Equinócio de Primavera

 
Mais uma vez temos aí em cima o desenho Firebird Suite (Fantasia 2000), baseado num conto russo em que o Espírito da Primavera fica frente a frente com o Pássaro de Fogo – retratando musicalmente e visualmente os temas vida, morte e ressurreição.

Já falamos disso lá quando do Solstício do Inverno… Lembram?

Pois bem, chegamos ao Equinócio de Primavera. Pontualmente às 06h04min.

E – coincidência das coincidências! – exatamente neste dia concluo também o rol com todas as músicas que fizeram parte de todo um ciclo, de todo o período que antecedeu minha entrada no meu Inverno pessoal. Cada uma destas músicas, sem exceção, teve seu motivo. Tem sua história.

Não sei como será essa Primavera. Daqui donde olho ainda está distante, pois ainda estou em junho, que é quando escrevo este post, e vocês o estão lendo aí em setembro. Aliás, todos esses posts foram escritos com antecedência, pré-programados para, uma vez a cada dia, compartilhar um quê de música e de sentimentos…

E o trabalho a ser feito, a partir daqui, ainda é árduo. Pois a cada dia, a cada música, a cada lembrança, cada uma das mais ínfimas emoções que foram sentidas, o serão novamente em toda sua plenitude.

E por uma última vez.

Uma a uma.

Até que nada mais venha a restar.

Até que acabe o Inverno.

Até que acabe o meu Inverno…

Pelo menos é o que hoje sinto. É o que hoje espero. E, ainda, vai um recado para o meu “eu” aí do futuro: não sei em que novas confusões você anda metido, ou, mesmo, se ainda continua com as suas mesmas velhas confusões; só sei que com sua prodigiosa “memória de pombo”, concertezamente não vai lembrar do conteúdo destas linhas (até mesmo pelo grau etílico atual deste que vos tecla); então faça-me o favor de manter o foco.

Lembrou-se agora?

O motivo de cada uma dessas músicas?

Reviver todos seus sentimentos com intensidade suficiente para então, definitivamente, deixá-los enterrados lá de onde jamais deveriam ter saído?

Pelo menos o plano era esse…

Espero sinceramente que, aí no futuro, você esteja bem, cara. Pelo menos vai ter a certeza de que, daqui onde estou, vou tentar trabalhar para isso. Pois agora, com o fim desse ciclo, se você se meteu em alguma outra confusão, resolva-se! E rápido! A Primavera chegou e você não precisa ficar enclausurado pra sempre. Só precisa crescer. Ao menos o suficiente para aprender a lidar consigo próprio e, em especial, com esse teimoso e tinhoso coração – obstinado em ser independente.

Tenho planos para você.

Não necessariamente grandiosos. Mas planos.

Então, não me decepcione.

Simples assim.

Conto de reencontro

Não importa o como ou o porquê.

O que importa é que estavam ali.

Como há muito não mais estavam.

Um certo nervosismo implícito. Um quê de dúvida. Um olhar no olhar. Profundo. Com mil questões e mil respostas. Sem palavras. Compreensão. Amor. Desejo. Paixão.

E suas bocas se encontram, tímidas, num primeiro momento. Vasculhando, procurando, se (re)conhecendo.

Mas esse era o sinal. Foi dada a largada. Agora os movimentos já não são tão calculados – tornam-se automáticos na justa medida em que precisam ser. É esta a bênção e a maldição da familiaridade. Em apenas segundos, pele na pele. Explorando. Buscando as curvas conhecidas, as experimentadas regiões prazerosas. Suave onde deve ser suave. Intenso onde deve ser intenso. Apenas um roçar aqui; uma firme pegada ali. Os lábios buscam mais que a boca. A boca experimenta os sabores de todo um corpo…

Mas a boca não descuida da boca.

Os olhos não descuidam dos olhos.

As mãos, de ambos, ávidas, exploram, tocam, puxam, sentem, empurram, procuram… e acham.

E um novo nível é atingido. Um prazer mais profundo. Mais denso. Seguro. Cada pequena partícula a ser explorada também dotada da familiaridade daqueles que sabem o que buscam. As mãos de ambos, experientes, há muito sabem o ponto certo de cada ponto. A justa medida e intensidade de cada toque. A ansiedade se instala. A vontade transcende. O desejo grita por ser atendido.

E então se completam.

Olhos nos olhos. Não se perdem. Não se buscam. Apenas dialogam na linguagem universal.

As mãos deixam de ser necessárias…

Seu peso, o arquear, o resfolegar, o envolver. Uma luta? Uma dança. Viram-se de novo e de novo e de novo. Frenético frenesi. Ritmado. Conjugado. Conhecem-se o suficiente para estabelecer a perfeita cadência. Prazer absoluto. Intenso. Máximo.

Explosão!!!

Mútua. Conjunta. Completa.

E os olhos ainda nos olhos.

E tão rápido quanto o início, também se dá o fim.

Cansaço misturado com felicidade misturado com silêncio. Mudo silêncio. Não há necessidade de palavras. De comunicação. Nem mesmo pelo olhar. Estar ali é tudo quanto basta.

E agora o aconchego.

O abraço aninhado.

A exaustão conjunta.

A felicidade final de um reencontro que superou as palavras, as discussões, as acusações, os dedos em riste, a mágoa, a tristeza, tudo, transcedendo até mesmo a própria relação.

E então…

Não mais que de repente…

Do mais profundo e obscuro canto do incosciente de meu subconsciente…

Eu acordo…

 

Perdido entre gerações

Esse mundo de crônicas, definitivamente, é fantástico.

Sempre acabo por descobrir mais sobre mim mesmo lendo as mais distintas crônicas alheias.

E Mário Prata – o cronista da vez – tem ótimas, como essa que segue logo abaixo.

E, talvez, a questão principal e que mais me chamou a atenção foi que acabei descobrindo que não existo. Não nessa concepção, ao menos. Não sou da geração dele, onde simplesmente havia uma clara linha separatória entre o que seria sexo e o que seria amor. Não, mesmo. Mas também não sou dessa geração atual, a de ficantes, onde tudo é permitido e nada há a ser perdoado. Estou entre ambas. Sou das antigas mas com pensamentos modernosos, sim, e daí? Na prática, creio que fiquei perdido entre as gerações…

Sabe o que acontece? Para mim, sexo e amor são elementos indispensáveis um para o outro, principalmente o segundo em relação ao primeiro. Se não houver um, não há que se falar no outro. O que já é uma evolução em relação à distinção da geração anterior. Mas daí a essas ficâncias e alternâncias dignas de Friends, onde a amiga de hoje será a namorada de amanhã, a esposa do amigo de depois de amanhã, e sabe-se mais o quê lá no futuro? Não. Sou daqueles que não sabem ficar. Que querem mais. Desse jeito, simplesmente não consigo.

É informação demais para este velho dinossauro…

Mas, cá entre nós, entre ficar por ficar, então fiquemos com a crônica de Mário Prata, que, garanto, é bem mais interessante que meus costumeiros devaneios.

De como ficar sem culpa

Mário Prata
MAR/1996

– O brasileiro é, antes de tudo, um infiel.

Poderia ter dito Euclides da Cunha, que conheceu na pele o problema. E nas costas.

Mas nem todos, diriam os mais jovens. Correto. Mas eu estou a me referir à minha geração, dos meus pais e meus avós.

Não é preciso deitar em nenhum divã de psicanalista para entender o que aconteceu com a minha turma.

Para nós, no começo dos 60, amor e sexo eram duas coisas completamente distintas. As namoradas não deixavam nada. Não se ficava, naquele tempo, imagine. A gente, depois de uns 15 dias (e de muita conversa), pegava na mão. Beijo na boca, só uns seis meses depois. E ficava nisso. Um ou outro conseguia um bico por cima do banlon. Sexo, jamais, impossível. Todo mundo tinha sua namorada (muitos casaram com elas). Depois do namoro íamos para a zona. Lá não tinha amor, tinha sexo, com descalcificadas prostitutas interioranas. E na capital, acontecia o mesmo.

Sexo com amor não existia. Portanto, para nós a divisão amor/sexo era absolutamente normal. Para nós, até então, uma coisa não tinha nada a ver com a outra.

A primeira vez que fiz amor e sexo junto, foi um desastre. A namorada sentou-se na cama e me disse:

– Não é nada disso.

E começou a falar de coisas que eu nunca havia imaginado. Carinho, por exemplo. Nunca tinha feito carinho numa profissional do amor, é claro. Essa namorada me ensinou a fazer amor com sexo. Foi uma grande descoberta para mim. Sei até o dia: 1º de maio de 68 (eu tinha 22 anos), entre uma barricada e outra lá na USP.

Portanto, para a minha geração, no início, traía-se naturalmente, sem culpa.

Hoje com um pouco de culpa, com um certo remorso.

Se na vida dos meus pais e avós eram normal a infidelidade e as amantes fixas ou eventuais (as esposas sempre sabiam e fingiam que não era com elas), com a nova geração a história é outra.

A maior invenção dos anos 90 foi o ficar. Que inveja! Fica-se com uma hoje, com outra amanhã e ninguém está enganando ninguém, traindo ninguém. Culpa?

Nem pensar. Sábia essa geração.

Ainda não entendi por que não se libera esse negócio de ficar para nós também, mais velhos. Acabaria a infidelidade. Você me traiu? Não, só fiquei. Ou seja, a novíssima geração continua infiel. Só que deram um jeito na jogada. Ficar não é pecado, não está nos mandamentos nem de Deus nem da Igreja. Mas se eu ficar, como fica a minha namorada?

Eu tento entender os limites do ficar, mas sinto que a compreensão foge aos meus limites de infiel salesiano. Eu pergunto aos mais jovens: mas ficar, fica até que ponto? Está me entendendo? Tem ficada completa? Ou, se for completa, não é mais ficar? E eles me dizem que, às vezes, ficar pode ser completo. E não é traição. Pinta, entende? E, se pinta, rola. No dia seguinte, imagino eu, nem contam para o melhor amigo. Onde já se viu?

Só que, com a gente, mais velho, elas não ficam. E não é por causa da idade, não. É que elas sabem que nós não sabemos ficar. Quando um cara da minha idade consegue ficar com uma, quer ficar mais, quer no outro dia de novo. Aí não é mais ficar, já entra compromisso, pai e mãe no meio. Ficar, pode.

Ficar mais de uma vez, não. Tá pensando o quê? Casa da sogra, como se diria no meu tempo? Definitivamente eu não sei ficar. Fico devendo.

Ou seja, esse negócio de ficar pra cá, ficar pra lá, completo ou incompleto, é só entre eles. Há de se entender o espírito da coisa. E a minha geração tá muito mais para a carne que para o espírito em relação à ficagem.

Já namorou fulana? Não, mas fiquei. Que coisa mais normal.

Outro dia encontrei com uma amiga da minha geração e ela me disse com a maior naturalidade que a filha dela tinha ficado com o meu filho. Só que quando eu quis tirar um sarro (que é como a gente ficava) com ela há uns 20 anos, nem pensar. Ficou me devendo. E agora vem pra cima de mim com essa normalidade toda. Será que ela quer ficar comigo? Agora? A gente quase avô?

E o mais doido é que há 30 anos a gente cantava no ouvido das meninas: fica comigo esta noite e não te arrependerás!!! E nenhuma delas entendeu o que eu queria dizer.

Resumindo: quem ficou, ficou. Quem não ficou, não fica mais!

E, como já dizia Zilda Mayo, atriz da pornochanchada, numa célebre entrevista para a revista Homem, amar não é só colocar lá dentro.

Volteando

Mundo cheio de voltas. De coisas que vêm e que vão. E que voltam.

Mais de quatro anos já se passaram e ainda hoje continuo tentando aprender parte da lição…

Constatação
segunda-feira, 26 de março de 2007, às 0:01

Tudo que eu sempre quis foi dividir meus sonhos.

Ledo engano.

Sonhos são únicos. Pessoais, indivisíveis e intransferíveis.

São duros de quebrar, mas às vezes se estilhaçam com facilidade.

E, mais às vezes ainda, acabam.