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Hoje eu fiz algo que há muito tempo não fazia. Andei na chuva. Aquela chuva forte que nossas mães nos recomendavam evitar para que não ficássemos gripados. Andei de peito aberto, sorrindo, um louco de braços abertos debaixo d’água ao olhar de estranhos. E a chuva me veio a limpar a alma, a sepultar as culpas, a afastar tudo aquilo que me corroía. A Chuva. Me limpou. Não me importa os incrédulos. Eu ainda sou o louco bailando na chuva… 😀

Volta ao Mundo em 80 Horas – VIII

VIII – E quando você acha que tudo acabou…

(Para os desavisados de plantão: esta é a conclusão da narrativa de uma de minhas desventuras que comecei a contar no final de 2016 – já há quase quatro anos! – e que até agora ainda faltava um desfecho. Nada demais, apenas um pré-infarto pelo qual passei. Se quiserem saber como tudo isso começou ou rememorar o causo desde o princípio, desçam direto lá para o final deste texto e cliquem no link “Início da Saga”.)

(Mais um recadinho do coração para um avisado de plantão: o amigo Hideki me cobrou por mais de uma vez quando sairia a continuação desta “saga” e, brincando, lhe disse que seria antes do capítulo final da Caverna do Dragão (entendedores entenderão). Pois é, meu amigo. Falhei com você. Pois finalmente esse capítulo saiu (está disponível aqui) e eu ainda não tinha conseguido terminar estas mal traçadas linhas. Perdoe-me. Agora que já fiz a média com meu vasto público de uma pessoa, continuemos de onde paramos!)

E finalmente chegamos na manhã de sábado! Durante quatro incompletos dias estive internado, numa viagem em torno de mim mesmo que durou cerca de 80 horas (Júlio Verne que me perdoe o infame trocadilho) e agora estava eu ali, com a alta na mão, uma lista de remédios a comprar e exames a fazer e sem ter como ir pra casa (dramático, não?).

Sinceramente não me lembro mais o motivo pelo qual a Dona Patroa não poderia me buscar naquele horário matutino – com certeza alguma correria com a criançada – mas, como diz o ditado, “quem tem amigo, não morre pagão”. As mesmas amigas que vieram tripudiar de minha internação também estavam disponíveis para me dar uma carona para minha casa, na cidade vizinha de onde eu estava “hospedado”.

Mas antes mesmo de voltar para meu abençoado lar e para os braços de minha amada, idolatrada, salve, salve, Dona Patroa, ainda precisava comprar a batelada de medicamentos que teria que tomar por algum tempo. Passamos em uma farmácia próxima do hospital e fui encantadoramente apresentado ao Programa Farmácia Popular, uma iniciativa criada pelo Governo Federal para distribuição de medicamentos com custos reduzidos, ou mesmo de forma gratuita, e que visa a universalização do acesso aos serviços voltados à saúde – principalmente no que diz respeito aos medicamentos referentes à diabetes e hipertensão arterial – de modo que não haja interrupção no tratamento dos pacientes em decorrência de uma eventual falta de dinheiro.

E como sou usuário de carteirinha do SUS e aparentemente “hipertensão arterial” tinha tudo a ver com o que passei, é lógico que saí dali com toda uma farmacopeia digna de fazer inveja a qualquer indústria química…

Pois bem. Apesar de ter tido alta e ter perdido (desinchado) uns cinco quilos no processo, ainda existem mais duas intercorrências dignas de nota.

Como acabei de lhes dizer, além dos remédios em si, também saí com a missão de fazer alguns exames específicos. O primeiro deles foi um teste ergométrico, ou seja, enfrentar uma esteira de forma monitorada para ver a quantas andam as batidas do combalido e sempre apaixonado coração deste que vos tecla.

Agendamento feito, no horário marcado compareci na câmara de tortura no consultório onde iria fazer o teste. O atendente-enfermeiro, muito atencioso, me explicou detalhadamente como seria: começaria com uma caminhada tranquila na esteira e, aos poucos, ele iria aumentando o ritmo e monitorando os resultados até uma determinada velocidade específica (ou até que eu fosse atirado pela janela por não ter conseguido acompanhar essa velocidade). Simples, prático e aparentemente indolor. “Então vamo que vamo!” Ato contínuo ele pediu para que eu tirasse a camisa para colocar os eletrodos.

– Xiiiii…

Caráy! De novo? Lembram-se lá no começo da saga que eu lhes falei dos meus nada ralos pelos no peito? Então. Ele coçou a cabeça, fez alguns testes para tentar colar um ou outro eletrodo, deu um passo pra trás e sentenciou:

– É. Não tem jeito. Vai ter que raspar.

– CUMÉQUIÉ???

– Eu tenho mais de uma dezena de eletrodos que preciso espalhar em diversos pontos específicos de seu corpo para que o teste possa ser validado. Eles têm que ficar bem firmes. Só que com toda essa Mata Atlântica aí não vai ter jeito.

– (Suspiro resignado) Quer dizer que vou ter que virar um atleta da natação, com peito pelado e tudo mais?

– Não! Basta raspar somente nos pontos que vou colocar os eletrodos, não precisa ser tudo não. E isso cresce rapidinho, você vai ver só!

Bem, como diz outro ditado, “já que está no inferno, abrace o capeta”. E lá foi ele dar uma “raspadinha” nos tais dos pontos específicos. Nem quis olhar. Depois de tudo colado e eu me sentindo uma daquelas marionetes do Cirque du Soleil de tanto fio que saía de mim, começamos o teste. Não vou entrar em detalhes de quanto tempo durou ou como foi minha (nada) atlética performance sedentária perante uma esteira que, eu nem sabia, podia chegar à velocidade de uns oitenta quilômetros por hora. Ao menos foi isso que me pareceu.

Concluído o teste e eu, com algumas pontadas nas costelas e com o coração parecendo que tinha acabado de participar de uma competição de taikô (aqueles tambores japoneses), ainda estava tentando recuperar o fôlego enquanto pontinhos prateados bruxuleavam à minha frente, e o atendente-enfermeiro-demônio-torturador já começou a arrancar todas as centenas de eletrodos que havia espalhado pelo meu corpo (provavelmente tendo colado com SuperBonder). Assim, sem cerimônia nenhuma. Já foi puxando e descolando na raça um por um. Sem um chamego. Sem um carinho. Sem um “vem cá meu bem”… Que puxa.

Só então tive coragem de dar uma olhada para baixo e ver o que sobrou do meu estofamento.

Lembram daqueles antigos filmes de guerra, com crateras gigantescas das explosões dos campos minados? Ou uma mata que tenha sido bombardeada e foram abertas clareiras nos locais mais inusitados? Ou um avião com horrendos buracos na fuselagem? Então. Foi mais ou menos essa a impressão que tive quando olhei para minha pobre caixa torácica.

Resultado disso tudo? “Arritmia não constante nos picos de esforço.” Ou seja, NADA. Normal. Segundo ele, qualquer pessoa que coleciona anos de sedentarismo e se submete a um teste de esforço como aquele vai ter esse mesmo diagnóstico. E, no mais, até que eu tinha aguentado bem, já que ele tinha dado um gás a mais no final só para ver se eu aguentava. Foi assim que, enquanto me despedia, olhos nos olhos, sorri carinhosamente enquanto pensava “fiadaputa!”

Ainda cansado, o fôlego irregular, fui para o carro pensando em mil coisas e no próximo exame que ainda teria que fazer. Ao colocar o cinto de segurança senti uma violentíssima fisgada, assim, bem aqui do ladinho, abaixo das costelas. Fiquei lívido. Num átimo de segundo inúmeras situações se descortinaram à minha frente. Será que eu tinha me esforçado demais? Será que prejudiquei algum órgão interno? Afinal de contas o que é mesmo que a gente tem aqui do lado? Não entendo bulhufas de anatomia! Soltei o cinto e enquanto levantava a camisa para apalpar onde doía fiquei imaginando o que seria. Será o baço? Será o rim? Será o fígado?

ERA UM ELETRODO!!!

O desinfeliz do Torquemada 2.0 havia esquecido um eletrodo na minha carroceria e quando ajustei o cinto fui espetado de uma maneira espetaculosa que eu nem sabia que era possível!

Arranquei o eletrodo e a pele que o forrava, joguei no lixo e, praguejando, fui pra casa.

Mas ainda faltava mais um exame.

O derradeiro exame seria o de cateterismo. Basicamente trata-se de enfiar uma mangueira (e vamos parando com esse pensamento pecaminoso aí!) em uma artéria até alcançar as vizinhanças do coração e soltar um líquido especial – o tal de “contraste” – para verificar se há algum entupimento no encanamento.

Me foi esclarecido que, basicamente, seriam quatro as hipóteses acerca da minha situação: normal; veias com paredes finas; com entupimento leve (até uns 20%); ou com entupimento pesado (70% ou mais de obstrução). Nesse último caso é considerado pra lá de preocupante e seria um forte candidato a algum tipo de cirurgia de desobstrução.

Apesar de ser um procedimento relativamente simples, essa “mangueira” – ou melhor, “cateter” – deve ser introduzida (sem gracejos, você aí do fundo) pela artéria da coxa ou do braço. Na maioria dos casos a probabilidade maior é que seja mesmo através da artéria femural, na coxa, o que implica em algumas restrições pós-procedimento: três dias sem esforço nenhum, sete dias sem esportes, e oito dias torcendo para que a Dona Patroa não expulse aquele vagabundo do sofá.

Mas não deixa de ser um “procedimento”. E com isso sempre há alguma preocupação. Amigos e família ficaram sabendo pelo que eu iria passar e não deixaram de me encaminhar diversas mensagens de ânimo:

– Vai dar tudo certo.

– Tenha fé em Deus.

– A gente confia na ciência, mas, ainda assim, boa sorte!

– Deixa o cesto de roupa suja pra fora quando for tomar banho.

E no dia marcado lá estou eu na clínica, de novo com a porra do avental de bunda de fora – mas ao menos agora com direito a touquinha e sapatinhos… Uma graça que vocês nem imaginam…

A enfermeira veio me posicionar no equipamento e avaliar por onde seria a introdução (óóóiii…). Concluiu que eu tinha uma veia boa, com uma pressão boa (“de menino!”, ela disse) e poderíamos fazer pelo braço mesmo. Vou lhes contar: não é uma dor, é uma espécie de desconforto. É como se uma longa minhoca viesse se esgueirando braço acima, parece que se aproxima da garganta e então, de repente, mergulha em direção ao coração. Muito esquisito. Na sequência é baixada aproximadamente meia tonelada de equipamento sobre o peito e tudo que lhe resta é ficar ali, quietinho e imóvel, com mais de um metro de mangueira enfiada pelo seu braço e torcendo para que a) o resultado do exame seja benéfico, b) que o braço mecânico que segura aquela parafernália não desmonte sobre você, e c) será que vai dar tempo de passar no boteco e tomar uma breja antes de ir embora?

Bão, enfim, pouquíssimo tempo depois, uma vez que injetado o contraste e feitas as chapas, o exame já estava concluído e enquanto eu me vestia o médico me veio com os resultados.

– Parabéns!

– Pelo quê, messs? Vou ganhar uma ponte de safena ou algo do gênero?

– Não, nada disso, muito pelo contrário. Seu exame foi excelente. Suas veias estão limpas e saudáveis. Lisas como um bumbum de bebê!

– Não!

– Sério!

– Doutor, eu tenho, hoje, 47 anos. Disso, quase uns 35 de esbórnia. O que o senhor está me dizendo é que estou garantido para mais uns 35 anos de farra?

– NÃO, não foi isso que eu disse, eu só comentei que…

Mas eu já não estava mais ouvindo. Para o desespero Dona Patroa, que estava na expectativa que minhas veias estivessem equiparadas a um cano de esgoto pantanoso após tantos anos de patuscadas, não teria mais como ela implicar com minhas eventuais cervejinhas. Não que ela vá deixar de implicar com minhas (nada) eventuais cervejinhas!

Mas com esse último exame concluímos toda essa desventura que me deu um belo susto, me fez passar três dias na UTI e me fez chegar a conclusões, no mínimo, interessantes.

Ora, minhas veias estavam perfeitas, sem entupimentos (apesar da ferrugem de Opaleiro que por ali circula). Meu coração continuava batendo forte (fraco somente para as paixões que a vida nos apresenta). Meus pulmões estavam em dia e com a respiração normal (exceto para tudo aquilo que me tira o fôlego). Ou seja, então por que catzo eu passei tão mal e fui parar no hospital?

Olhando pra trás creio que a resposta seja uma só: ansiedade.

O que muito provavelmente eu tive foi uma GIGANTESCA crise de ansiedade, ainda que não tenha percebido. Isso porque quem sinalizou foi meu corpo, pois na minha cabeça tudo estava normal. Vejam só: após longos 16 anos trabalhando na Prefeitura, 8 cuidando de todas as licitações do Município e outros 8 como Secretário de Assuntos Jurídicos, eu meio que me acostumei a trabalhar sob pressão. Pressão absoluta. Tudo é pra agora e não há como delegar. E no final de 2016 o nosso partido perdeu na cidade, o que significava que no dia 31 de dezembro cada qual tomaria seu rumo. Mas nesse meio tempo era minha obrigação ajudar a preparar tudo para a transição, disponibilizando todas as informações necessárias para o novo governo. E pensar no que fazer a partir de 1º de janeiro. E como pagar as dívidas que ainda estavam em aberto. E como dar o melhor encaminhamento para a parte de minha equipe que também estava saindo (servidores comissionados). E como lidar com a arrogância e despeito da parte da minha equipe que ficou na Prefeitura (servidores de carreira). E mil e uma outras pequeninas coisas com que eu teria que lidar antes do final do ano e depois que ele acabasse.

Como eu disse, na minha cabeça estava tudo normal, pois trabalhar sob pressão já era o meu padrão no dia a dia. Mas meu corpo abriu o bico. Não aguentou. E me obrigou a desacelerar mais que bruscamente antes que entrasse em colapso total. Pura ansiedade.

Desde então não tenho mais levado a vida tão a sério. Não que eu fuja de minhas responsabilidades, mas sempre procuro fazer avaliações acerca daquilo que me compete. Isso é realmente urgente? Isso é realmente necessário? Eu preciso mesmo disso? Tenho aprendido a viver mais tranquilo, com menos esforço, ganhando o que me é suficiente, compartilhando mais, convivendo mais com outras pessoas…

Acho que ainda estou longe da qualidade de vida que eu consideraria ideal, mas, cá entre nós: o que é “ideal”? Pois é, eu também não sei. Mas enquanto não descubro, só sei que vou levando. Me preocupando e cuidando com aquilo que está ao meu alcance, sem sofrência por aquilo que não me compete.

E com isso encerramos nossa volta ao meu próprio mundo e que resultou nessa bagunça toda que vocês tiveram a pachorra de acompanhar, sendo que, em verdade, em verdade vos digo: nem doente eu estava!

E só sei que foi assim!… 😉

(Início da Saga)                        (…acabou!)

Apenas um registro…

Diário de Bordo. Data Estelar: centésimo octogésimo sexto dia da Era Covid. Confinamento. A fronteira final. Estas são as viagens, elucubrações e alucinações de um nada ortodoxo causídico cinquentão que teima em ficar em casa, mas nem sempre consegue.

Já faz um bom tempo que estou ensaiando para tentar escrever alguma coisa que preste por aqui. Às vezes tenho lampejos de ideias excelentes para colocar no papel (ou na tela), mas quando percebo, já foi, evanesceu, esvaiu-se…

Desde o início da pandemia publiquei muitos textos alheios que achei interessantes – e alguns excelentes – mas de minha autoria mesmo foi bem pouca coisa: fiz uma comparação da quarentena com o teor do livro Decamerão, escrevi mais um capítulo sobre aquela minha internação na UTI (êita novela sem fim!), contei um causo vexatório envolvendo a Dona Patroa lá da nossa época de namoro, dei algumas dicas sobre higiene em época de quarentena, compartilhei gratuitamente meu livro para quem quisesse baixar, apresentei a melhor justificativa de lei de todos os tempos, falei do uso de máscaras pelos personagens de HQs, expliquei as complicações em minha relação com meus filhos, falei sobre as dificuldades da comunicação nos dias atuais e ainda consegui resgatar uma de minhas primeiras crônicas, antes mesmo de começar a escrever nesse formato aqui no blog. Se considerarmos que essa foi minha “produção” em 186 dias de quarentena, então não é quase nada.

E vinha eu levando mansamente minha vida, quieto cá no meu canto, fazendo meus trabalhos dentro do possível e com alguns esporádicos contatos com alguns de meus poucos amigos – que, justiça seja feita, também já entraram em contato para saber como eu estava, principalmente após a perda de dois amigos fantásticos e que significavam muito para mim: o Flavinho e o Bicarato. Pessoal, valeu mesmo!

Mas foi somente ontem, por conta de uma mensagem da amiga Sheilíssima, que meio que caiu a ficha. Apesar de admitir que já fazia até um tempinho que queria entrar em contato, pela dinâmica de seu dia a dia sempre ia deixando para depois. Mas acontece que ela foi visitar uma amiga doente e, sinceramente, não sei o porquê lembrou-se de mim. Preocupou-se comigo. Quis saber como eu estava.

E isso me tocou.

Muito.

E é lógico, como não podia deixar de ser, sendo eu a Rainha do Drama, somente mesmo escrevendo aqui no blog é que eu iria responder – com detalhes – como tenho passado e o que tenho feito…

Caríssima, o comecinho dessa quarentena foi meio zoado e com um confinamento não levado tão a sério nos primeiros dias. Mas quando começamos a perceber a gravidade da situação rapidamente tomamos medidas sanitárias rigorosas para o controle do que quer que viesse da rua.

Como em casa, apesar das duas portas, sempre entramos pelo corredor lateral diretamente para a cozinha então ali mesmo montamos nossa estratégia. Embaixo do balcão cimentado foi instalada uma sapateira, de modo que nenhum calçado que tenha vindo da rua vá para dentro de casa, onde passamos a andar somente de chinelos – ou de meia ou descalço, conforme for a pressa… Bem “casa de japonês”, mesmo…

No começo deixávamos sobre o balcão um reservatório de álcool gel e um rolo de toalhas de papel para limpeza de chaves, celulares, carteiras, cartões, pacotes, embalagens e o que mais que tivesse vindo da rua. Uma meleca só! Quase estraguei o alarme do carro por conta disso. Mas isso foi até descobrirmos o álcool spray 70! Tcha-rãããã! Muito mais simples, eficiente e prático, inclusive porque seca rapidamente (royalties, please). Não suja, não mancha (só de vez em quando), não arde (exceto nos cortes e arranhados), é barato (de dez a quinze dinheiros), dura bastante, abre tampa emperrada de vidro de azeitonas, ajuda a carregar as compras, faz a lição dos filhotes, vigia a casa, traz a pessoa amada em até sete dias, enfim, é pau-pra-toda-obra! Só perde para a dupla WD-40 e Silver Tape…

Bão, vortando ao assunto, quem quer que tenha chegado da rua já tem a obrigação de colocar as próprias roupas diretamente no cesto de roupas sujas, mas não sem antes ter realizado o “ritual de lavagem das mãos”, pois ali mesmo no corredor, antes da porta da cozinha, já havia antes uma “pia de jardim” que passou a ser devidamente abastecida de sabonete e toalha. Saiba que o sabão ainda é a arma mais eficaz para se livrar de um indesejável Coronavírus que tenha lhe acompanhado até em casa.

Falando no vírus em si (e não tem como deslembrar), confesso, Sheila, que andei meio surtado com tudo isso. Bastava qualquer alteração do tempo e eu já achava que estava com febre. Às vezes ficava experimentando cheirar coisas diferentes para ver se não estava perdendo o olfato. Por mais de uma vez confundi uma certa crise de ansiedade com falta de ar e daí já concluía que estava doente: “Pronto. Fodeu.” Mas bastou passar um pouco o tempo, tomar os devidos cuidados de distanciamento e de higiene, que uma certa serenidade finalmente se estabeleceu. E também depois de fazer um teste rápido, é lógico.

Os dias têm sido relativamente iguais – exceto quando são diferentes. Estabelecemos algumas rotinas aqui em casa, o que ajuda a passar o tempo. Ou não.

Jean, o caçula, segundo ano no curso técnico de informática, está tendo aulas remotamente, de segunda a sábado, e não sai de casa.

Erik, o do meio, concluiu o curso técnico de publicidade e está em seu “ano sabático” para decidir o que fazer, o que já havia sido planejado anteriormente e coincidiu com o isolamento, também sem sair de casa.

Kevin, o mais velho, está fazendo duas faculdades EAD (Ensino a Distância, veja só quanta modernidade!): engenharia informática e marketing. Mas faz estágio de segunda a sexta, então usa o carro praticamente todos os dias. Antes o estágio era na área de informática na Secretaria Municipal de Educação e ele ia de ônibus, o que nos deixava de orelhas em pé. Mas bem no comecinho da pandemia ele mudou e passou a fazer estágio na área de administração e marketing – adivinhe onde? Na área administrativa de uma igreja evangélica! E o fato de o pastor dessa igreja ser o pai da menina que ele namora há anos é meramente uma coincidência…

Levanto bem cedinho todos os dias e preparo o café da trupe inteira, pois a aula do Jean começa às sete e o Kevin sai de casa às nove e meia. Eu e a Dona Patroa temos trabalhado em casa – o que ela já fazia, pois na função de Auxiliar do Juiz tudo passou a ser via “home office” – e praticamente só saímos uma vez por semana: às quintas, bem de manhãzinha, para ir até a feira e reabastecer a geladeira, a fruteira, e o consumo de pastel e de caldo de cana.

Confesso-lhe que no meu caso já ando mais “saidinho”… Sempre que posso e não devo dou uma passada na firma para a qual presto serviços (aquela mesma), na casa de meus pais para ver como estão meus velhinhos e na “Autoelétrica do Japonês” para vagabundear um pouco, que é a oficina do sujeito que fez toda a parte elétrica do meu Opala e acabamos ficando amigos. Aliás, acho que até você já deve saber, mas além do bom e velho Titanic, voltei ao mundo de duas rodas!

Ou seja, além do Opala 1979 – que atualmente está na oficina mecânica do “Seo” Waltair, aí em Jacareí, para a revisão dos 1.000km (isso mesmo, milão, pois foi feito o motor, lembra?) agora também sou o feliz proprietário de uma CB 400 1981 (não deixe se enganar pelo adesivo), uma moto cujo dono anterior mandou fazer o motor, rodou cerca de 300 quilômetros em uma única viagem e em seguida a encostou num canto da casa. Por mais de quatro anos! Comprei a moto “no estado”, levei-a num mecânico especializado em motos antigas que trocou tudo que tinha que trocar por ter se estragado por todo o tempo em que ficou parada (mangueiras, cabos, relação, lonas, pastilhas, etc), revisou parte elétrica, mecânica e pronto! De volta ao mundo dos vivos! Ou seja, só eu mesmo para me sentir realizado com veículos com mais de 40 anos de uso…

No mais, vamos levando. Não consegui ser o abstêmio que pretendia, pois concluí que para mim é mais fácil me associar a alguma professora hare krishna de yoga e fundar um centro público de meditação transcendental lá no meio do mato do que deixar de tomar as minhas cajibrinas de vez em quando. Mas também não acho que seja o alcoólatra que pensava ser, pois tomar umas e outras apenas uma vez por semana não seria sinal de falta de moderação. Bem, só não podemos esquecer que todo viciado sempre encontra meios de defender seus vícios, então…

Falando em vícios, sabia que a Dona Patroa se tornou uma viciada? É sim: em suculentas! E não, não é nada dessa besteira que você pensou aí, não! É que no ano passado ela resolveu que iria presentear a cada uma das mães lá da Igreja Holiness com um vasinho de suculenta e então, desde dezembro, começou a cultivá-las. Apenas algumas dezenas já seriam o suficiente. Mas veio a pandemia, o isolamento, o Dia das Mães chegou e passou e as suculentas continuaram aqui em casa. E ela se encantou com sua variedade. E ela arranjou mais suculentas – “Ah, desse tipo eu ainda não tenho!” – e o negócio foi se multiplicando. E eis que na última contagem que fiz ali na varanda tínhamos nada menos que 166 vasinhos de suculentas! É ou não é um vício?

E vocês, como estão? Pelo que percebi o maridóvski voltou (com todos os cuidados) à ativa, certo? E o escritório? Transferiu pra casa ou ainda vai lá de quando em quando? As crianças estão bem? Seu caçula perdeu aquela mania de ralar a tela do iPhone no chão? 😂

Do tempo livre que passo em casa tenho aproveitado para aprofundar minhas pesquisas genealógicas (em linha reta já consegui chegar no final do século XVI, na Freguesia de Santa Comba de Fornelos, Distrito de Braga, região norte de Portugal), tenho lido um bocado (menos do que gostaria), e assistido muitos filmes e séries, alguns novos e outros repetidos (sempre naquele meu esquema de fuçar até achar na Internet e baixar tudo via Torrent).

Praticamente não tenho me exercitado, mas até que tenho segurado a boca – o que é bem difícil quando você tem um enorme tempo livre em casa e a sua cara metade adora fazer “experimentações culinárias”. Considerando que comecei o ano com 110kg e agora estou com 102kg, até que tá bom. Ainda é um excesso, mas tá bom.

E assim prosseguimos, bem no estilo do Bill Murray no filme Feitiço do Tempo (ou “Dia da Marmota”), lembra?

Ainda estamos nos acostumando ao “novo normal” e ainda não temos ideia de quando tudo isso vai acabar. Nem SE vai acabar. Talvez quando a vacina chegar as coisas mudem um pouco, mas não dá para se ter certeza. Só sei que ainda vai demorar. Mais de 130 mil pessoas (até onde é possível aferir) já morreram diretamente em decorrência do Coronavírus e na presidência do país temos um insano que teima em fazer vista grossa a tudo que está ocorrendo enquanto que uma boa parte da população, por sua vez, também insana, teima em não querer enxergar que essa família de corruptos não possui um projeto de governo, mas sim um projeto de poder. É bem como escrevi outro dia no Twitter: “E eis que as dez pragas do Egito estão sendo reeditadas no Brasil, pois até agora já tivemos, além da pandemia em si, ciclone com cerca de 250 km/h, gafanhotos se aproximando pelo sul, incêndio incontrolável no sudeste e Bolsonaro no Planalto”.

Minha linda amiga, obrigado pela mensagem. Obrigado por me lembrar que as pessoas são importantes e que não podemos deixar de entrar em contato porque estamos muito ocupados aqui em nossa terra de lugar nenhum fazendo nossos inexistentes planos mirabolantes exatamente para ninguém (e sim, isso é da música Nowhere Man). O tempo passa e a gente não percebe. Que eu me lembre a última vez que conversamos pessoalmente foi em novembro do ano passado. Foi a última vez que nos abraçamos – e convenhamos que, de lá pra cá, não tem sido possível abraçar mais ninguém…

Enfim, Sheilíssima, basicamente é isso! Mande notícias suas, quer seja por aqui, pelo zap, por telefone, através de carta, sinal de fumaça, transmimento de pensação, por onde quiser, mas mande! Parafraseando aquela música do Chico, seria mais ou menos assim (dê um play e só leia se for pra cantar junto 😁):


Minha cara amiga, me perdoe, por favor

Se eu não lhe faço uma visita
Mas até agora não tenho um portador
Então mando notícias por esta escrita

Na minha terra eu não jogo futebol
Não tem samba, não tem choro, mas rock’n’roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando que, também, sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão

Minha cara amiga, eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades

Não vou pescar, que não tenho vara nem anzol
E na segunda é dia de mudar lençol
As baixelas vou limpando com caol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

É pirueta pra cavar o ganha-pão
Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro
Ninguém segura esse rojão

Minha cara amiga, eu quis até telefonar
Mas a conexão não é de graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa

Pra esquecimento vou tomando Fosfosol
E de nervoso me ataca o terçol
Só não tem cura pr’esse meu besteirol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

Muita careta pra engolir a transação
Que a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinho
Ninguém segura esse rojão

Minha cara amiga, eu bem queria lhe escrever
Mas o Whatsapp andou arisco
Se me permite, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas com estes riscos

Outro dia me foi queimando o farol
Mas o motor com afinação de rouxinol
E de moto vou desviando de cerol

Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta

A Mieko manda um beijo para os seus
Um beijo na família, no Rodrigo e nas crianças
E eu já aproveito pra também mandar lembranças
A todo o pessoal
Adeus!

A volta dos que não foram

Nos últimos anos tenho feito mais bricolagem do que escrito propriamente dito. Quem me acompanha por aqui sabe que este blog não nasceu com cara de blog – até porque naquele longínquo ano de 1998 os blogs sequer existiam! Eu comecei compartilhando notícias e artigos que achava interessante, links úteis para quem quisesse acessar, mas, apesar de já me aventurar editando uma e-zine desde 1999, escrever, escrever mesmo, foi só lá pelo ano de 2004. Somente a partir daí comecei a dar cara e forma às minhas opiniões, sentimentos e paixões. Além de compartilhar o que acontecia pela Internet passei também a compartilhar o que me instigava o cérebro, tocava a alma e mexia com meu coração.

Escrevi muito. Muita coisa boa e também muita coisa ruim – se bem que nossos próprios textos, assim como nossos próprios filhos, sempre serão lindos, ainda que não. Mas os meus, são. Filhos e textos. Bem, no caso deste último, quase. Mas os últimos anos não foram tão graciosos assim em termos de produção. Acho que muito se deu por conta das chamadas redes sociais – Facebook, Twitter, Instagram, o escambau! – que com seu imediatismo e anonímia trouxe um ambiente mais “agradável” para todos aqueles que decidiram tirar seus monstros dos armários. Ou, ao menos, deixar à vista suas verdadeiras personalidades.

O blog, para mim, sempre foi uma grande “brincadeira”. É minha penseira virtual, onde de quando em quando compartilho minhas elucubrações, relembro de coisas que não quero esquecer e ainda utilizo como um quartinho de badulaques, acumulando pensamentos dos quais não quero me desfazer.  Nunca quis ganhar dinheiro com isso, ou, como diria meu amigo Bicarato, “monetizar” este nosso cantinho virtual. Sei que não é muito para os profissionais do ramo, mas tenho uma média de aproximadamente 100 visitas diárias, dando mais de 2,5k de visualizações por mês. E isso sem escrever absolutamente nada. Nem que preste, nem que não preste.

Diante desses números é fácil entender o encanto das Redes Sociais. Coloque uma foto bonitinha ou faça algum comentário ferino sobre algum tema relevante ou polêmico e em pouquíssimo tempo já poderá ter centenas de “likes” – sendo este o verdadeiro combustível que movimenta essas redes. Conheço pessoas que postam alguma coisa como se fosse a mais trivial do mundo, mas ato contínuo fica monitorando a própria conta para verificar não só quantos vão curtir como também quem são as pessoas que curtiram e/ou comentaram.

Cansei de ver usuários que já começam escrevendo “desculpe pelo textão”, como se estivesse escrevendo um tratado, mas que na realidade trata-se de um mero textinho de três ou quatro parágrafos – que já é muito mais do que os parágrafos de duas linhas normalmente publicados. Só este texto aqui já ultrapassou – e muito! – essa métrica torta que procura prevenir os leitores de que seus cérebros deverão ser utilizados. Um verdadeiro desserviço à inteligência e à capacidade de raciocínio estruturado.

É lógico que existem exceções, mas mesmo essas me causam um certo desânimo. Mestres do jornalismo, literatura, pensamento filosófico e de tantas outras áreas que outrora tiveram seus próprios blogs com postagens interessantíssimas, cujas caixas de comentários traziam discussões excelentes que somente abrilhantavam ainda mais a postagem original, hoje permanecem somente nas redes sociais, ainda com textos interessantes (mas não mais com tanta profundidade), tendo em sua grande maioria se rendido ao encanto das curtidas e dos comentários vazios ou meramente bajulatórios…

Sei lá, ando meio cansado de tudo isso. Deve ser por esse motivo que faz tanto tempo que não escrevo, pois eu mesmo caí nessa armadilha por tempo demais. Faltou-me a sobriedade tanto física quanto espiritual para conseguir dar um passo para trás e compreender que, como disse o personagem, temos que escolher entre o que é certo e o que é fácil. E cada vez mais, para mim, escrever aqui no blog é que é o certo. Ainda que venha a cair no mais absoluto ostracismo.

Mas somente assim serei fiel às minhas origens.

Não tem como voltar no tempo. Não há um capacitor de fluxo à disposição para que eu possa selecionar o momento exato em que as coisas começaram a descambar (em todos os sentidos) e tentar consertar tudo aquilo que deu errado. O tempo é uma via de mão única e já passou da hora de eu colocar esse trem descarrilado de volta aos trilhos.

Já tentei fazer isso antes.

Por mais de uma vez.

Mas atualmente, em tempos de pandemia e destempero social, tendo um Coronavírus que pode estar me aguardando em alguma esquina e que poderá decidir meu futuro imediato a curto prazo e de forma definitiva, acho que é melhor tentar, novamente, tomar as rédeas da situação.

Vamos ver no que dá…

Quarentena em casa (onde mais?)

Recentemente o amigo virtual Nelson Moraes resolveu disponibilizar gratuita e temporariamente o download do seu livro A Gargalhada de Sócrates (muito bom, diga-se de passagem) como contribuição àqueles que estão de quarentena.

Achei muito legal a ideia!

Tão legal que resolvi fazer o mesmo. Então, com praticamente as mesmas palavras dele, eis minha proposta:

Sua quarentena não precisa ser tediosa ou sem graça, já que rir não é o melhor remédio – é o único remédio.

É por isso que estou disponibilizando, GRÁTIS, o download do PDF de Filosofices de um Velho Causídico – Seletos 99 Causos. Clique aí na imagem da capa aí embaixo, faça o download do arquivo e torne sua reclusão em casa pelo menos divertida, com os 99 textos que são, resumidamente, os melhores, os de maior significância pessoal, os mais divertidos, os mais profundos, enfim, os mais relevantes que já publiquei (na minha nada humilde opinião, é claro). Distribuídos pelos capítulos Coisas de Casal, Criança dá Trabalho, Juridicausos, A vida como ela é, Passado a Limpo, Martelando o Teclado e Filosofices, falo um pouquinho da vida conjugal, da difícil arte de ser pai, acrescento mais um tantinho de causos jurídicos, reclamo dos perrengues do dia a dia, do passado que tanto me guia quanto persegue, bem como desfio um quê de crônicas, invencionices e elucubrações de praxe….

Enquanto aqui na vida real uma leva de canalhas bate bumbo chamando o povo de voltas às ruas, eu tento segurar você em casa oferecendo a possibilidade de se divertir, sem gastar um centavo. É o jeito de eu fazer minha parte.

Pela atenção, obrigado.