HQ Nacional em discussão

Notícia veiculada na revista Wizard Brasil nº 30:

Quadrinhos nacionais na pauta da Câmara dos Deputados

Sidney Gusman

Um sonho antigo de muitos quadrinhistas brasileiros parece perto de se realizar. Tramita em caráter conclusivo nas comissões de Educação e Cultura; de Finanças e Tributação; de Constituição e Justiça e de Cidadania na Câmara dos Deputados, em Brasília, o controverso projeto de lei 6581/06, do deputado Simplício Mário (PT do Piauí), que obriga as editoras a publicar um mínimo de 20% de histórias brasileiras, considerando-se a produção do ano inteiro.

A intenção é incentivar a produção, a publicação e a distribuição de gibis nacionais. A proposta também obriga as empresas a ter pelo menos 20% de obras brasileiras entre seus títulos de quadrinhos, e todos lançados comercialmente. Em ambos os casos, o percentual deverá ser atingido no quarto ano de vigência, a partir do aumento progressivo de um mínimo inicial de 5%.

A lei atinge até jornais que deverão observar a relação de uma tira ‘caseira’ para cada estrangeira publicada. O projeto entende HQ nacional como aquela criada por um artista brasileiro ou estrangeiro residente no País e publicada por empresa sediada aqui.

O projeto prevê que o poder público crie ações de apoio e incentivo à produção de HQs nacionais e que bancos e agências de fomento federais estabeleçam programas para financiar a confecção de publicações brasileiras. Na seleção dos projetos, será dada preferência aos com temática relacionada à nossa cultura.

Para Simplício Mário, esse percentual é suficiente para romper a hegemonia estrangeira, ‘sem impor uma limitação exagerada aos quadrinhos que vêm de fora, não representando assim, nenhum tipo de censura à liberdade de expressão e ao acesso à informação’. Se aprovada, a lei, que vem gerando discussões acaloradas, pode representar uma grande mudança no cenário da nona arte brasileira.

Eis a íntegra do Projeto de Lei nº 6581/2006 (tanto o texto como seus andamentos podem ser acessados em http://www.camara.gov.br):

PROJETO DE LEI N.º , DE 2006

(Do Sr. Simplício Mário)

Estabelece mecanismos de incentivo para a produção, publicação e distribuição de revistas em quadrinhos nacionais.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Esta Lei estabelece incentivo para a produção e distribuição de histórias em quadrinhos de origem nacional no mercado editorial brasileiro.

Art. 2º As editoras deverão publicar um percentual mínimo de 20 por cento de histórias em quadrinhos de origem nacional, considerando-se o conjunto das publicações do gênero produzidas a cada ano, na forma da regulamentação.

§ 1º Considera-se história em quadrinhos de origem nacional aquela criada por artista brasileiro ou por estrangeiro radicado no Brasil e que tenha sido publicada por empresa sediada no Brasil.

§ 2º O percentual de títulos estipulado no ” caput” deste artigo será atingido da seguinte forma: cinco (5) por cento no primeiro ano de vigência desta lei; dez (10) por cento no segundo ano; quinze (15) por cento no terceiro ano, atingindo-se a cota de 20 por cento no ano subsequente.

Art. 3º As empresas distribuidoras deverão ter um percentual mínimo de 20 por cento de obras brasileiras em quadrinhos entre seus títulos do gênero, obrigando-se a lançá-los comercialmente.

§ 1º O percentual de títulos e lançamentos a que se refere este artigo será implementado na forma prevista no § 2º do artigo anterior.

Art. 4º Em se tratando de veículos impressos de circulação diária, semanal ou mensal, deverá ser observada a relação de uma tira nacional para cada tira estrangeira publicada.

Art. 5º O Poder Público, por meio do órgão competente, implementará medidas de apoio e incentivo à produção de histórias em quadrinhos nacionais, tais como, estimular a leitura em sala de aula, promover eventos e encontros de difusão do mercado editorial de histórias com quadros em sequência voltadas para o público infanto-juvenil e a inserção de disciplinas práticas, tais como roteiro e desenho, no currículo das escolas e universidades públicas.

Art. 6º Os bancos e as agências de fomento federais estabelecerão programas específicos para apoio e financiamento à produção de publicações em quadrinhos de origem nacional, por empresa brasileira, na forma da regulamentação.

§ 1º Na seleção dos projetos, será dada preferência àqueles de temática relacionada com a cultura brasileira.

§ 2º Os projetos financiados com recursos públicos deverão destinar percentual de, no mínimo, 10% da tiragem das publicações em quadrinhos para distribuição em bibliotecas públicas, na forma da regulamentação.

Art. 7º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

Conhecida como “banda desenhada”, “BD”, “história em quadrinhos” ou “HQ”, a narração de histórias de forma sequencial, conjugando texto e imagens, publicadas no formato de revistas, livros ou em tiras, são um gênero de arte que conquistou o mundo.

Não há país que não mantenha uma legião de admiradores e colecionadores de histórias em quadrinhos, nos mais diversos formatos, estilos, gêneros e temas. Surgidas no século XIX, as histórias em quadrinhos tiveram o seu berço nos Estados Unidos, segundo alguns autores, com a publicação de “As Canções de Cego”, editadas em 1820.

Alguns autores apontam, no entanto, que foi de Angelo Agostini, em 1869, no Brasil, a idéia de fazer histórias ilustradas quadro a quadro. A primeira revista em quadrinhos brasileira chamava-se “Tico Tico” e acredita-se que foi a primeira do mundo a trazer histórias completas. Foi lançada em 1905 e em seus primeiros anos limitava-se a reproduzir os quadrinhos norte-americanos, principalmente Buster Brown e Tige de Richard Outcault (renomeados como Chiquinho e Jagunço).

Mas, apesar de ser uma arte antiga no País, o mercado nacional de historinhas ilustradas sempre foi dominado pelas publicações estrangeiras, com personagens como Yellow Kid, o Super Homem, o Batman, Tintin, acompanhado do cão Milou, além de outros, como o marinheiro Popeye e o detetive Dick Tracy.

Majoritariamente, os autores nacionais seguem o estilo comics (como os quadrinhos norte-americanos ficaram conhecidos, em função do humor) dos super-heróis criados nos Estados Unidos. No caso dos Comics, alguns artistas brasileiros, agenciados nos Estados Unidos, conquistaram fama internacional, como Roger Cruz que desenhou o X-Men e Mike Deodato, que desenhou Thor, Mulher Maravilha e outros. Além dos comics, os desenhos brasileiros também foram fortemente influenciados pelos gibis japoneses, conhecidos como Mangá.

A tira é considerada como estilo mais identificado com o brasileiro, tendo sido usada, como elemento de resistência à ditadura militar ou de sátira aos costumes nacionais. Entretanto, apesar de estarem há mais de 100 anos no mercado nacional, e de terem ganhado o apelido de “Gibi”, graças a uma revista lançada em 1939, os quadrinhos brasileiros nunca ganharam grande impulso.

Afora alguns títulos de menor expressão, o mercado brasileiro é identificado apenas por um grupo de personagens, criado por um artista nacional: a Turma da Mônica. Atualmente, grande parte das revistas vendidas em bancas leva a assinatura de Maurício Souza, o “pai” de Mônica, Magali, Cebolinha, Cascão e outras personagens que marcaram gerações no Brasil, mantendo sempre o mesmo estilo, a mesma mensagem, os mesmos papéis, mas sem envelhecer ou perder a atualidade. Atualmente, as revistinhas da Turma da Mônica são um fenômeno mundial, tendo sido traduzidas para diversas línguas e sendo vendidas em inúmero países.

Para os estudiosos, o mundo dos quadrinhos, que já foi visto como inimigos da aprendizagem por educadores, hoje representa um retrato de valores e costumes de uma sociedade e reproduz para a criança um universo estável, em meio a tantas mudanças e à insegurança que cerca o cotidiano da vida moderna. Além de ser uma “válvula de escape” para a fantasia infantil, os quadrinhos são uma grande forma de promover a cultura nacional.

O projeto que ora propomos leva em conta não apenas o potencial econômico do mercado consumidor brasileiro, que hoje beneficia apenas a indústria de entretenimento norte-americana e outras nacionalidades, mas também a importância de fomentar um elemento de identidade cultural e manifestação artística.

Por isso, sugerimos que sejam incentivadas as empresas que comprovem a publicação de, pelo menos, 20% de material nacional. O percentual estabelecido é suficiente para romper a hegemonia estrangeira, mas sem impor uma limitação exagerada aos quadrinhos que vêm de fora, não representando, assim, qualquer tipo de censura à liberdade de expressão e ao acesso à informação.

A analogia que fazemos é com a chamada “cota de tela”, prevista no art. 55 da Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, que determina que “por um prazo de vinte anos, contados a partir de 5 de setembro de 2001, as empresas proprietárias, locatárias ou arrendatárias de salas, espaços ou locais de exibição pública comercial exibirão obras cinematográficas brasileiras de longa metragem, por um número de dias fixado anualmente, por decreto, ouvidas as entidades representativas dos produtores, distribuidores e exibidores.”

A “cota de tela” constitui instrumento importante para incentivar a produção cinematográfica nacional, por meio da obrigatoriedade de exibição de uma quantidade mínima de películas nacionais nas salas de exibição de uma quantidade mínima de películas nacionais nas salas de exibição em todo o Brasil. Se temos as cotas para os filmes, podemos também ter as cotas para os quadrinhos, como uma política temporária de incentivo, a ser extinta no momento em que o setor se desenvolver e passar a caminhar de maneira autônoma.

Para que esse crescimento ocorra, também estabelecemos que caberá ao Poder Público, por meio de suas agências de fomento, financiar a produção de quadrinhos nacionais. Há vários anos, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por exemplo, criou uma linha de financiamento para patrocinar o cinema brasileiro, desde a produção até a exibição. Neste ano, destinou R$ 22 milhões para o setor, 46% a mais do que no ano passado.

Seguindo o mesmo modelo, e investindo em um gênero de arte como os quadrinhos, estamos convictos de que poderemos aumentar a presença internacional do Brasil na área cultural, ainda considerada tímida e restrita basicamente às novelas, com exportações anuais de cerca de US$ 60 milhões. Podemos fazer como a Coréia, onde os quadrinhos receberam forte apoio estatal, e hoje são exportados para vários países, inclusive o Brasil.

Assim sendo, pedimos o apoio dos ilustres parlamentares para a aprovação da norma proposta.

Sala de Sessões, em de de 2006.

Deputado SIMPLÍCIO MÁRIO

Bem x Mal?

Recentemente, visitando o Jesus me Chicoteia e acompanhando a discussão entre um pastor e o autor desse site acabei por descobrir um novo e interessante cantinho: ins-pirada. Segue uma perolazinha pinçada de lá:

Tem um diabinho sentado no meu ombro esquerdo:

– Toca um foda-se! Foge de casa! Mata o porteiro! Faça do mundo uma grande carreira!

E tem um outro diabinho sentado no meu ombro direito:

– É isso aí!

E a boa e velha dicotomia bem x mal?

Arcaicidades

Com todo o respeito que tenho ao órgão de classe dos advogados no qual sou inscrito, já disse mais de uma vez que discordo de determinados posicionamentos tomados pelo mesmo, eis que soam arcaicos e dissociados da dinâmica realidade na qual vivemos nos dias de hoje. Isso pode ser comprovado pelo meu posicionamento (de quase uns seis anos atrás) que pode ser visto na barra ali de cima, sob o título de “CONSULTAS”.

Pois bem. Também sou sócio da AASP (Associação dos Advogados de São Paulo), a qual manda quase que semanalmente um excelente material de consulta na forma de Boletim – fora os livros bimestrais, os cursos a preços módicos, as publicações (sempre corretas) e inúmeros outros benefícios. No Boletim de início de agosto (nº 2482) foi veiculado mais um posicionamento do Tribunal de Ética do qual discordo, pois acho que o livre exercício da profissão deve ser um direito do advogado, não podendo se curvar a posicionamentos – sob minha ótica – egoísticos.

Mas vamos à notícia. Trata-se da ementa de um acórdão do Tribunal de Ética da OAB/SP:

Assistência jurídica gratuita a membros da comunidade – Entidades escolares ou de ensino – Impossibilidade – Concorrência com programas de assistência jurídica já estabelecidos pela PGE/OAB e Faculdades de Direito – Possibilidade, mesmo que remota, de captação de clientela – Precedente. A prestação de assistência ou assessoria jurídica a pessoas da comunidade, carentes ou não, em entidade escolar ou de ensino por meio de advogados, adentra no campo da antieticidade, da captação de clientela e concorrência desleal, concorrendo, ainda, com programas de assistência jurídica às pessoas carentes financeiramente prestados pelo convênio PGE/OAB e pelas faculdades de direito. Qualquer prestação de assistência jurídica em estabelecimentos de ensino, religiosos ou similares, por mais altruísta que possa ser, necessariamente advém contato pessoal e preferência profissional para os casos presentes e futuros, ocasionando infração ética, ora coibida. Precedentes: E-1.637/98 e E-2.930/04 (Processo E-3.149/2005 – v.u., em 19/5/2005, do parecer e ementa do Rel. Dr. João Luiz Lopes).

Isso, pra mim, chama-se “nivelar por baixo”…

La soberanía de Cuba debe ser respetada

Recebi hoje um e-mail do amigo Cláudio. Interessante…

Mais de 400 personalidades de todo o mundo, entre eles oito prêmios Nobel, assinaram um manifesto divulgado à imprensa nesta segunda-feira (7/8) no qual exigem que os Estados Unidos respeitem a soberania de Cuba. O texto condena também as crescentes ameaças contra a integridade territorial da ilha.

Entre as personalidades estão os brasileiros Chico Buarque, Frei Betto e Oscar Niemayer, além de nomes como Eduardo Galeano, José Saramago, Ignacio Ramonet, Miguel Bonasso, Rigoberta Menchú, Desmond Tutu, Mario Benedetti e Noam Chomsky.

O documento, intitulado ‘A soberania de Cuba deve ser respeitada’, critica com firmeza a postura de Washington diante do problema de saúde do presidente Fidel Castro, afastado há uma semana do poder para se recuperar de uma cirurgia abdominal.

‘Devemos impedir a todo custo uma nova agressão’, defende o documento, levando em conta a crescente militarização da política externa norte-americana. Ao final, há o endereço de uma página na internet criada especialmente para propagar o manifesto e conquistar mais adesões.

Veja mais em http://www.porcuba.org.

Politicamente incorreto

O texto a seguir é um pequeno exemplo da criatividade elevada a sua enésima potência… Seu autor, Marco Aurélio Gois dos Santos, do site Jesus me chicoteia, vem fazendo uma sátira da Bíblia desde o Gênesis. Ah, e sim, tenho certeza ABSOLUTA que os mais carolas vão se sentir ofendidos não só com esse texto, mas com tudo o mais que estiver lá.

Ainda assim o bom humor do politicamente incorreto é inegável…

NOÉ

Se logo na sua segunda geração a humanidade já promovia tamanha zona, imaginem a esculhambação depois de dez gerações. E olhe que neguinho vivia muito naquela época. Adão, o primeiro homem, viveu 930 anos! Enoque, que deve estar lá pela sétima geração, viveu 365 anos e foi levado pro céu sem morrer, e seu filho, Matusalém, viveu 969 anos. E pensar que hoje em dia chamamos qualquer um que chegue aos oitenta de Matusalém, pobres velhinhos…

Mas é de Noé que quero falar. Noé é o décimo dos patriarcas, como podemos ver naquelas intermináveis genealogias bíblicas que parecem o Para Todos do Chico Buarque, com Noé cantando: O meu pai era Lameque/Meu avô, Matusalém/ O meu bisavô, Enoque/ Meu tataravô, Jarede, bom vocês já sabem onde isso vai parar, dez caras que viveram pra cacete em ordem cronológica inversa até Adão.

Quando Noé estava com 500 anos (recém saído da adolescência, portanto), deus o chamou para tomar umas e conversar. Perguntou da patroa, das crianças, Noé disse que Sem, Cam e Jafet eram os filhos que ele tinha pedido a deus, aliás queria muito aproveitar a ocasião para agradecer, e sua família, seu deus, como é que vai? E deus disse que não tinha família, aliás, tinha um filho, mas era uma carta que ele queria jogar só em último caso, o que levava ao assunto que o trouxera até ali: Estava arrependido de ter criado o mundo e a humanidade, os homens portavam-se de forma escandalosa, matavam-se uns aos outros, enganavam-se, traíam-se, blasfemavam contra deus, e aposto cem ovelhas com você como botaram água nesse ketchup. Resumindo, deus resolvera destruir tudo com uma grande inundação, matar todo mundo afogado. Mas Noé era um cara legal, boa praça, e deus determinara que ele seria o pai da nova humanidade.

Pegou um guardanapo e começou a desenhar: “Tá aqui, ó. Você vai construir essa caixa grande, botar uma porta, uma janelinha, uma rampa e encher a caixa com um casal de cada espécie de todos os animais”. Noé olhou o desenho, olhou pra deus pra ver se ele não estava brincando, olhou pro desenho de novo, coçou a barba e disse “Tudo bem”. Deus ficou muito feliz, pediu outra rodada e deu um prazo de cem anos para que Noé concluísse a empreitada.

No dia seguinte, com mil britadeiras dentro da cabeça e uma sede que dava vontade de beber todo o dilúvio, Noé se deu conta da sinuca de bico em que havia se enfiado. Era tarde demais para lamentar, no entanto, então chamou os filhos e perguntou o que eles achavam de um cruzeiro marítimo só de casais. Os três, claro, acharam supimpa. “Então peguem as ferramentas, que vamos construir o raio do barco”.

E passaram-se cem anos. Na hora de botar os animais dentro da arca, Noé percebeu que ali é que começava o trabalho de verdade. Tomou um porre homérico, embora Homero nem sonhasse em nascer naquele tempo, e foi pegando uns bichos a esmo. Pegou uns cachorros, umas cabras, umas vacas, galinhas, enfim, esses bichos de criação. Deus olhou lá de cima, viu que era trabalho demais pro cara e resolveu dar uma força. Sabia que seria impossível, por mais que quisesse, enfiar tudo quanto era animal na tal arca de Noé. Então fez uma seleção dos bichos que mais gostava, botou todo mundo em fila e foram entrando na arca.

Bom, é claro que na arca já viviam os animais de sempre, cupins, formigas, traças, lesmas, baratas de todos os tipos, ratos. E os animais carregavam suas pulgas, carrapatos, vermes. Com essa nem deus contava.

Mas o negócio é que começou a chover, inundou tudo e Noé, sua esposa, seus filhos e suas noras passaram 40 dias navegando sem rumo. Depois desse tempo, as águas começaram a baixar e a arca encalhou no monte Ararat, na Armênia. A família ainda levou um tempo para sair, pois tinham uma partida de pôquer para terminar (“Ninguém sai! Ninguém Sai!”). Mas acabaram por sair, pois precisavam repovoar a terra. Além do mais, o cheiro da bicharada tornava-se insuportável.

Saíram e deram de cara com o arco-íris no céu. Deus explicou a Noé que aquele arco representava o pacto que ele fazia com a humanidade a partir de então, de nunca mais destruir a terra pelas águas (inventando aí, de quebra, o contrato com letras miudinhas: “O que não me impede de, quando me der na telha, destruí-la pelo fogo, pelos terremotos, pela fome, pela peste ou outro meio que me aprouver”).

Todos viveriam felizes, se Noé meses depois não plantasse uma vinha, enchesse a cara mais do que nunca e amaldiçoasse um de seus filhos. Viu deus que tudo recomeçava, fez “tsk, tsk, tsk” e começou a se arrepender de novo. Ah, e Noé viveu até os 950 anos.

Versões

Volta e meia recebo algum texto cuja autoria é creditada a Luís Fernando Veríssimo. Já, há muito, aprendi a duvidar desse tipo de informação. O texto a seguir é mais um desses…

Vivemos cercados pelas nossas alternativas, pelo que podíamos ter sido.

Ah, se apenas tivéssemos acertado aquele número (unzinho e eu ganhava a sena acumulada), topado aquele emprego, completado aquele curso, chegado antes, chegado depois, dito “sim”, dito “não”, ido para Londrina, casado com a Doralice, feito aquele teste… Agora mesmo neste bar imaginário em que estou bebendo para esquecer o que não fiz – aliás, o nome do bar é Imaginário. Sentou um cara do meu lado direito e se apresentou:

– Eu sou você, se tivesse feito aquele teste no Botafogo.

E ele tem mesmo a minha idade e a minha cara. E o mesmo desconsolo.

– Por que? Sua vida não foi melhor do que a minha?

– Durante um certo tempo, foi. Cheguei a titular. Cheguei a seleção. Fiz um grande contrato. Levava uma grande vida. Até que um dia…

– Eu sei, eu sei… disse alguém sentado ao lado dele.

Olhamos para o intrometido. Tinha a nossa idade e a nossa cara e não parecia mais feliz do que nós. Ele continuou:

– Você hesitou entre sair e não sair do gol. Não saiu, levou o único gol do jogo, caiu em desgraça, largou o futebol e foi ser um medíocre propagandista.

– Como é que você sabe?

– Eu sou você, se tivesse saído do gol. Não só peguei a bola como mandei para o ataque com tanta perfeição que fizemos o gol da vitória. Fui considerado o herói do jogo. No jogo seguinte, hesitei entre me atirar nos pés de um atacante e não me atirar. Como era um “herói”, me atirei.

Levei um chute na cabeça. Não pude ser mais nada. Nem propagandista. Ganho uma miséria do INSS e só faço isto: bebo e me queixo da vida. Se não tivesse ido nos pés do atacante…

– Ele chutaria para fora.

Quem falou foi o outro sósia nosso, ao lado dele, que em seguida se apresentou:

– Eu sou você se não tivesse ido naquela bola. Não faria diferença. Não seria gol. Minha carreira continuou. Fiquei cada vez mais famoso, e agora com fama de sortudo também. Fui vendido para o futebol europeu, por uma fábula. O primeiro goleiro brasileiro a ir jogar na Europa.

Embarquei com festa no Rio…

– E o que aconteceu? perguntamos os três em uníssono.

– Lembra aquele avião da VARIG que caiu na chegada em Paris?

– Você…

– Morri com 28 anos.

– Bem que tínhamos notado sua palidez.

– Pensando bem, foi melhor não fazer aquele teste no Botafogo…

– E ter levado o chute na cabeça…

– Foi melhor, continuou, ter ido fazer o concurso para o serviço público naquele dia. Ah, se eu tivesse passado…

– Você deve estar brincando – disse alguém sentado a minha esquerda.

Tinha a minha cara, mas parecia mais velho e desanimado.

– Quem é você?

– Eu sou você, se tivesse entrado para o serviço público.

Vi que todas as banquetas do bar à esquerda dele estavam ocupadas por versões de mim no serviço público, uma mais desiludida do que a outra.

As conseqüências de anos de decisões erradas, alianças fracassadas, pequenas traições, promoções negadas e frustração.

Olhei em volta. Eu lotava o bar.

Todas as mesas estavam ocupadas por minhas alternativas e nenhuma parecia estar contente. Comentei com o barman que, no fim, quem estava com o melhor aspecto, ali, era eu mesmo. O barman fez que sim com a cabeça, tristemente.

Só então notei que ele também tinha a minha cara, só com mais rugas.

– Quem é você? perguntei.

– Eu sou você, se tivesse casado com a Doralice.

– E?

Ele não respondeu.

Só fez um sinal, com o dedão virado para baixo …

“As dez mais”

Numa conversa de ontem estávamos – pra variar – falando mal da vida alheia… Aí me lembrei de um e-mail que tinha escrito e enviado já há algum tempo sobre o tema em questão. Fuçando nas catacumbas de meu computador, achei-o! Foi enviado originalmente em 25/05/2004, pontualmente às 17h05min. Assim, ipsis litteris, direto do Túnel do Tempo, ei-lo:

Muitas vezes nós meros mortais ficamos chateados (pra não dizer emputecidos) com algumas atitudes tomadas pelos profissionais do departamento de informática.

Mas acontece que o que ninguém sabe é que existe um treinamento secreto padrão ao qual todos são submetidos antes de começar qualquer tipo de atendimento.

Assim, visando esclarecer alguns pontos controversos na prestação de serviços por parte dos profissionais de qualquer departamento de informática de qualquer empresa, seguem algumas explicações.

Todo profissional de atendimento enquadra-se, basicamente, em dois tipos:

a) “Testemunha de Jeová”. Senta em seu computador e NUNCA MAIS sai. Clica daqui, clica dali, abre janela, fecha janela, reinicia a máquina, começa de novo e… nada. Não adianta implorar, chorar, espernear, gritar, ou ameaçar. Somente após testar todas as possibilidades (como se verá a seguir) é que – talvez – ele devolva sua máquina para utilização. E ainda assim a deixará desfragmentando ou passando um anti-vírus, o que, segundo ele, não poderá ser interrompido em hipótese alguma, senão ele não se responsabiliza.

b) “Mocinha da Zona Azul”. Não adianta procurar. Não adianta ligar. Não adianta esperar. NUNCA vai aparecer ninguém, a menos, é lógico, que você saia de sua sala – que é quando alguém PODERÁ aparecer e dizer: “Ué, não tem ninguém aqui? Mas avisa que eu vim, tá?”.

Fora isso, temos os dez posicionamentos padrão que são adotados sempre que seu computador está com problemas:

1. “É vírus.”
2. “Já reinicializou a máquina?”
3. “É, tá muito estranho. Depois do Scandisk vou desfragmentar pra ver se resolve…”
4. “É que caiu a rede.”
5. “Ah! O problema é que esse programa não é original.”
6. “A placa está com problema.”
7. “Quem foi que mexeu na configuração?”
8. “Vamos ter que enviar para manutenção.”
9. “Com certeza o problema não é aqui. Deve ser no servidor deles.”
10. “É que a rede tá com vírus.”

Particularmente, hoje eu acrescentaria mais dois posicionamentos:

11. “Ah, o seu é Linux? Então vou ter que chamar outra pessoa.”
12. “Vai ter que formatar…”