Precisar x Precisar

Essa foi aprendida recentemente (pra dizer a verdade hoje) numa loja de roupas. Segundo a doutora Sheilissima, advogada, consultora jurídica, designer de moda, integrante do Livro Guiness no tópico coleção de sapatos, e gente boa a toda prova:

Quando um homem diz que precisa de uma roupa, significa que realmente está precisando, seja porque sua roupa atual está velha, rasgada, ou seja lá qual motivo for. Já quando uma mulher diz que precisa de uma roupa, significa simplesmente: eu quero.

Consagrado excreto

Essa eu juro que não aconteceu comigo, mas sim com um grande amigo e seu pequeno petiz de tenros cinco anos de idade (o que, aliás, comprova a teoria de que efetivamente, independente do endereço, criança dá trabalho).

De repente, não mais que de repente, o pequenino encontrou lá um lápis, um pauzinho, ou algo similar e saiu pela casa afora, realizando um pequeno ritual. Um dos primeiros lugares foi a cozinha. Chegou, com aquele olhar distante, ar compungido, e mirou sua mãe de alto a baixo.

– Que foi filho? Que é isso? – já perguntou ela com um meio sorriso nos lábios.

(Suspiro profundo) – Deus b’çoe essa cozinha. Em nóm do pai, do fio, espanto, amém.

E deu-lhe as costas (ignorando as gargalhadas que ficaram pra trás), seguindo rumo aos demais cômodos da casa e consagrando-os um a um.

Até que chegou no banheiro.

E lá estava seu pai numa posição, digamos… concentrada. Pensando na vida. Resolvendo os problemas do mundo. Tá bom, tá bom, cagando mesmo.

Ainda assim, isso não o abalou. Recomeçou seu ritual.

– Deus b’çoe esse banheiro. Em nóm…

– Ô filho, dá um tempinho pro papai, vai. Agora papai tá ocupado, tá fazendo cocô…

– Então Deus b’çoe o cocô do papai. Em nóm do pai, do fio, espanto, amém.

E, cumprida a missão, foi embora, deixando seu pai perplexo.

E agora?

Dava ou não dava descarga?

Afinal de contas aquela matéria havia sido transubstanciada pelo seu próprio filho em merda benta…

Tempus fugit (de novo e pra caramba!)

E eis que o primogênito havia pedido uma bicicleta de presente. Afinal a que ele tinha, apesar de já saber andar, estava ficando pequena demais para sua estatura de sete anos de idade. Isso tinha sido lá pelo meio do ano passado. Desde então conversamos bastante e acabamos negociando nos seguintes termos: se ele tivesse comportamento exemplar (dá-lhe Stitch!) no Natal ele ganharia uma bicicleta nova.

Bem, ele fez a parte dele.

E nós fizemos a nossa.

Na manhã de 25 de dezembro, juntamente com outros presentes do resto da tropa, bem no meio da sala e ao lado da árvore de Natal, lá estava ela, aguardando-o. Uma bicicleta novinha em folha da Monark, aro 16, preta, modelo BMX – que muuuuuito antigamente vinha com um tanquinho…

Indescritível a carinha de felicidade dele – apesar de, em seu íntimo, já ter a certeza de que iria ganhar esse presente. E antes mesmo disso, a pedido dele mesmo – caso viesse a ganhar a tal bicicleta – havia me dito para que não tirasse as rodinhas laterais, pois ele queria se “acostumar” primeiro com ela.

Pois bem.

Ontem, ao chegar em casa, ele simplesmente me pediu que tirasse as rodinhas. “Tãotáintão”. Uma recém-adquirida chave de boca de 14mm foi suficiente para essa missão. Tentei, ainda, abaixar um pouquinho mais o selim (ou seleta ou banquinho), mas já estava no limite. Confesso que fiquei com um tiquinho de preocupação, pois nessa bicicleta ele ainda não alcança totalmente o chão.

Que nada!

Saiu andando com a danada como se já tivesse feito isso a vida toda. E, à sua volta, os dois irmãos menores também o acompanhavam, em suas totocas (triciclos), em plena e esfuziante algazarra.

Vendo-o ali, orgulhosamente pedalando sua bike, me perdi um pouco em devaneios ao lembrar que, há não muito tempo, era eu quem o levava com apenas um ano e meio na cadeirinha de minha bicicleta. Aliás, parece que foi ontem que ele começou a andar. Ainda tenho gravado no computador suas primeiras palavras. Continua bem claro na minha memória o dia em que nasceu, bem no começo da tarde de uma quinta-feira, em 1999…

E agora ali está ele, pedalando sozinho sua bicicleta…

É pessoal, o tempo passa…

Dez anos depois…

Tenho certeza que já ouviram – talvez mais de uma vez – velhos fósseis como eu narrando sobre a era pré-cataclísmica cambriana antes dos computadores…

Sim, pois essa coisa de “informação na ponta dos dedos” (dá-lhe Bill!) é recentíssima. Em termos info-evolucionários, ainda estamos engatinhando.

Mas estou me adiantando. Toda história se inicia no mesmo ponto: lá no começo.

E o começo de meu contato com computadores se deu bem no início da década de 80 – não me recordo bem (coisas da idade), creio que lá por 82 ou 83. E a fera tinha um nome: CP-500. Numa época onde as linguagens de programação que “importavam” para o mundo dos negócios eram o COBOL e o FORTRAN, aquela molecada aprendendo BASIC era uma inovação. Sim, BASIC, pois ainda não se falava em PCs e Sistema Operacional era uma coisa que simplesmente não existia. Os dados eram carregados no computador e nossos programas eram gravados em fitas cassete. Não, vocês não entenderam errado não, eram fitas K-7 mesmo – para que pudéssemos executar qualquer programa que tivéssemos escrito tínhamos que conectar um gravador (do tamanho de uma caixa de sabão em pó) no equipamento e carregar os dados. É LÓGICO que todo mundo ao menos uma vez já havia tentado colocar aquela bendita fita com dados no aparelho de som de casa (os chamados três-em-um) pra ver o que saía…

E o tempo passou. Fui acompanhando meio de longe a evolução da espécie, até que no final do ano de 1991 (quando descobri o que era palíndromo), mais por força da necessidade que da curiosidade voltei a ter contato direto com a vida virtual. Era um poderoso XT, com sua romântica tela verde, um drive para disquetes 5 1/4″ e – A-HA ! – tinha ainda um disco rígido de portentosos 10 Megabytes.

Aliás, os disquetes eram um caso à parte. O único disquete que eu havia visto antes era um enorme, de 8 polegadas, quando ainda trabalhava num banco. Já na época do XT, os disquetes de 1,44Mb ainda eram um sonho distante e os que usávamos armazenavam somente 360Kb – o suficiente para carregar um Sistema Operacional DOS 3.30 completo, mais um Wordstar para textos e dBase III Plus para dados. Planilhas precisavam de maior espaço, por isso o Lotus 1-2-3 ocupava um disquete inteiro. Já naquela época o que estava em voga era um programinha italiano que enganava o computador, elevando a capacidade do disquete para inimagináveis 800Kb! Ainda devo ter uma cópia dele perdida nas catacumbas do meu computador.

Mas o tempo foi passando, vieram os 386 com suas telas coloridas e co-processadores matemáticos (só pra quem rodava AutoCAD), bem como a coqueluche do momento: o Windows 3.11 – que rodava muito bem sobre o DOS 5.0.

E, em 1995 o que surgiu? O Windows 95, é claro, trazendo uma nova concepção para o mundo da informática. A multitarefa finalmente parecia que estava saindo dos livros e entrando na vida real. Também foi nesse período que tive meu primeiro contato com o Linux, mais especificamente uma das primeiras distribuições da Conectiva.

Naqueles tempos a Internet para o povão era só um mito, uma coisa que acontecia lá fora e sobre a qual líamos nas “revistas especializadas”. A solução caseira se dava através dos BBS, uma espécie de rede local via linha discada. Alás, a primeira placa de fax-modem a gente nunca esquece: era uma Zoltrix de velocíssimos 28.800 Kbps.

E então, no final de 1996, finalmente conheci a Internet. Havia acabado de me formar em Direito e o escritório no qual eu trabalhava resolveu assinar um pacote: míseros R$100,00 por uma hora de acesso no mês (fora a conta telefônica)! Uma verdadeira pechincha!

Mas os preços foram caindo e as possibilidades se ampliando e o tempo de conexão aumentando. E criei meu primeiro site lá pelo início de 1997. No começo era apenas uma coletânea de links jurídicos para o escritório, e que foi crescendo se multiplicando, passando a ter alguns textos, matérias e por aí afora. Já esteve hospedado nos mais diversos provedores, desde Geocities, Xoom, Iconet, UOL e outros que nem me recordo mais. Teve, também, diversas personalidades, tendo começado sem nome, mais tarde ganhando o título de “Ergaomnes”, se transformado em “Habeasdata”, até atingir a fase de agora: o “Legal”. Que traz em seu bojo um pouco de tudo pelo qual já passou. Ou melhor, já passei

E já decorreram dez anos desde então. Milhares de pessoas já o visitaram nas suas mais variadas fases, mas posso apenas me reportar para aqueles que passaram por aqui no último ano e meio: quase nove mil visitas. É um número modesto, eu sei, mas esse interesse alheio pelas garatujas deste humilde escriba me deixa sinceramente feliz.

Assim, sobre o retrato mais antigo da versão mais antiga que consegui achar deste site em suas origens, com nossas taças virtuais de champanhe, brindemos o soprar das dez velinhas que comemoramos neste mês de janeiro!

Zetética para todos

E eis que ocorre a primeira baixa na eterna batalha dos casais…

Sim, pois não se iludam! Por mais que não queiramos – e de fato não queremos – todo e qualquer casal (qual parte do “todo e qualquer casal” você não entendeu?) vive um diuturno conflito de personalidades, cada qual procurando sobrepujar as artes e manhas de seu cônjuge. Estratégias são traçadas, planos são elaborados, linhas de comportamento são delimitadas. É a guerra que se deflagra!

Não, não estou sendo pessimista (como de costume). Estou sendo realista (é o que todo pessimista diz).

Particularmente eu pensava ter superado essa fase já há anos, mas, recentemente, acabei virando meu grande e curioso olho clínico para mim mesmo – e acabei constatando que não sou diferente de qualquer outra pessoa, independente do tempo de relacionamento que tenham tido. Ou seja, não há que se falar em “fase”. Essa situação é contínua e constante.

Aliás, não há como se esperar coisa distinta do ser humano. Somos seres individuais, com experiências próprias que determinaram um crescimento e desenvolvimento próprio. A vida conjugal faz com que constantemente reavaliemos nossas necessidades, objetivos, desejos e obrigações – em prol um do outro, numa contínua busca de serenidade no relacionamento. Ora, colocar dois indivíduos (frise-se a palavra “indivíduos”) confinados num mesmo ambiente rotineiro é o mesmo que submetê-los ao cozimento em uma panela de pressão. Em fogo brando. E sem água.

E é pra isso que existe a válvula de escape.

Não na panela, na vida.

Tá bom, na panela também…

Mas voltemos ao assunto. Em primeiro lugar não há que se confundir válvula de escape com escapismo. Fugir do problema não vai fazer com que ele se resolva por si só. A válvula de escape à qual me refiro, bem dentro de uma filosofia zen-budista, é a eterna busca do caminho do meio. Já que o confronto é inevitável – e é – o negócio é minimizar seus efeitos. A vida conjugal não nos torna uma terceira pessoa, constituída das duas anteriores. Continuamos com toda a carga íntima de nossa experiência pessoal, de nossas virtudes e de nossos defeitos (frise-se a palavra “defeitos”), carga essa que cada cônjuge se dispôs a ajudar a carregar tanto a sua própria quanto a de seu parceiro.

Mas, às vezes, a carga pesa.

E é justamente nesse momento que devemos ter percepção suficiente para aliviar a carga de nossa cara-metade. E isso não significa necessariamente assumir seus problemas, mas simplesmente dar o estímulo necessário, o empurrão, a palavra de carinho e de consolo que se faz necessária naquele momento.

É abdicar de seus próprios anseios em busca da realização dos anseios do outro. Mas, cuidado! Uma constante abdicação implica numa neutralização do seu próprio eu. E isso também desequilibra a balança. Aquilo que chamo de caminho do meio é impossível de ser trilhado em linha reta: como no andar trôpego do ébrio, sempre vamos um pouco pra lá e um pouco pra cá, às vezes um pouco demais para cada lado, mas numa busca de se manter no caminho.

Equilíbrio. Acho que talvez seja essa a palavra que resume a necessidade dos casais. Uma eterna busca de equilíbrio. E esse equilíbrio só se faz possível com abdicações e imposições mútuas, mas aliado a uma constante análise de se não estamos a exigir ou ceder demais.

Ou seja, é tentar trilhar sempre o caminho do meio.

Hm? A baixa à qual me referi? Não, não se preocupem. Creio que eu e a Dona Patroa vamos muito bem, obrigado. Continuo amando-a de paixão. Quem sofreu um revés foi o mais novo membro da família, o recém-adquirido Opala. Não quer pegar de jeito nenhum. Particularmente suspeito de alguma sujeira no carburador, ou, ainda, da bomba de combustível.

Mas a carinha dela ao me ajudar a empurrar o carro (sim, ela teve que me ajudar a empurrar o Titanic para dentro da garagem), exprimia um misto de ódio e triunfo que, provavelmente, significava o seguinte:

“Bem que eu te disse…”