Piloto Automático – III

( Direto das catacumbas do Legal… )

Nestes últimos dias por mais de uma vez estive tentado a sentar frente ao computador e colocar em palavras os devaneios de minh’alma. Mas não o fiz. E, sinceramente, perdi aquele momento de inspiração. Eu pretendia falar sobre muitas coisas, desde a riqueza e maravilha do mero SILÊNCIO em um ambiente (certo, Paulo?), passando pelo último filme de Harry Potter (muito bom, como sempre), mais alguns detalhes das obras de marcenaria que me custaram um ombro são (ainda tá doendo), e, talvez, concluindo com a demagógica visita de representante do Tribunal de Justiça para inauguração das novas Varas de Família de São José dos Campos (que sequer estão em condições de atender ao público).

Mas ainda voltarei a falar com detalhes desses assuntos.

Para não passar em branco, eis uma mensagem que recebi na forma de arquivo de powerpoint, enviada por Eloy Franco, com um soberbo fundo musical de Dilermano Reis (Abismo de Rosas):

Em 1955 em Campina Grande, na Paraíba, um grupo de boêmios fazia serenata numa madrugada do mês de junho, quando chegou a polícia e apreendeu o violão.

Decepcionado, o grupo recorreu aos serviços do advogado Ronaldo Cunha Lima, então recentemente saído da Faculdade e que também apreciava uma boa seresta. Ele peticionou em Juízo, para que fosse liberado o violão.

Aquele pedido ficou conhecido como “Habeas Pinho” e enfeita as paredes de escritórios de muitos advogados e bares de praias no Nordeste.

Mais tarde, Ronaldo Cunha Lima foi eleito Deputado Estadual, Prefeito de Campina Grande, Senador da República, Governador do Estado e Deputado Federal.

Eis a famosa petição:

HABEAS PINHO

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara desta Comarca:

O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção
Não é faca, revólver nem pistola.
É simplesmente, doutor, um violão.

Um violão, doutor, que na verdade
Não matou nem feriu um cidadão.
Feriu, sim, a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.

O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade.
Ao crime ele nunca se mistura.
Inexiste entre eles afinidade.

O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam as mágoas e que povoam a vida
Sufocando suas próprias dores.

O violão é música e é canção,
É sentimento de vida e alegria,
É pureza e néctar que extasia,
É adorno espiritual do coração.

Seu viver, como o nosso, é transitório,
Porém seu destino se perpetua.
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.

Mande soltá-lo pelo Amor da noite
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas leves e sonoras.

Libere o violão, Dr. Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito.
É crime, porventura, o infeliz,
cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

Será crime, e afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
perambular na rua um desgraçado
derramando na rua as suas dôres?

É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento.
Juntando esta petição aos autos nós pedimos
e pedimos também DEFERIMENTO.

Ronaldo Cunha Lima, advogado.

O juiz Arthur Moura sem perder o ponto deu a sentença no mesmo tom:

Para que eu não carregue
Muito remorso no coração,
Determino que seja entregue,
Ao seu dono, o malfadado violão!

* Publicado originalmente em 13/DEZ/2005

Reuniões

Reuniões. Taí uma coisa que me dá arrepios. Principalmente se falarmos em administração pública – qualquer que seja a esfera: municipal, estadual ou federal.

Eu costumo dizer que reuniões se assemelham a ervas daninhas. Surgem espontaneamente do nada, a qualquer momento e, quando você menos espera, já está envolto numa delas.

Mas, pior que isso são aquelas do tipo “reunião-de-marcar-reunião”. Fala-se muito, discute-se pouco, conclui-se nada. Ou melhor, tem conclusão sim: a data da próxima reunião, quando o assunto será então retomado…

Como estou de férias, pensei que tinha – pelo menos por algum tempo – me livrado desse tipo de coisa. Ledo engano. Já no meu primeiro dia, na última sexta-feira, quando meus filhotes também entraram de férias, lá fui eu nas respectivas escolas de cada um para retirada de seus trabalhos, do boletim e – adivinhem? Sim. Reunião do bimestre…

Entretanto, foi uma grata surpresa. Cada uma das professoras, a seu modo, em poucos minutos organizou aquela montoeira desconexa de pais e mães perdidos por ali (muito mais mães que pais, diga-se de passagem), tendo entrado diretamente no assunto, ou seja, o que foi lecionado no decorrer do bimestre, o desempenho global da turma, e, ao entregar os trabalhos de cada aluno, foram fazendo rápidas observações e recomendações caso a caso.

Simples. Rápido. Eficaz.

Quando menos esperava já estava voltando para casa, com um quadro geral na cabeça sobre tudo o que tinha ocorrido no bimestre inteiro com cada um dos filhotes.

Pois é… Talvez nossos políticos, agentes públicos, chefias, gerentes e administradores em geral devam fazer um curso de especialização com as professorinhas do ensino infantil para que aprendam como deve ser uma reunião…

* Post Scriptum – Só para constar: o filhote nº 1 (oito anos) tem apresentado uma sociabilidade maior, inclusive ajudando os colegas e mantendo boas notas; o filhote nº 2 (cinco anos), apesar de obediente, é meio que expansivo demais, não captando o dever num primeiro momento (na minha época chamávamos isso de “bagunceiro”); e já o filhote nº 3 (três anos) teve uma boa integração com a turma e não sente mais a falta da mãe no começo das aulas.