Ainda que pela metade, esta é a continuação da aventura
que agora se tornou uma narrativa
Então.
Lembram-se que a estrada tinha mudado de algo como “inacreditavelmente difícil” para apenas “extremamente complicada”? Teimosamente seguindo em frente a estrada conseguiu se tornar “absurdamente impossível”…
Aquelas pedras que faziam parte de alguns pontos da estrada há centenas de metros atrás, agora eram A PRÓPRIA estrada! Sabem aquelas ruas de Paraty, com pedras gigantes, onde não se consegue andar a não ser que seja de tênis? Espalhe um pouco de limo e barro para todos os lados e enfie um carro por ali. É mais ou menos essa a imagem do caminho.
Já não cogitávamos mais voltar. Se aquela caminhonete havia descido, então também era possível que descêssemos. Mesmo num Astra. Isso caso a caminhonete não tivesse despencado ribanceira abaixo. Ah, sim! Ribanceira. Inúmeras. Em curvas fechadas e precipícios vegetais por centenas de metros abaixo. E, para ajudar, em vários pontos da serra minava água da montanha, fazendo com que tudo que não fosse pedra se tornasse um verdadeiro tapete de lama pra lá de escorregadio.
Já não era mais possível ser um mero co-piloto palpitando de dentro do carro. Tomar a direção também não era uma opção – até porque eu não tinha nenhuma intimidade com carros automáticos. Desci e fui caminhando de costas para a estrada e à frente do carro, um verdadeiro guia, batedor naquele nosso safári das letras. Pulando de uma pedra para outra, tentando não escorregar, dançando uma dança de contorcionismos, meio como um Jack Sparrow das montanhas, lá ia eu orientando as manobras do carro:
“Isso… Agora vira tudo pra direita… Acelera! Pára, para! Agora vira pra esquerda… Vem bem devagarzinho… Agora pra direita de novo! Força! Isso…”
E assim por diante. E o carro vindo, todo desengonçado naquela estrada toda torta, às vezes começando ligeiramente a escorregar de lado, em direção à ribanceira, quando eu falava, suando frio: “Alê! Dá uma aceleradinha só, vai, devagarzinho…” E o carro voltava ao leito… Aquilo já havia deixado de ser uma estrada, era quase que meramente uma trilha!
Mas o mais fodasticamente incrível disso tudo foi o grau gigantesco de confiança que ela depositou em mim. Conheço muitas outras mulheres que numa situação como essa simplesmente teriam saído do carro, sentado na estrada e se colocado a chorar. Ela não. Confiou quase que cegamente no meu julgamento de que estava fazendo o melhor possível – mesmo quando o fundo do carro emitia barulhos horripilantes de metal se esfregando nas pedras, como o casco de um Nautilus prestes a arrebentar. E ela, lá. Firme. No mínimo deve ter enfiado a Do Bem e a Do Mal dentro do porta-luvas, só pra não atrapalhar…
Não sei dizer quantas centenas de metros durou esse sofrimento. Eu à frente e ela me seguindo. O medo de o carro quebrar ou enroscar de vez era uma constante. Isso sem falar em derrapar barranco abaixo! O dia já havia amanhecido e, pelos cálculos, sequer estávamos na metade do caminho.
Mas eis que o que já era inusitado acabou nos trazendo algo mais inusitado ainda! Além de todas aquelas pedras no meio do caminho, justamente quando a trilha parecia estar voltando a ser uma estrada, acabamos por encontrar algo totalmente inesperado!
(essa história ainda continua…)