Piloto Automático – VII

( Direto das catacumbas do Legal… )

(…)

Como continuo (sempre) em desenfreada correria e o dever me chama, segue uma pequenina estória bastante interessante que, apesar de já meio velhinha, continua proporcionando boas risadas. Atentem ao detalhe dos horários…

(…)

DIÁRIO DE UM ANALISTA DE SUPORTE

SEGUNDA

8:05 am
Usuário chama dizendo que perdeu a password. Eu disse a ele para usar um utilitário de recuperação de senhas chamado FDISK. Ignorante, ele me agradeceu e desligou. Meu Deus! E a gente ainda deixa essas pessoas votarem e dirigirem?

8:12 am
A Contabilidade chamou para dizer que não conseguiam acessar a base de dados de relatórios de despesas. Eu dei a resposta Padrão dos Administradores de Sistema #112: “Engraçado… Comigo funcionou…”. Deixei eles pastarem um pouco enquanto eu desconectava minha cafeteira do No-Break e conectava o servidor deles de volta. Sugeri que eles tentassem novamente. Ah… Mais um usuário feliz…

8:14 am
O usuário das 8:05 chamou dizendo que recebeu a mensagem: Erro no acesso ao drive 0. Disse a ele que isso era problema de SO e transferi a ligação para o microsuporte.

11:00 am
Relativamente calmas as últimas horas. Decidi reconectar o telefone do suporte para ligar pra minha namorada. Ela disse que os pais dela virão pra cidade nesse fim-de-semana. Pus ela “em-espera” e transferi a ligação para o almoxarifado. Que é que ela está pensando? Os torneios de “Doom” e “Myst” são neste fim-de-semana!

12:00 pm
Almoço.

15:30 pm
Retorno do almoço.

15:55 pm
Acordei da soneca. Sonhos ruins me dão tremores. Empurrei os servidores sem razão. Voltei pra soneca.

16:23 pm
Outro usuário liga. Quer saber como mudar fontes em um formulário. Perguntei que chip eles estão usando. Falei pra eles ligarem novamente quando descobrirem.

16:55 pm
Resolvi rodar a macro “Criar Salvar/Replicação de Conflitos” para que o próximo turno tivesse algo a fazer…

TERÇA

8:30 am
Terminei a leitura do log de suporte da noite anterior. Pareceram ocupados. Tempos terríveis com Salvar/replicação de Conflitos…

9:00 am
Gerente de suporte chega. Quer discutir minha atitude. Cliquei no PhoneNotes SmartIcon. “Adoraria, mas estou ocupado”, gritei enquanto pegava as linhas de suporte, que (misteriosamente) acenderam.

9:35 pm
O chefe da equipe de P&D precisa de ID para novos empregados. Disse a ele que precisava do formulário J-19R=3D9C9DARRK1. Ele nunca tinha ouvido falar de tal formulário. Disse a ele que estava no banco de dados de FORMULÁRIOS ESPECIAIS. Ele nunca ouvira falar de tal banco de dados. Transferi a ligação para o almoxarifado.

10:00 am
Ana ligou pedindo um novo ID. Eu disse que precisaria da matrícula, nome de departamento, nome do gerente e estado marital. Rodei @DbLookup nos bancos de dados de Controle de Doenças e não achei nada. Disse a ela que o novo ID estaria pronto de noite. Relembrando as lições de “Reengenharia para Parceria de Usuários”, ofereci-me para entregar pessoalmente em sua casa.

10:07 am
O cara do almoxarifado passou por aqui dizendo que estava recebendo ligações estranhas ultimamente. Ofereci a ele um treino em Notes. Começando agora. Deixei ele olhando a console enquanto sai para fumar.

13:00 pm
Voltei da pausa para o cigarro. O almoxarife disse que, como os telefones ficavam tocando demais, ele passou a transferir as ligações pra moça do café. Começo a gostar desse cara.

13:05 pm
Grande Comoção! Gerente de suporte cai num buraco aberto onde eu tinha tirado os tacos, na frente da porta do seu escritório. Falei pra ele da importância de não entrar correndo na sala do computador, mesmo que eu grite “Meu Deus – Fogo!!”

14:00 pm
A secretária do departamento jurídico liga e diz que perdeu a password. Pedi a ela que cheque sua bolsa, chão do carro e no banheiro. Disse que provavelmente caiu das costas da máquina. Sugeri que ela ponha durex em todas as entradas de ar que ela ache no PC. Grunhindo, ofereci-me para lhe dar nova ID enquanto ela colava os durex…

14:49 pm
O almoxarife voltou. Quer mais aulas. Tirei o resto do dia de folga.

QUARTA

8:30 am
Detesto quando os usuários ligam pra dizer que o chipset não tem nada a ver com fontes em um formulário. Disse a eles “claro, vocês deviam estar checando o ‘bitset’ e não ‘chipset'”. Usuário bobo pede desculpa e desliga.

9:10 am
Gerente de suporte, com o pé engessado, volta ao escritório. Agenda um encontro comigo para 10:00 am. Usuário liga e quer falar com o gerente de suporte sobre um suposto péssimo atendimento na mesa de suporte. Disse a ele que o gerente estava indo a uma reunião. Às vezes a vida nos dá material…

10:00 am
Chamei o Luiz do almoxarifado pra ficar no meu lugar enquanto vou no escritório do gerente. Ele disse que não pode me demitir, mas que pode sugerir vários movimentos laterais na minha carreira. A maioria envolvida com implementos agrícolas no terceiro mundo. Falando nisso, perguntei se ele já sabia de um novo bug que pega texto indexado dos bancos de dados e distribui aleatoriamente todas as referências. A reunião foi adiada…

10:30 am
Disse ao Luiz que ele está se saindo muito bem. Ofereci-me para mostrar-lhe o sistema corporativo de PBX algum dia…

11:00 am
Almoço.

16:55 pm
Retorno do almoço.

17:00 pm
Troca de turno. Vou pra casa.

QUINTA

8:00 am
Um cara novo (Jonas) começou hoje. “Boa sorte”, disse a ele. Mostrei-lhe a sala do servidor, o armário de fios e a biblioteca técnica. Deixei-o com um PC-XT. Falei pra ele parar de choramingar. O Notes rodava igual, tanto em monocromático quanto em cores.

8:45 am
Finalmente o PC do novato deu boot. Disse a ele que iria criar novo usuário pra ele. Setei o tamanho mínimo de password para 64. Sai pra fumar.

9:30 am
Apresentei o Luiz ao Jonas. “Boa Sorte”, comentou o Luiz. Esse cara não é o máximo?

11:00 am
Ganhei do Luiz no dominó. Luiz sai. Tirei o resto das peças da manga (“tenha sempre backups”). Usuário liga, diz que o servidor de contabilidade está fora do ar. Desconecto o cabo Ethernet da antena do rádio (melhor recepção) e ligo de volta no hub. Disse a ele que tentasse novamente. Mais um usuário feliz!

11:55 am
Expliquei ao Jonas a política corporativa 98.022.01 “Sempre que novos empregados começam em dias que terminam em ‘A’ estão obrigados a prover sustento e repouso ao analista técnico sênior do seu turno”. Jonas duvida. Mostrei o banco de dados de “políticas corporativas”. “Lembre-se, a pizza é de peperoni, sem pimenta!”, gritei enquanto Jonas pisa no taco solto ao sair.

13:00 pm
Oooooh! Pizza me dá um sono…

16:30 pm
Acordo de uma soneca refrescante. Peguei o Jonas lendo anúncios de emprego.

17:00 pm
Troca de turno. Desligo e ligo o servidor várias vezes (Teste do botão ON-OFF…). Até amanhã…

SEXTA

8:00 am
Turno da noite continua tendo problemas para trocar unidade de força do servidor. Disse a eles que estava funcionando direito quando sai.

9:00 am
Jonas não está aqui ainda. Decidi que deveria começar a responder as chamadas eu mesmo.

9:02 am
Chamada de usuário. Diz que a base em Sergipe não consegue replicar. Eu e Luiz determinamos que é problema de fuso horário. Mandei eles ligarem para Telecomunicações.

9:30 am
Meu Deus! Outro usuário! Eles são como formigas! Dizem que estão em Manaus e não conseguem replicar com Sergipe. Falei que era fuso horário, mas com duas horas de diferença. Sugeri que eles ressetassem o time no servidor.

10:17 am
Usuário do Espírito Santo liga. Diz que não consegue mandar e-mail pra Manaus. Disse pra eles setarem o servidor para 3 horas adiantado.

11:00 am
E-mail da corporação diz para todos pararem de ressetar o time dos servidores. Troquei o “date stamp” e reenviei para o Acre.

11:20 am
Terminei a macro @FazerCafe. Recoloquei o telefone no gancho.

11:23 am
O Acre liga, perguntando que dia é hoje.

11:25 am
Gerente de suporte passa pra dizer que o Jonas pediu pra sair. “Tão difícil achar boa ajuda…”, respondi. O gerente disse que ele tem um horário com o ortopedista essa tarde e pergunta se eu me importaria em substitui-lo na reunião semanal dos administradores. “No problems”, eu respondo.

11:30 am
Chamo Luis e digo que a oportunidade bateu à sua porta e que ele foi convidado para um encontro essa tarde. “Claro, você pode trazer seu jogo de dominó”, digo a ele.

12:00 am
Almoço.

13:00 pm
Começo backups completos no servidor Unix. Redireciono o device para NULL para o backup ser mais rápido.

13:03 pm
Backup semanal completo. Cara, como eu gosto da tecnologia moderna!

14:30 pm
Olho o banco de dados de contatos de suporte. Cancelo o compromisso de 2:45 pm. Ele deve ficar em casa descansando.

14:39 pm
Outro usuário ligando. Diz que quer aprender a criar um documento de conexão. Digo a ele para rodar o utilitário de documentos CTRL-ALT-DEL Ele disse que o PC rebootou. Digo a ele para chamar o microsuporte.

15:00 pm
Outro usuário (novato) liga. Diz que a macro periódica não funciona. Disse a ele para incluir a macro @DeleteDocument no final da fórmula e prometi mandar-lhe o anexo do manual que indica isso.

16:00 pm
Acabei de trocar a cor de frente de todos os documentos para branco. Também setei o tamanho da letra para 2 nos bancos de dados de ajuda.

16:30 pm
Um usuário liga pra dizer que não consegue ver nada em nenhum documento. Digo a ele para ir no menu Edit, opção Select all, e apertar a tecla Del e depois refresh. Prometi mandar-lhe a página do manual que fala sobre isso.

16:45 pm
Outro usuário liga. Diz que não consegue ver os helps dos documentos. Digo a ele que irei consertar. Mudei a fonte para WingDings.

16:58 pm
Conectei a cafeteira no hub Ethernet pra ver o que acontece… Nada… (muito sério).

17:00 pm
O turno da noite apareceu. Digo a eles que o hub está agindo estranho. Desejo um bom fim-de-semana.

* Publicado originalmente em 29/DEZ/2004

Ratzinger! (Saúde…)

A concorrência tá braba! Mais uma vez eu havia resolvido escrever sobre algo e me aparece outro distinto falando sobre a mesma coisa! Só desculpo porque é o Mino Carta… 😉

Mais uma, em 11/07/07, sob o nome de Epistolar, direto da Olivetti:

Papa Ratzinger mais uma vez prova o retorno de sua igreja ao Concílio de Trento. Acaba de dizer que a católica é a única verdadeira, fundada por Cristo e a ele definitivamente unida por causa do sacerdócio e da eucaristia. Entendo o raciocínio (disse e repito, o raciocínio) em relação à hóstia, que representa o pão da Última Ceia, corpo de Cristo. Não entendo a referência ao sacerdócio. Estaria aludindo ao celibato dos padres? E quem determinou que o nazareno era a favor do celibato? Que grande oportunidade seria entrevistar o pescador Pedro para saber o que de fato pregava o mestre. Infelizmente carecemos de um Evangelho segundo Pedro. Acho que cairíamos das nuvens a cada resposta, estarrecidos diante do que a Igreja fez para estabelecer-se como poder temporal, inescapavelmente terreno, ao adaptar lições de igualdade, tolerância e amor ao próximo a desígnios frequentemente brutais. Outra entrevista que me agradaria sobremaneira fazer é com Martinho Lutero, o santo da justa rebeldia. Não se espantem se um dia desses eu conseguir fazê-la.

Piloto Automático – VI

( Direto das catacumbas do Legal… )

– Senhor Presidente, peço a palavra.

– Tem a palavra, nobre deputado.

– Tenho dito, Senhor Presidente.

– Como? Mas Vossa Excelência não disse nada!

– Disse “tenho dito”.

– Tenho dito o quê?

– O que tinha a dizer.

– Eu sei. Mas o que é que Vossa Excelência tinha a dizer?

– O que disse. Muito obrigado.

– Mas Vossa Excelência limitou-se a pedir a palavra…

– Exatamente, pedi a palavra. E desde que Vossa Excelência ma concedeu, eu vi que nada mais havia a dizer, a não ser o óbvio, gastando inutilmente o tempo precioso desta ilustre Assembléia com uma exploração mais ou menos demagógica de todas as implicações e consequências do simples fato, em si tão significativo, de eu haver pedido a palavra – o que prova que a palavra existe, e pode ser solicitada, requisitada, exigida – uma vez que Vossa Excelência mesmo, ao permitir que eu fizesse uso dela, reconheceu implicitamente não ser a palavra um mito divino, mas um instrumento de comunicação acessível à capacidade humana. Obtendo-a, podemos usá-la ou não, falar ou silenciar, e eu da minha parte, confesso que prefiro silenciar, mesmo porque estou meio rouco e com um pouco de dor de garganta mas de qualquer forma, sei que a palavra me foi concedida, e, assim sendo, não estou condenado à nudez. O resto depende de mim, da minha loquacidade ou da minha parcimônia verbal, da minha audácia ou de minha prudência, da minha coragem ou da minha covardia. Assumo a responsabilidade dos meus atos. Dependendo de mim mesmo – e não dos outros. A palavra existe. E eu peço a Vossa Excelência que mande consignar esse auspicioso acontecimento nos anais. Ainda uma vez, Senhor Presidente, tenho dito. E mais não direi.

Exemplo significativo de quando se pode gastar as palavras, sem dizer absolutamente nada.

Publicado originalmente em 05/SET/2005

Piloto Automático – V

( Direto das catacumbas do Legal… )

AND THE OSCAR GOES TO…

Vai para meu filho, Erik, pela “melhor performance espontânea”. Ontem, final da tarde, do alto de seus dois anos e meio, ele nos convocou direto do banheiro. É que ele estava fazendo “totô” (criança nunca defeca, faz “totô”) e, após terminado o serviço ele nos chamou…

Ele simplesmente continuou sentadinho, inclinou-se beeeem pra frente, abaixou a tampa do vaso sobre as costas e disse: “Paiê, Mãiê: Tartaiuga!…”

* Publicado originalmente em 05/JUL/2004

Piloto Automático – IV

( Direto das catacumbas do Legal… )

– ROOOONNCC…

– Bonito, hein?

– Hmm?

– A que horas o senhor chegou ontem?

– UAAHH… Umas onze, eu acho…

– Pois é. Custava ligar? Volta e meia o senhor me apronta uma dessas. Já parou pra pensar por um único momento que eu fico preocupada com você? E se tivesse acontecido alguma coisa? Se ia demorar e sabia que ia demorar então ao menos avisasse. Já perdi a conta de quantas vezes o senhor me aprontou uma dessas. Eu já devo ter direito a sair de casa sem deixar nenhum recado por pelo menos umas duzentas e cinquenta e seis vezes, você não…

– Oito…

– Quê?

– Oito.

– Como assim, “oito”?

– Duzentas e cinquenta e OITO vezes. Não seis.

– …

– Mi?

– VOCÊ. NÃO. TEM. JEITO ! ! !

– Mas te amo tanto…

– @#$%¨&*!!!!

* Publicado originalmente em 12/OUT/2005.

Piloto Automático – III

( Direto das catacumbas do Legal… )

Nestes últimos dias por mais de uma vez estive tentado a sentar frente ao computador e colocar em palavras os devaneios de minh’alma. Mas não o fiz. E, sinceramente, perdi aquele momento de inspiração. Eu pretendia falar sobre muitas coisas, desde a riqueza e maravilha do mero SILÊNCIO em um ambiente (certo, Paulo?), passando pelo último filme de Harry Potter (muito bom, como sempre), mais alguns detalhes das obras de marcenaria que me custaram um ombro são (ainda tá doendo), e, talvez, concluindo com a demagógica visita de representante do Tribunal de Justiça para inauguração das novas Varas de Família de São José dos Campos (que sequer estão em condições de atender ao público).

Mas ainda voltarei a falar com detalhes desses assuntos.

Para não passar em branco, eis uma mensagem que recebi na forma de arquivo de powerpoint, enviada por Eloy Franco, com um soberbo fundo musical de Dilermano Reis (Abismo de Rosas):

Em 1955 em Campina Grande, na Paraíba, um grupo de boêmios fazia serenata numa madrugada do mês de junho, quando chegou a polícia e apreendeu o violão.

Decepcionado, o grupo recorreu aos serviços do advogado Ronaldo Cunha Lima, então recentemente saído da Faculdade e que também apreciava uma boa seresta. Ele peticionou em Juízo, para que fosse liberado o violão.

Aquele pedido ficou conhecido como “Habeas Pinho” e enfeita as paredes de escritórios de muitos advogados e bares de praias no Nordeste.

Mais tarde, Ronaldo Cunha Lima foi eleito Deputado Estadual, Prefeito de Campina Grande, Senador da República, Governador do Estado e Deputado Federal.

Eis a famosa petição:

HABEAS PINHO

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara desta Comarca:

O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção
Não é faca, revólver nem pistola.
É simplesmente, doutor, um violão.

Um violão, doutor, que na verdade
Não matou nem feriu um cidadão.
Feriu, sim, a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.

O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade.
Ao crime ele nunca se mistura.
Inexiste entre eles afinidade.

O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam as mágoas e que povoam a vida
Sufocando suas próprias dores.

O violão é música e é canção,
É sentimento de vida e alegria,
É pureza e néctar que extasia,
É adorno espiritual do coração.

Seu viver, como o nosso, é transitório,
Porém seu destino se perpetua.
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.

Mande soltá-lo pelo Amor da noite
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas leves e sonoras.

Libere o violão, Dr. Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito.
É crime, porventura, o infeliz,
cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

Será crime, e afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
perambular na rua um desgraçado
derramando na rua as suas dôres?

É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento.
Juntando esta petição aos autos nós pedimos
e pedimos também DEFERIMENTO.

Ronaldo Cunha Lima, advogado.

O juiz Arthur Moura sem perder o ponto deu a sentença no mesmo tom:

Para que eu não carregue
Muito remorso no coração,
Determino que seja entregue,
Ao seu dono, o malfadado violão!

* Publicado originalmente em 13/DEZ/2005

Reuniões

Reuniões. Taí uma coisa que me dá arrepios. Principalmente se falarmos em administração pública – qualquer que seja a esfera: municipal, estadual ou federal.

Eu costumo dizer que reuniões se assemelham a ervas daninhas. Surgem espontaneamente do nada, a qualquer momento e, quando você menos espera, já está envolto numa delas.

Mas, pior que isso são aquelas do tipo “reunião-de-marcar-reunião”. Fala-se muito, discute-se pouco, conclui-se nada. Ou melhor, tem conclusão sim: a data da próxima reunião, quando o assunto será então retomado…

Como estou de férias, pensei que tinha – pelo menos por algum tempo – me livrado desse tipo de coisa. Ledo engano. Já no meu primeiro dia, na última sexta-feira, quando meus filhotes também entraram de férias, lá fui eu nas respectivas escolas de cada um para retirada de seus trabalhos, do boletim e – adivinhem? Sim. Reunião do bimestre…

Entretanto, foi uma grata surpresa. Cada uma das professoras, a seu modo, em poucos minutos organizou aquela montoeira desconexa de pais e mães perdidos por ali (muito mais mães que pais, diga-se de passagem), tendo entrado diretamente no assunto, ou seja, o que foi lecionado no decorrer do bimestre, o desempenho global da turma, e, ao entregar os trabalhos de cada aluno, foram fazendo rápidas observações e recomendações caso a caso.

Simples. Rápido. Eficaz.

Quando menos esperava já estava voltando para casa, com um quadro geral na cabeça sobre tudo o que tinha ocorrido no bimestre inteiro com cada um dos filhotes.

Pois é… Talvez nossos políticos, agentes públicos, chefias, gerentes e administradores em geral devam fazer um curso de especialização com as professorinhas do ensino infantil para que aprendam como deve ser uma reunião…

* Post Scriptum – Só para constar: o filhote nº 1 (oito anos) tem apresentado uma sociabilidade maior, inclusive ajudando os colegas e mantendo boas notas; o filhote nº 2 (cinco anos), apesar de obediente, é meio que expansivo demais, não captando o dever num primeiro momento (na minha época chamávamos isso de “bagunceiro”); e já o filhote nº 3 (três anos) teve uma boa integração com a turma e não sente mais a falta da mãe no começo das aulas.