“Jamais discutas, pois perderás.”
Essa deveria ser uma recomendação expressa em toda e qualquer cerimônia de casamento. Dirigida aos homens, é claro.
Tudo começou porque caí na BESTEIRA INOMINÁVEL de falar – durante o preparo de uma salada – que “Péraê, péraê, vinagre não. Prefiro sem”.
Foi o suficiente.
Ela até deixou uma porçãozinha à parte da salada para mim – sob meus próprios protestos, depois que percebi o tamanho da bobagem que havia feito.
Tivesse tudo acabado aí, maravilha.
Jamais eu voltaria a cometer essa gafe de novo.
Mas não.
Mais tarde, enquanto eu estava na garagem, ela me perguntou lá do alto das escadas: “Benhê! Posso pegar um cigarro seu?”
– Cuméquié? – perguntei, incrédulo.
– É que preciso fazer um preparado pra matar ou espantar essas formigas pequenininhas. E um dos ingredientes é o fumo de um cigarro. Afinal você sabe o quanto esse negócio é venenoso…
Tive que concordar, resignado, com essa última parte. Era o lado bruxa Morgana dela que, de quando em quando, aflora. Cedi, de bom grado o “ingrediente” para sua poção natureba e voltei aos meus afazeres funilariais.
Final do dia. O guerreiro, cansado, exausto, mas certo e feliz de seu dever cumprido, sobe as escadas lenta e compassadamente de volta ao seu lar, à sua toca, ao seu ninho de conforto.
Mas, eis que depara-se com uma cena inusitada: todos os móveis meio que afastados, as cadeiras sobre a mesa (tal qual num bar que já houvesse fechado), nenhum brinquedo espalhado pelo chão.
Antes mesmo que pudesse raciocinar e concluir logicamente sobre a “operação limpeza” que passou por ali, veio o cheiro.
Não surgiu de algum lugar específico, mas de toda parte, simultaneamente. Atingiu-me como uma bomba. Aquele conhecido odor agridoce, que faz coçar o fundo da parte de cima das narinas e imediatamente enche a boca com seu sabor, causando um imediato arrepio de compreensão.
“Vinagre!”
Ela estava em nosso quarto, distraída, enxugando nosso menor pequerrucho após o banho.
– Amôoor…
– Oi?
– Me diz uma coisa, tô sentindo um cheiro meio diferente… O que é?
– Ah! É aquele preparado pras formigas!
– Não era para suas plantas, lá fora?
– É que tinham alguns pontinhos de formigueiro aqui dentro de casa também.
– Ahn… Entendi… Só por curiosidade: vai VINAGRE nesse coiso?
– Sim!
Seus olhinhos nipônicos estavam brilhantes e um sorriso bailava, teimoso, em seus lábios.
– Pôxa! Só porque eu não quis vinagre na hora do almoço?
– Imagiiiiiiina… É que faz parte da receita…
A essas alturas já não procurava mais disfarçar o sorriso.
Pro bem das formigas, espero que elas tenham desaparecido.
Ôôôô boca maldita!