Caríssimos, sempre que falo em compartilhar a informação, é mais ou menos isso que tenho em mente…
Publicado na revista Nossa História nº 36, Editora Vera Cruz, em OUT/2006, p. 11.
Cartas, desenhos e fotos são alguns dos elementos da vida do escritor disponíveis em novo site.
Armazenada no Centro de Documentação Alexandre Eulálio, em Campinas, boa parte do acervo de Monteiro Lobato já pode ser consultada de várias regiões do país. O projeto “Monteiro Lobato (1882-1948) e outros modernismos brasileiros” teve financiamento de Fapesp, CNPq e Unicamp para organização, digitalização e interpretação de documentos. Agora, o endereço eletrônico http://www.unicamp.br/iel/monteirolobato abriga correspondência, fotos de família, árvore genealógica, bibliografia, desenhos e pinturas do escritor, e banco de teses sobre sua obra. Um complemento valioso ao que já estava disponível no site www.lobato.com.br.
“Digitalizamos uma parte do acervo e a idéia é ir alimentando o site com mais material de tempos em tempos”, explica Marisa Lajolo, coordenadora da equipe do Instituto dos Estudos de Linguagem da Unicamp, que conversou com NH sobre as possibilidades que a internet dá para a divulgação de arquivos:
Nossa História – Por que ainda é raro vermos arquivos de grandes escritores ou personagens da história brasileira disponíveis na internet?
Marisa Lajolo – A interação com a internet requer uma certa aclimatação, mais do que aprendizagem. Há séculos, a dupla papel-e-tinta vem sendo vista como suporte mais adequado/privilegiado para o registro da história e não é de um dia para outro que – pacificamente – vai dividir espaço com o suporte eletrônico. Além disso, há alguns problemas com a impossibilidade de versões eletrônicas de documentos darem conta da materialidade deles: se se quer estudar questões ligadas a papéis e a tintas é preciso ter acesso aos documentos propriamente ditos e não a cópias digitalizadas.
NH – Há uma desconfiança dos pesquisadores em relação ao potencial e à segurança na rede ou é apenas uma questão de tempo e de verba?
ML – A questão da segurança na web não me parece, essencialmente, distinta da segurança necessária para acervos tradicionais. A questão maior, em meu ponto de vista, é mesmo a “cultura” da área. Arquivos disponíveis na internet democratizam o acesso à documentação e quebram a situação de privilégio de só ter acesso a documentos quem tem condições de se locomover até a instituição que abriga este ou aquele arquivo. E, no varejo, a internet libera o interessado dos horários e eventuais limitações materiais das intituições que preservam documentos.
NH – Há a perspectiva de que o site sobre a obra de Monteiro Lobato sirva de exemplo para outros trabalhos deste tipo?
ML – Algumas instituições brasileiras já disponibilizam documentos em sites. Mas a prática precisa se ampliar e as universidades podem cumprir um grande papel nisso. Trata-se de uma questão de política cultural. Discute-se muito se o brasileiro não tem memória, mas a experiência com o site de Monteiro Lobato sugere que não é bem assim: várias pessoas procuram a Unicamp para doar cartas ou livros raros de Lobato. O mais belo exemplo disso foi da professora Therezinha Antunes, de Pelotas. Logo que soube que a Unicamp tinha a guarda de documentos de Monteiro Lobato, ela nos doou oito cartas que recebeu dele entre 1946 e 1947, quando o escritor morava na Argentina. As cartas são documentos preciosos de um intelectual auto-exilado, extremamente crítico da situação brasileira da época. Temos todo o apoio da família de Monteiro Lobato, mas para divulgarmos as cartas é preciso ter autorização dos demais envolvidos. Na seção de correspondência do site, há uma lista de todos os remetentes e destinatários das cartas do Fundo Monteiro Lobato. Quem sabe sobrinhos, filhos, netos e bisnetos dessa gente toda se animem e permitam a reprodução? Acho que a disponibilização de arquivos torna a história – mesmo aquela com agá maiúsculo – mais próxima de todos.