Acontece que numa sessão de abertura de envelopes de uma licitação às vezes (aliás MUITAS vezes) tem algum caboclo chato, daqueles que só reclamam.
E, nesse dia, esse era o caso.
Estavam a presidente da comissão mais as duas outras integrantes já ficando com dor de cabeça por causa das reclamações do “distinto” representante de uma das empresas que participavam da licitação. Que, aliás, era o único presente além da própria comissão.
Passava e repassava pelos documentos apresentados por outras empresas, a cada vez falando uma coisa.
– Vocês têm que ver que esta empresa aqui apresentou uma cópia mal tirada, se não seria o caso de inabilitar, aliás, essa outra aqui apresentou um atestado bem antigo, e eu acho que nem seria mais válido, tem também essa outra que não fica na cidade e eu nem sei se o edital fala se daria pra contratar empresa de fora, deixa eu ver o edital… – ué, mas não está aqui – quero ver a pasta número um da licitação, então dá pra me mostrar ou será que teria algum motivo pra ela não estar aqui, senão essa licitação já estaria toda viciada e seria o caso de anular tudo, e quero inclusive fazer constar tudo isso em ata, viu, e preciso ler antes de imprimir, pra ver se não mudaram minhas palavras, será que posso ver a pasta, então?
Com a pequena deixa naquela torrente de resmungos e reclamações – que, diga-se de passagem, proferidas sob o manto do mais tenebroso mau humor já visto – meio que saindo do torpor, a presidente da comissão liga para uma outra sessão e pede para que tragam a malfadada pasta número um.
Enquanto isso, talvez mais até de si para si mesmo, permanecia o infeliz ali resmungando, folheando, repassando, enfim, procurando defeitos onde não existiam.
E eis que trazem a pasta.
Quem mesmo?
A estagiária novinha, é lógico.
– Licença?
Lá da porta do salão ela perguntou e já foi entrando. Todas as cabeças se viraram à sua chegada. Veio ela em direção à mesa trazendo a pasta debaixo do braço. Mignonzinha, com os cabelos metade soltos, metade presos no alto da cabeça, sempre sorrindo, com tudo no lugar certo, tudo bem durinho, empinadinho e apontando para o céu, usando um topzinho que deixava o umbiguinho bem torneado à mostra para quem quisesse ver. Percorreu o curto trajeto com seu alegre passinho peculiar – já há muito tempo caracterizado pelas “boas línguas” que a cercam: “ela não anda, saltita”.
O queixo do velho babão representante veio ao chão.
Enquanto a estagiária – toda solícita e sorrisos – entregava a pasta, o homem permaneceu calado.
Depois, com um mero tchauzinho, foi embora da sala – toda, toda – com aquele caboclo ali, tiquetaqueando com a cabeça, acompanhando sua saída.
Foi a mudança da água (barrenta) para o vinho (finíssimo).
Ele ficou num bom humor insuportável.
Não tinha mais nada a reclamar, não queria constar mais nada em ata, deixa o processo pra lá, ganha quem ganhar, é assim mesmo, o dia está lindo lá fora, vocês todas são muito competentes, a licitação tá muito boa, o edital tá muito bom, cadê a ata, onde é que eu assino, muito obrigado, tudo de bom pra vocês, fica assim, até uma próxima vez…
Quem estava de queixo caído agora era a comissão…
Mas até que foi bom.
Pois já ficou decidido.
Apesar de não ter constado em ata.
Doravante, TODA e QUALQUER licitação que tiver algum representante chato, algum caboclo pentelho, algum distinto que esteja lá só pra encher o saco, pois bem, visando garantir o bom andamento dos trabalhos, nesses casos a solução passará a ser uma só:
– Chama a estagiária!