Heráldica

Texto publicado em 17/02/2001 por
Sandra Wienke Tavares e equipe da Heráldica Pelotense.

Introdução
O seu nome e a Heráldica

Na Europa da Idade Média, no calor das batalhas, viver ou morrer dependia de saber distinguir o amigo do inimigo. Essa era uma tarefa difícil, com os cavaleiros cobertos por armaduras.

Assim, cada combatente costumava decorar seu escudo e sua túnica com um distintivo único, que o diferenciava dos demais. Surge então a heráldica, nome proveniente do inglês “heralds”, que eram os homens encarregados pelos reis para desenhar os brasões.

Arte que nasceu para atender a nobres e cavaleiros, expandiu-se com o surgimento dos reinos e cidades, onde cidadãos importantes recebiam a sua cota de armas.

Praticamente todas as famílias de origem européia tem o seu brasão registrado nos antigos livros de armas.

Este trabalho de pesquisa é oferecido pela Heráldica Pelotense, trazendo ao portador do brasão um sentimento de identidade e contexto na história.

Capítulo I
A concessão das Armas

Brasão e armas são termos heráldicos de igual valor e significam o conjunto de insígnias hereditárias, compostas de figuras e atributos determinados, concedidos por príncipes e reis em recompensa por serviços relevantes. Podem ainda indicar marca ou distintivo de linhagem premiada.

A idéia de usar símbolos é muito primitiva e na sua origem foi hieróglifa. Os primeiros que se tem conhecimento eram religiosos e indicativos de profissão, geralmente gravados no túmulo.

A origem do uso de símbolos heráldicos remonta à Idade Média, quando das Cruzadas. Para distinguirem-se dos outros exércitos e até mesmo para facilitar a contagem dos mortos em batalha, os escudos eram pintados de certa cor ou com determinado símbolo. Ao retornarem dos confrontos ou de outro país, muitas vezes estes escudos eram enriquecidos com novos símbolos e cores.

Os símbolos como sinais de honra e nobreza, que passavam de pais para filhos, começaram a ser empregados nas armarias no final do século X, tendo sido regularizado o seu uso e aperfeiçoadas suas regras nos três séculos seguintes. Mas as regras precisas da confecção dos brasões e os termos próprios da heráldica somente foram estabelecidas ao final do século XV. Seu apogeu na Idade Média deve-se ao apogeu da cavalaria, do romantismo na arte e da exaltação da família e da nobreza.

Posteriormente os símbolos e cores foram usados em torneios da cavalaria, evoluindo para o conjunto de símbolos e cores concedidos por autoridades reais como recompensa por serviços prestados ou por feitos heróicos. Os símbolos podiam ser transmitidos aos filhos e herdeiros, estabelecendo-se assim as linhagens. Com isto, nesta etapa da história da heráldica formou-se um corpo de nobreza com escudo de armas ou brasões, que raras vezes representavam feitos de guerras ou conquistas, mas sim o procedimento de antepassados mais ou menos diretos e algumas vezes indiretíssimos.

Quase ao mesmo tempo foram criadas as armas de ordens militares, religiosas, da classe política e judicial. Ao final das concessões, os brasões eram quase que exclusivamente outorgados a ocupantes de cargos políticos, pertencentes ao pequeno círculo da corte.

No Brasil a heráldica nasceu durante o Império Brasileiro e o uso dos títulos extinguia-se com a morte do titular. Os brasões eram concedidos a grandes fazendeiros, políticos e outros que, de uma forma ou de outra, prestavam apoio ou préstimos à Coroa.

Capítulo II
Os Metais e os Esmaltes

Na representação dos brasões de armas são utilizados apenas dois tipos de metais, o ouro e a prata, e cinco tipos de esmaltes, a saber: vermelho, azul, verde, púrpura e negro, conforme mostrado na figura abaixo. Os desenhos que representam o corpo humano ou suas partes podem ser usados na sua cor natural, também conhecida como “carnação”. O termo esmalte tem origem nas palavras “hasmal” (hebraico) e “esmaltium” (latim) que referem-se ao preparo de um verniz vítreo com grande aderência, que era usado para proteger os metais da oxidação.

Metais e esmaltes heráldicos
Metais e esmlates utilizados na heráldica.

O ouro pode receber outros nomes, em determinadas circustâncias: nos escudos dos reis passa a ser chamado de sol; nos brasões da nobreza em geral é chamado de topázio. Aqueles que tem este metal no seu escudo estavam obrigados, na idade média, a fazer bem aos pobres e a defender seus senhores, lutando por eles até o final das suas forças.

O metal prata, quando presente nas armas dos soberanos, recebe o nome de lua. A prata está associada com a inocência e pureza, e aqueles que a tinham em seu brasão estavam obrigados a defender as donzelas e a amparar os órfãos.

O vermelho é conhecido também como goles ou gules, recebendo este nome nas armarias da nobreza geral. Quando presente nos escudos dos príncipes, passa a ser chamado de marte, enquanto nos brasões dos nobres titulados é chamado de rubi. Este esmalte é associado com o valor e a intrepidez, e obrigava os seus portadores a socorrer os injustiçados e oprimidos.

O azul chama-se júpiter quando aplicado às armas reais, safira nas armas dos nobres titulados ou simplesmente azul nos escudos da nobreza em geral. Este esmalte significa nobreza, majestade, serenidade, e os seus portadores estavam obrigados a fomentar a agricultura e também a socorrer os servidores despedidos injustamente ou que se encontrassem sem remuneração.

O esmalte verde é conhecido na heráldica como sinople, quando aplicado às armas da nobreza em geral. Para os príncipes e reis passa a ser chamado de vênus, enquanto para a nobreza titulada é referenciado como esmeralda. Um brasão que continha este esmalte obrigava o seu portador a socorrer os lavradores em geral, assim como aos órfãos e pobres oprimidos.

A púrpura significa dignidade, poder e soberania, e aqueles que a usavam em sua cota de armas deveriam proteger os eclesiásticos e religiosos.

Finalmente, o esmalte preto é também chamado de sable nas armarias em geral, mudando o seu nome para saturno nas armas reais e para diamante nas armas da nobreza titulada. O sable está associado a ciência, a modéstia e a aflição, e aqueles que apresentavam este esmalte em seus brasões estavam obrigados a socorrer as viúvas, os órfãos e todas as pessoas dedicadas às letras.

Capítulo III
Os Heraldos e os Reis de Armas

O termo heráldica deriva dos originais heraldo ou arauto. A palavra heraldo vem, segundo alguns autores, do alemão antigo her, heer ou hold, que quer dizer devotado, e segundo outros vem da raiz har da palavra alemã haren, que significa gritar ou chamar.

Os heraldos tinham a missão de anunciar publicamente os nomes dos concorrentes em torneios, levar declarações de guerra ou propostas de paz, contar e anunciar o número de mortos em batalhas.

Na idade média os heraldos eram oficiais de guerra e cerimônias, conservando-se esta atividade até o tempo de Carlos Magno. Pela sua importância social e política, o termo heraldo foi substituído pela designação Rei de Armas, e estes eram sempre escolhidos entre os heraldos mais antigos.

As incumbências dos Reis de Armas eram de zelar por brasões e títulos de nobreza, enfrentando usurpadores de títulos e armarias, publicar datas de celebração das festas e torneios entre as Ordens de Cavalaria, proclamar casamentos, dirigir solenidades e determinar colocação de insígnias e legendas nos túmulos dos príncipes.

O Rei Carlos VIII foi quem criou o ofício de Mestre de Armas, figura que tinha função oficial de regulamentar, no seu reino, o uso de brasões. Nas pompas fúnebres os Mestres de Armas trajavam-se com grande luxo, levando sempre em suas mãos um bastão de nogueira que simbolizava a importância do seu cargo.

Capítulo IV
Principais Figuras Heráldicas

Parte A – O Elmo

Na heráldica, o elmo ou casco do brasão pode apresentar-se em diversas posições e formatos. De acordo com a sua posição pode-se inferir algum informação sobre o seu portador. Por exemplo, um elmo perfilado para o lado esquerdo significa bastardia.

O elmo dos imperadores e reis apresenta-se de frente, com a viseira aberta, sem grades ou então com onze grades no sentido vertical (figura abaixo). Este formato é muito comum na heráldica francesa. Nesta classe de elmos, os mesmo devem ser representados no metal (cor) ouro. Os príncipes herdeiros, descendentes de imperadores ou reis, apresentam seus elmos semi-abertos e no metal prata. Os altos dignatários, como os duques, usam o elmo também em prata e com nove grades. Os elmos dos marqueses são muito semelhantes aos dos duques, exceto pelo número de grades, totalizando sete. Os condes e viscondes tem o elmo representado em prata bronzeada, sendo que na França os elmos desta categoria são de aço, perfilados, e apresentam apenas três grades.

Elmo Real
Representação de um elmo de rei ou imperador.

Na heráldica portuguesa o elmo é geralmente de prata, guarnecido de ouro e com o estofo da mesma cor do campo. Se este for de ouro ou de prata o estofo deve ser amarelo ou branco, respectivamente.

Quanto à situação do elmo sobre o escudo é interessante observar que, se o indivíduo for fidalgo há pelo menos quatro gerações, o elmo deve ser representado olhando para a direita e com a viseira levantada (aberta). Para os nobres até três gerações o elmo também deve ser representado olhando para a direita, mas a viseira deve ser representada fechada.

Parte B – O Leão

O leão é uma das figuras mais empregadas na heráldica, sendo encontrado nos brasões de inúmeras famílias e nas armas de diversos países.

Em medalhística podem ser encontradas ordens tendo o leão como tema e motivação: Ordem do Leão de Zaehring, de 1812; Ordem do Leão de Ouro, organizada em 1079 por Frederico II; Ordem do Leão e do Sol, da Pérsia, fundada em 1808; Ordem do Leão Neerlandês, de 1815, organizada por Guilherme I, entre outras.

As diversas posições com que se apresenta o leão são mostradas na figura seguinte.


Algumas posições usuais na representação heráldica do leão.

No campo do brasão podem aparecer um ou mais leões, sendo que o número total não pode ser superior a dezesseis.

Nos brasões infamados, assim classificados pela prática condenável do seu dono, caso exista a figura de um leão, este é representado desprovido de cauda e dentes.

Às vezes o leão aparece composto com outros animais, como a águia. Neste caso, passa a chamar-se Grifo. Esta peça, com a parte superior de águia e corpo de leão, é encontrada nos brasões de muitas famílias, como por exemplo dos Bachasson, Dauyat e Doriac.


Brasão de armas destacando-se a figura do grifo.

A presença do leão no brasão de armas insinua força, grandeza, coragem, nobreza de condição. Também caracteriza domínio e proteção, condições que deve ter um superior sobre aqueles que domina.

Nos brasões portugueses e espanhóis o leão representa, em muitos casos, aliança com a casa real de Leão (Espanha) ou concessão por ela outorgada.

Parte C – Outros Animais Quadrúpedes

O leopardo apresenta-se nos brasões da maneira chamada “passante”, com a pata dianteira erguida. A pantera também é representada passante, o tigre correndo, o urso pode ser rompante (em posição de combate), passante ou levantado. O lobo é representado andante, com a pata dianteira levantada. É muito frequente na armaria vasco-navarra, já que é insígnia da batalha de Arnigorriaga.

O cavalo é representado marchando, o touro e a vaca parados ou andantes, e o javali andante e de perfil. O coelho e a lebre podem aparecer passantes, correndo, deitados ou como presa.


Alguns animais quadrúpedes utilizados na heráldica.

Parte D – O Castelo

Os castelos tiveram uma importância muito grande nos tempos medievais, pois eram poderosos baluartes de defesa e residência de imperadores e reis. No seu interior reuniam-se os exércitos, camponeses e vassalos, além dos rebanhos e toda produção da terra, que ficava a salvo da cobiça dos inimigos. Esses castelos tinham meios próprios de subsistência, visto que muitas vezes eram assediados e cercados por longo tempo.

A figura do castelo, por tais condições e por seu simbolismo, é muito empregada na heráldica, obedecendo a determinados critérios para seu desenho. Uma regra geral, nem sempre observada na prática, estabelece a composição entre metais e esmaltes: se o castelo for desenhado com um esmalte (cor), as suas portas devem ser de metal; quando o castelo é desenhado em ouro, as aberturas (portas e janelas) deverão ser representadas em vermelho; se o castelo for de prata, as aberturas devem ser representadas em preto.

O castelo não deve ser confundido com a torre. O seu desenho deve apresentar-se rigorosamente em um só bloco, com uma porta e duas janelas, o todo sobreposto por três torres, geralmente com a do meio maior que as das laterais.

A presença do castelo em um brasão de armas significa que o seu portador participou com destaque em tomadas de assalto, ou despojos conquistados. Quando representado de portas abertas indica sucesso na defesa ou tomada.


Alguns exemplos de castelo em brasões de armas.

Tanto nos brasões portugueses quanto nos espanhóis o castelo representa, muitas vezes, aliança com a casa real de Castela. Nos brasões portugueses concedidos na segunda dinastia, os castelos são alusivos a feitos de armas praticados no ataque ou defesa de praças de guerra do norte da África e outras conquistas. Os castelos sobre ondas representam feitos ligados a praças marítimas.

Finalmente, se o castelo for representado em prata sobre um campo de azul, pode-se afirmar que o seu possuidor era pessoa de grande virtude.

Parte E – A Torre

A torre tem seu desenho próprio, não devendo ser confundida com um castelo. A palavra provém do latim “turre”, é uma peça que se apresenta isolada e, conforme o seu desenho, tem sua significação. A torre é parte de destaque do castelo e geralmente é representada com uma porta e duas janelas. A torre mais alta ou de maior proeminência do castelo é chamada de torre de homenagem; quando aparece com três torres sobrepostas se diz donjonada; quando podem ser notadas as janelas, esclarecida; quando aparece o teto, coberta; quando tem a porta com grade e pontas na parte inferior, é gradeada; quando a torre vem com chamas nas janelas e sobre as ameias ou seteiras se diz ardente. A torre apresenta o seu corpo na forma arredondada. Já o torreão constitui uma derivação da torre original, pois a forma do seu corpo é quadrada ou retangular, com uma porta e quatro ameias.


A torre, o torreão e o torreão ardente.

Parte F – A Flor-de-lis

Na heráldica a figura da flor-de-lis tem muita importância, não só porque simboliza e fixa características ligadas à família, pessoas, locais, como por ser uma peça constantemente encontrada nos brasões franceses, isto por ter sido este o símbolo da sua monarquia.

A flor-de-lis é símbolo de poder e soberania, assim como de pureza de corpo e alma, candura e felicidade.

A origem do símbolo é muito controvertida e o que se sabe é que seu surgimento não data de pouco tempo. Sabe-se que foi usada nas armas da França em 496, na vitória de Tolbiacum (Zulpich), onde os francos de Clodoveu, derrotaram os alemães e coroaram-se de lírios. Seu desenho era colocado no manto de reis já na época pré-cruzada, na indumentária de luxo dos reis de armas, nos pavilhões, nas bandeiras e, ainda hoje, em vários brasões de municípios franceses.

Garcia IV, rei de Navarra, que viveu pelo ano de 1048, passou a adotar o desenho como símbolo de seu reinado, após ter visto uma imagem de Nossa Senhora desenhada no fundo de um lírio e logo após ter se curado de uma grave enfermidade.

No ano de 1125, a bandeira da França apresentava o seu campo semeado de flores-de-lis, o mesmo acontecendo com o seu brasão de armas até o reinado de Carlos V (1364), quando estas passaram a ser apenas em número de três. Este rei adotou oficialmente o símbolo como emblema, para honrar a Santíssima Trindade.

Outros historiadores relatam que antes disso o símbolo começou a ser utilizado no reinado de Luiz VII, o Jovem (1147), e como emblema da cidade de Florença. Além disto, aparece em numerosos brasões desde o século XII. Quanto a esse rei, foi ele o primeiro dos reis da França a servir-se desse desenho para selar suas cartas patentes, principalmente devido à alusão ao seu nome Luiz, que então se escrevia “Loys”. Os reis Felipe Augusto e S. Luiz, conservaram o lis como atributo real, o que seus descendentes perpetuaram.

Alguns heraldistas afirmam que a flor-de-lis teve sua origem na flor-de-lótus do Egito, outros que sua origem provem da alabarda ou lírio, um ferro de três pontas que se colocava, fincados, nos fossos ou covas para espetar quem neles caísse e também da flor do lírio ou da íris cuja semelhança é encontrada quando as analisamos de perfil. Ainda outra possível origem é aventada, a que seja uma cópia do desenho estampado em antigas moedas assírias e muçulmanas.

A flor-de-lis deve ser representada por desenhos padronizados, jamais feitos livremente. São brasonados ao natural, mas podem ter cor de um esmalte ou de um metal.


A flor-de-lis em várias representações.

Quando acontece de um brasão ser carregado de flores-de-lis, o que é comum em brasões franceses, se diz flordelizado e se a mesma aparecer cortada ou sem pé, então deve ser dita de “pé morto”; quando a representação vier acompanhada de dois botões ladeando uma pétala de maior tamanho, é denominada flor-de-lis florentina. Como timbre não é comum. Todavia aparece nos brasões de armas dos Macieira, Macoula e Maciel.

As flores-de-lis são muito frequentes nos brasões portugueses. Representam, em geral, uma concessão dos reis da França, principalmente quando assentam sobre campo azul, e só em casos raros, como o dos Nápoles e dos Lacerda, representam parentesco ou aliança com a Casa Real francesa.


Brasão dos Nápoles, contendo flores-de-lis por ligação com a Casa Real francesa.

Parte G – A Cruz

Na heráldica, a aplicação da cruz é muito ampla. Isto decorre principalmente da enorme quantidade de formatos que a ela são dados na confecção dos brasões. Além disto, há um vasto uso na heráldica religiosa, tumular e na confecção de condecorações, bandeiras e insígnias. A correta definição de cruz é a de uma figura formada por uma pala e uma faixa cruzadas, mas sem continuidade entre elas.

Um dos formatos mais primitivos da cruz foi usado pelos gregos e pelos egípcios há 5 mil anos e tinha a forma de um “T” encimado por um anel, símbolo de divindade, e que se chamava Cruz de Ankl.

A primeira vez que a cruz foi oficializada como símbolo, neste caso de fé, aconteceu no reinado de Constantino. Isto ocorreu devido ao imperador ter sido, surpreendentemente, vencedor da batalha contra Mexêncio. Daí por diante, na vanguarda do exército constantino, sempre era conduzido um estandarte composto por uma cruz com a legenda “IN HOC SIGNO VINCES” (com este sinal vencerás). O uso da cruz como elemento de brasão de armas nasceu com as cruzadas. As grandes ordens de Cavalaria como São João, dos Templários, de Calatrava, de Malta e outras escolheram a cruz como seu símbolo. Os duques de Saboya trazem em seu escudo uma cruz branca como lembrança de terem socorrido a Rhodes contra os turcos. Muitas famílias da nobreza européia trazem a cruz em seus escudos, como lembrança de terem tomado parte nas cruzadas. Os contingentes das cruzadas de diferentes países distinguiam-se no uso da cruz: os escoceses usavam a Cruz de Santo André; os ingleses, uma cruz de ouro; os alemães, de negro; os italianos, de azul; e os espanhóis de vermelho. Eduardo III da Inglaterra, reinvindicando a Coroa da França, adotou a cruz vermelha para seu exército em 1335 e a França, para evitar confusão, ficou com o branco. Enfim, ainda hoje a Cruz Vermelha de São Jorge caracteriza a Inglaterra, assim como, depois de outra mudança, a cruz branca caracteriza a Itália. Portugal ficou caracterizado pela cruz azul que o conde de São Henrique trouxe para a Terra Santa.

Na heráldica portuguesa, desde 1459, encontra-se a cruz em muitos brasões. Quanto a heráldica brasileira, muitas famílias apresentam a cruz sob várias formas. Entre os barões, encontra-se, por exemplo, a cruz nos sobrenomes Abadia, Alegrete, Catumbi, Guarulhos e Saquarema, entre outros.


Exemplos de brasões de armas contendo cruzes.

Parte H – As Figuras Quiméricas

As chamadas figuras quiméricas surgiram da imaginação dos poetas e cantadores da idade média, provavelmente inspirados pela mitologia fantástica da antiguidade. O uso dessas figuras na heráldica é muito antigo e frequente, aparecendo nos brasões de família pelo simbolismo que podem representar. Existem muitas figuras quiméricas, sendo relacionadas abaixo algumas das principais, na descrição de Silveira (1972).

Grifo – figura com cabeça e garra de leão, asas de águia, orelha de cavalo, com barbatanas ao invés de crinas.

Licórnio ou Unicórnio – animal quimérico que tem forma de cavalo, cauda em ponta e, no centro da testa, um chifre agudo, vindo daí seu nome. Esta figura é muito utilizada na heráldica, fazendo parte de cimeiras, ladeantes, nos escudos de armas e empregada como suportes do brasão.


Unicórnio (Licórnio) em brasão de armas.

Dragão – nome que vem do latim “dracone” e do grego “dracon”. Animal fantástico com garras, cauda de serpente terminada em arpão e cabeça de crocodilo. Este ser quimérico está ligado à figura de São Jorge, padroeiro da Inglaterra, sendo também consagrado à Minerva, deusa da caça e da sabedoria, e ao nome da Ordem Chinesa do Dragão.

Esfinge – é um animal com cabeça e busto de mulher, corpo de leão, asas de águia, que entre os egipcios representava o Sol. Essa figura foi difundida pela lenda de Édipo.

Hidra – figura quimérica, representada por uma serpente monstruosa com corpo de dragão alado, com sete cabeças. De acordo com a lenda, habitava os campos de Lerna, na Argólia. É evocada na lenda dos trabalhos de Hércules, que conseguiu matá-la abatendo as suas sete cabeças de uma só vez.

Centauro – monstro fabuloso, que tinha a parte superior do seu corpo de homem e o restante de cavalo. Sua lenda é registrada nos frisos do Partenon, na ilha grega de Creta, e conta o combate dos centauros nas bodas de Piritoo, rei dos Lápidos. Este, auxiliado por Teseu e Hércules, teria eliminado aqueles seres.

Hárpia – figura de um monstro com rosto e pescoço de mulher e o resto do corpo de um abutre, com unhas em forma de garras. Na heráldica é sempre apresentada de frente e com asas distendidas.

Sereia – outro ser fantástico, que tem a parte superior do corpo de mulher e o restante de um peixe. Conforme a lenda, ela costumava cantar para seduzir os pescadores e levá-los para o fundo do mar. É representada geralmente com um espelho na mão direita e um pente na esquerda.

Fênix – figura mitológica que habitava os confins do deserto da Arábia. Tinha possibilidade de viver muitas dezenas de anos e, quando se sentia morrer, fazia seu ninho com ervas e essências perfumadas, ficando ali aninhada, deixando o sol incendiar tudo. Porém, acontecia que sempre ressurgia das suas próprias cinzas.

Pégaso – é o cavalo alado, surgido, segundo a lenda, do sangue de Medusa, no momento em que Perseu lhe cortou a cabeça. Pégaso simboliza a inspiração e o gênio da poesia.

Quimera – monstro com o corpo de um leão, cabeça de cabra e cauda de dragão, soltando fogo pela boca.

Hipógrifo – cavalo alado, com meio corpo de grifo, tendo as patas dianteiras em garras.

Medusa – uma das Górgonas, que tinha lindos cabelos, mas como tivesse ofendido Minerva, a deusa da Sabedoria, teve os seus cabelos transformados em serpentes, sendo depois a sua cabeça decepada por Perseu.


Dragão e grifo batalhantes, no brasão de Pêro Cardoso (Portugal, 1580).

Capítulo V
A Nobreza

Utiliza-se este substantivo para denominar um conjunto de indivíduos que goza, em virtude de transmissão legal hereditária, de privilégios políticos e direitos superiores aos da maioria da população. O princípio de tudo está nas sociedades primitivas, quando os homens mais fortes e hábeis tornavam-se chefes de tribos ou clãs. Frequentemente havia um corpo de indivíduos que o apoiava e que adquiria prestígio em virtude do poder do chefe. Mais tarde essa casta especial transmitia aos seus descendentes os privilégios de que gozava. Em fase mais avançada da história, a riqueza ou a influência política muitas vezes permitia aos seus possessores ganhar o estado de nobreza. Nas nações da moderna Europa a nobreza teve origem na aristocracia feudal. A partir do século XI os nobres tomaram os nomes de seus domínios territoriais, de seus castelos ou de povoações sob seu domínio. Daí a partícula “de”, para os franceses e “von” para os povos germânicos. Em Portugal a monarquia liberal criou novos titulares e alargou muito as honras da nobreza, distinguindo-se não só militares e políticos como também escritores, artistas, diplomatas, comerciantes e banqueiros. Depois da proclamação da república, um decreto de 18 de outubro de 1910 aboliu os títulos nobiliárquicos, distinções e direitos de nobreza.

A aristocracia ou segunda nobreza é definida como a subinfeudação da grande nobreza. Nos séculos VIII a XI dividia-se em ricos-homens, infanções, cavaleiros e escudeiros.

Ricos-homens: os senhores mais poderosos, pois reuniam a fidalguia de nascimento, a autoridade e prestígio de cargos públicos mais elevados.

Infanções: nobres de raça, mas não revestidos de magistratura civil ou militar. A partir de meados do século XIV a palavra foi substituída pelo termo fidalgo.

Cavaleiro: todos que eram admitidos à confraria militar medieval da cavalaria e também homens livres que podiam custear por si cavalos e armas e ir à guerra, recebendo, por isso, certos privilégios.

Escudeiros: eram nobres ou não, que tinham por dever seguir, cada um, o seu cavaleiro, ajudando-o a vestir as armas e combatendo na retaguarda dele. A idade que se passava a escudeiro era a de 14 anos. Antes disso os mancebos nobres costumavam servir como pajens ou “donzéis” nos paços dos grandes senhores.

Capítulo VI
Títulos de Nobreza

A ordenação moderna dos títulos de nobreza é a seguinte:

Príncipe – do latim “princeps”, “principis” (primeiro). Filho primogênito do rei, chefe de um principado, filho ou membro de família real. É o título de nobreza mais elevado.

Duque – do latim “dux”, “ducis” (aquele que conduz).

Marquês – título intermediário entre o de Duque e o de Conde.

Conde – do latim “comes”, “comitis” (companheiro).

Visconde – do latim “vicecomes” (viceconde). Dado principalmente aos filhos caçulas dos condes e sua descendência.

Barão – homem, varão, pessoa poderosa pela posição ou riqueza.

Cavaleiro – do latim “caballarius” (escudeiro). Membro de Ordem de cavalaria.

Entre os títulos de nobreza figuram também as Grandezas de Espanha, títulos espanhóis concedidos a estrangeiros ilustres.

Título de Príncipe

O título de príncipe, em praticamente todos os países que tiveram ou têm monarquia, não é concedido, mas sim herdado dos pais Reais desde o nascimento. Na Espanha, por exemplo, o herdeiro da Coroa ostenta o título de Príncipe das Astúrias. Isto acontece desde o reinado de Don Juán I, que o concedeu a seu filho, o Infante Don Enrique (mais tarde Enrique III, 1379-1406). Os raros casos de concessão do título para um descendente não real espanhol foram suspensos e substituídos por títulos de duque e/ou conde. Na Espanha, o decreto de 4 de junho de 1948 restabeleceu a validade de títulos nobiliários.

Título de Duque

Um dos primeiros a se intitular Duque foi o Conde de Castilla, Fernán Gonzáles, em 1029, que se auto-apelidava Duque dos Castellanos. Mas os primeiros ducados considerados como títulos nobiliários e com caráter hereditário só se homologaram no reinado de Don Enrique II, que titulou Beltrán Duguesclin como Duque de Sória e de Molina, em 1370, e Don Fadrique de Castilla, seu filho, como Duque de Benavente. O primeiro ducado reverteu à Coroa por compra e o segundo por morte, na prisão do Infante Don Fadrique, por se ter colocado contra seu irmão, o rei Don Juan I de Castilla. Daquele tempo até o reinado de Felipe II houveram vinte fidalgos que ostentaram o título de Duque. Na Espanha este título era designado para o principal e mais importante fidalgo general do rei. Em Portugal era usado tão somente para os filhos do rei ou parentes mais próximos e, como no restante da Europa, teve maior uso no século XIV. Naquele país o titular gozava da mais alta autoridade e de mais extensa jurisdição. Suas funções incluíam o comando geral dos exércitos do país. Na Itália confiava-se aos Duques a administração militar e civil de cidades e províncias.

Título de Marquês

O Marquês é definido pelos escritos históricos como “senhor de alguma terra que está em comarca do reino”. Na Catalunha foram intitulados Marqueses os governadores da marca hispânica, costume seguido pelos Condes de Barcelona. O marquesado mais antigo remonta a Henrique II de Castela que, em 1336, concedeu o título a Don Alonso de Aragón, tio do rei Don Pedro de Aragón. Em Portugal, também o marquês era o governador das marcas fronteiriças.

Capítulo VII
Os Brasões da Sala de Sintra

O rei Dom Manoel I, o Venturoso (1495 a 1521), foi quem fez reunir pelo reino de Portugal todos os brasões, insígnias e letreiros, para acabar com o livre arbítrio no uso das armas e concessão de brasões. Com este material, transcrito e falado, planejou fazer um livro onde fossem pintados os brasões. Consta que existiram três livros de brasões, dos quais restaram apenas dois. O Livro Antigo dos Reis d’Armas, escrito por António Godinho, escrivão da Câmara Real, teria desaparecido quando um terremoto destruiu o Cartório da Nobreza. Restaram o Livro do Armeiro-Mor, datado de 15 de agosto de 1509, escrito por João Rodrigues, Rei de Armas de Portugal e o Livro da Torre do Tombo, escrito pelo Bacharel Antonio Rodrigues, também Rei de Armas de Portugal.

Após a conclusão da obra o rei mandou pintar o teto de um palacete, localizado no Paço de Sintra, com os brasões das 72 principais famílias lusas da época, ilustres em honra, história e bens. A execução ocorreu entre os anos de 1515 e 1540 e todos os brasões estão assentes no ventre de veados, sobre cujas cabeças repousa o timbre de cada família. No centro do teto da sala, que mede 14 por 13 metros, encontram-se as armas do rei, circundadas por seis brasões portugueses representando sua descendência masculina (os príncipes) e dois brasões em lisonja representando sua descendência feminina (as princesas).


Diagrama esquemático do teto da Sala de sintra, em Portugal. Ao centro, o brasão do rei, cercado pelos brasões de sua descendência masculina e feminina. No entorno, os brasões das 72 famílias ilustres à época (1515 a 1540).

Relação dos sobrenomes representados na Sala de Sintra
A – Armas do rei Dom Manuel
B – Infante Dom Yoam
C – Infante Dom Luis
D – Infante Dom Fernando
E – Infante Dom Afonso
F – Infante Dom Enrique
G – Infante Dom Duarte
H – Infante Dona Isabel
I – Infante Dona Beatris
1 – Noronha
2 – Coutinho
3 – Castro
4 – Ataíde
5 – Eça
6 – Menezes
7 – Castro (outros)
8 – Cunha
9 – Sousa
10 – Pereira
11 – Vasconcellos
12 – Melo
13 – Silva
14 – Albuquerque
15 – Andrada
16 – Almeida
17 – Manoel
18 – Febos Monis
19 – Lima
20 – Távora
21 – Henriques
22 – Mendonça Furtado
23 – Albergaria
24 – Almada
25 – Azevedo
26 – Castelo-Branco
27 – Abreu
28 – Brito
29 – Moura
30 – Lobo
31 – Sá
32 – Corte-Real
33 – Lemos
34 – Ribeiro
35 – Cabral
36 – Miranda
37 – Tavares
38 – Mascarenhas
39 – Sampaio
40 – Malafaia
41 – Meira
42 – Aboim
43 – Carvalho
44 – Mota
45 – Costa
46 – Pessanha
47 – Pacheco
48 – Souto-Maior
49 – Lobato
50 – Teixeira
51 – Valente
52 – Serpa
53 – Gama
54 – Nogueira
55 – Betancour
56 – Goes
57 – Pestana
58 – Barreto
59 – Coelho
60 – Queirós
61 – Ferreira
62 – Siqueira
63 – Cerveira
64 – Pimentel
65 – Goio
66 – Arcas
67 – Pinto
68 – Gouvea
69 – Faria
70 – Vieira
71 – Aguiar
72 – Borges

Técnica de Leitura: nomes e abreviaturas em documentos dos séculos XVII e XVIII

Cobra Maria José & Rubem Queiroz
(Autores de Um comerciante do século XVIII)
COBRA.PAGES.nom.br – Internet, Brasília, 2001

Em nossas pesquisas para os livros sobre os Távora (em preparo) e os Cobra, utilizamos quase todos os tipos de documentos listados abaixo. O livro dos Segredos da Santa Casa de Misericórdia é de difícil acesso, mesmo tratando-se de volumes dos séculos passados:

Nomes. Repetiam-se grandemente os nomes, ocorriam também muitos casamentos na mesma família, inclusive tios com sobrinhas ou tias com sobrinhos. Torna-se importante qualquer dado que possa identificar a pessoa, e que acompanha o seu nome. Por esse motivo, na identidade de um indivíduo é importante levar em conta:

a) O nome da mulher. Mas aqui também não se pode confiar integralmente, pois era frequente casarem-se as pessoas duas vezes, devido ao alto índice de viuvez.

b) Tão importante ou talvez mais importante que a vinculação ao nome de uma mulher, é o nome do lugar onde o indivíduo vivia ou de onde ele era natural. Hoje, devido à facilidade de movimentação de indivíduos e famílias, esse dado parece irrelevante para identidade, e o pesquisador tende a não lhe dar a importância que tinha em épocas antigas.

Desde a antiguidade, o local de nascimento ou moradia da pessoa era com frequência agregado ao nome do indivíduo, para identificá-lo entre outros de mesmo nome. Assim, “Domingos Pereira, morador na Sobreda”, vale para toda a vida desse Domingos, uma vez que provavelmente viverá sempre naquela localidade e assim se distinguirá de muitos outros Domingos Pereira. Muitos nomes de lugares incorporaram-se assim ao nome de família dos indivíduos. Esse costume passa da idade média à idade moderna, e vai praticamente desaparecer na época contemporânea.

c) A crença de que alcunhas tenham se tornado nomes de família não parece corresponder à verdade. As alcunhas eram indicadas muito distintamente, e serviam como identificador quando havia muitos nomes iguais no mesmo lugar. Pelo menos nos documentos das Igrejas da Vila de Almada, as alcunhas eram sempre indicadas com muita clareza e nao acompanhavam os nomes de filhos e netos. Assim Diogo da Costa, o Camílio, Antônio Vaz, o Bengala, etc.

Mudança de nomes. Abandono de um nome da linha paterna por um nome da linha materna pode ocorrer, ou alguma alteração por influência social mudar o sobrenome de todo um grupo. Uma família italiana que veio de Gênova para o Brasil e cujo sobrenome era Covre, teve, por descuido do funcionário que lhes emitiu documentos brasileiros, alterado para Cobra (Os Cobra de Piracicaba, S.P.).

Quando os judeus foram obrigados a adotar a religião católica, desapareceram os Isaac, Jacob, Judas, Salomão, Levi, Abeacar, Benefaçam, etc., e ficaram somente nomes e sobrenomes cristãos. Tomaram nomes vulgares, sem nada que os diferenciasse da maioria dos cristãos velhos, a não ser por vezes a manuntenção de algum sobrenome antigo judaico pelo qual o individuo era vulgarmente conhecido. Assim aconteceu com Jorge Fernandes Bixorda, Afonso Lopes Sapaio, Henrique Fernandes Abravanel, Duarte Fernandes Palaçano, Duarte Rodrigues Zaboca, etc.

Daí que é falsa a idéia de que os cristãos novos usavam nomes de árvores como Nogueira, Pereira, Pinheiro Carvalho, etc., para distinguir-se. Estes já eram sobrenomes existentes e pertencentes a própria nobreza de épocas anteriores.

Abreviaturas. A leitura da documentação antiga é tarefa um tanto dificil para o iniciante, mas que, após algum esforço, vai se tornando cada vez mais fácil. Existem umas poucas regras que facilitam muito a leitura dos documentos mais difíceis. É imprescindível também conhecer de antemão as formas de abreviatura comuns em cada época. São abreviados não somente palavras nos textos do documento como também os nomes das pessoas. Existem livros inteiramente dedicados a este problema.

Alguns nomes e sobrenomes passaram a existir a partir de abreviaturas como por exemplo “Roiz”, abreviatura de Rodrigues; Brites, abreviatura de Beatriz; Alves, provável abreviatura de Alvarez, etc.

Os sobrenomes eram frequentemente escritos com a inicial minúscula: oliveira, pereira, etc.

Aqui vão alguns exemplos de abreviaturas extraídas de documentos dos séculos XVII e XVIII:

7bro = setembro

8bro = outubro

Alz’ = Alvares

Ant.o = Antônio

Ant.o lopes das neves = Antônio Lopes das Neves.

Azd.o = Azevedo

C.na = Catarina

D.a = Dona

d.a V.a = dita Vila

d.o, d.a = dito, dita

D.os dias = Domingos Dias

D.os, D.as = Domingos, Domingas

D.tor = Douto

de prez.te = presentemente

delegc.as = diligências

delig.as = diligências

E. R. M.ce = espera receberá mercê

Evang.os = Evangelhos

f.o, f.a = filho, filha

feu.ro, feur.o, Feu.ro = fevereiro

Fon.ca = Fonseca

Fran.co, fran.co, Franc.o, Fr.co, fr.co; Fr.ca = Francisco, Francisca

freg.a ou fg.a = Freguesia

Frr.a, frr.a, Fer.a = Ferreira

Frz’, ou frz’ = Fernandes

Glz’ ou glz’ = Gonçalves

Im.o = Jerônimo

impedim.to– = impedimento

in facie ecctiae = in facie ecclesiae

Jan.ro, Janrr.o, Jan.r = janeiro

Jhs’., ihus’., Jhus. = Jesus

Joph. = Joseph ou José

l.o, ou legit.o, legit.a, legt.a, leg.ta, leg.ma = legítimo, legítima

M.a = Maria

M.a dias = Maria Dias

Mz = Munis ou Martins

M.el = Manuel

m.or, m.ora = morador, moradora

minha lç.a = minha licença

miz.a = Misericórdia

Mnz. = Martins

Montr.o, montr.o = Monteiro

Mrc.o = Março

N. Sr.a = Nossa Senhora

n.al = natural

n.al da V.a = natural da vila

Nascidos de hum ventre = filhos gêmeos

nessec.o = necessário

Nov.bro, 9bro = novembro

P. C. = passar carta

p.a = para

P.e = Padre

P.o = Pedro ou Pero

prez.tes = presentes

Prr.a,prr.a, Per.a = Pereira

q’ = que

q’ Ds’. guarde como des.o. = que Deus o guarde como desejo

ribr.o = Ribeiro

Roiz = Rodrigues

Ryo de Janr.o = Rio de Janeiro

S.er = Senhor

Sagr. Con. trid. e Const.oe(n)s deste Arc. = Sagrado Concílio Tridentino e Constituições deste Arcebispado

SMq’Ds’., SMDs’. = Sua Magestade que Deus guarde

Snra. = Senhora

Supp.te, supp.te = suplicante

Teix.ra, teix.ra, teixr.a = Teixeira

test.as ou t.as = testemunhas

V. Ill.ma e R.ma = Vossa Ilustríssima e Reverendíssima

V.a = Vila

VM, Vm.ce = Você, o Senhor, a Senhora

X.er = Xavier

A melhor fonte para socorro do leitor de documentos da nossa história colonial talvez seja ainda o Elucidário das Palavras e Termos e Frases que em Portugal Antigamente se Usaram e que Hoje Regularmente se Ignoram: Obra Indispensável para Entender sem Erro os Documentos Mais Raros e Preciosos que Entre Nós se Conservam. Esta obra de tão extenso título, de autoria do frade franciscano Joaquim de Santa Rosa de Viterbo, veio a público em Portugal em 1798 e 1799, mas foi reeditada, sendo de 1962 a “edição crítica”, por Mário Fiuza (Livraria Civilização Porto-Lisboa) a mais facilmente encontrável. Existe um exemplar na Biblioteca Central da UnB.

  • Cappeli, Adriano – Lexicon Abbreviaturarum. 1912.
  • Bacellar, Bernardo de Lima e Melo – Dicionário. 1782.
  • Bluteau, Raphael – Vocabulário. 1727.
  • Câmara, Paulo Perestello da – Dicionário. 1850.
  • Mascarenhas, Joaquim Augusto d’Oliveira- Novíssimo Dicionário Archeológico Histórico.

 
Procedimento para leitura de textos antigos:

Por mais difícil que seja a leitura de um texto antigo, ela não é impossível, se restam palavras legíveis o bastante para se chegar à construção de frases, e se são utilizadas certas técnicas para a leitura das interpretação das palavras pouco legíveis dos trechos danificados.

1. Transcrever as palavras facilmente reconhecíveis.

2. Desenhar as letras como o copista as escreve, observando a inclinação que ele dá, como fecha as letras redondas, como prolonga a haste das consoantes como d, t, h, etc.

3. Aplique o desenho de cada letra nas palavras parcialmente legíveis procurando completá-las.

4. O sentido que se pode dar à frase é também um recurso para desvendar um texto pouco legível, porém é traiçoeiro.

5. Busque auxílio no jargão próprio, por exemplo, jargão cartorial, lendo um documento da mesma época (outros documentos constantes do mesmo códice ou processo, ou se isto não for possível, procurando um documento do mesmo tipo, da época mais próxima que conseguir. Geralmente o jargão permanece através dos séculos. Por exemplo: E. R. M. = Espera Receberá Mercê.

6. Nunca procure completar uma palavra alterando o original, mesmo que usando grafite. Para isso faça uma cópia xerox do documento, ou fotografia, se for possível, ou simplesmente o copie a mão, de modo que possa fazer os ensaios de interpretação das letras e textos sem danificar o documento.

7. A posição da luz pode dar uma ajuda extraordinária. Por isso é bom ter uma luminária móvel pequena, que possa ser colocada em várias posições sobre o documento para iluminação direta ou oblíqua, no ângulo que for mais favorável.

8. Outro equipamento indispensável é a lente. As lentes maiores e de menor poder de ampliação ajuda na visão mais ampla de um texto a ser interpretado. Porém a lente pequena e de mais poder é não menos útil quando se deseja examinar vestígios de volteios de uma letra, para identificá-la.

São José dos Campos – Símbolos do Município

BRASÃO

Brasão do MunicípioO Brasão de Armas de São José dos Campos, de autoria do Dr. Afonso de Taunay e desenhado por J. Wash Rodrigues, foi aprovado pela Lei Municipal nº 180 de 23 setembro de 1926. Voltou a ser símbolo municipal pela Lei nº 19 de 26 de agosto de 1948 e teve seu desenho restaurado através da Lei nº 2178 de 03 de maio de 1979 com as seguintes características:

I. Escudo redondo português, cortado ao meio, partido o campo do chefe em dois quartéis e encimado pela coroa mural:

a) Primeiro Quartel: em campo de ouro, quatro cabeças, de sua cor, de índios guaianazes, afrontados e acantonados ladeando o brasão do venerável José de Anchieta, como símbolos da fundação do povoado de São José no século XVI.

b) Segundo Quartel: em campo de sinople (verde) um lírio e uma haste cruzados, de prata, e um rio, também de prata, simbolizando o Rio Paraíba, constituindo as armas “falantes” do município – São José do Paraíba ou São José dos Campos. O lírio é o símbolo atribuído a São José, e a haste florida recorda a piedosa lenda cristã relativa aos esponsais de São José e Nossa Senhora.

c) Campo Inferior: em campo de goles (vermelho), uma panóplia bandeirante, arcabuz, espada, machado e bandeira, tudo de sua cor, recordando a entrada dos desbravadores em terras de São José no século XVII.

II. Suportes: dois tenentes do terço miliciano criado para o Norte de São Paulo pelo Morgado de Mateus, então Governador da Província.

III. Coroa Mural: em ouro, com cinco torreões visíveis, tendo na porta principal, aclarada, o brasão do Morgado de Mateus.

IV. Listão: em fundo de prata e letras de goles (vermelho) com a divisa “AURA TERRAQUE GENEROSA” (generosos são a minha terra e os meus ares). Ao listão ornam dois ramos de café frutificados, tudo ao natural, recordando a grande lavoura do município.

BANDEIRA

Bandeira do MunicípioInstituída pela Lei 655 de 02 de fevereiro de 1960. Desenho do estudante da escola João Cursino, Sr. João Vitor Guzzo Strauss, vencedor do concurso promovido pela municipalidade.

Cores: Blau e prata; treze listras; figura de uma roda dentada em ouro simbolizando a riqueza sempre ascendente do Município; faixa em prata, sinuosa, representando o Rio Paraíba do Sul; três estrelas simbolizando os três distritos: São José dos Campos, Eugênio de Melo e São Francisco Xavier; os treze dentes da engrenagem falam do entrosamento entre o Estado e o Município.

HINO

Em 1967, ano do 2º Centenário de elevação a Vila (que depois alcançou o status de cidade, pela Lei Provincial nº 27 de 22 de abril de 1864), a Prefeitura instituiu um concurso para a confecção do Hino do 2º Centenário, oficialmente pela Lei nº 1463 de 26 de agosto de 1968, tendo alcançado sucesso o trabalho do Professor Vitor Machado de Carvalho, que teve partitura do Maestro Pepe Àvila, de São Paulo.

Ei-la envolta na neblina
Debruçada na colina,
Sob o olhar da Mantiqueira
São José a Hospitaleira
São José Bicentenária

Das mãos de Anchieta nascida,
Desta terra legendária
Que alegre vivas unida
No teu trabalho febril
Que o orgulho sejas do Vale
A cidade que mais cresce
Pois o título desvanece
todo São Paulo e o Brasil

(estribilho)

De operário a estudante,
Teu sangue novo estoante
Flui da escola à oficina
E da fé te ilumina,
Unes o livro ao esmeril,
Terra de obreiro e de bardo,
Que tens Cassiano Ricardo
O Poeta do Brasil.

São José dos Campos – Coordenadas

ÁREA : 1.102 Km² ( Conf. Res. n° 24 de 25/07/1997- IBGE )

ALTITUDES DO MUNICÍPIO : 550 X 2.082 – Cidade 550/690, média de 660m.

MUNICÍPIOS LIMÍTROFES :

  • Norte: Camanducaia, Sapucaí Mirim – MG
  • Sul: Jacareí, Jambeiro – SP
  • Leste: Monteiro Lobato, Caçapava – SP
  • Oeste: Igaratá, Joanópolis, Piracaia – SP

 
VIAS DE ACESSO :

  • Norte: Estrada SP-50 – Sul de Minas Gerais e Campos do Jordão; São José dos Campos 216 – Joanópolis (extensão do SP-36)
  • Sul: Estrada dos Tamoios, SP-99 – Costa Norte Paulista; SP-70 – Carvalho Pinto
  • Leste / Oeste: BR-116 – Rodovia Presidente Dutra; RFFSA – Rede Ferroviária Federal S/A – Divisão Central

 
TABELA DE DISTÂNCIAS (APROXIMADAS) :


De São José dos Campos até:

MUNICÍPIOS km
Belo Horizonte (MG) 611
Brasília 1.114
Caçapava (SP) 22
Camanducaia (MG) 177
Campos do Jordão (SP) 93
Caraguatatuba (Costa Norte Paulista) 84
Igaratá (SP) 35
Jacareí (SP) 16
Jambeiro (SP) 32
Joanópolis (SP) 118
Monte Verde (MG) 210
Monteiro Lobato (SP) 33
Piracaia (SP) 100
Rio de Janeiro (RJ) 321
São Paulo (SP) 84 (BR 116)
São Paulo (SP) 97 (SP 70)
Sapucaí Mirim (MG) 85
Santos (SP) 160
Taubaté (SP) 42

 
PONTOS EXTREMOS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS :


Extremo Norte:
Latitude Sul – 22° 49′
Longitude Oeste – 45° 54′

Extremo Oeste:
Latitude Sul – 23° 06′
Longitude Oeste – 46° 06′

Extremo Leste:
Latitude Sul – 23° 13′
Longitude Oeste – 45° 40′

Extremo Sul:
Latitude Sul – 23° 18′
Longitude Oeste – 45° 51′

São José dos Campos – Divisões Administrativas

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Região Administrativa

O Estado de São Paulo está dividido político-administrativamente em 11 regiões, sendo São José dos Campos Sede da 3ª Região Administrativa e Integrada por Municípios de todo o Vale do Paraíba Paulista e Costa Norte.

Formação Administrativa Municipal

Oficialmente, o município é constituído por três Distritos: São José dos Campos (sede), Eugênio de Melo (Decreto Estadual nº 6.638 de 31/08/11934) e São Francisco Xavier (Lei Estadual nº 59 de 16/08/1982). O Distrito de São José dos Campos é, ainda, subdividido em dois Subdistritos: 1º Subdistrito de São José dos Campos e 2º Subdistrito de Santana do Paraíba (Decreto-Lei nº 14.334 de 30/11/1944).

Para melhor administrar o município de São José dos Campos, o Poder Público dotou os Distritos de Eugênio de Melo e São Francisco Xavier de Administradores Distritais, enquanto que o Distrito sede foi dividido em quatro Regionais: Centro, Leste, Norte e Sul.

São José dos Campos – Histórico

O Aldeamento Indígena

Supõe-se que a colonização do território joseense teve início quase que contemporâneo com o da Capitania de São Vicente: presume-se aind que tal início aconteceu na segunda metade do século XVI, tendo sido primitivamente uma aldeia de índios guainazes emigrados de Piratininga, provavelmente no ano de 1564, fundada por determinação do Padre José de Anchieta, com o nome de Aldeia de São José do Rio Comprido.

O território joseense foi inicialmente ocupado por uma fazenda de pecuária criada oficialmente a partir da concessão de sesmarias, por volta de 1590, a pedido de padres jesuítas. Os indícios mais veementes de sua localização situam-na nas cabeceiras do Rio Comprido (hoje divisa natural entre São José e Jacareí), quando ao final da várzea o terreno se alteia em anfiteatro, e onde hoje se encontra a conservada sede da Fazenda Jardim, um dos belos casarões do período do café.

A classificação como fazenda de gado foi um artifício usado pelos jesuítas para ocultar dos bandeirantes uma missão catequetética.

A Lei de 10 de setembro de 1611, que criava e regulamentava aldeias de índios dispersos administrados por religiosos nos pontos em que conviessem ao interesse do Reino, não só transformou oficialmente a fazenda em missão de catequese, como também fez com que os índios se dirigissem aos sertões. Esse fato causou desagrado aos colonos que necessitavam e dependiam da mão-de-obra indígena e que tiveram suas ações dificultadas. O resultado desse conflito entre religiosos e colonos culminou com a expulsão dos jesuítas em 1640 e a consequente extinção da missão pela própria dispersão dos aldeados.

Alguns anos mais tarde os jesuítas reapareceram, trazendo mais alguns indígenas e, diferente do primeiro aldeamento, que ficava a leste de Piratininga, localizado às margens do Alto Rio Comprido, aproximadamente a 15 km a sudoeste da cidade atual, resolveram buscar ponto melhor e escolheram a magnífica planície, a 3 km do Rio Paraíba do Sul, onde hoje está o centro comercial da cidade. Do novo local tinha-se uma visão privilegiada da área que circundava a aldeia nova, garantindo maior segurança contra invasões, enchentes e permitindo boa ventilação e insolação.

Tais fatos ocorreram no intervalo de 1643 a 1660, quando os jesuítas obtiveram para os índios diversas léguas de terra concedidas por João Luiz Mafra, cavalheiro fidalgo da Casa de Sua Majestade. Essas terras eram compostas de quatro léguas em quadras, e o aldeamento foi estabelecido onde estão hoje as Praças João Pessoa e Expedicionários. Progredia a Aldeia Nova de São José, quando em 1650 foram concedidas sesmarias a Angelo de Siqueira Afonso e esposa, vindos de Jacareí, estabelecendo-se entre os índios.

Sabe-se ainda que a organização urbana no plano teórico e prático da aldeia, é obra atribuída ao padre jesuíta Manoel de Leão, cuja principal ocupação era a de ser administrador, estando em São Paulo desde o ano de 1663, encontrava-se à frente das fazendas mais remotas. Entre estas, figurava-se o aldeamento em solo joseense.

Em 1692 essa aldeia aparece com o nome de “Residência do Paraíba do Sul” e em 1696 como “Residência de São José”. A 8 de janeiro de 1747, segundo Alfredo Moreira Pinto, foi feito o primeiro lançamento de batizados, assinado pelo Padre Francisco de Paula.

Com o início do ciclo da mineração, o aldeamento passa por sérias dificuldades devido a saída de braços para o trabalho nas minas. Nota-se, ainda, por parte dos padres um certo abandono em relação ao destino da aldeia.

Após a expulsão dos jesuítas do Brasil em 1759, todos os bens dessa ordem religiosa, tais como fazendas, colégio e aldeias passaram para a custódia da Coroa. Esta determinou ao Governador Geral, D. Luis Antonio de Souza Botelho Mourão, o Morgado de Mateus, que tornasse essas novas propriedades produtivas.

O Governador Geral pediu e obteve do Vice-Rei autorização para criar Freguesias e Vilas, de modo que a 27 de julho de 1767 foi formalizada a ereção da Aldeia em Vila de São José do Paraíba. Foi um fato atípico à época, posto que que a Vila ainda não houvera sido Freguesia.

A Evolução de Vila à Cidade

A emancipação à categoria de Vila não foi um fator determinante para o seu progresso, que por muitos anos manteve as mesmas características de uma pequena vila com predominância do setor rural. A principal dificuldade de São José era o fato de a Estrada Real, que ligava as Capitanias de São Paulo e Rio de Janeiro, passar fora de seus domínios. Somente cerca de um século mais tarde, em 22 e abril de 1864, foi elevada à categoria de Cidade. Em 04 de abril de 1871 recebeu a atual denominação de São José dos Campos, adotado em virtude da imensa extensão de campinas aqui existentes, seguida pela criação da Comarca em 1872.

O Ciclo do Algodão: O algodão teve uma rápida evolução na região, atingindo seu apogeu no biênio 1867/1869, como a maior produção da Província, quando chegou até a concorrer com a produção cafeeira, declinando sensivelmente até o final do século. São José foi o município da região ocidental do Vale que mais se destacou na cultura do algodão, que visava, principalmente, o abastecimento das indústrias inglesas de tecidos.

O censo de 1872 registrou que o município possuía uma população de 12.998 habitantes, sendo que destes 1.245 eram escravos. O progresso da cidade recebeu novo alento quando da chegada da estrada de ferro, cortando o centro urbano.

O Ciclo do Café: Quase simultaneamente, há o desenvolvimento da cultura cafeeira no Vale do Paraíba, que começou a ter alguma expressão a partir de 1830, sendo que São José do Paraíba já contribuía para a produção regional. Em 1854 constatou-se que o incremento da produção joseense seria um dos maiores da região, conseguindo repercussão nacional. No entanto, foi no ano de 1886, quando já contava com o apoio da Estrada de Ferro inaugurada oficialmente em 18 e janeiro de 1877 (já estava pronta desde 1876), que a produção cafeeira joseense teve seu auge, mesmo num momento em que já acontecia a decadência dessa cultura na região, conseguindo ainda algum destaque até por volta de 1930.

No censo de 1920 os bovinos da região alcançavam um total de 10.966 cabeças, indo atingir no Censo de 1940 o total de 28.549, época em que o ciclo da pecuária se sobrepõe ás culturas do café e do algodão.

Em 23 de maio de 1932, na Praça da República, em São Paulo, é vitimado o estudante Euclides Miragaia, joseense, nascido em 20/11/1910. Em virtude desse trágico acontecimento eclodiu a Revolução Constitucionalista.

Fase Sanatorial: A procura do município de São José dos Campos para o tratamento de tuberculose pulmonar, teria se tornado perceptível no início deste século, devido às condições climáticas supostamente favoráveis. Entretanto, somente em 1935, quando o município foi transformado em Estância Hidromineral, que São José passou a receber recursos oficiais que puderam ser aplicados na área sanatorial. Com o advento dos antibióticos nos anos 40, a tuberculose começou a receber tratamento ambulatorial, caracterizando assim o fim da função sanatorial até então exercida. Essa fase ainda persistiu até fins da década de 50, quando definitivamente cedeu lugar à industrialização, num momento onde era crescente a vinda de novos estabelecimentos industriais para a cidade.

A Industrialização: O processo de industrialização do município, tomou impulso a partir da instalação do Centro Técnico de Aeronáutica – CTA, em 1950. No segundo semestre desse ano foi transferido para a cidade o Instituto Tecnológico da Aeronáutica, criado em 1947 no Rio de Janeiro, cujos alunos eram bolsistas do Ministério da Aeronáutica. Já em 19 de janeiro de 1951, acelerando o desenvolvimento industrial, foi inaugurada a BR-116 – Rodovia Presidente Dutra, possibilitando assim uma ligação mais rápida entre Rio de Janeiro e São Paulo e cortando a parte urbana da cidade. A conjunção desses fatores permitiu que o município caminhasse para o potencial científico-tecnológico em que atualmente se encontra.

Pequena história da telecomunicação

( Publicado originalmente no e-zine CTRL-C nº 01, de novembro/99 )

Telecomunicação significa, basicamente, comunicação à distância. Desde o século XIX já eram conhecidas as leis da eletricidade e do eletromagnetismo, e, com o auxílio de algumas figuras como Samuel Morse (telégrafo, em 1840), Alexander Graham Bell (telefone, em 1876) e Heinrich Hertz (ondas eletromagnéticas, em 1890), teve início a era das telecomunicações. Modernamente podemos dizer que telecomunicação significa a transmissão telefônica de informações, seja de voz ou de sinais eletrônicos.

Telégrafo

O primeiro aparelho moderno de telecomunicação foi o telégrafo, inventado por Samuel Morse em 1837 e patenteado em 1840. O telégrafo Morse consistia de um transmissor, cabo e um receptor. O transmissor era formado por uma pilha e uma alavanca que, quando pressionada, fechava o circuito e permitia a passagem da corrente pelo cabo até o receptor. Este continha um eletroimã que, ao receber a corrente, atraía uma roda embebida em tinta, colocando-a em contato com um rolo de papel e marcando, assim, pontos e traços conforme a duração dos impulsos elétricos.

Esses pontos e traços eram a base de um código binário que, combinados de diferentes maneiras, conseguiam representar todas as letras e sinais do alfabeto, tendo sido rapidamente aceito em todo o mundo – foi o surgimento do “Código Morse”. Mas a velocidade sempre foi um problema a se enfrentar: os primeiros telegramas eram enviados a duas mil palavras por hora, com o advento do chamado “Multiplicador Baudet” chegariam a sete mil, alcançando seu ápice em torno de 20 mil palavras por hora. Ora, isto dá cerca de 20 caracteres por segundo, o que não chega aos pés da média atual, de cerca de 33,6 mil caracteres por segundo…

Para se ter uma idéia da aceitação e rápida expansão do telégrafo, em 1866 já funcionava um cabo transatlântico unindo telegraficamente a Europa e a América. Em 1878, uma mensagem enviada pela Rainha Vitória ao presidente dos Estados Unidos, James Buchanan, levou “apenas” 17 horas e 40 minutos para chegar de uma ponta a outra do cabo.

Radiofonia

A invenção da comunicação sem fio, ou radiofonia, foi patenteada pelo italiano Guglielmo Marconi em 1895. A título de curiosidade, cabe lembrar que no Brasil o padre Roberto Landell de Moura, em 1893, na cidade de São Paulo, já havia feito alguns experimentos bem-sucedidos na mesma área.

Entretanto o grande arauto da invenção do italiano foi, na verdade, uma das maiores tragédias da época moderna: o naufrágio do Titanic. Após o impacto com o iceberg, o transatlântico transmitiu o primeiro sinal de S.O.S. da história, minutos antes da meia-noite de 14 de abril de 1912. A mensagem foi captada em dois locais: pelo transatlântico Carpathia, a quatro horas da posição do naufrágio, e pelo jovem imigrante russo David Sarnoff, no estúdio de Marconi, situado na Times Square, em Manhattan.

Como era o único a receber as mensagens do Carpathia sobre os trabalhos de busca e resgate dos sobreviventes, o discípulo de Marconi, com agudíssimo senso de oportunidade, repassou as notícias de primeira mão a um pequeno tablóide cujos escritórios estavam instalados no edifício ao lado. A partir daí este modesto tablóide teve condições de se transformar em um dos maiores jornais do mundo: The New York Times.

Invenção do telefone

A primeira conotação de que se tem conhecimento para a propagação do som através dos corpos sólidos data de 1667 e é atribuída ao físico inglês Robert Hooke (1635 – 1703). Constava de uma demonstração utilizada pelos pesquisadores de física onde as ondas sonoras percorrem um fio ou cordel esticado entre dois diafragmas. Tratava-se simplesmente do “telefone de cordel” ou, como conhecemos em nossas brincadeiras de infância, o “telefone de latinha” – duvido que as crianças supermodernizadas de hoje tenham idéia do que venha a ser isso ou até mesmo qual a graça nessa brincadeira. Particularmente, eu gostava…

Aliás, a própria palavra “telefone” provavelmente foi utilizada pela primeira vez em 1682, quando Dom Gauthey, um jovem monge, propôs à Academia de Ciências de Paris a instalação de um sistema de propagação da voz por tubos metálicos acústicos.

Apesar de já serem conhecidos os princípios e elementos básicos do funcionamento do telefone, somente em 1876 é que foi efetivamente “inventado” o telefone. Alexander Graham Bell e Thomas Watson trabalharam juntos nessa invenção, sendo que foi por meio de uma obra do acaso – um pequeno acidente ocorrido durante uma de suas inúmeras experiências – que se vislumbrou a possibilidade de desenvolvimento do primeiro aparelho telefônico. Ao soltar a lâmina do diapasão que se colou devido a um curto-circuito, Watson fê-la vibrar com intensidade e o som foi transmitido para o outro aparelho. A partir do estudo desse evento ambos puderam desenvolver o projeto final do telefone.

Em 07 de março de 1876, em Boston, foi deferida a patente do telefone para Alexander Graham Bell, sob o nº 174.465. A história conta que em 10 de março daquele ano é que foi efetivamente dado utilidade a esse aparelho recém-criado, com a transmissão das seguintes palavras: “Mr. Watson, come here. I need you!”. Diz a lenda que Graham Bell, ao limpar uma bateria, havia acidentalmente derramado um pouco de ácido na própria roupa…

Nos dias de hoje o transmissor de um telefone é constituído de um microfone que converte as ondas sonoras, correspondentes à voz humana, em impulsos elétricos. Estes viajam por um cabo telefônico até o receptor, que contém um disco metálico capaz de vibrar ao receber os impulsos elétricos, reproduzindo as ondas sonoras originais. Um telefone contém, além disso, circuitos eletrônicos que convertem o número marcado nos impulsos elétricos correspondentes e que amplificam os sinais elétricos antes de chegarem ao receptor.

Voltando a nossa linha histórica, após obtida a patente, os cientistas correram contra o tempo para completar o desenvolvimento do telefone, para que pudessem participar da Exposição do Centenário que iria realizar-se na Filadélfia e que fazia parte das comemorações dos 100 anos da independência dos Estados Unidos. Como não havia mais tempo para instalar o telefone na seção de eletricidade, ficaram num canto humilde no pequeno pavilhão de amostra educacional do Estado de Massachusetts.

A exposição foi aberta com grandes solenidades no dia 04 de junho de 1876, a um mês da data do centenário, e contou com a presença de grandes personalidades, dentre elas, o Imperador do Brasil – D. Pedro II, que era um aficcionado em inovações tecnológicas. Em 25 de junho o Imperador retornou à exposição, desta vez como membro honorário da comissão científica que julgaria os eventos.

Ao final do dia o Imperador encontra-se com Graham Bell, o qual já conhecia de um encontro 15 dias antes, em Boston, e participa de uma demonstração do aparelho. O inventor começa, então, a declamar Shakespeare (“to be or not to be…”) de um transmissor instalado a 150 metros dali, ante o que o Imperador não se contém e exclama: “My God, it speaks!”.

A presença de D. Pedro II conferiu novo sentido e a força que faltava para a produção do invento, pois foi a partir daí que o telefone de Graham Bell ganhou o respeito dos cientistas e fama nos jornais. O invento do então obscuro cientista tornou-se alvo do interesse tanto da imprensa quanto do governo – um experimento que até então não havia sido levado a sério: o telégrafo que falava, vulgo telefone.

A evolução do telefone no Brasil

O primeiro telefone instalado no Brasil foi um presente de Graham Bell ao imperador e começou a funcionar em janeiro de 1877 no Palácio de São Cristóvão (hoje Museu Nacional), na Quinta da Boa Vista, com uma linha que o ligava até o centro da cidade.

Em 15 de novembro de 1879 foi outorgada no Brasil a primeira concessão para exploração de serviços telefônicos a uma empresa que representava os interesses da “Bell Telephone Company” (que foi, nos Estados Unidos, a primeira das empresas com esse nome).

A L. M. Ericsson, fundada em 1876 pelo sueco Lars Magnus Ericsson, criou no ano de 1892 o primeiro aparelho telefônico em que transmissor e receptor (bocal e auricular) estão acoplados numa única peça (conhecidos como “pés-de-ferro”).

Naquele mesmo ano Almon Brown Strowger, empresário funerário criou o embrião da primeira central telefônica automática, que comportava até 56 linhas telefônicas. Seus motivos não foram tão nobres como pode-se pensar, pois sua intenção era livrar-se dos serviços de uma telefonista de La Porte, Indiana, que sempre cometia o mesmo “equívoco”: ao invés de completar uma ligação de qualquer possível cliente, sempre transferia para uma outra funerária, que coincidentemente pertencia ao seu marido…

Entretanto só no começo do século é que realmente surgiram, nas principais cidades norte-americanas, as centrais automáticas. Em 1913 Paris contava com 93 mil telefones manuais, sendo que Nova Iorque já dispunha de mais de 500 mil telefones. A automatização total só veio a ocorrer a partir de 1919.

A primeira central automática no Brasil foi inaugurada em 1922, na cidade de Porto Alegre; a segunda em 1925, no Rio Grande do Sul e a terceira, finalmente, em 1928, na cidade de São Paulo. No fim de 1929 a Companhia Telefônica Brasileira – CTB – já tinha mais de cem mil telefones instalados, sendo mais de 50% só no estado de São Paulo.

Com a recessão econômica mundial dos anos 30 e o advento da Segunda Guerra Mundial, cessaram as importações de equipamento para o Brasil. O serviço telefônico no Brasil deteriorou-se, visto que seu desenvolvimento não acompanhou o ritmo de crescimento das cidades aliado à multiplicação da população. Ademais, caiu a rentabilidade das concessionárias de serviços telefônicos, visto que as tarifas eram reajustadas por decisão meramente política. Cada vez mais aumentava a demanda e retraía-se a oferta de terminais.

Em 1962 a situação começou a melhorar com a promulgação da Lei 4.117, de 27/08/62, que regulamentou o Código Brasileiro de Telecomunicações. Com a vigência do mesmo, criou-se o CONTEL – Conselho Nacional de Telecomunicações, cuja secretaria executiva era o DENTEL – Departamento Nacional de Telecomunicações, que tinha, dentre outras responsabilidades, a de supervisionar as concessões e propor as tarifas.

Das ações da DENTEL surgiu, em 1965, a EMBRATEL – Empresa Brasileira de Telecomunicações, a qual caberia a responsabilidade das telecomunicações interestaduais e internacionais.

Por outro lado a CTB não possuía mais recursos para executar a manutenção da rede de cabos e muito menos para a expansão, o que acabou por gerar sobrecarga nas centrais de comutação telefônica (consequentemente a demora na obtenção do tom de discar e as dificuldades de completar as ligações). Assim, em 1966, o governo brasileiro negociou com a Canadense Brasilian Traction a compra da CTB e de suas empresas associadas (Companhia Telefônica de Minas Gerais e Companhia Telefônica do Espírito Santo).

Com nova administração e um novo estatuto, a CTB e suas associadas ganharam, também, um novo fôlego, podendo expandir e modernizar os serviços nas áreas em que operava (basicamente a região Sudeste do país).

Através da Constituição de 1967 foi criado o Ministério das Comunicações e a concessão dos serviços telefônicos passou para a União. Em 09/11/72 foi criada a TELEBRÁS – Telecomunicações Brasileiras S.A. e em 12/04/73, a TELESP – Telecomunicações de São Paulo S.A. Desta feita o Ministério reestruturou a CTB, transferindo à TELESP a responsabilidade pelo atendimento do estado de São Paulo.

Desde então o atendimento telefônico no país ficou dividido, de norte a sul, por diversas empresas, tais como TELESP, TELEMIG, TELEPAR, TELENORTE, etc. Recentemente, com a privatização e o caos a que fomos expostos (você realmente conseguiu fazer um interurbano no primeiro dia?), o cenário nacional foi mais uma vez alterado. Por enquanto as prestadoras estão no mesmo patamar de preços e serviços, até porque, na minha opinião, deve ser feito primeiramente um trabalho de base, reconstruindo a rede instalada para daí então estarem preparadas para fornecer um serviço diferenciado.

Enquanto esse dia não chega, a única diferença fica por conta do maciço marketing a que estamos expostos. Particularmente, aqui no Estado de São Paulo, apesar do 15 da Luana Piovani e do 23 da Letícia Spiller, fico mesmo é com o 21 da Ana Paula Arósio… >:P

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