Trata-se de um artigo bastante elucidador escrito por Sérgio Rosa lá no Overmundo. Cheguei nesse artigo por intermédio de um outro artigo, escrito por Felipe Fonseca, lá no novíssimo Metapub (que, inclusive, já consta da lista aí do lado). Bão, segue o que interessa:
Qual o sentido da vida para um Pentium 233? Para onde vão os videocassetes que não funcionam direito? Como evitar a proliferação de mouses estragados dentro dos armários? Existe vida para os aparelhos eletrônicos após a superação tecnológica? A metareciclagem tem uma resposta para todas as suas dúvidas existenciais.
A solução espiritual frente à angústia causada pela crescente voracidade de consumo de aparelhos tecnológicos é o desapego. Doar, compartilhar, consertar e botar para funcionar é o caminho para a ascensão tecno-espiritual. Como o Dalai Lama disse uma vez: “A revolução tecnológica é positiva. Um dos principais objetivos do budismo é a iluminação. E iluminação significa saber mais. Se a tecnologia facilita o acesso à informação e a comunicação entre as pessoas, ótimo.”
Vez ou outra surgem essas idéias “do bem”, que crescem escondidas e à parte da atenção das pessoas. Ninguém sabe direito como nascem, qual a sua origem, para onde vão ou quem está por trás delas. Isso não é muito importante. A metareciclagem é uma dessas idéias. Quando comecei a me interessar e pesquisar sobre o tema, percebi que já havia várias idéias e projetos surgindo em diversos cantos do país que buscam se apropriar de tecnologias para mudanças sociais.
Você vai encontrar por aí iniciativas distintas que se afirmam como metarecicleiros. Esse é um campo no qual é muito mais necessário realizar do que teorizar. A idéia extrapola o simples reaproveitamento de computadores velhos. O necessário é dar um fim social a toda tecnologia “estacionada” que você possui em sua casa. Compreender que outras pessoas podem fazer algum uso daquilo. Uma boa forma de tentar descobrir o que pode estar rolando localmente na sua região sobre metareciclagem é acessar os arquivos da lista de discussão nacional sobre o assunto e procurar pelo nome do seu estado ou da sua cidade. Vale dar uma olhada e entrar em contato.
Fui atrás de algumas metareciclagens que estão ocorrendo ou sendo planejadas em Belo Horizonte. Descobri programa de rádio, espaço de reunião e produção cultural (e agora um Ponto de Cultura), um metacafé e uma lista para doação de equipamentos diversos. Alguns deles em fase embrionária, e outros já com monitores ligados.
Felipe Fonseca, um dos participantes e organizadores do principal site sobre o tema no país, fala que as dificuldades de colocar em prática os projetos são muitas: “de uma resistência à maneira aberta e livre que tentamos dar para a apropriação tecnológica, até uma visão míope que tenta entender a metareciclagem como mero projeto de reaproveitamento de computadores velhos (o que é uma visão muito limitada do que a gente tem a propor)”.
É natural que esse tema se misture ao de inclusão digital, embora não esteja necessariamente limitado por ele. Uma das principais razões dessa distinção é exatamente por onde começa a mobilização. Enquanto a inclusão digital está mais ligada a políticas governamentais, a metareciclagem já parte do sempre atual “faça você mesmo”. Das Zonas Autônomas Temporárias, às questões da inteligência coletiva, a metafísica das redes P2P-todos-para-todos: Hakim Bey lança para Pierre Lévy que toca e deixa Mcluhan de cara para o gol.
Adicione a esse debate também o movimento do software livre que parece ganhar força no país. A equação pode ser interessante. Computadores reutilizados + software livre + coletivos organizados e movimentos sociais = ?
Vamos encontrar a resposta só com o tempo. Se não a acharmos, poderemos concluir que a crítica de Fonseca faz sentido. Sem dúvida que vivemos um momento de expectativas em relação à capacidade de mudança (inclusão, transformação, revolução: escolha o seu termo predileto) social com a possibilidade apresentada pelas novas tecnologias. Inevitáveis futurologias e “apocalipssismos” surgem o tempo todo. O nosso papel agora é de sentarmos, começarmos a analisar mais friamente o momento que estamos vivendo: experiências como a Wikipédia (e os demais wikis), o Youtube e o próprio Overmundo. Cabe a nós descobrirmos se realmente vivemos uma fase mais “humana” da relação entre homens e máquinas (uma potencialização de comunhão e aproximação entre os indivíduos com auxílio da tecnologia), ou se tudo não passa mais uma vez de uma grande expectativa que depositamos sobre o tema.
E como falei em budismo acima, tem aquela música do Darma Lovers que cabe bem aqui: “nos chamam seres humanos, um tipo bem estranho de bicho. Heróis de circo mexicano, animais reprodutores de lixo, nos chamam seres humanos… Mas isso nem sempre somos”.