Desde pequeno eu sempre achei estranho aqueles países do Oriente Médio que estavam em guerra. Puxa, eram bombas caindo de um lado para outro, soldados se matando, explosões de terroristas, e a população continuava lá, firme, no seu dia-a-dia, como se nada houvesse. Sempre achei que numa situação dessas o bom senso (no mínimo) falaria mais alto e faria com que todo mundo deixasse essa zona de conflito. “Querem brigar? Que briguem! Mas me incluam fora dessa!”
Mas, antes de entrar no ponto ao qual pretendo chegar, para contextualizar um pouco a coisa, alguns esclarecimentos são necessários. Minha adolescência foi muito profícua em diversos sentidos. Apesar de ser de uma família da chamada classe média (achatada), meu pai mecânico e minha mãe costureira, tive amigos e colegas em todas as camadas sociais da cidade onde cresci. E quando eu digo todas, quero dizer TODAS mesmo. Tanto estive presente em alguns eventos da mais fina nata da sociedade, quanto participei do sofrido cotidiano da favela, vindo a conhecer bem de perto muitos de seus aspectos.
Com isso só quero deixar claro que (segundo penso) consigo ter um ponto de vista um pouco mais abrangente – e menos parcial – de algumas das situações pelas quais passamos recentemente.
Há bem pouco tempo o Estado de São Paulo teve o que chamei de “segunda-feira cinzenta”, na qual o PCC fez uma demonstração do poder velado que possui. Lembro-me bem do clima de terror incutido nas pessoas. Ainda que não tivesse ocorrido nada assim tão grave nas proximidades do Município onde trabalho, o medo era palpável – um denso véu de temor baixou sobre a vista de todos, fazendo com que agissem como multiplicadores desse medo.
Apesar das vítimas em outros lugares, localmente nada de tão grave aconteceu que pudesse justificar tal atitude.
Então, semana passada, tivemos uma repetição do ocorrido. Muitas pessoas sequer tomaram conhecimento de que alguma coisa estava acontecendo! E olha que a coisa foi bem mais séria que antes… O número de ônibus incendiados praticamente triplicou (deixando de lado aqueles que foram em decorrência de “aproveitadores” da ocasião), as ameaças foram mais sérias e, inclusive, cumpridas. Houveram rebeliões de presos, um ônibus foi totalmente queimado a poucos quilômetros de minha casa, e – pasmem – uma bomba foi colocada na porta do Fórum, a aproximadamente uns cem metros de meu local de trabalho. Polícia, bombeiros, esquadrão anti-bombas, e o escambau. Foi enterrada, detonada, e seus escombros levados para longe.
E nós, população? Parecia que não era conosco. Continuamos nossos afazeres, trabalhamos tranquilamente, almoçamos no “por quilo”, como se tudo fosse mais uma daquelas notícias do Oriente Médio, tão distante de nossa realidade.
Assim, acho que hoje consigo entender um pouco melhor aquelas crianças do outro lado do mundo que já crescem com um fuzil de verdade nas mãos, enquanto suas mães vão calmamente ao mercado. É o costume. A certeza da fatalidade. Que o mundo é mesmo dessa maneira e temos que nos acostumar com isso.
Infelizmente, no nosso caso, existe, sim, uma guerra e estamos bem no meio da batalha. Não posso dizer que se trata necessariamente dos mocinhos contra os bandidos, pois existem representantes dessas facções em ambos os lados. O que aconteceu é que um desses lados mostrou que consegue se organizar de maneira mais rápida e ordenada que sua contraparte poderia. Ou gostaria.
Livre das influências políticas e das necessidades de acordos realmente deve ter sido de uma absurda facilidade orquestrar os últimos eventos.
Pois é, pessoal… Nunca senti a Faixa de Gaza tão real e próxima…