Meu Natal

Sei que a música em si não está completa – fica mais no instrumental…

Mas – vamos combinar? – são quarenta e dois anos de história. E de estória. Quatro. Ponto. Dois. Então eu creio que posso me dar ao luxo de passar por cima dos detalhes.

Aliás, já passei por tanta coisa que poderia escrever um ou mais livros. E, sei lá, quem sabe um dia eu ainda os escreva…

Há quarenta e dois anos perambulo por este nosso mundinho chamado Planeta Terra. Conheço-o menos do que gostaria, mas creio que entendo-o até mesmo mais do que deveria.

Mas o ponto é que todas minhas andanças, amigos, paixões, aventuras, desventuras, responsabilidades, doideiras, tristezas, alegrias, euforias, enfim, tudo pelo que já passei me direcionou e me trouxe para aqui e para agora.

E posso garantir-lhes.

Do fundo de meu coração.

Ainda que tenha tanta coisa para resolver na minha vida.

É este o momento e é este o lugar em que eu queria estar.

Simples assim.

E caso alguém não concorde com este meu posicionamento tão objetivamente óbvio…

…bem, sempre temos a música para dar a mensagem!

Aniversariando

Aniversário é uma coisa bem estranha…

Principalmente se é o próprio!

Jamais sei como vou encarar a data – a não ser quando efetivamente chega. Minhas expectativas são mais relacionadas ao humor que estarei ostentando no dia de meu aniversário que com o “efeito” da data propriamente dito.

Explico.

Nunca encanei com esse negócio de idade. Sou bem resolvido quanto a isso. Crise dos trinta, crise dos quarenta, crise da crise, sei lá! Nada disso jamais me incomodou. Confesso que a única vez na vida – que eu me lembre – que a idade foi um fator determinante foi quando eu estava às vésperas de fazer dezoito anos, afinal eu queria porque queria tirar minha habilitação, né? 😀

Mas, ressalvado esse ponto, não me recordo de já ter ficado em alguma neuras com relação à idade. Hoje chego nos meus quatro-ponto-dois (DOIS e não TRÊS, certo Andréa?) e continuo sendo o mesmo taurino (com ascendência em leão) turrão de sempre… Tenho tido uma boa vida – nada demais e nada de menos – permeada de amores e paixões, com bons trabalhos (simplesmente amo o que hoje faço), filhos maravilhosos e sempre cercado de amigos inesquecíveis, independentemente da idade – até porque eu realmente já tenho milhagem suficiente para ser pai de alguns…

Hoje tenho plena consciência de que há um moleque travesso, um nerd dedicado e um velho rabugento que pacificamente coabitam dentro de mim.

Ou seja, estou em paz comigo mesmo…

E numa data tão querida e especial como essa, foi exatamente de uma pessoa muito querida que ganhei um presente muito especial!

Só pra contextualizar, para aqueles que não sabem fui, sou e sempre serei um apaixonado por gibis. Já falei disso aqui (confiram e poderão conhecer um pouquinho das publicações brasileiras das últimas quatro décadas). Em particular, eis uma palhinha:

Uma das minhas lembranças mais antigas no que diz respeito a quadrinhos me remete diretamente à Turma da Mônica, pois costumávamos ir até a casa de meu bisavô e lá havia uma espécie de hall onde sempre haviam alguns jornais da semana. Assim, em pleno início da década de 70, eu já chegava fuçando tudo e procurando pela Folhinha (era esse mesmo o nome?) para poder ver aqueles desenhos que me agradavam tanto. Sim, ver, pois eu sequer era alfabetizado…

Pois bem. E não é que este velho alfarrabista que vos tecla acabou sendo presenteado com uma edição da “Folhinha de S. Paulo” (sim, era esse o nome) dessa época?

Vejam só:

Algumas curiosidades sobre essa edição, em especial:

– ela é do ano de 1969 (grande ano para a humanidade – foi quando nasci!);

– ela fala de Natal (que, lembrem-se, nada mais é que “nascimento”);

– é de uma época em que o Maurício desenhava absolutamente tudo, desde os quadrinhos, até os jogos e mesmo a logomarca desse suplemento!

Mas, melhor ainda, caso não tenham percebido, vejam bem o que tem nesse jornal em especial (isolei do resto da imagem para ficar mais legível):

O próprio Maurício de Sousa teve acesso àquele meu post sobre gibis e ficou sabendo há quanto tempo já acompanho as estórias da Mônica e sua turminha, de modo que o exemplar do jornal veio devidamente autografado!

Não é o máximo?

Aliás, o interessante é que ele gostou tanto da lembrança – simplesmente não acreditou que ainda existissem alguns exemplares do jornal – que queria ficar com essa edição. Desculpa aí, Maurício. Não foi dessa vez… 😉

Aliás do aliás, ainda que coincidências não existam, nesta semana em que acabou de ser lançado o filme Thor, adivinhem qual baixinha invocada quebrou o Mjolnir (martelo encantado do Deus do Trovão) no jogo dos sete erros dessa edição da Folhinha…

Enfim, gostei muito!

Mesmo!

Elpidio Reali Junior

Sei que não é num “bom momento”. Mas simplesmente venero a maneira como esse caboclo sabe trabalhar com as palavras…

A morte de um jornalista
MINO CARTA

Um amigo partiu desta vida, e dizer amigo sem adjetivos basta, são poucos os amigos cuja lealdade não admite dúvidas e cuja lembrança é para sempre. Elpidio Reali Jr., que nunca chamei Elpidio, era o Reali e ponto final, pertencia e pertence a esta categoria. Faz pouco tempo saiu o livro das suas memórias, Às Margens do Sena, longo depoimento recolhido por meu filho, Gianni, e prefaciado pelo acima assinado. E ali eu dizia que quando nos encontrávamos, frequentemente nas cercanias de uma garrafa de bom vinho, podíamos conversar horas a fio sem tropeçar em um único, escasso ponto de discordância. Conhecíamos um ao outro passo a passo no espaço alastrado entre o coração e a alma.

Sim, verdade factual é que já tivemos opiniões diferentes no confronto entre vinhos franceses e italianos, mas também a respeito desta questão crucial acabamos por convergir para uma posição comum. A amizade tinha raízes. Meu pai, Giannino, conhecera em 1947 o pai do Reali, o primeiro Elpidio, então diretor da Interpol, policial culto e competente. Ambos estavam em ação por causa do rapto presumido de um filho de Francisco Matarazzo II, cada qual ao sabor de suas funções, o policial e o jornalista.

Descobriu-se finalmente que o plano do sequestro era da lavra do sequestrado, Eduardo, e contava com a desastrada colaboração de dois empregados italianos das IRFM, Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, os engenheiros Malavasi e Comelli dispostos a arcar com o papel de sequestradores. Resgate entregue, tramoia revelada logo após. Eduardo, o filho que pretendia extorquir dinheiro do pai Chiquinho, safou-se incólume, embora cuidasse de levar vida apartada. Os italianos, em compensação, passaram uma esticada temporada na cadeia. O policial e o jornalista lamentaram o desfecho e ficaram amigos.

Quanto a mim, dei com o Reali pela primeira vez no vídeo. Eu acabava de regressar da Itália, onde havia exercido a profissão por três anos e meio, primeira metade de 1960, e o Reali era repórter de campo em jogos de futebol televisados, o repórter Canarinho da Record como o apelidara Silvio Luiz. Acabamos por nos conhecer em Paris, na década de 70, onde ele voluntariamente se exilara com a mulher, sua eterna companheira Amelinha, e filhas, depois de receber o Prêmio Governador do Estado de São Paulo como melhor radialista esportivo. Na hora da entrega, dedicou-o aos colegas presos pelo terror de Estado, infelizmente impossibilitados de concorrer.

Há o indivíduo, o cidadão, o profissional. Entre eles, os elos indissolúveis da coe-rência no respeito dos princípios e dos valores. Leio nos obituários que Reali foi um grande jornalista. Eu diria que, sobretudo, foi raro, jornalistas que honram a profissão há poucos. Pouquíssimos. A maioria vive no terror de perder o emprego, quando não se trata de um daqueles que se aboletaram em posições de comando na qualidade de sabujos do patrão. Pergunto-me se têm consciência da adulação desbragada a que se entregaram, se ao se olharem no espelho percebem o lacaio, ou se são sinceros na submissão porque a carregam no sangue ou se compartilham em harmonia integral das ideias de quem lhes paga o salário e lutam bravamente a favor dos interesses do próprio.

Por exemplo. O que vai pelas entranhas da revista Época, que há duas semanas dedicou uma reportagem de capa ao relatório da PF sobre o famigerado valerioduto para divulgar uma versão manipulada, esconder a personagem principal do enredo, o banqueiro Daniel Dantas, e esquecer a Globo, também envolvida no episódio? Sei tão somente que a mídia nativa reservou estrondoso silêncio ao texto autêntico publicado por CartaCapital, em seus trechos principais na semanal e integralmente pela internet. Não é surpresa, está claro, que Época não peça desculpas aos seus leitores, ou que a mídia nativa não repercuta a verdade factual, a soletrar o que até hoje impávida sustenta, ou seja, a existência do mensalão que o relatório nega. Contra esta caterva de escribas e oradores a soldo do privilégio não há verdade factual que resista.

A diferença, no caso de Reali, e a raridade estão no fato de que ele serviu antes de mais nada à sua consciência. E eu aqui estou, saudoso, e de súbito me ocorre a imagem do jovem loiro a correr à margem de um gramado com os cachos ao vento.

Respira pela barriga, o longa metragem que deu origem à série

Este post foi originalmente ao ar em 02/06/2005, no finado blog Respira pela Barriga – “Reflexões, aventuras e desventuras de alguém que come com os olhos, fala pelos cotovelos, pensa com o coração e tenta, honestamente, respirar pela barriga”.

Por que “respira pela barriga”?

Porque um dia disseram que a minha vida mudaria e eu seria muito mais

– feliz

– calma

– paciente

– pacata

– cordata

– produtiva

– tranqüila

– equilibrada do ponto de vista energético

– alinhada do ponto de vista dos chacras

– resolvida se aprendesse a respirar pela barriga em momentos cruciais da minha vida.

No começo, ri. Logo eu, a pragmática das pragmáticas, a prática das práticas, a que se arrepia só de ouvir falar em horóscopo, falando em chacras, em equilíbrio energético, respirando pela barriga? Ora, pelamordedeus! Daqui a pouco, vão me pedir para comprar um duende e conversar com ele!

Aí, me pediram para parar só um pouquinho e reparar em como a minha respiração acontecia exclusivamente no peito – é lógico, pensei. É aí que ficam os meus pulmões! – e às vezes até no pescoço. Comecei a perceber que quando ficava tensa, o que é, no mínimo, freqüente para alguém que faz dez coisas ao mesmo tempo, minha respiração “subia” mesmo.

Me ensinaram a deitar, colocar a mão no umbigo e respirar, profundamente, até sentir a barriga ficar inflada de ar. Em seguida, pra dar certo, soltar o ar totalmente e fazer tudo de novo. Com calma, sem pressa (coisa rara na minha rotina), uma meia dúzia de vezes pelo menos. Fiz uma vez e achei bom.

Me disseram que com um mínimo de prática, eu conseguiria fazer isso sem deitar e sem precisar colocar a mão no umbigo. Ótimo, pensei. Imagina eu, voando, estressada, no meio do trânsito, atrasada para uma reunião, falando no celular, trocando o CD da Macy Gray pelo do Castelo Rá Tim Bum, tentando convencer a minha filha de dez anos de que “não, essa blusa não marca a barriga” e o meu filho de três que “com certeza nós veríamos um caminhão-caçamba, ou um caminhão-baú, ou um caminhão-tanque, ou uma betoneira, ou uma motoniveladora até chegarmos ao nosso destino”, tendo que parar o carro, deitar no asfalto, botar a mão no umbigo e respirar pela barriga?

Sugeriram que eu colocasse bilhetinhos para mim mesma em lugares estratégicos como o monitor do computador, o painel do carro, o espelho do banheiro, me lembrando de respirar. Soube até que há cursos que ensinam a gente a respirar…

Comecei a respirar pela barriga sempre que me lembrava e, impressionantemente, acalma mesmo. Ainda não fiquei mais calma, feliz, paciente, tranqüila, equilibrada, pacata, produtiva, alinhada, cordata ou resolvida. Mas juro que tenho tentado, honestamente, respirar cada vez mais pela barriga.

Assim, sem querer parecer zen, ou mística, ou outros babados do gênero, sempre que der vontade de

– quebrar o CD de Sons da Amazônia ou o dos Monges Beneditinos contra o painel do carro;

– esquartejar o motorista do ônibus da frente;

– afogar o filho caçula no Tietê;

– matar a empregada (ou o chefe, ou o estagiário, ou o ex-marido, ou a sogra) no beliscão;

– abrir a machadadas a cabeça do homem super zen que a gente gosta para fazê-lo entender que, sim, você é ansiosa, apressada, vertiginosa, enlouquecida mas o ama, de todo o coração, não se esqueça: RESPIRA PELA BARRIGA que a vida há de melhorar.

Nota: Post (re)publicado com o consentimento (até agora) da autora…

Tédio criativo

Diretamente das catacumbas de meu computador, eis resgastado um antigo post – lá dos idos de 2006 – do finado blog Respira pela Barriga. Tudo a ver…

Quando inventou o chuchu, Deus devia estar muito sem inspiração. Mesmo. Provavelmente, foi num dia em que acordou com o pé esquerdo, pisou no penico, xingou o Filho, brigou com o Espírito Santo, teve crise de identidade, arrumou encrenca com os apóstolos e, mesmo assim – ah, as obrigações… – teve que trabalhar.

A gente sabe que quando não está a fim de trabalhar, trabalha do mesmo jeito, mas que os resultados são qualquer nota. Por que é que com Deus seria diferente? Em um dia assim, ele fez o chuchu.

O chuchu é a prova definitiva da existência palpável do nada. É um não-alimento incorporável tanto a doces, quanto a salgados, que agrega um sabor de absolutamente nada ao que quer que acompanhe. Que outro elemento dos reinos animal, vegetal ou mineral pode ser colocado junto com carne, ovo, camarão, peixe, carne de porco, suflê, doce de abóbora ou de marrom glacê e não fazer, absolutamente, nenhuma diferença?

Chuchu é o sonho de consumo de todo restaurante por quilo, porque pesa que é uma desgraça e pode ser enfiado em virtualmente todos os pratos do buffet para aumentar a conta do cliente, ao mesmo tempo em que alivia bolso do empresário. Quem conhece, mesmo que remotamente, a dinâmica perversa de um restaurante por quilo, sabe que nada melhor que um ou dois quilos de chuchu para elevar à enésima a rentabilidade de um strogonoff, de uma peixada, de um pavê…

Êta coisa mais sem graça! O chuchu algo que, por princípio, não deveria existir. Meu pai, por exemplo, se gaba de fazer um excelente camarão com chuchu que, por sinal, eu até já provei. De fato, é saboroso mas ficaria ainda melhor sem o chuchu. Por quê? Porque haveria mais camarão por centímetro quadrado de prato, oras! Simples assim.

O chuchu está para os vegetais, como o escargot está para os animais. Misture qualquer coisa com chuchu (ou com escargot), que você terá 100% do gosto da coisa. Até porque, chuchu não tem gosto!

Em suma, eu detesto chuchu. Não que não aprecie o sabor – isso seria uma impossibilidade física. O que não suporto é a sensação de estar enchendo a barriga de limbo. E como se tanto “nada” não fosse o bastante, o maldito ainda é infernalmente chato de descascar! Ninguém merece…