Software Livre na Administração Pública – PL 2269/99

( Publicado originalmente no e-zine CTRL-C nº 02, de março/2000 )

Continuando no tema de software livre, encontra-se em votação na Câmara um projeto de lei, de autoria do Deputado Walter Pinheiro, membro da Comissão de Ciência e Tecnologia, que visa utilização de programas abertos pelos entes de direito público e de direito privado sob controle acionário da administração pública. Se aprovado, com certeza os órgãos governamentais poupariam milhares (milhões?) de reais que seriam originariamente dispendidos com software. Ora, um computador que atenda os requisitos mínimos de utilização deve conter, pelo menos, o Sistema Operacional, um Editor de Texto e uma Planilha de Cálculos. Tudo isso está disponível no ambiente Linux, mas como o padrão utilizado pelo mercado é o da Microsoft, temos que, para equipar o dito computador, gastaríamos mais de R$1.000,00 somente em software básico! Multiplique isso pelas centenas (milhares?) de computadores espalhados por aí pelos entes públicos e ter-se-á uma vaga idéia do tamanho do rombo.

Mas se fosse somente uma questão de gasto público o problema não seria tão grande. A dificuldade maior encontra-se no fato de que os entes públicos não liberam facilmente verbas para aquisição de software. Sei de um caso concreto na Polícia Civil do Estado do Espírito Santo, que optou por adotar o Linux após aguardar por seis meses a resposta a um pedido de aquisição de software. A resposta foi: “estamos impossibilitados de atender no momento por falta de recursos financeiros”…

Por fim, lembrem-se que, por enquanto, isso é apenas um PROJETO DE LEI, ainda não é lei. Dependerá tão-somente do bom senso de nossos parlamentares aprová-lo ou não.

JUSTIFICAÇÃO:

Há mais de quinze anos discute-se em todo o mundo a livre manipulação dos programas de computador ou “open/free software”. Em 1984 era impossível usar um computador moderno sem a instalação de um sistema operacional proprietário, fornecido mediante licenças restritivas de amplo espectro. Ninguém tinha permissão para compartilhar programas (software) livremente com outros usuários de computador, e dificilmente alguém poderia mudar os programas para satisfazer as suas necessidades operacionais específicas. O projeto GNU, que data do início do Movimento do Software livre, foi fundado para mudar isso. Seu primeiro objetivo foi desenvolver um sistema operacional portável compatível com o UNIX que seria 100% livre para alteração e distribuição, proporcionando aos usuários que contribuíssem com o seu desenvolvimento e alteração de qualquer parte de sua constituição original. Tecnicamente GNU é como UNIX, mas difere do UNIX pela liberdade que se proporciona aos seus usuários. Para a confecção deste programa aberto, foram necessários muitos anos de trabalho, por centenas de programadores, para desenvolver este sistema operacional. Em 1991, o último componente mais importante de um sistema similar ao UNIX foi desenvolvido: o LINUX. Hoje a combinação do GNU e do Linux é usada por milhões de pessoas, de forma livre, em todo o mundo. Este programa é apenas um exemplo de como a liberdade na alteração, distribuição e utilização de programas de computador poder transformar ainda mais rapidamente, e de maneira mais democrática, o perfil do desenvolvimento social e tecnológico no mundo. O Estado, como ente fomentador do desenvolvimento tecnológico e da democrátização do acesso a novas tecnologias para a sociedade, não pode ser furtar a sua responsabilidade de priorizar a utilização de programas abertos ou os “free software/open source”. E se as pequenas, médias e grandes empresas multinacionais já estão adotando programas abertos, evitando assim o pagamento de centenas de milhões de dólares em licenciamento de programas, porque deveria o Estado, com uma infinidade de causas sociais carentes de recursos, continuar comprando, e caro, os programas de mercado.

Sala das Sessões em 15 de Dezembro de 1999

Deputado Walter Pinheiro
pinheiro@lognet.com.br

PROJETO DE LEI Nº 2269 DE 1999

(Do Sr. Walter Pinheiro)

Dispõe sobre a utilização de programas abertos pelos entes de direito público e de direito privado sob controle acionário da administração pública.

Art. 1º. A administração pública, em todos os níveis, os Poderes da República, as empresas estatais e de economia mista, as empresas públicas, e todos os demais organismos públicos ou privados sob controle da sociedade brasileira, ficam obrigadas a utilizarem preferencialmente, em seus sistemas e equipamento de informática, programas abertos, livres de restrição proprietária quanto a sua cessão alteração e distribuição.

Art. 2º. Entende-se por programa aberto aquele cuja licença de propriedade industrial ou intelectual não restrinja sob nenhum aspecto a sua cessão, distribuição, utilização ou alteração de suas características originais.

Art. 3º. O programa aberto deve assegurar ao usuário acesso irrestrito ao seu código fonte, sem qualquer custo, com vista a modificar o programa, integralmente, se necessário, para o seu aperfeiçoamento.

Parágrafo único. O código fonte deve ser o recurso preferencial utilizado pelo programador para modificar o programa, não sendo permitido ofuscar a sua acessibilidade, nem tampouco introduzir qualquer forma intermediária como saída de um pré-processador ou tradutor.

Art. 4º. A licença de utilização dos programas abertos deve permitir modificações e trabalhos derivados e sua livre distribuição sob os mesmos termos da licença do programa original.

§ 1º. A licença somente poderá restringir a distribuição do código fonte em forma modificada caso permita a distribuição de programas alterados conjuntamente com o código fonte original, objetivando a alteração do programa durante o processo de compilação.

§ 2º. Deve permitir também explicitamente a distribuição de programa compilado a partir do código fonte modificado, podendo para tanto exigir que os programas derivados tenham diferentes nomes ou números de versão, que os diferenciem do original.

Art. 5º. Não poderá haver cláusula na licença que implique em qualquer forma de discriminação a pessoas ou grupos.

Art. 6º. Nenhuma licença poderá ser específica para determinado produto, possibilitando que os programas extraídos da distribuição original tenham a mesma garantia de livre alteração, distribuição ou utilização, que o programa original.

Art. 7º. As licenças de programas abertos ou restritos, não restringirão outros programas distribuídos conjuntamente.

Art. 8º. Os certames licitatórios que objetivem transacionar programas de computador com os entes especificados no artigo 1º desta lei, deverão obrigatoriamente ser regidos pelos princípios estabelecidos nesta legislação.

Art. 9º. Apenas será permitida a utilização pelos entes do artigo 1º, de programas de computador cujas licenças não estejam em acordo com esta lei, na ausência de programas abertos que não contemplem a contento as soluções objeto da licitação pública.

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