A insustentável leveza do ser

Parmênides, um filósofo que já era filósofo antes mesmo de Sócrates (o filósofo, não o jogador), lá pelos idos de 500 a.C. (“antes de Cristo”, ô sapiência!) defendia uma tese acerca das dualidades ontológicas do ser, ou seja, suas propriedades transcedentais do ponto de vista da metafísica. Parece complicado, mas não é. Explico. Como o ser é, por excelência, unitário, então as dualidades surgem de acordo com a sua própria perspectiva, sua percepção do mundo que o cerca, conforme venha notar a presença ou a ausência de uma determinada entidade. Focando no que é o natural, naquilo que seria óbvio, percebe-se a existência de seu contrário. Nesse sentido, o frio é apenas a ausência de calor, o “não-calor”. As trevas são a ausência de luz, a “não-luz”. E, diferente do que poderíamos supor, o peso, por sua vez, seria a ausência de leveza, ou seja a “não-leveza”. Na minha opinião, uma lógica bastante consistente, jogada digna do calcanhar de Sócrates (o jogador, não o filósofo).

Ou seja, o óbvio para o ser humano é o “peso” que surge naturalmente em sua vida, uma “não-leveza”. Esse peso pode ser percebido como um sem número de coisas ou fatores: o peso de um comprometimento, o peso de um engajamento, o peso do medo, o peso da ansiedade, o peso da vida…

Sim, pois não se iluda! A vida pesa, sim – e muito!

Afinal de contas, quantas vezes já não fomos simples e inevitavelmente levados pelo destino ao encontro de uma situação improvável, ingenuamente acreditando que o acaso estaria traçando os rumos de nossas vidas – mas que, sobretudo, estaríamos sempre no controle.

Ledo engano!

Basta puxar pela memória. Pense no passado e como hoje você veio parar onde está, na tão peculiar situação em que se encontra. Tá vendo? Não disse? Minha memória pode não ser tão boa, mas em sua seletividade ela consegue me reconduzir pelos caminhos que já trilhei. Como eu já disse por aqui antes, você pode passar toda uma existência andando pelos jardins de Destino, sempre com bifurcações e múltiplas opções de caminhos. Mas, ao parar e olhar para trás, verá que deixou atrás de si um único caminho trilhado. Assim é o destino.

Então qual é o segredo? Pois, ao perceber a pequenez dessa vida em que vivemos e sobre a qual não temos, de fato, controle nenhum, percebemos também o quanto isso pesa. Como se livrar desse peso?

Bem, se pensarmos como o filósofo ali de cima, a nossa verdadeira busca é tentar transcender para a outra ponta da dualidade que envolve a entidade peso: passar da “não-leveza” para a leveza.

Ou seja, é abandonar o medo de arriscar, abandonar o medo de ser superficial, buscar a leveza da franqueza aliando-a à beleza da sinceridade.

Almejar essas metas são simplesmente um começo. É certo, sim, que buscar deixar pra trás aquilo que te cansa, aquilo que te desgasta, aquilo que te rejeita, bem, não tenha dúvidas: isso tudo gera ansiedade. E ansiedade também é um peso desgraçado para se carregar. E, ainda que não seja preciso, é preciso continuar!

É… Não tem jeito… Viver é para profissionais!

Então deixe de lado a leveza do País das Maravilhas e busque a leveza em sua própria vida.

Sem medo. Sem peso. Sem culpa. Pois culpa também é peso.

Somente com tudo isso em mente – que é e sempre vai ser apenas uma parte do todo – é que será possível dar a devida importância àquilo que realmente é importante.

A vida é assim. Sozinhos viemos, sozinhos nos fizemos e sozinhos partiremos. Mas, nesse meio tempo, façamos com que seja possível mudar o rumo das coisas de modo tal que a vida siga seu rumo, que seja possível compartilhar a alegria que é viver, que seja possível dividir e mostrar que viver é bom – afinal, tem que ser gostoso! Há que se preocupar com quem se preocupa com você, há que se fazer rir, há que se consolar, há que se responder as perguntas (em especial as que não são feitas), há que se acalmar, há que se cuidar.

Há que se ter leveza.

Faça isso. Vai por mim: faça!

Transformar a própria vida não é fácil. E a de outrem, então? Dangerosíssima missão quase que impossível!

Mas, ainda assim, é possível.

E, diferente da canção, a que diz que no coração cabem três vidas inteiras, em cada fase de nossas vidas cabem muitas vidas inteiras…

De minha parte já perdi a conta de quantas vidas tive. E olhe que estou falando somente desta vida!

Bem, é isso Fica a dica. Viva. Deixe viver. Compartilhe a vida. Não há que se preencher o espaço da vida de outrem, mas sim fazer com que perceba como deve ser preenchido.

É isso. Vamos viver. Plenamente. Um dia de cada vez. Com alegria, com amor, com carinho, com paixão, com tesão.

E, finalmente, parafraseando o autor, entenda que as perguntas mais simples são sempre as mais profundas, com respostas por muitas vezes pra lá de complexas.

Quer um exemplo? Fácil. Vejamos a mais simples de todas elas:

“Você é feliz?”

Pense sobre isso de vez em quando e observe suas respostas se modificarem…

 
 

O que nos falta é magia

Antes de mais nada, não, não ando reprisando nenhum dos filmes do Harry Potter ou da série Once Upon a Time aqui em casa – se bem que a ideia não é nada má…

O que acontece é essa inevitável constatação de que, com o passar dos anos, vamos ficando cada vez mais céticos com relação a tudo e a todos. Em especial a todos. As obrigações profissionais vão se sobrepondo às familiares. As obrigações familiares vão se sobrepondo às do relacionamento. As obrigações do relacionamento vão se sobrepondo às pessoais. E, no fim, pergunto-lhes: sobra o quê?

Enquanto perco um considerável tempo aqui matutando – e com a cabeça em background já pensando quais são as minhas obrigações pendentes enquanto tento colocar pra fora um pouquinho desse sentimento – acabo percebendo que o problema é exatamente esse: um problema de tempo. O tempo, literalmente, a cada dia que passa, é matéria cada vez mais escassa na vida de cada um. Afastemos todas as outras variáveis possíveis que determinaram quem hoje nós somos e o que raio estamos fazendo aqui onde estamos e teremos que o tempo é a única variável absoluta com a qual não temos como negociar. Acontece por si só e tudo o mais é por nossa conta. Assumamos nossa parcela de responsabilidade no tocante a isso, ok?

E, nostálgico que sempre sou, olhando para trás vejo o quanto já desperdicei dessa preciosa matéria que se esvai, grão após grão, ampulheta abaixo. E também vejo que a cada punhado a menos de areia, um punhado a mais de ceticismo foi se empilhando em minh’alma. A cidade não é mais um mistério a ser explorado, mas sim uma equação a ser resolvida. O povo já não é mais uma fonte de curiosidades, mas sim uma população crítica e eternamente descontente. O céu já não é mais tão azul, as matas já não são mais tão verdes, sequer os rios possuem o mesmo frescor. Tudo isso se perdeu no outrora. E a vida ficou mais cinza e maçante.

Falta-me leveza para o dia a dia…

E o que me veio à mente nessa minha constante e incessante busca de um tiquinho de qualidade de vida foi a lembrança de um tempo perdido, num lugar que não existe mais com gente que, provavelmente, também já não. Namorava então com aquela que viria a ser minha esposa (e que também viria a deixar de sê-la) e numa noite quente ela propôs que fôssemos à casa de sua madrinha, para visitá-la. Logo imaginei a gente sentado em sofás de tecido estampado, numa salinha pequena e de janelas grandes, com mesinhas cheias de badulaques sobre toalhinhas de crochê, enquanto tomávamos chá com rosquinhas feitas em casa e sua idosa madrinha nos contava, tediosa e chorosamente, sobre o saudoso e finado marido.

Ou seja, o último programa na face da Terra que um adolescente fervilhando nos seus 17 anos de idade gostaria de fazer num sábado à noite, ainda mais acompanhado da formosidade que era sua namorada.

E é lógico que eu, desde então já sendo um idiota no que diz respeito a assuntos sentimentais, prontamente concordei.

Naquela época, nos idos da década de oitenta, quando o excesso de carros e a falta de mobilidade urbana ainda não eram os temas preferidos de dez entre dez cidadãos, restavam-nos os ônibus, as caronas e as longas caminhadas. Neste caso, a última.

Meu silêncio sepulcral no decorrer do caminho só era sobreposto para a sorridente carinha de lambeta que ela ostentava. Que raios aquilo queria dizer, afinal de contas?

E então chegamos.

E – surpresa das surpresas – nada mais distante da realidade que eu havia racionalizado na minha mente!

O primeiro choque foi conhecer a madrinha propriamente dita, já na porta da casa. Hoje calculo que, na época, ela deveria ter uns trinta e poucos anos. Uma mulher alta, linda, longos cabelos pretos, cheia de anéis, brincos e colares, usando uma psicodélica saia hippie que vinha até os pés.

O segundo choque foi a casa em si. Uma acolhedora casinha, já quase nos arredores do bairro, fantasticamente decorada com tudo o que se possa imaginar no que diz respeito a material hippie. Os caquinhos na parede do lado de fora, as cortinas para passar por entre os cômodos, os tapetes trançados, os móveis de bambu ou reciclados, os adornos pendurados, espalhados, afixados por todos os lados, enfim, tudo aquilo fazia um mosaico, ou melhor, um caleidoscópio de cores, imagens e sons simplesmente maravilhosos.

E, sim, eu disse sons. Porque do lado de fora, nos fundos, num amplo pátio protegido por uma frondosa árvore e com plantilhas e vasinhos espalhados para todos os cantos que se pudesse olhar, estava um grupo simplesmente fora de série! Em tamboretes e banquinhos improvisados faziam uma verdadeira roda de samba, tocando e cantando não só os grandes clássicos, de Adoniran a Chico Buarque, como ainda intercalando com músicas de sucesso da época, como Legião, Paralamas e por aí afora. E, temperando tudo isso, no meio do grupo, uma garrafa com uma deliciosa cachaça que aguardava sua vez de, por cada um, ser saboreada. Não rolava, como hoje, os (caros) excessos de cerveja, mas sim um módico bebericar de uma cachacinha enquanto se cantava, conversava, discutia e se resolviam os problemas do mundo…

E era isso. Simples assim. Não mais que de repente um véu se rasgou e fui apresentado a um mundo novo, uma dimensão paralela, que estava ali, presente, bem do meu lado. Naquele mesmo lugar conheci e reconheci muitas pessoas maravilhosas e, dentre elas, o Braz da Viola, figurinha pra lá de carimbada e ali mesmo combinamos que iríamos todos acampar no alto da Pedra do Baú, em São Bento do Sapucaí. Mas isso já é uma outra história!

Enfim, perguntam-me vocês, onde afinal de contas eu quero chegar com esse causo?

Em lugar nenhum. É somente para demonstrar como a vida era mais fácil e intuitiva em tempos passados, quando a ampulheta ainda estava bem mais cheia. Nos dias de hoje, nestes dias em que nos circunda a horrenda figura do “politicamente correto”, nestes tempos em que, diuturnamente conectados no mundo virtual, nossas obrigações clamam cada vez mais por atenção, fazendo com que horas pareçam minutos, sinto falta dessa época em minha vida. Era meio que como surfar no dia a dia, passando por cima e à parte da sociedade, do tempo, de tudo, simplesmente aproveitando aquele momento, aquele tubo, aquela onda – que jamais voltaria a surgir, mas que trazia, então, o equilíbrio perfeito para nossas vidas. Para minha vida.

E é exatamente esse tipo de magia a que me refiro…

Por uma voltinha de bicicleta…

O matemático Edward Norton Lorenz, nos idos da década de sessenta, desenvolveu a tese básica de que “situações iniciais ligeiramente diferentes podem se desenvolver em situações consideravelmente diferentes”. Sei que parece um pouco confuso, mas – vejam só! – este é exatamente o enunciado primordial da “Teoria do Caos”.

Particularmente prefiro um dos corolários da Lei de Murphy (aquele velho sacana e que tem a cara do House) em que diz que “se uma série de fatos pode dar errado, dará errado na pior sequência possível”.

Dito isso, vamos aos fatos. Isolados em sua essência, mas conectados em sua conclusão. E cheio de links para vocês se divertirem…

Desde a adolescência minha coluna vertebral já possuía uma ligeira “deformação morfológica em curva dupla” – o nome é pomposo, mas nada mais é que a chamada “escoliose em S”. Durante muitos anos isso me causou dores e desconforto, mas, como com tudo a gente se acostuma, ela sempre estava ali, presente, às vezes com algumas crises e outras, por longos períodos, sem sequer me incomodar. E isso somente “sarou” após o acidente. Desde então ganhei um joelho que dói o tempo todo e vive clamando por atenção, de modo que a escoliose foi alçada para um segundo plano, praticamente imperceptível. Até hoje.

Independentemente disso, desde a mais tenra idade sempre adorei andar de bicicleta. Sozinho, em bando, para me divertir, para me distrair, para me desestressar ou, simplesmente, para namorar. E, sim, isso é da profícua década de oitenta, época em que nós, meninos, levávamos as moçoilas para dar uma voltinha sentadas no quadro da bicicleta, entre o selim e o guidão, totalmente aninhadas em nossos braços. Como desde aquela época eu já não dava ponto sem nó, a minha bicicleta era a única que tinha uma almofada para elas sentarem, então nem preciso dizer por quem elas preferiam ser levadas, né? E, assim, bateu uma vontade de dar umas pedaladas, pois já fazia muito tempo que eu não tirava a bicicleta do lugar. Até hoje.

Isso porque nos últimos tempos tenho estado mais sedentário do que jamais fui na minha vida. Totalmente acomodado. Desde a cirurgia no joelho, em 2012, que comecei a me acomodar. Até que, durante a recuperação, ainda estava fazendo meus alongamentos, algumas caminhadas e por aí afora. Daí veio um inverno terrível e uma preguiça maior ainda. O inverno passou. A preguiça, não. E, hoje pela manhã, numa conversa sincera com a dona balança, cientes dos três dígitos que teimam em não baixar, juntos chegamos à conclusão que estava na hora de uma nova dieta! Afinal de contas minha boa e velha bicicleta – que, diga-se de passagem, eu mesmo montei – está encostada lá na garagem, num canto, soterrada pelas bicicletas da Dona Patroa e dos meus filhotes, acumulando camadas seculares de poeira. Somente assim, com um pontapé inicial, eu sairia desse sedentarismo que diretamente estava me incomodando. Até hoje.

E, último dos fatos que interessam para nossa narrativa, temos meu sogro. Sim, aquele bom e simpático velhinho, um japonês de 82 anos, que mora conosco, mal fala uma palavra de português e surdo como uma porta de carvalho. Dupla. E que, como todo japonês velhinho tradicional, tem uma compulsão mania de guardar coisas. Acumular, mesmo. Alguns dizem que é uma tradição herdada desde a época dos tempos difíceis da guerra, quando nada se tinha e era preciso guardar tudo o que fosse possível e usar de muita criatividade para aproveitar tudo isso para as coisas práticas do dia a dia. Aquele negócio de que “vai que um dia precisa, né?”. Bem, dessa genética pela guarda de quinquilharias e criatividade para usá-las, meu sogro tem de sobra. E, numa dessas, num canto bem ao lado das bicicletas, tem um monte de caibros, madeiras e ripas, variando de dois a três metros de comprimento, desordenadamente acumulados para que, como sempre, algum dia jamais viessem a ser utilizados. Ou sequer tirados do lugar. Até hoje.

Já começaram a perceber o tamanho da encrenca, né?

Então.

Hoje, logo pela manhã, munido mais de ânimo que de bom senso, resolvi que já era hora de sair do marasmo. Como meu pé ainda está meio avariado do tombo da moto (não este – ainda – não tem link) correr não é possível, caminhar é quase uma opção, mas andar de bicicleta seria tudo de bom! Logo após o café fui até a garagem com o firme intuito de encher os pneus da bicicleta – vazios já há muito. Faria isso, subiria para ler o jornal com uma boa xícara de café, desceria novamente já com um balde d’água, constataria que os pneus estão bons, faria uma bela duma lavagem e limpeza na menina e, ato findo, sairia para dar uma boa e saudável voltinha de bicicleta. Me cansaria um tanto, suaria outro tanto, mas, feliz, voltaria para casa endorfinicamente com uma sensação de dever cumprido. E seria só o começo! Plano perfeito.

Ou quase.

Isso porque o fiadaputa do Murphy resolveu que era o momento ideal para combinar de modo magistral todos os fatos isolados anteriores que já acabei de descrever…

E, lógico, ao começar a desvencilhar as bicicletas da Dona Patroa e dos filhotes que estavam impedindo de tirar a minha, não percebi que parte daquelas madeiras estavam sutilmente apoiados nelas. A não ser quando já era tarde demais. Já foram pegos de surpresa por uma chuva quando estão no meio da rua? Ou pela água gelada do chuveiro quando esperavam que estar quente? NADA DISSO se compara a receber no lombo uma chuva de caibros e ripas e madeiras e sei lá mais o quê quando menos se espera. Do susto, da cacetada, da exagerada torsão no corpo para me desviar do que ainda não tinha me atingido, restou somente a mais antiga e familar dor que me acompanha até hoje.

E meu bom humor matinal se esvaiu junto com a poeira que baixava no chão da garagem.

Com toda a sutileza e cuidado de um mastodonte em fúria coloquei as madeiras de volta no lugar.

Carinhosamente, como um babuíno selvagem, empilhei todas aquelas bicicletas de volta no lugar.

E agora, calmo como no decorrer de toda essa desventura, ciente e cioso da necessidade de cuidar deste templo que é meu corpo, deixo-lhes a refletir sobre todas essas conexões que nos envolvem, e, enquanto isso, vou pegar minha moto e me dirigir até o boteco mais próximo para uma cervejinha gelada.

Pois três quarteirões é uma distância muito longa para ir a pé…

História de uma multa

E então o caboclo, sabe-se lá por quais motivos, precisou transportar a moto de um lugar para outro.

Fez o de praxe: tirou a máquina da garagem, trancou tudo, deu partida, aguardou um tempinho pra esquentar (sim, ele sempre foi cuidadoso), colocou o capacete, afivelou, refez o trajeto mentalmente, engatou a primeira e foi.

Mas não foi longe – na realidade bem ali perto. Isso porque o transporte ia ser feito usando o reboque de um amigo. Chegou, deu uma buzinadinha, foi atendido – o carro e reboque já estavam na rua – colocou uma prancha, subiu com a moto, prendeu-a de modo bem firme, desceu do reboque, agradeceu o amigo, pegou a chave, ligou o carro, engatou a primeira e foi.

Um dia até fresco num bairro tranquilo, abriu a janela, cotovelo apoiado, um olho na rua, outro no retrovisor e seguiu seu caminho…

Mas a cada semáforo percebeu que as pessoas invariavelmente apontavam em sua direção e algumas até mesmo riam. Esquisito aquilo. Olhou pra trás: a moto estava bem firme lá no reboque. Paciência. Gente esquisita, essa. Continou seu caminho.

De repente – já viu de longe – um comando lá na frente. “Tudo bem”, pensou consigo mesmo. “Toda documentação está em ordem, tanto do carro, quanto da moto e até mesmo do reboque. Se me pararem vão perder seu tempo comigo.”

E não é que mandaram que parasse?

Sorriu, deu uma acenadinha, reduziu a marcha, ligou a seta, encostou o carro, puxou o freio de mão, desligou o motor, abriu a porta, desceu, já meteu a mão no bolso, tirou a carteira, puxou os documentos e, ali na rua mesmo, dirigiu-se ao guarda.

– Documentos, né? Tá tudo aqui, ó: os do carro, da moto, do reboque, minha habilitação…

– Meu senhor, está tudo bem?

– Uai, tá sim.

– O senhor tem certeza?

– Claro que tenho certeza. Que coisa! Olha, se o senhor puder já conferir os documentos e me liberar, é que eu tô meio com pressa, sabe?

– Meu senhor, por favor venha aqui para a calçada. Precisamos conversar.

– Seu guarda, não estou entendendo. O que é que tá pegando? Por que é que o senhor está me tratando assim?

– O senhor tem certeza que não sabe?

– Claro! Não estou entendendo nada!

– Olha, quando vi o senhor vindo já achei esquisito. Por isso que pedi pra que encostasse o veículo. Agora que o senhor desceu e está aqui conversando comigo, estou achando muito mais estranho ainda. Por favor, insisto, venha aqui para a calçada.

– Seu guarda, faça o favor de explicar o que é que está acontecendo!

– Então vamos fazer o seguinte: primeiro, acalme-se. Agora, se o senhor fizer o favor de tirar esse capacete então poderemos conversar com calma, tá certo?

Só então, só daí, já morrendo de vergonha, foi que ele percebeu o que realmente estava acontecendo desde o momento que saiu de casa…

Quié?

Vocês estão achando que tudo isso é invenção, é?

Bem, com multas como essa abaixo, já dá pra perceber que não…

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