Literatura Orgânica

“Literatura Orgânica” seria uma espécie de certificação de que determinada obra foi produzida sem a utilização de ferramentas de Inteligência Artificial ou, se utilizada, em qual forma e proporção. Esse conceito – que é bastante interessante – surgiu no meu radar ao ler uma matéria online do The Guardian, publicada em 15/10/2025. Segue a íntegra da matéria, devidamente traduzida (ironicamente, por intermédio de Inteligência Artificial…) e ligeiramente revisada:

Certificado orgânico e livre de IA: novo selo para livros escritos por humanos é lançado

À medida que os livros feitos à máquina inundam os mercados online, uma nova iniciativa do Reino Unido busca introduzir um selo de Literatura Orgânica para ajudar os leitores a identificar livros criados por autores reais

Uma nova startup do Reino Unido está mirando na crescente onda de livros gerados por IA, lançando uma iniciativa que visa verificar e rotular obras escritas por humanos.

A Books By People lançou uma certificação de “Literatura Orgânica”, em parceria com um grupo inicial de editoras independentes.

O esquema envolverá selos de Literatura Orgânica colocados em livros escritos por humanos, com uso limitado de IA permitido apenas para tarefas como formatação ou geração de ideias.

A startup, fundada pela especialista em livros raros Esme Dennys junto com Conrad Young e Gavin Johnston, disse que planeja se expandir globalmente em 2026.

O primeiro título certificado será Telenovela, de Gonzalo C. Garcia [ambientada em Santiago, no final da ditadura de Pinochet, a obra explora a vida secreta de uma família envolvida neste período sombrio da história do Chile], com lançamento previsto para novembro pela Galley Beggar Press, uma das editoras fundadoras. Outros parceiros incluem Bluemoose Books, Snowbooks, Scorpius Books e Bedford Square Publishers.

Sam Jordison, codiretor da Galley Beggar e consultor da Books By People, afirmou que a iniciativa “é extremamente importante para editoras, autores e, principalmente, leitores. É tanto um selo de qualidade quanto uma garantia da humanidade compartilhada que buscamos nos livros.”

“Tenho muito orgulho de ser a editora que terá o primeiro selo — e parece muito apropriado que esse selo vá para Telenovela, um livro sobre a luta pela verdade e contra o autoritarismo.”

As editoras podem se qualificar por meio do comprometimento com os padrões de certificação e de verificações pontuais anuais. As taxas variam de acordo com o número de títulos produzidos a cada ano.

O lançamento ocorre em um momento de tensão acirrada entre as indústrias criativas e as empresas de IA. No início deste ano, a Anthropic concordou em pagar US$ 1,5 bilhão a autores que acusaram a empresa de usar cópias piratas de suas obras para treinar seu chatbot.

Movimentos para destacar a criatividade humana estão ganhando força. Em agosto, a Faber aplicou um adesivo com a inscrição “escrita humana” em exemplares de Helm, de Sarah Hall. Na época, a CEO da Faber, Mary Cannam, afirmou que o logotipo da editora “sempre representará essa origem da escrita humana”.

O lançamento também ocorre em meio ao crescente escrutínio do conteúdo gerado por IA em varejistas on-line, como os marketplaces da Amazon, que, segundo especialistas, continuam sendo um “faroeste” devido à falta de regulamentação em torno de textos gerados por IA, e que informações incorretas perigosas podem se espalhar como resultado disso.

Dan Conway, CEO da Publishers Association, acolheu os esforços voluntários para destacar a autoria humana, mas disse que a indústria não está atualmente pressionando pela rotulagem obrigatória.

“Como Associação de Editores, é fundamental que continuemos a apoiar editores e autores na defesa da criatividade humana e do pensamento crítico”, disse ele, acrescentando que a Publishers Association está incentivando varejistas online como a Amazon a tomar medidas mais firmes contra “conteúdo de baixa qualidade escrito por IA”.

Cá entre nós, achei extremamente positiva essa ideia. É lógico que não bastará meter um carimbo na capa de um livro para garantir esse tipo de “autenticidade humana”; certamente ferramentas serão criadas e equipes serão montadas para administrar a gestão desse empreendimento (se é que já não o foram).

E eu, que tenho trabalhado na reedição de antigos livros de genealogia mediante sua transcrição, vejo essa atitude com bons olhos. Já me perguntaram mais de uma vez o porquê de eu simplesmente não digitalizar essas obras e passar as imagens por um OCR – Optical Character Regonition, ou seja, Reconhecimento Óptico de Caracteres – e minha resposta é sempre a mesma: eu não posso correr o risco de que o original seja deturpado, de modo que, ao transcrever cada página, eu tenho a compreensão macro de todas as ligações genealógicas que estão presentes, tanto no livro em questão quanto em outros correlatos. E em genealogia, a informação fidedigna é essencial.

Dito isso, fiquei mancomunando com meus curiosos botões e lhes perguntei “Por que não tomar eu mesmo uma iniciativa desse gênero?”… Eles não chegaram a me responder, mas tenho quase certeza que concordariam comigo.

Para essa empreitada (estritamente pessoal e não lucrativa) imaginei o seguinte “selo”:

Até que ficou bem bonitinho, né?

Mas para levar adiante esse tipo de coisa, seria necessário estabelecer um conjunto de regras coerentes com a iniciativa.

1. O selo “Literatura Orgânica – 100% humana” certifica obras literárias criadas integralmente por seres humanos, sem o uso de Inteligência Artificial em qualquer etapa da escrita, edição ou revisão, garantindo sua autenticidade, ética criativa e valorização do trabalho intelectual humano.

2. O selo não pode ser utilizado em obras que contenham conteúdo gerado ou editar por IA, sob qualquer forma.

3. Estabelecer definições de diretrizes visuais e éticas para o uso correto do selo em livros, e-books e materiais editoriais (mais ou menos seguindo a linha utilizada pelo Creative Commons).

4. Símbolo livre para utilização em obras efetivamente criadas sem IA, permitido para autores, editoras e instituições que respeitem a autenticidade da autoria.

Bem, não sei quanto a vocês, mas garanto que os meus livros, a partir de agora, só saem pra gráfica com este selo!