GRANDE DIA!

22/11/2025.

Vinte-e-dois-de-novembro-de-dois-mil-e-vinte-e-cinco.

Nunca antes, em todos esses anos nesta indústria vital, a vinheta do Plantão da Globo foi tão bem-vinda.

E me é muito difícil até mesmo tentar colocar em palavras meus sentimentos e percepções, quando tanta gente muito mais capacitada do que eu já o fez. Sim, é “Síndrome do Impostor” que se chama. Então, vida que segue. Mas como não podia deixar de fazer este registro histórico, segue nas palavras de outros.

Lá do Threads, temos Fabiana Mendez, Filósofa da Imagem e Posicionamento Etratégico.

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Por que a prisão domiciliar de Bolsonaro virou prisão preventiva na PF?

Explicando como se eu estivesse desenhando, e rindo pq tem gente se achando o intelectual explicando o que não sabe.

1. Começo básico:
Bolsonaro estava em prisão domiciliar.
Tradução: castigo. “Fica quieto em casa e não apronta.”
Mas né… estamos falando dele.

2. A LEI diz:
O art. 312 do CPP 1 permite a prisão preventiva quando há risco de fuga, ameaça à ordem pública, risco à investigação, etc.

O art. 318 [particularmente creio que aqui se enquadraria melhor o art. 317 do CPP 2] diz que a “domiciliar” é tipo um presente: só funciona se o indivíduo não for… digamos… “irresponsável”.

Adivinha.

3. A tornozeleira:
Meu anjo tentou tirar a tornozeleira.
Sim.
O homem que governou o país não conseguiu governar a própria panturrilha.

Moraes viu isso e pensou:
“Se deixar, foge pra Miami com a tornozeleira na mão dizendo que foi ‘coincidência’.”

4. A mobilização do filho:
Flávio Bolsonaro convocou não uma vigília, mas um mini-7 de setembro com cosplay de quartel.

Parecia anúncio de Black Friday para golpista: “CORRE PRA PORTA DO MEU PAI!!!”

Aí complica. Isso gera risco à ordem pública.
Tá no CPP. Tá no planeta Terra. Tá em qualquer manual de “como não parecer suspeito”.

5. O problema jurídico:
Tentativa de fuga + mobilização golpista + descumprimento de medidas = Requisitos COMPLETINHOS para prisão preventiva (art. 312, caput e §1º) 3.

Bolsonaro, sinceramente…
Conseguiu fazer um speedrun 4 da própria desgraça jurídica.

6. O resumo bem infantil:
• Prisão domiciliar = castigo.
• Regras = não fugir, não chamar multidão, não causar caos.
• Ele: faz tudo isso ao mesmo tempo.

Resultado?
• Vai pro quarto escuro da PF.
Com direito a lanche, ar condicionado, mas sem torcida e sem live.

7. A parte mais irônica:
Se Bolsonaro tivesse ficado quieto…
QUIETO!
Talvez continuasse em casa, comendo pão com leite condensado em paz.
Mas não.

O homem é tão frouxo que nem o próprio castigo consegue cumprir sem pedir ajuda pros filhos, pros militares e pra Nossa Senhora do Zap.

8. O X da questão:
Não foi o STF que endureceu.
Foi o Bolsonaro que… amoleceu.
Ele derrete juridicamente igual gelatina ao sol.

9. Em suma:
A lei existe. Ele descumpriu.
A PF agradeceu.
E Moraes, de caneta em punho, escreveu:
“Se não sabe brincar, volta pra cadeia.”

10. Como diria Kant, se estivesse no Brasil em 2025:
“A liberdade termina quando você tenta arrancar a tornozeleira e convoca golpe com o Wi-Fi da mansão.”

E ainda teve vigília na porta da PF, é claro, teve show para os seus fãs com direito a choro do Flávio Bolsonaro. Mas a melhor parte foi um pastor, da Frenteevangelica que falou a verdade na frente dos bolsonaristas e foi agredido. Afinal, nunca foi por Deus, pátria ou família, sempre foi por causa desse ser inescrupuloso e mentiroso.

Entendeu??

E tem mais; os governadores bolsonaristas que estão como urubu em cima de carne morta, defendendo o indefensável para pegar o capital político dessa familicia. Eita ferro!

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BÊ-Á-BÁ

1 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

2 Art. Art. 317. A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.

3 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. / § 1º A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).

4 SPEEDRUN: é a prática de jogar um videogame ou uma parte dele o mais rápido possível, com o objetivo de terminar o jogo no menor tempo possível (Wikipedia).

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DECRETUM EST

E, vamos combinar? O Xandão ainda teve mais consideração por ele do que o próprio coiso jamais teve por todo o povo brasileiro. Além destes dois trechos finais, a quem interessar possa, a íntegra da decisão está disponível aqui.

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EXPECTATIVA X REALIDADE

 

Nas asas da Graúna

Para quem ainda não conhece (assim como eu também não conhecia), esta é a galera que está à frente da Rede Graúna de Cultura, Diversidade e Solidariedade, atualmente capitaneada pela Sara e pela Stella. Sinceramente não sei bem como descrever essa entidade além daquilo que seu próprio nome já deixa bem evidente – mas, para simplificar, ela mesma se apresenta como uma “rede multiplicadora de afeto”.

Fundada em 13/10/2021, já foi anteriormente dirigida pela Vivian Pelodan e pelo Matheus Korting (foi o que acho que descobri, mas se eu estiver errado, me corrijam!), e o espaço que hoje ocupa foi inaugurado em 10/12/2021, onde, desde então, vem desenvolvendo suas atividades culturais, artísticas, sociais e outros quetais – às vezes aos trancos e barrancos, outras tantas, graças ao abnegado time do voluntariado, avançando a largos passos. Mas, vejam só: já passou de dois anos de existência, então provavelmente seu futuro deve, a cada vez mais, se estabilizar!

Mais do mesmo vocês podem encontrar no espaço virtual, em suas páginas do Facebook (aqui e aquimas algum dia alguém me explica do porquê de existirem duas…) e em sua conta no Instagram.

E em seu espaço físico, uma ampla dependência cedida pelo Carlos Alberto Leal (o CAL, ou CAU, ou CAO – eu nunca consigo me lembrar!), há um bom tempo já existia a Sala de Leitura Paulo Bicarato. Mas, pelo visto, a quantidade de livros foi crescendo, se avolumando, e, ao mesmo tempo, foram sendo organizados, chegando a um ponto que não fazia mais sentido ser tratada apenas como “sala de leitura”, pois já se tornara muito mais que isso. Era uma biblioteca. E, além: uma Biblioteca Comunitária!

Então, nada mais justo que essa árvore de livros, nascida daquelas sementes de leitura, permanecesse com o mesmo nome de seu patrono. Mas é preciso formalizar, é preciso inaugurar, é preciso ter festa, é preciso ter proseio, recordação e emoção!

E assim foi feito.

Bica, Bicarato, Paulo, Pô, Biquinha – e talvez até outras tantas alcunhas que eu ignoro -, esta é a mais justa homenagem para quem te conheceu. Você sabe. Você estava lá, conosco, comemorando e bebemorando. Um espaço que é a sua cara e, provavelmente, seria praticamente sua moradia se ainda estivesse por aqui. Nos reunimos e proseamos e rimos e rememoramos algumas de suas desventuras. De quando você foi “vendido” de uma redação de um jornal para outra pelo preço de duas cervejas; de uma de suas primeiras matérias – e ainda nem era contratado – que rendeu a primeira página do jornal (bem como uma rápida passagem pelo cárcere); de como você tão bem sabia escrever “com a letra dos outros” a partir do roteiro básico que lhe fosse dado (impossível não comparar, nos dias de hoje, com o prompt a ser passado para alguma inteligência artificial generativa executar suas tarefas); de suas sugestões, simples e desinteressadas, que acabavam rendendo a execução de projetos sociais e culturais que preenchiam a cidade; e de outros tantos causos que não vem ao caso elencar, pois aqui é um blog de família e não interessa a ninguém xeretar sobre essas histórias. Mas, se quiserem realmente saber, me perguntem no particular…

E confesso que foi com uma pontinha de orgulho (mas não muito, que é pra não estragar) que fiquei sabendo que algumas de minhas palavras, copiadas lá do prefácio  do seu livro O Alfarrábio – Elucubrações Diárias de um Roseano (2001 a 20204), acabaram integrando sua “minibiografia”:

Mas, afinal de contas, quem foi Paulo Bicarato? Ele foi um jornalista, fã incondicional da obra de Guimarães Rosa, riponga, palmeirense, ativista, canhoto, blogueiro das antigas, viajandão, mochileiro, temulento, amante da língua portuguesa, agitador de movimentos sociais, dono de um texto impecável, apaixonado pelo Brasil, de uma inteligência fora de série, um cara sincero, poeta de guardanapo de boteco, humilde, teimoso, com um coração de ouro, o senhor das crases, extremamente confiável, excelente copoanheiro, desapegado, de fina verve humorística e o melhor escritor que já conheci. Foi tudo isso e muito mais. Porém, sobretudo – ao menos para mim – o mais importante: Paulo Bicarato foi meu amigo.

Pô, Bica (e sua família, que estava presente, vai facilmente enxergar a redundância dessa expressão), foi uma noite muito Legal. E mesmo sabendo que você estava conosco, faltou você!

E eu não podia deixar de transcrever aqui a Balada para um Louco. Não vou nem explicar, pois só quem estava lá para entender…

Num dia desses ou, numa noite dessas
você sai pela sua rua ou, pela sua cidade ou,
ou, sei lá, pela sua vida, quando de repente,
por detrás de uma árvore, apareco eu!!!

Mescla rara de penúltimo mendigo
e primeiro astronauta a por os pés em vênus.
Meia melancia na cabeça, uma grossa meia sola em cada pé,
as flores da camisa desenhadas na própria pele
e uma bandeirinha de táxi livre em cada mão.

Ah! Ah! Ah! Você ri… Você ri porque só agora você me viu.
Mas eu flerto com os manequins,
o semáforo da esquina me abre três luzes celestes.
E as rosas da florista estao apaixonadas por mim, juro,
vem, vem, vamos passear.
E assim meio dançando, quase voando eu
te ofereço uma bandeirinha e te digo:

Já sei que já não sou, passei, passou.
A lua nos espera nessa rua é só tentar.
E um coro de astronautas, de anjos e crianças
bailando ao meu redor, te chama:
bem voar.

Já sei que já não sou, passei, passou.
Eu venho das calcadas que o tempo não guardou.
E vendo-te tão triste, te pergunto: O que te falta?
…talvez chegar ao sol, pois eu te levarei.

Ah! Ah! Ah! Ah!

Louco, louco, louco! Foi o que me disseram
quando disse que te amei.
Mas naveguei as águas puras dos teus olhos
e com versos tão antigos, eu quebrei teu coração.

Ah! Ah! Ah! Ah!

Louco, louco, louco, louco, louco!
Como um acrobata demente saltarei
dentro do abismo do teu beijo até sentir
que enlouqueci teu coração, e de tão livre, chorarei.

Vem voar comigo querida minha,
entra na minha ilusão super-esporte,
vamos correr pelos telhados com uma andorinha no motor.
Ah! Ah! Ah!
Do Vietnã nos aplaudem:
Viva! viva os loucos que inventaram o amor!
E um anjo, o soldado e uma criança repetem a ciranda
que eu já esqueci…
Vem, eu te ofereço a multidão, rostos brilhando, sorrisos brincando.
Que sou eu? Sei lá, um…
um tonto, um santo, ou um canto a meia voz.

Já sei que já não sou, nem sei quem sou.
Abraça essa ternura de louco que há em mim.
Derrete com teu beijo a pena de viver.
Angústias, nunca mais!!! Voar, enfim, voaaaarrr!!!

Ama-me como eu sou, passei, passou.
Sepulta os teus amores, vamos fugir, buscar,
numa corrida louca o instante que passou,
em busca do que foi, voar, enfim, voaaaarrr!!!

Ah! Ah! Ah! Ah!…

Viva! Viva os loucos!!! Viva!
Viva os loucos que inventaram o amor!
Viva! Viva! Viva!

Oswaldo Lelis Tursi

Diazinho modorrento, quente como o nono círculo do Inferno e eu cá em casa, cuidando das minhas coisinhas, prestando meus serviços, o trivial.

Para fechar o dia, quase oito da noite, depois de passar algumas tarefas (para eu “aproveitar” o final de semana), o Chefe me mandou no Zap: “E aí? Tá sabendo do Lelis? O que foi que aconteceu?”

Pronto.

Numa rápida fuçada nas redes sociais descobri que o Lelis tinha falecido. Dois dias atrás!!!

Tudo bem que não moro e nem trabalho mais em Jacareí, raramente vou para lá, mas será que NENHUM FILHO DUMA ÉGUA PODERIA TER ME AVISADO???

Que me perdoem os poucos que ainda acompanham minhas desventuras aqui no blog, mas isso também serve para vocês, que trabalharam comigo.

Catzo.

Enfim, o Lelis se foi. Com 64 anos. Não sei de quê. Se bem que vinte anos atrás, quando trabalhamos juntos, ele já tinha problemas com diabetes e pressão alta. E, se não me engano, em algum momento também já teve um infarto. E nos últimos tempos, provavelmente morando sozinho (fiquei sabendo que ele tinha se separado novamente), eu duvido que ele estivesse se cuidando como deveria.

Oswaldo Lelis Tursi. Foi meu professor na faculdade de Direito. Um va-ga-bun-do. Tanto é que nem lembro mais qual era a matéria que ele lecionava. Estava mais interessado em terminar logo as aulas e sair com o povo para tomar todas. Não importa quão fácil ou difícil fossem as provas que ele aplicava: ele simplesmente dava nota sete para TODO MUNDO e pronto. Independentemente do que você tivesse respondido.

Mas quando trabalhamos juntos, foi totalmente diferente. Somente ali, no dia a dia da Prefeitura, é que ele realmente foi meu “professor”. Se comecei a gostar de verdade da área de licitações foi graças a ele. E, sim, eu já falei tudo isso na cara dele, na época.

Ele foi Secretário de Assuntos Jurídicos de julho de 2002 até outubro de 2006, mas já havia passado pela Prefeitura antes, se não me falha a memória, no governo do Dr. Thelmo. Ele costumava dizer que tinha por “missão” ser um Secretário melhor do que ele havia sido da vez passada. Eis uma antiga foto dele, lá pelos idos de 1995 (eu acho), ao lado do ainda rapazinho Izaías (de azul), que viria um dia a ser o Prefeito de Jacareí.

Passamos por poucas e boas juntos. Inventamos licitações e soluções jurídicas para contratos que ninguém mais no mundo teria a ideia, a coragem (ou a loucura) de fazer. Discutíamos muito (no bom sentido da coisa) mas sempre respeitei aquele velho ditado (que acho que eu mesmo criei): “superada a técnica, resta a hierarquia”. Enfim, formávamos uma boa equipe, junto com toda essa turma nessa foto aí embaixo, que foi tirada na nossa confraternização de 2005.

Tínhamos a liberdade, inclusive, de zoar com ele. Aliás, zoávamos com todo mundo, bastava aparecer uma oportunidade. Na época foi lançado o filme dos Incríveis e a Fernandinha, da Comunicação, achou que o Lelis era a cara do Sr. Incrível, pelo que fez essa (tosca) arte. Deixei pregado atrás da porta da sala dele, de modo que ele somente viu após uma reunião com alguém importante. Que, aliás, foi quem viu primeiro. Já contei essa história antes, neste post aqui.

Mas agora ele se foi.

Não sei de quê.

Não sei como estava, o que estava fazendo, como andavam as coisas. Há mais de uma década não nos víamos.

E os buraquinhos no coração vão aumentando na medida que cada um destes meus personagens da velha guarda vai partindo.

Mesmo já tendo passado dois dias de seu falecimento, resolvi não publicar nada nas redes sociais (Face, Insta, Threads, o escambau), pois percebi, pelas últimas postagens, que minha timeline tá mais parecia com um obituário do que qualquer outra coisa…

Fascismo avança

( Roubartilhado diretamente lá do Boteco Escola… )

O fascismo avança. Nada fazemos. Ficamos calados. E não é a primeira vez que isto acontece. Por tal motivo, vale lembrar um poema de Martin Neimoller, pastor evangélico preso por Hitler em 1938.

Primeiro, eles vieram…

Primeiro eles vieram atrás dos comunistas

E eu não protestei, porque não era comunista;

Depois, eles vieram pelos socialistas,

E eu não disse nada, porque não era socialista;

Mais tarde, eles vieram atrás dos líderes sindicais,

E eu me calei, porque não era líder sindical;

Então foi a vez dos judeus,

E eu permaneci em silêncio porque não era judeu;

Finalmente, vieram me buscar,

E já não havia ninguém que pudesse falar por mim.

Tem caroço nesse angu…

Antes de mais nada, permitam-me explicar uma coisa: o angu, aquele anguzão crássico messs, é simprão de tudo. Água, fubá, cozinha, tá pronto. Pode até mudar o ponto, pra mais cremoso ou pra mais firminho, mas angu é só isso aí. Sem tirar nem por. Nem mesmo uma manteiguinha ou um salzinho pra dar tempero.

Não confundam com polenta, que, na minha opinião, nada mais é que o “angu chique”. Pois essa prima rica do angu pode ser feita com fubá, com farinha de milho mais grossa, flocão, farinha de aveia e até mesmo farinha de trigo. Invariavelmente cremosa, costuma ainda vir com um molho por cima à base de carne moída, tomate refogado, o escambau. Os cozinheiros de plantão poderão lhes indicar as mais distintas variedades de molhos e temperos para o deleite de seus paladares.

Angu e Polenta: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Certo?

Então.

Meu pai, como bom e legítimo mineiro, nunca abriu mão – ao menos em casa – de um prato de angu para acompanhar as refeições. Sim, tínhamos feijão, arroz, a mistura e, sempre, o angu. Minha mãe cozinhava o suficiente para virar aquela massa pura de água e fubá num prato, esperar um bocadinho para esfriar e ganhar a consistência mais ou menos de uma pamonha, para cortar com colher e se servir, deixando o resto intacto. Ele podia comer aos pedaços ou amassar com o garfo junto com feijão ou, ainda, ir misturando aos pouquinhos. Diferente de meu irmão do meio, que sempre se servia e, uma vez o prato feito, só faltava bater no liquidificador, de tanto que misturava tudo, amassava, remexia e mexia de novo, para que a comida toda ficasse com uma só aparência.

De minha parte nunca gostei desse coiso assim não. Nem o angu, nem de misturar tudo numa só levada. Afinal de contas, cada qual com seu cada seu.

Isso tudo só pra contar dois causos procês.

Esse mesmo irmão, tempos depois de separado e já se engraçando com uma nova moçoila – que mais tarde viria a trocar seu Castelo Branco pelo Solar dos Andrade –, foi jantar com ela. Comidinha caseira, ela mesma iria fazer, perguntou o que ele gostaria de ter à mesa.

– Ah, amor, sabe de uma coisa? O que eu gosto bastante e faz tempo que não como, pois nunca encontro isso em restaurante, é angu. Pode ser?

Ela não teve dúvidas. Disse que claro que sim, pode ficar aí sentadinho, que vou preparar tudo e já, já a gente vai comer uma comidinha bem gostosa. Dito isso, foi pra cozinha e com esmero e carinho preparou o almoço e mais aquela iguaria que meu irmão tanto queria.

Pratos prontos, serviu a mesa, com satisfação e encanto, apenas aguardando uma já esperada aprovação.

Mesa servida, ele dá aquela fiscalizada e, de rompante solta: “Quié isso?”

– Ué, amor, o que você pediu. Seu angu. Fiz bem cremosinho e temperadinho e com um molho que ficou simplesmente divino!

Resignado, engolindo um longo suspiro, se serviu. Na primeira bocada já soltou.

– O que minha mãe faz é diferente…

Deixo para a fértil imaginação de vocês como deve ter se dado o proseio a seguir. Mas já lhes adianto que o relacionamento miraculosamente sobreviveu a esse entrevero e até hoje os dois vão muito bem, obrigado. Eu acho. Ao menos, desde que não se tenha angu à mesa…

Esse foi um, mas, pasmem, teve outro!

Situação parecida, este velho causídico que vos tecla, tempos depois de separado e já se engraçando com uma nova moçoila – que mais tarde viria a compartilhar seu clássico Miura com um não tão clássico Andrade –, levou-a para almoçar em casa. Na realidade, na casa de minha mãe, pois recém separado e durango à toda prova, eu mesmo não tinha muito lá o que oferecer…

E eis que essa preciosa japinha se põe a ajudá-la a arrumar a mesa para servir o almoço. Se desvencilha da cachorrinha – a saudosa Brisa, sempre a nossos pés – e, enquanto conversa, coloca as esteirinhas, põe os pratos, os talheres e vai ajudando no que pode. De repente dá de cara com aquele prato de angu esfriando sobre a pia e não tem dúvidas: coloca-o no chão, perto da porta. Minha mãe:

– Menina! O que é que você está fazendo?

– Ué? Pondo no chão. Ou a senhora quer que ponha lá fora?

– Não, não, não!!! Isso é o angu do Bento!

– Sério? Lá na roça isso sempre foi comida pros cachorros…

Minha mãe, sem disfarçar um longo suspiro, resgata a “iguaria canina” e a devolve à mesa, antes que meu pai tivesse sequer percebido o que aconteceu.

Para quem me conhece, não é preciso nenhuma fértil imaginação para já saber que tive que sair da cozinha às gargalhadas enquanto deixava as duas pra trás para que se entendessem. Mas, passada a saia justa, não levou nem duas semanas para que ela voltasse a falar comigo…

Conclusão?

Vocês, moçoilas – pêlamôr! – tratem de conhecer melhor seus novos namorados para evitarem situações constrangedoras como essas. Pois, no fundo, no fundo, nós só temos a perder. E quando me refiro a “nós”, estou falando dessa ignara casta masculina que acha que todo mundo NO MUNDO já deve de antemão saber de cor e salteado o que se passa nestas nossas frágeis cabecinhas apaixonadas…

Enfim, só sei que foi assim !

😁

Bodas de Opala

Bem, mais uma vez vou esclarecer: o termo “bodas” vem do latim. Significa promessa – no caso, os votos matrimoniais, feitos no dia do casamento. Assim, a cada ano que passa, comemoramos o aniversário de bodas, o aniversário daquela promessa feita um para o outro. Em sua origem comemorava-se apenas a de Prata (25 anos) e a de Ouro (50 anos), mas com o tempo foram surgindo outras simbologias para os demais anos.

E cá chegamos nós aos 24 anos de casado – e sem gracinhas, aí no fundo, que eu tô ouvindo… O vigésimo quarto ano de casado é simbolizado pela pedra preciosa Opala. Não há uma cor definida para essas bodas, pois essa pedra possui uma grande variação de cores, parecendo um verdadeiro arco-íris. Ela é constituída de um material muito resistente, que para chegar até essa condição passa por diversas fases, da mesma forma que acontece em um casamento que dura tantos anos. Afinal, não é nada fácil permanecer por mais de duas décadas com alguém do seu lado, mantendo o sentimento forte o bastante para continuarem na caminhada juntos!

Mas, particularmente, ainda prefiro a definição de Ailin Aleixo, na orelha do livro Balde de Gelo, de Daniela Macedo & Marco Aurélio: “A vida a dois não é complicada. Complicado é sambar em descida. A vida a dois é um milagre, isso sim. Só vivendo pra entender o que é aguentar maus humores, parentes, cachorro pentelho, ciúmes, amigos intrometidos. Mas também é só vivendo que se compreende a delícia de chegar em casa depois de um dia corno e encontrar quem se ama, receber cafuné assistindo filme, soltar pum sem precisar pedir desculpa. E (…) todos esses ingredientes misturados com graça, leveza e humor – atributos indispensáveis para a sobrevivência de qualquer relação. E de qualquer um.”

Já contei a minha história com a nossa querida, amada, idolatrada, salve, salve Dona Patroa (com direito a muitas fotos) por mais de uma vez aqui neste nosso cantinho virtual, em especial nos textos “Bodas de Marfim”, “Bodas de Louça” e “Bodas de Palha” – é só dar uma fuçada básica no blog e pronto!

Mas sempre me divirto ao recordar da seguinte passagem, lá dos idos do dia 12/12/1998, nas dependências do restaurante rural Coelho e Cabrito, quando formalizamos nossa união perante os homens e perante Deus. Aliás, logo após a cerimônia civil e sem que tivesse chegado o pastor que faria um culto ecumênico (pois ele se perdeu no caminho lá no meidumatu…), chamamos todos os convidados para que se sentassem e começassem a se servir. Então, quando todos já estavam acomodados, eis que o pastor chegou. Pediu desculpas aos presentes e falou suas palavras. O que rendeu o inesquecível comentário do Luisinho, nosso padrinho:

“O melhor casamento que eu já fui foi o da Mieko e do Adauto. Enquanto o padre falava a gente estava lá, sentadão, com o copo de cerveja na mão!”

E para não perder a oportunidade, pois sei que quem me conhece já deve estar esperando a “piada pronta”, NÃO, as Bodas de Opala do nosso casamento não tem nada a ver com o MEU Opala, mais conhecido como Titanic – a Lenda. Até porque, entre nós, estamos apenas nas Bodas de Cristal… 😉

Tio Alemão

Meu pai, atualmente com 85 anos, é o mais velho de doze irmãos, sendo eles: José Bento (Zé Bento), Fé, Roberto (Alemão), Esperança, Caridade, Luiza, Felisberto (Dinho), Jorge, Geraldo (Gêra), Maria Madalena (Máda), Pedrina (Pêdra) e Laura. Destes já se foram Luiza, que aos poucos meses faleceu de coqueluche, em 1947, Fé, em 1987, Jorge, em 2007, e o Gêra, em 2014.

O Roberto, mais conhecido na família como “Tio Alemão”, nunca se casou e outrora foi o único dos irmãos que continuou com a “lida” na roça, cuidando de sítios, vendendo cavalos e outros quetais.

E para encerrar este introito faltou somente esclarecer que a genética de minha família pelo lado paterno é bem “forte”. Mesmo atravessando gerações somos, de um modo geral, todos mais ou menos parecidos – conforme já contei lá no blog no causo O passado bate à porta (II).

Ah, e mais um último detalhe: a maioria de minhas tias tem uma capacidade assustadora de lembrar a data de aniversário de praticamente todos os membros da família!

Agora vamos ao causo.

Tempos atrás, ainda antes do advento da pandemia, numa de suas andanças minha tia Madalena encontrou uma amiga que há muito tempo não via.

– Nossa, Madalena, há quanto tempo!

– Pois é, menina, já faz mais de ano, né?

– Ô, se faz! Muito mais! Mas Máda, me diga uma coisa.

– O quê?

– O Alemão. Ele tá com quantos anos?

– O Roberto? Deixa eu ver… Ele é de 1940, então ele já está com 79 anos.

– Tudo isso? Puxa vida, que bênção, hein? É que eu vi que outro dia você publicou uma foto dele com sua sobrinha e eu fiquei impressionada: NOSSA, COMO ELE ESTÁ CONSERVADO!

– Ah, mas aquele lá não é o Alemão, não. Aquela foto é do Adauto, filho do Bento.

– Sério? Nossa, mas eu podia jurar que era o Alemão! E esse Adauto, quantos anos ele tem?

– O Adauto? Deixa eu ver… Ele é de 1969, então está com 50 anos.

– Cinquenta anos? Só? NOSSA, COMO ELE ESTÁ ACABADO!

Ou seja, na minha vida nada muda, é sempre a mesma coisa: sósifôdo!