A felicidade não é poética

Nicole Ayres Luz

É comum associar a inspiração poética à tristeza. Ainda perdura a ideia romântica de que a literatura, sobretudo a poesia, é a forma de expressão das angústias humanas. O que não deixa de ser verdade, apesar de a questão ser mais profunda que isso. Não se escreve sem motivo, mesmo que ele seja desconhecido. Aliás, é em busca de um motivo que se escreve. Tem gente que procura na música, na pintura, nas artes cênicas, no esporte; outros, na literatura. Procura o quê? Não sei. Uma razão de viver, algo além da banalidade, uma libertação, um encontro consigo mesmo, com o mundo… Como queira. E o que acontece é que a busca vira o sentido em si, porque se encontra tanta coisa interessante no caminho!

Por que será que a tristeza, a agonia, a dor são fontes de inspiração tão ricas? Porque elas nos fazem parar para pensar. Ninguém gosta de sofrer, é claro. Mas todo mundo sofre em algum momento. Não subestimemos a importância do sofrimento. Ele nos aperta o peito, nos corrói a alma, nos deixa inquietos. É aí que entramos mais intimamente em contato com nós mesmos. A experiência é linda, reveladora. Sim, a tristeza é bonita demais; por isso ela é tão querida pelos poetas. Para os otimistas, a conclusão da tristeza é a alegria. Não se chega a uma sem a outra. Tudo na vida funciona por comparação: não saberíamos apreciar a beleza de um dia de sol sem conhecer a chuva.

A felicidade, porém, basta em si mesma. Quando estamos felizes, não pensamos: somos. Isso cabe numa palavra, num gesto. Não rende um poema completo. Não é boa fonte de inspiração. Vinicius de Moraes já explorou o assunto.

A UM PASSARINHO
(Vinicius de Moraes)

Para que vieste
Na minha janela
Meter o nariz?
Se foi por um verso
Não sou mais poeta
Ando tão feliz!
Se é para uma prosa
Não sou Anchieta
Nem venho de Assis.

Deixa-te de histórias
Some-te daqui!

O poeta feliz já não é mais poeta. Ele precisa da crise, da instabilidade, do questionamento. Assim como na prosa não existe personagem sem conflito, que não enfrente obstáculos para atingir seu objetivo, na poesia não existe eu-lírico sem algum tipo de aflição. Louvemos a tristeza, meus amigos, porque a felicidade dispensa comentários. Ela é a própria celebração, apenas alcançada e devidamente valorizada a duras penas, em forma de versos ou de lágrimas.

Já acabou?

Vamos lá, criançada, sem preguiça! Sentem-se e leiam tudo, porque isto é importante. Recortado-e-colado lá do Brasil 247

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), perdeu. Ponto. Não há nada mais que ele possa fazer para reverter o desastre criado por seu malfadado plano de reforma educacional, que fecha 93 escolas e afeta a vida de 311 mil alunos.

Desde que a ideia foi anunciada, mais de 100 escolas foram ocupadas pelos alunos – e, na maioria dos casos, com apoio dos pais e dos professores.

O governo paulista bem que tentou retirá-los à força. Não conseguiu. Nesta manhã, sofreu uma derrota histórica, quando, por decisão unânime, três desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo determinaram que nenhuma ordem de reintegração de posse será concedida ao governo paulista, uma vez que as ocupações dos estudantes foram consideradas pacíficas.

Agora, sem ter como retirar os alunos, que não aceitam o fechamento das escolas, Alckmin só tem uma saída: engavetar seu plano, pedir desculpas aos pais e estudantes e permitir que eles retomem suas aulas.

Nem que seja apenas pelo simples fato de que todos eles são ou já serão eleitores em 2018 – afinal, Alckmin ainda sonha com a presidência da República.

Para entender melhor o “caso” – e sem descuidar do Juridiquês deste nosso cantinho virtual – basta ler esta reportagem da Sarah Fernandes, lá da Rede Brasil Atual, sob o título “Tribunal de Justiça de SP desautoriza reintegração de posse de escolas ocupadas”:

Em decisão unânime, cinco desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinaram, na manhã de hoje (23), que poderão ser mantidas todas as ocupações de por alunos, pais e professores em protesto contra a reorganização do ensino imposta pelo governo de Geraldo Alckmin (PSDB), que prevê o fechamento de pelo menos 93 escolas. Segundo a decisão, considerada histórica por entidades do setor, nenhuma ordem de reintegração de posse será concedida na capital paulista. Até o início da tarde desta segunda-feira, já eram 114 escolas ocupadas no estado.

Os desembargadores da 7ª Câmara de Direito Público entenderam que a questão é muito mais ampla do que o simples pedido da reintegração dos prédios das escolas e atinge um problema de política pública. Para os juízes, o governo Alckmin não discutiu com as comunidades escolares e com a população o projeto de “reorganização”, como prevê o artigo 14 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Além disso, a Justiça considerou as ocupações pacificas e afirmaram que em nenhum momento o governo perdeu a posse dos prédios.

Com a decisão, a Defensoria Pública e o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) podem pedir que juízes de outras cidades reconsiderem as reintegrações de posse, já que o Tribunal de Justiça, que é uma instância superior, negou o pedido, criando uma jurisprudência para o caso. Na última semana, a Fazenda do estado haviam impetrado um agravo de instrumento para revogar a suspensão das reintegrações de posse em todas as escolas da capital paulista, decidida no último dia 13 pela 5ª Vara da Fazenda Pública, do Tribunal de Justiça.

O relator do processo, desembargador Sérgio Coimbra Schmidt, reforçou que a “reorganização” das escolas não foi discutida com os alunos, que o movimento é pacífico e que não causou danos em nenhum local. Ele recomendou, no entanto, que as atividades letivas sejam retomadas e que os estudantes possam entrar nas escolas, mesmo com as ocupações mantidas.

O presidente da 7ª Câmara, desembargador Eduardo Gouveia, ressaltou que não via condições de realizar desocupações com segurança, que o movimento não tem finalidade de posse e que o Alckmin não cumpriu o princípio constitucional da democracia. Em seu voto, o magistrado ressaltou que não é aceitável fechar escolas em um país que ainda precisa avançar muito em educação e lembrou que nos colégios ocupados estão ocorrendo atividades culturais, palestras e até um show do Chico César, realizado no fim de semana, na escola Fernão Dias, em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. [grifei]

“Foi uma decisão histórica e acho que o movimento ganhou muita força a partir dela. O governo do estado vai ter que ceder, até porque achava que facilmente conseguiria reintegrações e agiria com arbitrariedade e violência, como é costume”, afirma o advogado membro do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condeca) de São Paulo Ariel de Castro Alves. “A sociedade como um todo está apoiando as ocupações, exatamente por ser contra fechamento das escolas, porque não tem clareza de como vai ser a reorganização e pelo receio que ela gere violações de direitos de crianças e adolescentes. Se o governo fosse sensato, suspenderia esse projeto por no mínimo um ano e faria debates, seminários e atividades para discuti-lo e só depois implementaria uma suposta reorganização.”

Os estudantes presentes ao TJ-SP festejaram a decisão e prometeram continuar e ampliar a mobilização até que o governo Alckmin abra diálogo. “Estávamos com muito receio de repressão policial, porque sabemos que já existiram algumas tentativas, em Osasco e Diadema por exemplo, e que elas foram muito negativas. Nossa perspectiva agora é conseguir que a Secretaria de Educação dialogue com a gente. Até lá, vamos continuar ocupados”, disse a presidenta da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes), Ângela Meyer.

“Se a reorganização fosse feita para melhorar a educação, seria genial. Mas como ela é para economizar dinheiro, o governo vai fechar escolas, demitir pessoas e deixar os alunos sem aula”, afirma o estudante Lucas Penteado, conhecido como Koka, que é presidente do grêmio da escola Caetano de Campos, na Consolação, região central da capital. “A argumentação do Herman (Voorwald, secretário da Educação) é que as ocupações não têm organização. Têm sim. As escolas não estão paradas: tem atividades culturais, tem aulas públicas… Temos todo um cronograma cultural. No Caetano, inclusive, passamos a ter uma organização e uma limpeza que não existia há muito tempo. A galera da comunidade está nos ajudando muito com doações.”

Os desembargadores ainda propuseram nova audiência para esta tarde, mas os estudantes, juntamente com a Defensoria Pública, solicitaram um prazo maior para se organizar. Ainda hoje, às 18h, ocorrerá uma assembleia com representantes das ocupações para definir os rumos do movimento e as ações conjuntas a serem tomadas.

Aliás, só pra constar: apesar de eu ter dado o link das matérias (nem mais, nem menos que minha obrigação), é de dar ânsia de vômito a breve leitura dos comentários em cada site. Ressalvados – sei lá – uns 10%, todo o restante eu disse TODO O RESTANTE, é no sentido mais reaça da coisa, alegando que só tinha barbudo do MST nas escolas, que foi por isso que acabou a mortadela nas imediações, que foi o PT do Governo Federal – através da APEOESP – que articulou tudo isso, que tinha mais que sentar a borracha no lombo dessa corja de baderneiros, desocupados, invasores de propriedade alheia, que tinham saudades da época do Paulo Maluf.

Nesse ponto eu parei de ler.

Para compreender melhor ainda sobre o que estou falando, leiam esta outra reportagem, também da Sarah Fernandes, também lá da Rede Brasil Atual, desta vez sob o título “Organizados e com apoio popular, jovens dão lição de democracia em escolas ocupadas”:

Eram só 10h, mas os alunos da Escola Estadual Ana Rosa Araújo, na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, já tinham realizado muitas atividades. E não estamos falando da resolução de problemas de matemática ou de interpretação de textos. Os jovens já haviam limpado a escola, cozinhado, recebido os pais e realizado uma assembleia para definir os rumos da ocupação do colégio, iniciada na última sexta-feira (13), em protesto contra o fechamento de pelo menos 93 instituições de ensino anunciado pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB). Até o fim da tarde de hoje (18) eram 48 escolas ocupadas no estado contra a medida, que faz parte do projeto de “reorganização” da educação paulista.

“Nós realizamos uma assembleia aqui em frente à escola às 5 horas da sexta-feira, antes do início das aulas, e concordamos que ocupar era nossa única alternativa de conseguir permanecer aqui. Foi o que fizemos”, conta o estudante do primeiro ano do ensino médio na escola José Vinicius Soares. A partir do ano que vem, sua escola passará a oferecer apenas o fundamental II e ele e os amigos terão de migrar para a escola Adolfo Gordo Senador. A transferência será automática, por um sistema informatizado. Os alunos são apenas notificados da mudança.

Desde que ocuparam as escolas, eles se dividiram em comissões, que são responsáveis pela limpeza do local, pelo preparo da comida, pelo contato com a imprensa, pelo controle dos portões e pela organização de atividades culturais. “Já fizemos sessões de cinema ao ar livre, shows, teatros, saraus e leituras de poesias. Esta escola nunca teve tanta vida cultural como agora, conta José Vinicius, que se mantém em contato com os estudantes de outras ocupações pelas redes sociais, em especial o Facebook e o Whatsapp. [grifei]

“Está sendo um grande aprendizado de política, democracia e convivência. Conheci várias pessoas que estudam na mesma escola que eu há anos, mas que eu nunca tinha visto. Nós não vamos desocupar. Vamos resistir até que essa proposta seja revista. Precisamos sim de uma reorganização, mas que ela seja discutida com a comunidade escolar e não imposta”, conta a estudante Marissol Dias, também do primeiro ano do ensino médio, sentada atrás de um cartaz feito pelos estudantes, que dizia: “Ordem e progresso é coisa de fascista. Quero liberdade, igualdade e justiça”.

A conversa foi interrompida por uma moradora do bairro, que rapidamente encostou o carro na porta da escola, abriu o vidro e chamou os estudantes: “Do que vocês estão precisando?” “De produtos de limpeza”, responderam os jovens. “Eu vou trazer para vocês”. Ela não é a única: vizinhos, professores e ex-alunos vão com frequência ao colégio levar doações. Os pais são bem-vindos. “Queremos que eles entrem e vejam que não estamos fazendo bagunça aqui. A grande maioria dos pais nos apoia e nos incentiva a resistir. Eles também não querem que tenhamos de mudar de escola”, conta José Vinicius.

“Fico muito satisfeito de ver meus alunos desempenhando sua autonomia, que é exatamente a proposta da educação estadual. É muito hipócrita que agora que os alunos estão mostrando o que aprenderam o governo se negue a dialogar”, lamenta o professor de História do colégio Luís Mendes. “Nós estamos apoiando os alunos, que estão lutando por um direito legítimo. E essa reorganização nos afeta também. Os professores de Sociologia e Filosofia desta escola, que só lecionam para o ensino médio, ainda não sabem o que vai acontecer com eles.”

Há pouco mais de cinco quilômetros dali, outro grupo de estudantes permanece ocupando a escola Fernão Dias Paes, em Pinheiros, na zona oeste da capital. A instituição foi uma das primeiras a iniciar o movimento e, como resposta, foi sitiada pela Polícia Militar durante a toda semana passada, até que, na noite de sexta-feira (13), o juiz Luis Felipe Ferrari Bedendi, da 5ª Vara da Fazenda Pública, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, suspendeu a reintegração de posse do prédio, que ele mesmo havia determinado horas antes, e estendeu a decisão para todas as escolas da capital paulista, acatando um recurso impetrado pelos advogados do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado (Apeoesp), da Defensoria Pública e do Ministério Público.

“Estamos realizando saraus, que ocorrem ali na escadaria do pátio da escola. Todos podem participar. Inclusive, o (Eduardo) Suplicy (secretário de Direitos Humanos da prefeitura de São Paulo) esteve aqui e participou cantando uma música dos Racionais”, conta uma das estudantes que integra a comissão de comunicação com a imprensa. Os grupos de trabalho se revezam e são organizados pelos próprios estudantes. Tudo é definido em assembleia.

Desde que a Polícia Militar liberou os portões, a passagem é livre para os alunos da escola. As pessoas sem relação direta com a instituição de ensino, mas que querem conhecer a ocupação, devem procurar os alunos, que estão organizando visitas monitoradas. Por decisão do grupo, profissionais de imprensa não podem entrar no prédio.

Desde ontem circula nas redes sociais uma lista de sete formas de apoiar as ocupações das escolas, que incluem ajuda na produção do material gráfico, comunicação por telefone e doação de alimentos e produtos de higiene. No portão da Fernão Dias, há um cartaz dizendo que a escola José Lins do Rego, na Estrada do M’boi Mirim, é no momento a que mais precisa de doações. “Nosso colégio ficou muito em evidência e por isso recebemos muitas doações. Estamos agora fazendo uma campanha de levantamento de verba para conseguir mandar parte das coisas para outras escolas que precisam mais”, conta a porta-voz dos alunos, em frente a uma estátua do bandeirante Fernão Dias, que decora o pátio do colégio, e que foi encapuzada pelos alunos.

“Nós temos um ensino bancário que perpetua as desigualdades, mas esses jovens estão lutando pelo direito de poder conviver. Estão indo contra este modelo. Esta foi a aula mais importante que eles tiveram no ano: a aula de desobedecer, de enfrentar o poder, de questionar e de descobrir a força que têm”, afirmou o padre Júlio Lancellotti, conhecido pela atuação em defesa dos direitos humanos, dos pobres e dos moradores de rua. Na última semana, ele esteve na ocupação do Fernão Dias, em solidariedade aos estudantes.

O governo Alckmin justificou o fechamento das escolas dizendo que vai reunir apenas alunos do mesmo ciclo – fundamental I e II e médio – nas instituições de ensino e com isso melhorar a qualidade da educação. Professores e estudantes temem que as mudanças levem à superlotação de salas, demissão de docentes e à redução de salário decorrente da redução de jornada. Além disso, a Apeoesp acredita que o número de escolas a serem fechadas será muito maior.

Na escola recém-ocupada Godofredo Furtado, também em Pinheiros, os alunos começavam a organizar as primeiras doações, enquanto aguardavam a saída da diretora que, ao contrário de professores e funcionários, negou-se a deixar o prédio até o fim do seu expediente, que terminou às 19h de ontem (17). “Está tudo assim, em cima das mesas, porque ela não quer nos entregar as chaves da cozinha, nem do banheiro que tem chuveiro. Mas isso não vai nos fazer voltar atrás. A nossa escola está ocupada, isso já é uma realidade. Só saímos quando o governo rever sua decisão”, diz uma jovem, que preferiu não se identificar.

Pelo projeto do governo, no próximo ano, a escola deixará de ter ensino médio e todos os alunos dessa etapa do ensino irão migrar para a Fernão Dias. “Nós temos medo da superlotação. As salas de aula já estão cheias. Como vão colocar mais gente ainda?”, questiona um aluno que integra a comissão de limpeza da ocupação, enquanto limpava uma mesa.

No prédio funciona também uma Escola Técnica Estadual (Etec). Funcionários do Centro Paula Souza, que administra esse tipo de instituição de ensino, foram ao local recolher os computadores, por “questões de segurança”. Enquanto isso, uma senhora entregava aos alunos uma sacola cheia de produtos de higiene: “Obrigada, meninos! Vocês estão dando uma lição para todos nós”, disse.

Enfim, é isso. Tirem suas próprias conclusões…

Hm?

O porquê daquela imagem lá em cima?

Por conta deste videozinho viral aqui embaixo…

Sobre o terrorismo no Brasil

(Aviso aos Navegantes: os gnomos revisores/censores que vivem nas entranhas deste blog classificaram este post como altamente sarcástico e politicamente incorreto. Se você for do tipo que fica indignado com coisas desse tipo, então pare agora e aguarde algum próximo texto não tão carregado. Pode voltar à sua leitura de Pollyana Moça, aos seus afazeres normais ou seja lá o que for que pessoas como você costumam fazer. Não diga que não avisei.)

Com todo respeito à desgraceira ocorrida na França – e realmente me chocou toda essa história – e sem entrar no mérito da outra desgraceira ocorrida em Minas, inclusive saindo fora da rasa discussão de quem é que está mais fodido ou a quem é que se “deve” apoiar, eis que (re)encontrei este texto que trata com um bom humor (negro) uma suposta estória de quem o Estado Islâmico queria explodir o Cristo Redentor…

Deleitem-se.

Documentos descobertos e mantidos em sigilo pela Polícia Federal do Brasil, FBI e Polícia Francesa revelam que o Estado Islâmico (ISIS) teria ordenado a execução de um atentado no Brasil.

O alvo da ação seria a estátua do Cristo Redentor, um dos símbolos mais conhecidos do Rio de Janeiro. Dois agentes da célula terrorista foram enviados para o sequestro de um avião que seria lançado contra a “estátua-símbolo dos infiéis cristãos”.

Os registros da Polícia Federal dão conta de que os dois terroristas chegaram ao Rio no domingo, 1º de novembro, às 21h47min, num vôo da Air France.

A missão começou a sofrer embaraços já no desembarque, quando a bagagem dos muçulmanos foi extraviada, seguindo num vôo para o Paraguai.

Após quase seis horas de peregrinação por diversos guichês e dificuldade de comunicação em virtude do inglês ruim, os dois saem do aeroporto, aconselhados por funcionários da Infraero a voltar no dia seguinte, com intérprete. Os dois terroristas apanharam um táxi pirata na saída do aeroporto, sendo que o motorista percebeu que eram estrangeiros e rodou duas horas dando voltas pela cidade, até abandoná-los em lugar ermo da Baixada Fluminense. No trajeto, ele parou o carro e três cúmplices os assaltaram e espancaram.

Eles conseguiram ficar com alguns dólares que tinham escondido em cintos próprios para transportar dinheiro e pegaram carona num caminhão que entregava gás. Na segunda-feira, às 7h33min, graças ao treinamento de guerrilha no Afeganistão, os dois terroristas conseguem chegar a um hotel de Copacabana.

Alugaram então um carro e se perderam no Rio; entraram para o lado da Rocinha e o carro foi totalmente metralhado. Mais uma vez, graças ao treinamento de guerrilha, se safaram e voltaram para o aeroporto, determinados a sequestrar logo um avião e jogá-lo bem no meio do Cristo Redentor. Enfrentam um congestionamento monstro por causa de uma manifestação de estudantes e professores em greve – e ficaram três horas parados na Avenida Brasil, altura de Manguinhos, onde seus relógios foram roubados em um arrastão. Às 12h30min, resolvem ir para o centro da cidade e procuram uma casa de câmbio para trocar o pouco que sobrou de dólares.

Recebem notas de R$ 100,00 falsas, dessas que são feitas grosseiramente a partir de notas de R$ 1,00.

Por fim, às 15h45min chegam ao Tom Jobim para sequestrar um avião.

Aeroviários e passageiros estão acantonados no saguão do aeroporto, tocando pagode e gritando slogans contra o governo.

O Batalhão de Choque da PM chega batendo em todos, inclusive nos terroristas.

Os árabes são conduzidos à delegacia da Polícia Federal no Aeroporto, acusados de tráfico de drogas, pois tiveram papelotes de cocaína plantados pelos manifestantes nos seus bolsos.

Às 18 horas em ponto, aproveitando o resgate de presos feito por um esquadrão de bandidos do Comando Vermelho, eles conseguem fugir da delegacia em meio à confusão e ao tiroteio. Às 19h05min eles se dirigem ao balcão da GOL para comprar as passagens.

Mas o funcionário que lhes vende os bilhetes omite a informação de que os vôos da companhia estão suspensos.

Eles, então, discutem entre si: começam a ficar em dúvida se destruir o Rio de Janeiro, no fim das contas, seria um “ato terrorista” ou “uma obra de caridade”.

Às 23h30min, sujos, doloridos e mortos de fome, decidem comer alguma coisa no restaurante do aeroporto. Pedem sanduíches de churrasquinho com queijo de coalho e limonadas. Voltam a acordar somente na terça-feira, às 4h35min, quando finalmente conseguem se recuperar da intoxicação alimentar de proporções equinas, decorrente da ingestão de carne estragada usada nos sanduíches. Foram levados para o Hospital Miguel Couto, depois de terem esperado três horas para que o socorro chegasse e percorresse cada um dos hospitais da rede pública até encontrar vagas. No hospital foram atendidos por uma enfermeira feia, grossa, gorda e mal-humorada.

Debilitados, só teriam alta hospitalar no domingo.

Domingo, 18h20min: ambos os terroristas, ainda convictos de sua missão, saem do hospital e chegam perto do estádio do Maracanã justamente no momento em que o Flamengo acabara de perder o jogo. A torcida rubro-negra confunde os dois com integrantes da galera adversária e lhes dá uma surra sem precedentes. O chefe da torcida é um tal de “Pé de Mesa”, que abusa sexualmente deles.

Às 19h45min, finalmente, são deixados em paz, com dores terríveis pelo corpo, em especial na área proctológica. Ao verem uma barraca de venda de bebida nas proximidades, decidem se embriagar ao menos uma vez na vida (mesmo que seja pecado, a essas alturas Alá que se foda!). Tomam cachaça adulterada com metanol e precisam voltar ao Miguel Couto.

Reencontram a mesma enfermeira feia, grossa, gorda e mal-humorada, que os recepciona. Ainda pior do que antes.

Quando finalmente são atendidos pelo corpo médico do hospital, os médicos também diagnosticam gonorréia no setor retofuricular inchado (Pé de Mesa não perdoa!).

Segunda-feira, 23h42min: os dois terroristas, mesmo que sem alta, deixam o hospital e fogem do Rio escondidos na traseira de um caminhão de eletrodomésticos, assaltado horas depois na Serra das Araras. Desnorteados, famintos, sem poder andar e sentar, eles são levados pela van de uma ONG ligada a direitos humanos.

Viajam deitados de lado.

Conseguem fugir do retiro da ONG no dia seguinte e perambulam o dia todo à cata de comida. Cansados, acabam adormecendo debaixo da marquise de uma loja.

A Polícia Federal ainda não revelou o hospital onde os dois foram internados em estado grave, depois de terem sido espancados quase até a morte por um grupo de mata-mendigos. O porta-voz da Polícia Federal declarou que, depois que os dois saírem da UTI, serão recolhidos no setor de imigrantes ilegais, em Brasília, onde permanecerão aguardando até o Ministério da Justiça autorizar a deportação dos dois infelizes, se tiver verba, é claro.

Algumas semanas depois, ainda aguardando o posicionamento do Ministério, os dois finalmente conseguiram acesso à Internet – ainda que precário – para divulgar uma nota onde consideraram desnecessário o terrorismo no Brasil e irão sugerir um convênio para realização, no Rio de Janeiro, de treinamento especializado para o pessoal do Estado Islâmico…

Sobre ser mãe

E ela, aquela mãe dedicada, estava a ler um livro infantil para a pequenina filhota quando, sem querer, meio que sentou de ladinho sobre o celular corporativo da empresa em que trabalha. Como não podia deixar de ser, Murphy resolveu aparecer e, mais sem querer ainda, fez com que ligasse para um dos diretores da empresa.

E ela, obviamente, não percebeu! Somente foi se dar conta disso quando esse mesmo diretor, momentos depois, “retornou” a ligação…

E ela, atônita, atendeu para ouvi-lo dizer que sim, foi ela quem ligou primeiro; que não, não tinha problema; e, mais, que ele havia ficado ali ouvindo a historinha – inclusive as partes em que ela estava imitando os bichos – e que achou linda essa atitude.

E ela, estupefata, não sabia se agradecia ou se morria de vergonha…

Parabéns, atingimos a burrice máxima

Eis um excelente artigo recomendado pelo sempre antenado amigo e copoanheiro Bicarato.

Sim, eu sei que é longo – bem longo, aliás – mas tenho fé que vocês vão ler até o fim. Porque é disso que precisamos: de leitura, de reflexão, de pensar antes de falar. E, no caso, Eliane Brum falou e falou muito bem.

De minha parte aceito a dica e devo procurar o livro da Marcia Tiburi. Mas também acho que devo começar a estocar alimentos…

Eliane BrumA fogueira de Simone de Beauvoir a partir da questão do ENEM mostrou que a burrice se tornou um problema estrutural do Brasil. Se não for enfrentada, não há chance. Hordas e hordas de burros que ocupam espaços institucionais, burros que ocupam bancadas de TV, burros pagos por dinheiro público, burros pagos por dinheiro privado, burros em lugares privilegiados, atacaram a filósofa francesa porque o Exame Nacional de Ensino Médio colocou na prova um trecho de uma de suas obras, O Segundo Sexo, começando pela frase célebre: “Uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher”. Bastou para os burros levantarem as orelhas e relincharem sua ignorância em volumes constrangedores. Debater com seriedade a burrice nacional é mais urgente do que discutir a crise econômica e o baixo crescimento do país. A burrice está na raiz da crise política mais ampla. A burrice corrompe a vida, a privada e a pública. Dia após dia.

Recapitulando alguns espasmos do mais recente surto de burrice. O verbete de Simone de Beauvoir (1908-1986) na Wikipedia, conforme mostrou uma reportagem da BBC, foi invadido para tachar a escritora de “pedófila” e “nazista”. A Câmara de Vereadores de Campinas, no estado de São Paulo, aprovou uma “moção de repúdio” à filósofa. O deputado Marco Feliciano (PSC-SP), da Bancada da Bíblia, descobriu na frase “uma escolha adrede, ardilosa e discrepante do que se tem decidido sobre o que se deve ensinar aos nossos jovens”. Em sua página no Facebook, o promotor de justiça do município paulista de Sorocaba, Jorge Alberto de Oliveira Marum, chamou Beauvoir de “baranga francesa que não toma banho, não usa sutiã e não se depila”. Como o tema da redação do ENEM era “a persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”, houve gente que estudou em colégios caros afirmando que este era um tema de esquerda, e portanto um sinal inequívoco de uma conspiração ideológica por parte do governo federal. Como sugeriu o crítico de cinema Inácio Araújo em seu blog, se defender que a mulher tenha o direito de andar sem ser perturbada, agredida e chutada é tema de esquerda, isso só pode significar que a direita vai muito mal.

A única arma capaz de derrotar a burrice é o pensamento

Está cada vez mais difícil fazer humor no Brasil. Como nada do que foi relatado acima é piada, somos submetidos cotidianamente a uma experiência de perversão. Também não tem sido fácil escrever quando não se é humorista, por que o que se pode dizer, seriamente, diante de uma moção de repúdio à Simone de Beauvoir? Mas é preciso tratar com seriedade, porque talvez não exista nada mais sério do que a boçalidade que atravessa o país. Torna-se urgente, prioritário, fazer um esforço coletivo e enfrentar a burrice com o único instrumento capaz de derrotá-la: o pensamento.

Esta é a potência e a generosidade de um livro lançado pela filósofa Marcia Tiburi, escritora e professora universitária. O título vai direto ao ponto, afinal os tempos são graves demais para papinhos de salão: Como conversar com um fascista – reflexões sobre o cotidiano autoritário brasileiro (Record). Nas 194 páginas, Marcia enfrenta as várias faces do cotidiano atual com profundidade, mas de forma acessível a quem não está familiarizado com os conceitos. Faz o mais difícil: escrever simples sem simplificar. É um livro que se pretende para todos, e não para os seus pares. Quem acompanha a trajetória da filósofa conhece a sua coragem. E este é um livro de coragem, já que é tão difícil quanto arriscado escrever sobre o que está em movimento, sem a proteção assegurada pelo distanciamento histórico. Poucos são os intelectuais que se arriscam a sair do conforto de seus feudos para enfrentar o debate público com suas dúvidas. E por isso aqueles que se arriscam de forma honesta, sem ficar arrotando suas certezas e suas credenciais, ou usando-as para massacrar aqueles que já são massacrados, são tão preciosos.

O confronto atual não é entre direita e esquerda, mas entre os que pensam e os que não pensam

“Eu queria saber por que dialogar é impossível”, conta Marcia Tiburi, sobre a pergunta que a moveu nessa busca. Para enfrentar a ausência do pensamento, a filósofa propõe a resistência pelo diálogo. Este é um esforço de cada um –e de todos. Arriscar-se a deixar o “isolamento em comunidade”, a forma atual da vida social e política, para confrontar o que ela chama de “consumismo da linguagem”. Compreender o confronto atual como um confronto entre direita e esquerda, desenvolvimentistas e ecologistas, governistas e oposicionistas, machistas e feministas é, segundo ela, uma redução. O confronto atual seria mais profundo e também mais dramático: entre os que pensam e os que não pensam.

O exercício que faço, deste parágrafo em diante, é buscar compreender a fogueira em que Simone de Beauvoir foi jogada nos últimos dias, entre outros fatos recentes, a partir das ideias deste livro. Para começar, a seriedade do episódio do ENEM pode ser demonstrada neste trecho tão agudo: “Se levarmos em conta que falar qualquer coisa está muito fácil, que falamos em excesso e falamos coisas desnecessárias, um novo consumismo emerge entre nós, o consumismo da linguagem. O problema é que ele produz, como qualquer consumismo, muito lixo. E o problema de qualquer lixo é que ele não retorna à natureza como se nada tivesse acontecido. Ele altera profundamente nossas vidas em um sentido físico e mental. O que se come, o que se vê, o que se ouve, numa palavra, o que se introjeta, vira corpo, se torna existência”.

Vale perguntar. Num país em que a preocupação com a educação é uma flatulência, em que a não educação é a regra, para onde vai o lixo e que tipo de impacto ele produz na tessitura do cotidiano, nos corações e mentes de quem o consome? O que acontece com a fogueira de Simone de Beauvoir num contexto em que aqueles que a jogaram no fogo possivelmente sequer a leram? Que restos dos discursos vazios sobre a filósofa permanecerão na memória de uma população que não tem seus livros na estante e que tipo de eco produzirão?

Como dimensionar a gravidade de um vereador eleito, pago com dinheiro público para legislar e, portanto, para decidir destinos coletivos, dizer que a escolha da frase de Simone de Beauvoir para uma prova do ENEM é algo “demoníaco”, como afirmou Campos Filho (DEM)? E como enfrentá-la com a seriedade necessária?

Com a palavra, o autor da “moção de repúdio”: “Foram buscar lá Simone de Beauvoir, lá pro ano de mil trocentos e pôco… (…) A grande maioria é favorável à lei da natureza. Homem é homem. Mulher é mulher. (…) Cuidado com essa pulsão, essa pulsão pode levar à cadeia. O senhor pode passar na frente do caixa eletrônico e ter uma pulsão de vontade de roubar e vai preso. Pode ter uma pulsão de vontade de estuprar e vai preso. Então, tomem cuidado com essa pulsão, ah, hoje de manhã sou menina, agora à noite eu sou homem….”.

O vazio de pensamento não é silencioso, mas repleto de clichês, frases prontas e repetições

O vereador nem sequer sabe em que século Simone de Beauvoir nasceu, viveu e produziu pensamento – “mil trocentos e pôco”. Nem sequer tentou compreender o que a frase citada no ENEM significa. Não é engraçado. É a ruína causando mais ruína. O que interessa é fazer barulho, porque o barulho encobre o vazio de ideias. O que importa é perverter a palavra, usando o que sequer tentou entender para enclausurar o pensamento e reafirmar a certeza em nome de uma suposta “lei da natureza” que jamais existiu. A perversão do fascista é a de acusar o outro de manipulação ideológica quando é ele o manipulador. É acusar o outro de impor um pensamento quando é ele que empreende todo os esforços para barrar qualquer pensamento. É impedir o diálogo denunciando o outro pelo ato que ele próprio cometeu. É nessa repetição de boçalidades que seguem os discursos de outros vereadores, invocando clichês bíblicos, lembrando de Sodoma e Gomorra e Adão e Eva, abusando de Deus.

Para perverter a realidade, o fascista conta com o consumismo da linguagem. Trata-se, como aponta Marcia Tiburi, de um vazio repleto de falas prontas. Não é um vazio silencioso, espaço aberto para buscar o outro, o inusitado, o surpreendente. Mas sim um vazio barulhento, abarrotado de clichês, de frases repetidas e repetitivas, usadas para se proteger do pensamento. Os lugares-comuns, neste caso específico a constante invocação de Deus e de leis bíblicas, são usados como um escudo contra a reflexão. Todo o esforço é empreendido para não existir qualquer chance de pensamento, ainda que um bem pequenino.

Neste vazio, a filósofa acredita que os meios tecnológicos e a mídia desempenham um papel crucial. Repete-se o que é dito na TV, no rádio. Fala-se, muito, sem pensar no que se diz. No gesto do mero “compartilhar” sem ler, tão fácil quanto comprar com um clique pela internet, foge-se do pensamento analítico e crítico, trocando-o pelo vazio consumista da linguagem e da ação repetitiva. É assim que a burrice se multiplica em cliques, propagando-se em rede. O título deste artigo é esperançoso, mas não corresponde à realidade: a burrice não tem limites, ela sempre pode atingir patamares ainda mais extremos.

Se não houver limites para a idiotice, resta isolar-se e estocar alimentos

Episódios semelhantes à “moção de repúdio” à Simone de Beauvoir ocorriam esporadicamente em rincões afastados, e logo eram ridicularizados. Hoje, acontecem na Câmara de Vereadores de uma das maiores e mais ricas cidades do estado de São Paulo, no sudeste do Brasil, uma cidade que abriga várias universidades, entre elas a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), uma das mais respeitadas do país. E cadê os intelectuais? Rindo dos burros nas cantinas universitárias? Será? Não era de se esperar mais iniciativas de busca do diálogo, de criação de oportunidades para explicar quem é Simone de Beauvoir e refletir sobre sua obra, ou mesmo a ocupação da Câmara, para produzir reação e movimento que permitisse o conhecimento e combatesse a ignorância?

Talvez o polêmico livro Submisssão (Alfaguara), do francês Michel Houellebecq, possa ter alguma ressonância maior por aqui. Nele, só para lembrar, o protagonista é um acadêmico desencantado que se depara com a vitória de um partido islâmico nas eleições da França. Depois de assistir ao desenrolar dos acontecimentos pela TV, já que não se sente motivado a participar de nenhum debate que não seja sobre a sua própria tese acadêmica (ou nem mesmo sobre ela), se choca com o resultado eleitoral. É o protagonista que não protagoniza –ou só protagoniza por omissão (ou submissão). Aos poucos, os novos donos do poder lhe acenam não só com a manutenção dos privilégios, mas com uma considerável ampliação dos privilégios. E ele, afinal, conclui que aderir pode não ser tão ruim assim.

Os burros estão por toda parte e muitos deles estudaram nas melhores escolas e, o pior, muitos ensinam nas melhores escolas. A “moção de repúdio” à Simone de Beauvoir foi aprovada pela Câmara de Campinas por 25 votos a cinco. Assim, os burros são a maioria. É preciso enfrentá-los com pensamento, fazer a resistência pelo diálogo. Ou, como diz Marcia Tiburi: “Sem pensamento não há diálogo possível nem emancipação em nível algum. Se não houver limites para a idiotice, resta isolar-se e estocar alimentos”.

O promotor e professor universitário que reduziu Simone de Beauvoir a “uma baranga”, ao comentar a questão do ENEM em sua página no Facebook, fez o seguinte comentário: “Exame Nacional-Socialista da Doutrinação Sub-Marxista. Aprendam jovens: mulher não nasce mulher, nasce uma baranga francesa que não toma banho, não usa sutiã e não se depila. Só depois é pervertida pelo capitalismo opressor e se torna mulher que toma banho, usa sutiã e se depila”. Depois da repercussão negativa, o que incluiu uma nota de repúdio por parte da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Jorge Alberto de Oliveira Marum apagou os posts e defendeu-se, em outra postagem, alegando que pretendia ter sido irônico: “Ironia, para quem não sabe, é uma figura de linguagem que consiste em afirmar o contrário do que se pensa”. Interprete-se.

A burrice, tanto como categoria cognitiva quanto moral, venceu

“Distorcer é poder” é o título de um dos capítulos do livro em que a filósofa enfrenta a prática amplamente difundida de esvaziar as palavras pela distorção. Como transformar a vítima em culpada, como se faz rotineiramente com as mulheres no falso debate do aborto, por exemplo, ou no tratamento do estupro. Ou distorcer para que aquele que detém os privilégios pareça ser o que têm seus direitos ameaçados: o branco, por exemplo, quando se apresenta como prejudicado pelo sistema de cotas raciais que busca reparar injustiças históricas cometidas contra os negros, ocultando assim que sempre foi o privilegiado; ou quando se invoca um suposto “orgulho heterossexual” na tentativa de mascarar a violência contra os homossexuais, alegando que querem privilégios, quando todos sabem que a heterossexualidade jamais foi contestada ou atacada, nem em sua expressão nem em seus direitos. E também é por essa conversão que os manifestantes de junho de 2013 foram tachados de “vândalos” por parte da mídia e, hoje, uma lei em discussão no Congresso ameaça converter quem protesta em “terrorista”.

A própria “democracia” pode ser vista a partir da prática da distorção, já que há aquela, mais difundida, que é vendida pelo mercado. “De um lado, há uma democracia que deve parecer como realizada, contra outra democracia, que está na ordem do desejo e do sonho e que não teria preço”. O capitalismo sequestra a democracia também como palavra, que passa a ser consumida, junto com outras: felicidade, ética, liberdade, oportunidade, mérito. Palavras que a filósofa chama de “mágicas”, invocadas a serviço do ocultamento da opressão. “Antidemocrático, o capitalismo precisaria ocultar sua única democracia verdadeira: a partilha da miséria e, hoje em dia, cada vez mais, a matabilidade”, afirma Marcia Tiburi.

Quando se invade o verbete de Simone de Beauvoir na Wikipedia é também disso que se trata: distorcer e replicar até virar “verdade”. Aliena-se os fatos de seu contexto histórico para produzir rótulos. Assim, após o ENEM, a filósofa foi tachada de “pedófila” e de “nazista”. Ambas as afirmações já foram retiradas da página pelo responsável, avisando que a manteria fechada até “que o furor acabasse e as pessoas perdessem o interesse em danificar o artigo”. Entre as dezenas de distorções do verbete, segundo a matéria da BBC, um usuário disse que a filósofa havia escrito um “livro de estupro”. Outro informou que Beauvoir era uma “antifeminista”. Um terceiro disse ainda que ela era “muito conhecida por seu comodismo e pela luta na justiça por uma lei que proibia o trabalho das mulheres fora de casa”.

Se a linguagem nos tornou seres políticos, a destruição da linguagem nos tornará o quê?

As distorções servem à reprodutibilidade da burrice. Ao converter a filósofa no que é interpretado como o mais monstruoso – “pedófila” e “nazista” – o objetivo é tornar impossível refletir sobre o que ela escreveu: “uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher”. A ampla distorção das palavras serve, de novo, ao vazio do pensamento. Pede-se aos burros que a repliquem à exaustão em cliques histéricos. A linguagem, como escreve Marcia Tiburi, tem sido rebaixada à distribuição da violência – também pelos meios de comunicação e pelas redes sociais. “Vivemos no império da canalhice, onde a burrice, tanto como categoria cognitiva quanto moral, venceu”, afirma. “Ela se transformou no todo do poder.”

Aderir é viver. Esta parece ser a frase deste momento de orgulho da ignorância e exaltação da burrice. Aqui, a pergunta se impõe: “se a linguagem nos tornou seres políticos, a destruição da linguagem nos tornará o quê?”.

Na semana passada, foi divulgado na página da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República um estudo que reuniu pesquisadores de diversas instituições, apresentado como o mais completo já feito no Brasil sobre os efeitos da mudança climática. Refletir seriamente sobre a mudança climática é urgente, mas há muito menos pensamento e ação do que o momento exigiria, apesar de estarmos às vésperas da Conferência do Clima em Paris. Assim, a divulgação de um estudo com as conclusões a que se chegou poderia ser uma oportunidade excelente para promover participação e diálogo. Mas, entre as tantas previsões que apontaram para um possível drama climático daqui a 25 anos, em 2040 – doenças, calor extremo, falta d’água e de energia etc –, uma foi destacada por diferentes veículos da imprensa: a possível perda de uma área imobiliária avaliada em R$ 109 bilhões no Rio de Janeiro, devido à elevação do nível do mar causada pelo aquecimento global.

Não as perdas humanas, não a corrosão da vida, não o aniquilamento dos mais pobres e dos mais frágeis. Não. O que se destaca é aquilo que se monetariza, é a perda do patrimônio material, no caso imobiliário. O que merece título é o cifrão. O episódio evoca um dos capítulos mais interessantes de Como conversar com um fascista: “O capitalismo é a redução da vida ao plano econômico. (…) O pensamento está minado pela lógica do ‘rendimento’. Viver torna-se uma questão apenas econômica. A economia torna-se uma forma de vida administrada com regras próprias, tais como o consumo, o endividamento, a segurança pela qual se pode pagar. Tudo isso é sistêmico e, ao mesmo tempo, algo histérico. (…) As palavras funcionam como estigmas ou como dogmas que sustentam ideias orientadoras de práticas”. Se a ordem do discurso capitalista é basicamente teológica, é porque ele funciona como uma religião no âmbito das escrituras e das pregações (em geral no púlpito tecnológico da televisão)”. Se depois de tanto calarmos sobre a mudança climática, falarmos dela a partir da lógica monetária, estamos todos (mais) perdidos.

Precisamos resistir em nome de um diálogo que torne o ódio impotente

Mas é em outro episódio destes últimos dias que a perversão do Brasil atual se revelou em toda a sua monstruosidade: a Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio de Janeiro concluiu em inquérito que o policial que matou um menino de dez anos agiu em “legítima defesa”. Eduardo de Jesus brincava na porta da sua casa, numa das favelas do Complexo do Alemão, quando teve a cabeça atingida por um tiro de fuzil. Sua mãe encontrou parte do seu cérebro na sala. O inquérito isentou de qualquer responsabilidade os policiais envolvidos, por estarem supostamente em confronto com narcotraficantes. Eles teriam apenas “errado” o tiro.

Eduardo estava a cinco metros do policial que o matou. Terezinha de Jesus, a mãe do menino, afirma que não havia tiroteio naquele dia. “Eu parti para cima do policial. Gritei que tinha matado meu filho e ele me respondeu, com seu fuzil na minha cabeça, que igual que tinha matado ele poderia também me matar, porque o menino era filho de bandido. Nunca vou esquecer aquilo. Posso estar em qualquer lugar do mundo, que nunca esquecerei a cara daquele policial”. Ao ser informada por jornalistas que a polícia concluiu que seu filho foi morto em legítima defesa, Terezinha disse que sentia vontade “de quebrar tudo”.

Quando a perversão supera tal limite é porque estamos quase no ponto de não retorno. “Não acabaremos com o ódio pregando o amor”, diz Marcia Tiburi. “Mas agindo em nome de um diálogo que não apenas mostre que o ódio é impotente, mas que o torne impotente.”

Em Como conversar com um fascista, a filósofa defende a necessidade de começar a tentar falar de outro modo. O diálogo não como salvação, mas como experimento, como ativismo filosófico para enfrentar a antipolítica. A política, lembra a autora, “é laço amoroso entre pessoas que podem falar e se escutar não porque sejam iguais, mas porque deixaram de lado suas carapaças de ódio e quebraram o muro de cimento onde suas subjetividades estão enterradas”.

Num país de antipolítica e antieducação generalizada como o Brasil é preciso se mover. É urgente aprender a conversar com um fascista, mesmo que pareça impossível. Expor ao outro aquele que não suporta a diferença. Revelar suas contradições e confrontá-lo pelo diálogo é um ato de resistência. Enfrentar a burrice com a única arma que ela teme: o pensamento.

É isso ou não vai adiantar nem estocar alimentos.

Operação Resgate

Não é de hoje que ando querendo “voltar a desenhar”… Mas sequer consigo arranjar tempo – ou paciência (leia-se “ânimo”) – para ao menos uma caminhada diária, que dizer então dessa tola pretensão?

Bem enquanto – frise-se “enquanto” – isso não ocorre (desenhar, não caminhar), andei resgatando alguns rabiscos que tenho guardado comigo já há muito tempo…

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Este é um dos mais antigos. Se bem me lembro era a ilustração de uma camiseta de meu irmão e que achei bem bacaninha…

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Este aqui, ainda da época do ginásio, vem a provar que desde sempre eu estava fadado a ter uma Harley!

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Quando estudava Administração de Empresas, no segundo grau, haviam algumas aulas simplesmente insuportáveis! E o que me restava era rabiscar nas folhas do meu caderno. Este desenho é fruto de um desses momentos de tédio. Existem outros, mas são impublicáveis…

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Já este daqui, baseado em uma imagem tirada de uma das revistas do Conan, remonta ao tempo em que eu estudava Desenho Técnico Mecânico, na ETEP.

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Falando em Conan, já tratamos deste desenho antes, bem aqui

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Mais alguns devaneios – já não sei mais de qual época…

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Este aqui tem uma longa história – que não cabe nestas parcas linhas. Basta, por ora, saber que foi um “estudo” pensando num “brasão de família”, baseado na figura central, que é a tatuagem que tenho.

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Eis outro desenho que também não sei dizer exatamente de que época foi, copiado de uma das tirinhas do Laerte, referente aos Piratas do Tietê.

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E pra fechar, o guru mutcholoco do Angeli, desenhado quando eu trabalhava no Valeparaibano, como Supervisor de Digitação, e tinha que ficar às vezes horas aguardando o fechamento do jornal…

Vamos ver se crio coragem para trazer algo de novo por aqui. Até mesmo pra saber se ainda resta alguma firmeza nestas trêmulas e ébrias mãos que invariavelmente vos tecla… 😉