Mas, na convocatória, a Lelê deixa claro que a desconferência não quer ser nenhum encontro de luluzinhas, e chama também os *masculinistas*. Ok, dirão vocês, mais um *ismo* pra encher o saco, né? Concordo, também não tô a fim de embarcar nessa, mas de qualquer maneira vale o Manifesto Masculinista que a Lelê anexou, com a ressalva de que é de 1985 — relevem-se alguns exageros e expressões, portanto. Destaque pra um item importantíssimo: *Pelo amparo aos pais solteiros e abandonados pelas mulheres amadas desalmadas: creches nos bares*.
1 – CABECINHA
Nas questões ligadas à discriminação e aos papéis sexuais, as mulheres já estão na sua, os homossexuais idem, os bi também, e até os machões se organizam e se solidarizam, como se viu no caso daquele cara que ferrou a mulher no rosto e teve apoio da Associação dos Maridos Traídos, fundada no Ceará. Todos os setores se mobilizam. E como ficamos nós, que não somos mulheres, nem homossexuais, nem bi, e rejeitamos o modelo machista que nos é imposto desde criancinhas como a marca da masculinidade? A resposta está no masculinismo — uma movimentação crítico-autocrítica, reivindicativa, desfrutativa, solidarista e convivencial.
Sabendo que de carta de princípio e discursos generosos a humanidade já está de sacos e ovários repletíssimos, colocamos os dedos nas feridas através de um manifesto e proclamamos, indicativamente, o que rejeitamos e pretendemos transformar para viver melhor.
2 – COMEÇO DE PENETRAÇÃO
MMN – Movimentação Masculina Nordestina.
Símbolo: um cacto ereto ou em repouso.
Observação: um cacto sem espinhos.
* contra o terror machista.
* contra a ditadura clitoriana.
* contra o homossexualismo autoritário.
* pela reconciliação do espermatozóide com o óvulo.
Renunciamos a todas as prerrogativas do poder machista.
Que omem seja escrito sem “H”.
Não nos consideramos superiores nem inferiores às mulheres, aos homossexuais e aos bi: somos diferentes e iguais.
Rejeitamos todos os modelos pré-fabricados de sexualidade, caretosos ou vanguardeiros, partindo de três princípios: 1) carência não se inventa; 2) receita, somente de bolo; 3) vanguarda também é massa.
Somos solidários com qualquer saída (ou entrada) sexual que a humanidade venha a inventar e curtir, desde que não haja imposição e violência. E exigimos que se respeite a nossa opção fundamental: gostamos é de mulher.
3 – APROFUNDANDO A ENTRADA
* Abaixo o guarda-chuva preto. Não somos urubus.
* Abaixo as exigências do paletó e da gravata.
* Contra o relógio bolachão.
* Pelo direito de mijar sentado.
* Pelo respeito ao pudor masculino: mictórios privativos.
* Pelo amparo aos pais solteiros e abandonados pelas mulheres amadas desalmadas: creches nos bares.
* Queremos pensão por viuvez, auxílio alimentação e licença paternidade.
* Não amamentamos mas podemos trocar fraldinha.
* Pela liberação da lágrima masculina.
* Contra o fechamento do mercado de trabalho aos homens: queremos ser secretários, telefonistas, babás, etc.
* Não queremos ser “chefes” de família nem regentes sexuais. Igualdade fora e em cima da cama.
* Queremos trepar mais por baixo.
* Queremos ser tirados pra dançar.
* Queremos ser cantados e comidos.
* Pelo nosso direito de dizer não sem grilos nem questionamentos da nossa masculinidade.
* Pelo direito de brochar sem explicação. Mulher também brocha. Aquele ou aquela que nunca brochou que atire a primeira pedra.
* Abaixo a máscara da fortaleza masculina. Queremos ter o direito de assumir nossas fragilidades.
* Abaixo o complexo de corno. Por que mulher não é corna? Fidelidade ou infidelidade recíproca.
* Cavalheirismo é cansativo e custoso. Delicadeza é unissex. Que seja extinto o cavalheirismo ou se instaure, também, o damismo.
* Queremos receber flores.
* Exigimos a modificação do Pai Nosso:
a) Pai e Mãe nossos que estais no céu…;
b) bendito seja o fruto do vosso ventre, do nosso semen.
* Pela capacitação dos homens, desde a infância, para as tarefas tidas como “essencialmente feministas”. Reciclagem geral. Queremos aprender corte e costura, culinária, cuidado de crianças etc. Em contrapartida, ensinaremos às mulheres: trocar pneu de carro, bujão e fusível; dar porrada, atirar e espantar ladrão; matar barata e rato.
* Pela paternidade responsável e contra a gravidez e os filhos serem utilizados como elementos de chantagem sentimental sobre nós.
* Pelo respeito à intuição masculina.
* Denunciamos a utilização depreciativa das expressões “cacete”, “caralho”, “pra cacete”, “pra caralho”. Exigimos que cada um ou cada uma se posicione: cacete/caralho é bom ou não é? Se é bom, respeitem como ao seu pai ou a sua mãe.
* Protestamos contra o fato do nosso órgão do amor ser representado, simbolicamente, por espadas, canhões, porretes, e outros instrumentos de agressão e guerra. Só aceitamos a simbolização a partir de coisas gostosas e sadias: chocolates, biscoitos, bananas, batons, picolés, pirulitos, etc.
* Denunciamos como principais vias condutoras do machismo: as vovozinhas cândidas, as mulherezinhas dondocas, as mãezinhas possessivas e as professoronas assexuadas.
4 – EMPURRADINHA FINAL
Considerando que muitos masculinistas trabalham dois expedientes, estudam e frequentam um milhão de reuniões e eventos, sem falar das poligamias possíveis, não iríamos incorrer na atitude fascista de inventar mais uma reunião para a comunidade masculinista. Portanto, o nosso princípio de organização é o seguinte: grupos de um, cada grupo obedece a seu chefe. Assembléias gerais com ego, id e superego. Voto de minerva para ego.
Convencidos de que a perfeição não é uma meta e é um mito, procuramos fazer um esforço no sentido de romper com 70% do nosso machismo atual e acrescentar sempre novos itens neste manifesto, aceitando a contribuição crítica e propositiva de todos os masculinistas e outros segmentos sexuais, preservada a nossa opção fundamental pelas mulheres.
Denunciamos os machões enrustidos, que utilizando o discurso masculinista, pretendem apenas dar os anéis para não perder os dedos: recuam em 30% de machismo para manter os 70%. É a Nova República do machismo.
Somos todos oprimidos. E sendo os homens, estatisticamente, minoritários diante das mulheres, isto já nos caracteriza como minoria oprimida. Nós, homens masculinistas, sofremos a pressão dos machões, das feministas sectárias e dos homossexuais autoritários — o que nos caracteriza como a menor minoria oprimida. Requeremos, portanto, o apoio extremo e a solidariedade máxima por parte da sociedade inservil.