Correndo, correndo, correndo

Quem disse que final de ano é época de descanso?

O fluxo de trabalho anda batendo recordes, o ponteirinho da pressão passou da margem vermelha de segurança, o vapor já começou a apitar e sair em disparada pelos ouvidos e a coisa não para.

Apesar da pertinaz ajuda das minhas meninas (as advogadas e a estagiária que trabalham comigo), já estou antevendo o momento em que elas vão acabar me tocando da sala, tal é o mau humor que venho demonstrando por estes dias…

A elas só posso pedir paciência. Tudo passa. Tudo tem limite.

Para deixá-las um pouco em paz (e livres de minha presença) hoje vou pra Capital (do Estado, não do País) para uma daquelas reuniõezinhas básicas. Além de lhes dar sossego, também vai servir para dar uma espairecida na cabeça…

Isso porque a parte divertida da coisa é que vou acompanhar o amigo Bellini para resolver um perrengue de um convênio. Ele é tenente-coronel da polícia militar, atualmente na reserva (uma espécie de aposentadoria), e figurinha ímpar no pedaço. Sempre vestido de preto da cabeça aos pés, com um longo rabo-de-cavalo que se contrapõe à calvície do topo, amante de um bom e velho rock pesado, de temperamento forte mas com um coração de ouro, possui assunto e disposição pra qualquer proseio que se possa imaginar. Em suma, é daquelas figuras antigas de cujo estofo se forjam lendas.

É. Apesar da correria, parece-me que talvez o dia de hoje possa vir a ser um pouco mais calmo…

Boas Notícias – Más notícias

Atendendo uma ideia muito LEGAL dada pela Michelle em seu comentário em um post de 30/11, depois de dar uma boa fuçada por aqui e por ali, e graças ao plugin para WordPress (WP-EMail) criado por Lester ‘GaMerZ’ Chan, consegui inserir aqui no site um “serviço do tipo: envie esta notícia para um amigo”. É esse envelopinho aí embaixo com o texto “Envie este Post por e-mail”. Uma nova janela será aberta solicitando os dados de quem manda, de quem recebe e eventual comentário. Já testei e o bichinho funciona…

Essa foi a boa notícia.

má notícia é que ainda tenho que dar uma mexida no código desse plugin para deixá-lo totalmente em português, pois atualmente está bem híbrido (uns 80% em inglês e os 20% restantes em português). Essa é a parte fácil. O difícil – e continuando a “má notícia” – é que ao enviar o e-mail ocorre uma “tecnicidade”: ele desconfigura o padrão de texto UTF-8 para o qual o WordPress está originalmente configurado, transformando-o em ISO-8859-1. E ao fazer isso avacalha totalmente com a acentuação do texto…

Mas para tudo tem jeito. Mais um tempinho e eu vou acabar descobrindo o nó górdio desse trem doido e conserto…

Chama a estagiária

Acontece que numa sessão de abertura de envelopes de uma licitação às vezes (aliás MUITAS vezes) tem algum caboclo chato, daqueles que só reclamam.

E, nesse dia, esse era o caso.

Estavam a presidente da comissão mais as duas outras integrantes já ficando com dor de cabeça por causa das reclamações do “distinto” representante de uma das empresas que participavam da licitação. Que, aliás, era o único presente além da própria comissão.

Passava e repassava pelos documentos apresentados por outras empresas, a cada vez falando uma coisa.

– Vocês têm que ver que esta empresa aqui apresentou uma cópia mal tirada, se não seria o caso de inabilitar, aliás, essa outra aqui apresentou um atestado bem antigo, e eu acho que nem seria mais válido, tem também essa outra que não fica na cidade e eu nem sei se o edital fala se daria pra contratar empresa de fora, deixa eu ver o edital… – ué, mas não está aqui – quero ver a pasta número um da licitação, então dá pra me mostrar ou será que teria algum motivo pra ela não estar aqui, senão essa licitação já estaria toda viciada e seria o caso de anular tudo, e quero inclusive fazer constar tudo isso em ata, viu, e preciso ler antes de imprimir, pra ver se não mudaram minhas palavras, será que posso ver a pasta, então?

Com a pequena deixa naquela torrente de resmungos e reclamações – que, diga-se de passagem, proferidas sob o manto do mais tenebroso mau humor já visto – meio que saindo do torpor, a presidente da comissão liga para uma outra sessão e pede para que tragam a malfadada pasta número um.

Enquanto isso, talvez mais até de si para si mesmo, permanecia o infeliz ali resmungando, folheando, repassando, enfim, procurando defeitos onde não existiam.

E eis que trazem a pasta.

Quem mesmo?

A estagiária novinha, é lógico.

– Licença?

Lá da porta do salão ela perguntou e já foi entrando. Todas as cabeças se viraram à sua chegada. Veio ela em direção à mesa trazendo a pasta debaixo do braço. Mignonzinha, com os cabelos metade soltos, metade presos no alto da cabeça, sempre sorrindo, com tudo no lugar certo, tudo bem durinho, empinadinho e apontando para o céu, usando um topzinho que deixava o umbiguinho bem torneado à mostra para quem quisesse ver. Percorreu o curto trajeto com seu alegre passinho peculiar – já há muito tempo caracterizado pelas “boas línguas” que a cercam: “ela não anda, saltita.

O queixo do velho babão representante veio ao chão.

Enquanto a estagiária – toda solícita e sorrisos – entregava a pasta, o homem permaneceu calado.

Depois, com um mero tchauzinho, foi embora da sala – toda, toda – com aquele caboclo ali, tiquetaqueando com a cabeça, acompanhando sua saída.

Foi a mudança da água (barrenta) para o vinho (finíssimo).

Ele ficou num bom humor insuportável.

Não tinha mais nada a reclamar, não queria constar mais nada em ata, deixa o processo pra lá, ganha quem ganhar, é assim mesmo, o dia está lindo lá fora, vocês todas são muito competentes, a licitação tá muito boa, o edital tá muito bom, cadê a ata, onde é que eu assino, muito obrigado, tudo de bom pra vocês, fica assim, até uma próxima vez…

Quem estava de queixo caído agora era a comissão…

Mas até que foi bom.

Pois já ficou decidido.

Apesar de não ter constado em ata.

Doravante, TODA e QUALQUER licitação que tiver algum representante chato, algum caboclo pentelho, algum distinto que esteja lá só pra encher o saco, pois bem, visando garantir o bom andamento dos trabalhos, nesses casos a solução passará a ser uma só:

– Chama a estagiária!

Organograma de um escritório de advocacia

E já que tiramos o dia pra falar dessa raça (na qual me incluo), segue mais uma pitoresca:

O SÓCIO MAJORITÁRIO: Sempre de bom humor, o Sócio Majoritário ganha rios de dinheiro explorando o trabalho escravo dos outros componentes da pirâmide social do escritório. Graças à sua reputação de excelente jurista, o escritório conquistou inúmeros clientes trilhardários, que mal sabem que ele só assina as petições e fica lendo jornal e fazendo contatos na sua mega sala GLX. Passa o tempo viajando pelo mundo em “congressos” com a família e pendura todo diploma que ganhou em suas andanças pelas paredes do escritório para impressionar a moçada. Seu maior prazer é prometer a direção do escritório aos sócios minoritários.

O SÓCIO MINORITÁRIO: Misteriosamente, sempre trata o Sócio Majoritário de “Pai”, “Tio” ou “Benhê”. De sobrenome idêntico ao que dá nome ao escritório, o Sócio Minoritário pega todos os consultivos que o Majoritário não tem saco, nem tempo para entender e delega tudo aos Advogados Associados, que por sua vez passam tudo para os estagiários que: 1) claro, nunca tiveram aquela matéria; 2) nunca tiveram aquela matéria bem dada; 3) faltaram naquela aula; 4) como sabem a matéria, têm noção de que os advogados pretendem uma heresia jurídica. O Sócio Minoritário larga o escritório às 18:00h para fazer as aulas da pós, com o orientador arranjado pelo “Papi”. Seu maior prazer é prometer consultivos para os pobres Associados que nunca tiveram e nem vão ter contato físico com os clientes, e esperar a morte do Sócio Majoritário.

O ADVOGADO ASSOCIADO: Dá um duro danado no escritório: hora extra não remunerada, leva trabalho para o fim de semana, tem estresse, estafa, início de calvície e impotência sexual. Leva o trabalho para os sócios analisarem e assinarem tudinho. Em troca, ganha muito bem e, como perdeu os amigos, a mulher e os filhos, sobra uma puta grana. Não tem a menor ideia do que fazer com toda a bufunfa no seu tempo livre: a hora do almoço. Sua maior diversão é prometer passar “umas coisas” para os recém efetivados e rir das piadas infames de todos os sócios.

A SECRETÁRIA: Essa funcionária dedicou os últimos 30 anos (entregando a sua saudosa juventude) em “servir” o Sócio Majoritário. É figura intocável no escritório, assim como as bibliotecárias boazudas que quando completam 26 anos são sumariamente demitidas. Seu maior prazer é puxar o saco dos sócios e tornar a vida de todos os outros um inferno.

O RECÉM EFETIVADO – O ESTAGIÁRIO COM OAB: Normalmente é o mais elegante do escritório e se acha “O” advogado, enchendo o saco dos amigos com as “causas” lá do escritório. Despreza os outros estagiários e, para mostrar seu enorme status, manda os pobrezinhos para os piores buracos possíveis: fóruns do interior, Justiça Federal, elevadores da Fazenda Pública Estadual, até em busca e apreensão o filho da mãe manda. Tem certeza de que pode fazer muito melhor o trabalho dos Advogados Associados. Sua grande felicidade é dizer aos novatos, com ares de experiência, que “é assim mesmo” ou “antes era pior”.

O ESTAGIÁRIO NOVATO: A vida dele é tão miserável que nem precisava fazer turismo na cidade de Canas. Só pega serviços externos o dia inteiro, se ferra na faculdade. Seu conhecimento de pontos de ônibus é notável e é capaz de recitar na ordem todas as estações da linha “Corinthians-Itaquera”. Seu maior prazer é contar para os amigos que está “aprendendo muito”.

Justiça decide: esperma é propriedade da mulher!

Essa recebi da amiga Sheila, advogada sempre atenta a contribuir com o nosso modesto FEBEAPÁ…

Usar esperma para engravidar sem autorização do homem pode render um processo, mas não caracteriza roubo porque “uma vez produzido, o esperma se torna propriedade da mulher”. O entendimento é de uma corte de apelação em Chicago, nos Estados Unidos, que devolveu uma ação por danos morais à primeira instância para análise do mérito.

Nela, o médico Richard Phillips acusa a colega Sharon Irons de “traição calculada, pessoal e profunda” ao final do relacionamento que mantiveram há seis anos. Sharon teria guardado sêmen depois de fazerem sexo oral, e usado o esperma para engravidar. Phillips ainda alega que só descobriu a existência da criança quando Sharon ingressou com ação exigindo pensão alimentícia.

Depois que testes de DNA confirmaram a paternidade, o médico processou Sharon por danos morais, roubo e fraude.

Os juízes da corte de apelação descartaram as pretensões quanto à fraude e ao roubo, afirmando que “a mulher não roubou o esperma”, mas o caso por danos morais deverá prosseguir.

O colegiado levou em consideração o depoimento da médica. Ela afirmou que quando Phillips entregou seu esperma, deu “um presente”. Para o tribunal, “houve uma transferência absoluta e irrevogável de título de propriedade e não houve acordo para que o depósito fosse devolvido quando solicitado”.

Ou seja, agora é oficial: os homens não mandam mais em porra nenhuma mesmo!

Arquétipos

Desde a mais tenra idade somos apresentados – ou, pelo menos, os imaginamos com uma fúria terrível – àqueles que seriam os arquétipos de controle e limitação à nossa falta de explicação para o mundo que nos cerca. Ruídos no escuro, passos atrás da porta, um brilho distante – quaisquer coisas que minimamente se aproximem do inexplicável podem seguramente assumir a figura de “monstros”.

Mas daí começamos a crescer e esses monstros começam a tomar formas mais definidas e intimistas. Sei lá, talvez isso seja apenas uma busca de familiaridade numa vã tentativa de compreensão, de provar para nós mesmos que não há que se ter medo daquilo que conhecemos. Mas ainda assim inspiram terror nas desavisadas mentes infantis. Tão assustadores quanto antes, os monstros outrora sem forma e sem nome passam a ser conhecidos por Bicho-papão, Homem do Saco, Corpo Seco e por aí afora.

Curioso como, apesar do riquíssimo folclore brasileiro, nesses lados mais urbanoides do país nos limitamos a umas poucas figuras. Saci-Pererê, Boitatá, Curupira e todos seus companheiros nos soam mais como espíritos livres dos campos, matas e florestas que “monstros” propriamente ditos. Apenas como exemplo teríamos que eles não seriam páreos para a “Loira do Algodão na Boca”, também conhecida como “Loira do Banheiro”…

Mas falávamos de arquétipos.

Com o passar do tempo essas figuras saem da nossa esfera de mitologia infantil e dão lugar a outras, utilizadas para explicar atitudes e comportamentos – próprios ou de terceiros – já em nossa fase adulta. Em povos e civilizações antigas haviam as figuras dos deuses e demônios, as quais eram criadas e utilizadas para explicar desde um simples fenômeno da natureza até mesmo às mais complicadas sensações da psiquê humana.

Mas isso somente porque eles não tinham televisão!

As figuras da TV (e daí passando também pelo cinema e quadrinhos) passaram a conviver em nosso dia a dia de uma forma insuportavelmente familiar. Nas mais variadas esferas. Em todas as camadas sociais. Em qualquer tipo de evento. E isso já há um bom tempo. Exemplos não nos faltam.

O caboclo está sujo? Rapidamente aparece alguém para chamá-lo de Cascão, tal qual o personagem do Maurício de Souza.

Meio feinho, mas com complexo de beleza? E dá-lhe o apelido de Zé Bonitinho que tá tudo certo.

Fortão e valentão? Rambo já era suficiente.

Bastava alguém falar alguma besteira inominável e pronto. Era taxada de Magda por um booooom tempo. Com direito a “calaboca” e tudo mais…

E se a situação fosse uma reunião com alguém totalmente irascível e despótico presidindo-a? Já era motivo mais que o suficiente para receber a alcunha de Justus (por mais injusto que seja essa figurinha deplorável).

Inventor, fuçador, gambiarreiro, enfim qualquer denominação que pudesse ser dada a alguém que seja um “faz-tudo”, que a partir de um clips, dois elásticos e uma calculadora consegue montar um celular para ligações via satélite (e que ainda tira fotos), pois bem, esse indivíduo passou a ter como sinônimo o nome MacGyver.

Já para crianças impossíveis, a tábua de salvação (quem quer que fosse) certamente passou a ser chamada de Super Nanny.

Mas agora o “herói” da vez é outro. Para todo e qualquer problema, passou a ser um só. Não há nada tão espetacular ou tão pequeno que não seja merecedor de sua atenção. Tudo ele resolve. Do jeito dele, é lógico. Mas resolve. O carro não funciona? Chama ele. A fila tá demorando? Chama ele. O caixa quer te dar balinha de troco? Chama ele. O mais novo arquétipo da sociedade brasileira tem um nome simples: Capitão Nascimento

Apesar de ser o personagem que atualmente anda na boca do povo, que o vê com bom humor, que concorda com seus métodos, que se diverte ao dizer a já recorrente frase “basta chamar o Capitão Nascimento” – bem, no meu ponto de vista parece-me simplesmente que mais um daqueles monstros que viviam debaixo da cama saiu e passou a ter forma e nome.

E isso me faz sentir novamente aquela já antiga (e quase esquecida) sensação de pânico premente que paira dentro de mim num limbo indefinido, em algum lugar entre o peito e o estômago…