” – e com isso se vê autorizado a abrir seu destampatório contra as mulheres, os gays, os negros, os índios e quem mais ele conseguir.

Não nego que o “politicamente correto”, em suas versões mais extremadas, seja uma interdição ao pensamento, uma polícia ideológica.

Mas o “politicamente incorreto”, em sua suposta heresia, na maior parte das vezes não passa de banalidade e estupidez.

Reproduz preconceitos antiquíssimos como se fossem novidades cintilantes. “Mulheres são burras!” “Ser contra a guerra é viadagem!” “Polícia tem de dar porrada!” “Bolsa Família serve para engordar vagabundo!” “Nordestino é atrasado!” “Criança só endireita no couro!”

Diz ou escreve tudo isso, e não disfarça um sorrisinho: “Viram como sou inteligente?” “Como sou verdadeiro?” “Como sou corajoso?” “Como sou trágico?” “Como sou politicamente incorreto?”

O problema é que “politicamente incorreto”, na verdade, é um rótulo enganoso. Quem diz essas coisas não é, para falar com todas as letras, “politicamente incorreto”. Quem diz essas coisas é politicamente fascista.

Só que a palavra “fascista”, hoje em dia, virou um termo… politicamente incorreto. Chegamos a um paradoxo, a uma contradição.

O rótulo “politicamente incorreto” acaba sendo uma forma eufemística, bem-educada e aceitável (isto é, “politicamente correta”) de se dizer reacionário, direitista, fascistoide.

A babaquice, claro, não é monopólio da direita nem da esquerda. Foi a partir de uma perspectiva “de esquerda” que Danilo Gentili resolveu criticar “os velhos de Higienópolis” que não querem metrô perto de casa.

Os vizinhos judeus, por exemplo. É este um dos mecanismos, e não o vagão de um metrô, que ajudam a levar até Auschwitz.

Recortado e colado daqui.

Trabalho, trabalho, trabalho…

Sabem todos aqueles problemas que, na sexta-feira, você tinha pensado terem ficado para trás e só voltariam a incomodá-lo na segunda-feira?

Pois é.

Quando menos se espera, eis que a segunda-feira chegou.

E os problemas de sempre rastejam para fora de suas cavernas e, um a um, nos atacam com força redobrada…

Ah, meu São Jorge… Dai-me forças!

Dez estratégias de manipulação midiática

Será que recentemente alguém viu algo assim na mídia?…

Direto lá do Escrevinhador:

O lingüista estadunidense Noam Chomsky elaborou a lista das “10 estratégias de manipulação” através da mídia:

1- A estratégia da distração.
O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundações de contínuas distrações e de informações insignificantes. A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir ao público de interessar-se pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. “Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja como os outros animais (citação do texto ‘Armas silenciosas para guerras tranqüilas’)”.

2- Criar problemas, depois oferecer soluções.
Este método também é chamado “problema-reação-solução”. Cria-se um problema, uma “situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este seja o mandante das medidas que se deseja fazer aceitar. Por exemplo: deixar que se desenvolva ou se intensifique a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público seja o mandante de leis de segurança e políticas em prejuízo da liberdade. Ou também: criar uma crise econômica para fazer aceitar como um mal necessário o retrocesso dos direitos sociais e o desmantelamento dos serviços públicos.

3- A estratégia da gradação.
Para fazer com que se aceite uma medida inaceitável, basta aplicá-la gradativamente, a conta-gotas, por anos consecutivos. É dessa maneira que condições socioeconômicas radicalmente novas (neoliberalismo) foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990: Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que haveriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.

4- A estratégia do deferido.
Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como sendo “dolorosa e necessária”, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Em seguida, porque o público, a massa, tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isto dá mais tempo ao público para acostumar-se com a idéia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegue o momento.

5- Dirigir-se ao público como crianças de baixa idade.
A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade, como se o espectador fosse um menino de baixa idade ou um deficiente mental. Quanto mais se intente buscar enganar ao espectador, mais se tende a adotar um tom infantilizante. Por quê? “Se você se dirige a uma pessoa como se ela tivesse a idade de 12 anos ou menos, então, em razão da sugestão, ela tenderá, com certa probabilidade, a uma resposta ou reação também desprovida de um sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos ou menos de idade (ver “Armas silenciosas para guerras tranqüilas”)”.

6- Utilizar o aspecto emocional muito mais do que a reflexão.
Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e por fim ao sentido critico dos indivíduos. Além do mais, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para implantar ou enxertar idéias, desejos, medos e temores, compulsões, ou induzir comportamentos…

7- Manter o público na ignorância e na mediocridade.
Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. “A qualidade da educação dada às classes sociais inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que paira entre as classes inferiores às classes sociais superiores seja e permaneça impossível para o alcance das classes inferiores (ver ‘Armas silenciosas para guerras tranqüilas’)”.

8- Estimular o público a ser complacente na mediocridade.
Promover ao público a achar que é moda o fato de ser estúpido, vulgar e inculto…

9- Reforçar a revolta pela autoculpabilidade.
Fazer o indivíduo acreditar que é somente ele o culpado pela sua própria desgraça, por causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Assim, ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo se auto-desvalida e culpa-se, o que gera um estado depressivo do qual um dos seus efeitos é a inibição da sua ação. E, sem ação, não há revolução!

10- Conhecer melhor os indivíduos do que eles mesmos se conhecem.
No transcorrer dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência têm gerado crescente brecha entre os conhecimentos do público e aquelas possuídas e utilizadas pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o “sistema” tem desfrutado de um conhecimento avançado do ser humano, tanto de forma física como psicologicamente. O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele mesmo conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos do que os indivíduos a si mesmos.