Questão de preconceito

Clique na imagem para ampliar!

Ligia Ribeiro

Quando eu era adolescente, era simpatizante do anarquismo, inocência boa típica da idade.

Gostava de punk rock/hardcore mais que de chocolate… Uma das bandas que eu simpatizava era dead fish (me julguem) e dentre as músicas deles, havia uma chamada “Anarquia Corporation” que criticava a maneira como o anarquismo estava se popularizando e virando um movimento de preconceito às avessas.

“Acho que já sei o que você quer, mais uma regra pra seguir, constituição anárquica. Feita pra outra minoria dominar. Não há mudança, só alternância de poder. Discriminado hoje, discriminador amanhã. Mudança aonde? Aonde cidadão?”

 

Então hoje, já longe da utopia anárquica, vejo esse comportamento preconceituoso em outros grupos.

Grupos que tem uma causa seria, mas que avacalham demais na milícia.

Vi um vídeo fantástico da Avon onde uma mulher trans se maquiava… Pensei comigo: “Que do caralho! Puta quebra de paradigma!”

 

Aí, Li os comentários… Ah, meus amigos… Que grande enxurrada de bosta!

Chegando ao cúmulo de dizer que os homens estavam tirando o protagonismo das mulheres nas propagandas de cosméticos… (WTF?)

E uma luta pra saber quem é mais oprimido que o outro… Como se o foco fosse esse. Como se o foco não fosse a equidade entre as pessoas…

São só mais um monte de fantoches sem senso crítico, disseminando um discurso de ódio contra aquilo que é diferente do que acreditam.

Mais uma vez… Não há mudança, só alternância de poder.

Que tristeza, meus amigos.

Que tristeza…

Namore um cara que lê

Namore um cara que se orgulha mais da biblioteca que tem, que do carro, das roupas ou do penteado. Ele também tem e se interessa por essas coisas, mas sabe que não é isso que vai torná-lo interessante aos seus olhos. Namore um cara que tenha uma pilha de quatro ou doze livros na cabeceira e que lembre com carinho do nome da professora que o ensinou as primeiras letras. Namore um cara que tem uma lista de livros que quer ler e que ainda possui aquele mesmo cartão de biblioteca desde que tinha doze anos – mesmo que, hoje, prefira ter seus próprios livros.

Encontre um cara que lê. Não é difícil descobrir: ele é aquele que tem a fala mansa e os olhos inquietos. Ele é aquele que sempre entra numa livraria, ainda que só para olhar um bocadinho. Você vai reconhecê-lo na figura do sujeito que olha com carinho e ternura para as prateleiras da livraria, o único que surta (ainda que em silêncio) quando encontra o livro que quer. Você está vendo um cara estranho cheirar as páginas de um livro antigo em um sebo? Esse é o leitor. Nunca resiste a cheirar as páginas, especialmente quando ficaram amarelas.

Ele é o cara que não tem medo de se sentar sozinho num café, num bar, num restaurante. Mas, se você olhar bem, ele nunca está sozinho: tem sempre um livro por perto. O rosto pode ser sério, mas é só porque está absorto, provavelmente perdido em um mundo criado pelo autor. Sente-se na mesa ao lado, estique o olho para enxergar a capa, sorria de leve. É bem fácil saber sobre o que conversar.

Pergunte se ele está gostando do livro. Descubra que outros livros que ele já leu. Fale sobre sobre alguns novos lançamentos e de novas traduções que andam saindo por aí. Mas entenda que se ele quiser começar a lhe explicar como deve ser compreendida alguma obra complexa, isso é só para parecer inteligente. Neste caso, fuja. Um cara que realmente lê não precisa ser chato, muito menos arrogante. Caso contrário, pergunte o que mais ele está lendo – e tenha paciência para escutar, a resposta nunca é assim tão fácil…

É fácil namorar um cara que lê. Ofereça livros no aniversário dele, no Natal e em comemorações de namoro. E até mesmo no Dia das Crianças – por que não? Afinal, um cara que lê jamais abandona aquela pontinha de vontade de entrar num mundo de fantasia. Ofereça poesia, crônica, contos, histórias. Deixe que ele saiba que você entende que as palavras são amor. Normalmente, por tudo que já leu, ele vai entender um pouco melhor o seu universo. Entenda que ele sabe a diferença entre os livros e a realidade mas tenha certeza que ele vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco como seu livro favorito. E se ele conseguir não será por sua causa, mas porque ele é assim. Não sabe ser de outro jeito.

Por isso seja você mesma, você mesmíssima, porque ele sabe que são as complicações, os poréns, os porquês, que fazem uma grande heroína. Um cara que lê pode vir a enxergar em você todas as personagens de todos os romances.

E você também ganhará um ou outro livro de presente. No seu aniversário ou no Dia dos Namorados ou numa terça-feira qualquer. Não existe um padrão. E já fique sabendo que o mais importante não é bem o livro em si, mas o que ele quis dizer quando escolheu justo aquele. Um cara que lê não dá um livro por acaso. E escreve dedicatórias. Sempre.

Um cara que lê não tem pressa, sabe que as pessoas aprendem com os anos, que qualquer um dos grandes autores tem parágrafos ruins, que alguns começaram a escrever já velhos, que outros melhoram a cada romance, que sempre existirão aqueles famosos que podem soar sem sentido e que para chegar ao final de algumas obras é necessária muita paciência. Os caras que leem sabem que as pessoas, tal como os personagens, evoluem.

Ao conviver com um cara que lê você corre o risco de encontrá-lo acordado às duas da manhã, irrequieto e desconfiado, talvez até andando de um lado para outro; pode procurar, pois certamente haverá algum livro aberto por perto. Prepare um café, deixe-lhe um beijo e tudo certo. Entenda que de vez em quando ele precisa de um tempo sozinho, mas não é porque quer fugir de você. Você pode perdê-lo por um par de horas, mas ele sempre vai voltar para você. E falará como se os personagens do livro fossem reais – até porque, durante algum tempo, são mesmo.

Ao namorar com um cara que lê, você vai sorrir tanto, terá tanto contentamento, que acabará por se perguntar por que é que o seu coração ainda não explodiu lá dentro do seu peito. Ele não só vai transformar sua vida numa história, como também vocês escreverão a história das suas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos mais estranhos ainda. Ele vai apresentar aos seus filhos os personagens de vários mundos de fantasias – provavelmente misturando-os todos. Não por não conhecer as histórias, mas só pelo prazer de arrancar um brilho dos olhos e um sorriso dos lábios dos pequeninos. E do seu, também. Vocês vão atravessar juntos os invernos de suas velhices, e ele recitará poemas enquanto, enrolados num cobertor, saboreiam um chocolate quente. Ou, talvez, chá.

Enfim, namore um cara que lê porque você merece. Merece um cara que pode lhe proporcionar uma vida mais colorida do que você possa imaginar. Por vezes com a força envolvente dos grandes romances e por vezes com a beleza singela dos melhores poemas. Mas se você quiser uma companhia superficial, uma coisinha só para quebrar o galho por um tempo, então talvez ele não seja a melhor escolha. Então talvez seja até melhor ficar sozinha. Mas se quiser o mundo e outros além, em especial aquela parte do “e eles viveram felizes para sempre”, não tenho dúvidas: namore um cara que lê.

Ou, melhor ainda, namore um cara que escreve.

Rosemary Urquico escreveu
“Namore uma garota que lê”;
Gabriela Ventura traduziu e adaptou;
Bruno Palma e Silva fez uma adaptação
para “Namore um cara que lê”;
e eu adaptei a adaptação do jeito que quis…

Transbordo, não nego

Mylena Gama

O direito de transbordar… Ah, que poético é! Se encher de emoções, das mais perversas às mais humanas, sendo mais emoção do que corpo, razão ou qualquer lógica. Eu já passei por isso e você também. Transbordar faz parte da nossa natureza, somos inundados de sentimentos e vez ou outra, eles são maiores que nós. Por isso, amo essa imagem que achei no Pinterest e que traduz esses sentimentos.

E aí depois que a gente transborda e volta a caber, tudo se encaixa e o caminho volta a ficar claro. Ano passado, minha xícara esteve cheia praticamente o tempo todo, não foi surpresa quando transbordei. A parte boa é que a gente ganha novas lentes para ver o mundo, e como sou dessas que gosta de compartilhar minhas descobertas, aqui vão elas.

Tudo tem só duas perspectivas, a do ser ou não ser, a do ter ou não ter, do querer ou não querer. Por isso, quando a ansiedade bate, existem apenas duas opções: dar atenção e vez para ela ou não. Juro que não é difícil, faz uma diferença tremenda, tudo fica mais leve! Às vezes acho que criamos esses pensamentos e inquietações porque gostamos de brincar com fogo, pode parecer divertido ter sentimentos oscilantes, mas eu decidi que não quero mais isso.

A caneta e o papel, ou os dedos e um teclado, são duplas fantásticas que têm a função de exorcizar tensões e angústias. Mesmo que ninguém vá ler, mesmo que você nunca releia. Uma vez que não está mais em você, simplesmente não está mais em você, entende? É diferente de desabafar com um amigo e é diferente de ficar ruminando mentalmente os acontecimentos. Desde que eu me conheço por gente eu escrevo muito, talvez isso não seja da sua natureza, mas vale a pena tentar e depois vale a pena não parar.

Depois que voltar a caber, dê tempo ao tempo, não seja um rolo compressor que destrói as lembranças. Deixe que fiquem soltas. Automaticamente e de forma delicada, cada coisa vai tomando seu lugar, cada sentimento dá sua cara verdadeira. E aí sem drama ou sem antecipação, você colabora para que a xícara não volte a encher tão cedo.

É, estou em um momento mais zen, mas quem me conhece sabe a garota enxaqueca que posso me tornar quando estou prestes a transbordar. E sabe o quê? Eu não me culpo e nem me sinto mal, tento só ver o lado bom das coisas para que o próximo transbordamento (ou seria transbordação?) seja diferente, porque né, sem tédio ou repetição!

♪ Queen & David Bowie – Under Pressure

Fragmentos

E eis que um novo grupo foi criado – “Rui Dória Anos 80” – já há algum tempinho por essa linda, que é minha prima, Regina. Um grupo novo para reunir gente das antigas. Desenterrar fotos e situações, bem como compartilhar com outros ex-alunos que também tenham estudado no bom e velho prédio da (na época) Escola Estadual de Primeiro Grau Dr. Rui Rodrigues Dória, lá em Santana.

Um grupinho tranquilo, até. Calminho. Umas postagens iniciais, uns comentários daqui e dali, nada demais…

Isso até que o Cláudio Alciprete, um de meus mais antigos amigos, resolveu lançar no grupo o desafio de enviar uma foto da época! Desafio aceito, foto encaminhada! Achei outras (poucas) de outros alunos e também mandei. O conversê começou a zunir. Toca um daqui, outro dali a buscar outros alunos, a adicionar, a entrar na conversa, a combinar encontro, a um monte de coisas – mas, sobretudo, a resgatar dos mais antigos cantões da memória um pouco de nosso dia-a-dia escolar.

Gente que há muito tempo não tínhamos sequer notícias começaram a aparecer: ou já participando do grupo ou através de sugestão para que fossem adicionados! Apesar da minha usual memória de pombo – como dá pra perceber pela última vez que falei da escola – alguma coisa foi clareando, novas velhas lembranças foram surgindo e situações, momentos, causos e outras tantas coisas naturalmente começaram a emergir, vindo sabe-se lá de qual obscuro canto das catacumbas de minha memória…

E, uma vez reunida, essa Turminha do Fosfosol não perdoa!

Dentre tantas outras, foi a Vilminha (desculpa aí, mas NUNCA vou conseguir te chamar diferente) que me veio com essa:

Vilma Adauto, o menino mais inteligente da minha sala. Certo que era muito mimado tbém… rs

Carái! Mesmo depois de tanto tempo, sósifôdo…

Mas ela tem o seu quê de razão. Com certeza até a quinta série eu devo ter tido um “comportamento exemplar”. Aluno que não faltava, só tirava nota “A”, desde sempre gordinho, desde sempre usando óculos, desde sempre acostumado a ser o dono da razão (ainda que não o fosse). Meus amigos eram poucos (não devia ser lá muito fácil me suportar…), como bem lembrou o Silvinho:

Silvio Eu sempre fui de poucos amigos… fechado.. mas me lembro… era Adauto no primário… inseparáveis… O Gordo e o Magro! Lembra Adauto de Andrade?

Isso só foi mudar a partir da sexta série. Quis o destino que eu fosse me sentar bem na carteira atrás de um dos sujeitos mais bagunceiros da escola: o João Carlos Dellu. Sei lá por qual vez ele estava refazendo a sexta, só sei que ficamos muito amigos. E foi ali, aos meros onze anos de idade, que comecei a ter um pouco mais de consciência do mundo que nos cerca e de que a vida não devia ser levada tão a sério.

Aliás, ali já comecei a me tornar o que sou hoje, ou seja, um daqueles idiotas que levam tudo até as últimas consequências. Tanto o é que vejam este outro fragmento de memória, agora já da oitava série:

Rosemary Vcs lembram dos passeios ? Era zoológico, depois Playcenter.
Rosemary Uma vez fomos para o museu Ipiranga e levaram batida.
Simone Meu Deus o Adauto de Andrade com aquele jeitinho de quietinho, quando a Bocuda prof. de português, saía era muito atentado! kkkkk
Rosemary O Adauto de Andrade segurou a bronca na diretoria , a diretora entrou na sala e quis saber quem estava com a bebida e o Adauto levantou para a sala inteira não levar suspensão! kk isso que é amigo!

Ok, Rose, sua linda. A imagem é muito bonita – estoica, até! Só que você precisa saber de uma coisa… Ainda que , naquela excursão, as garrafas de batida terem rodado pelo ônibus inteiro, DE FATO fui eu quem as levei… Então, apesar de segurar a bronca, entenda que a bronca foi merecida!

Aliás, ao falar de fragmento de memória, acho que é bem isso mesmo. O “todo” é um tanto quanto impossível de se visualizar, e, passado tanto tempo, nossas lembranças individuais também empalideceram ou, pior, se apagaram. Esse nosso reencontro virtual nos permite avivar as memórias uns dos outros, lembrar de fulano, beltrano ou sicrano, invariavelmente com um meio sorriso no rosto, ou mesmo de situações que gostaríamos de ter esquecido mas que, ainda assim, ajudaram a forjar a pessoa que nos tornamos.

Estamos em nossa grande maioria mais para os cinquenta que para os quarenta. E o tempo é, sim, inclemente. Por isso mesmo que é tão prazeroso esse resgate de rostos, sensações, sentimentos, vidas, de quando tínhamos a tenra idade de não nos preocuparmos com o dia de amanhã. E, melhor ainda, é essa alegria por muitos de nós termos contribuídos em buscar cada qual sua peça de um quebra-cabeças cujo aspecto cada um enxerga à sua própria maneira.

Apesar de, às vezes, ser um sacrifício a simples lembranças de uns e outros!

E meu melhor exemplo é o da amiga Rosele. Através do grupo encontrei-a no Face, mandei-lhe um inbox perguntando se era ela mesma, a que tinha estudado no Rui Dória. Respondeu:

Sim sou eu mesma!! Rs. E você também?? Estudamos juntos??? Seu nome não me é estranho.

CUMÉQUIÉ?????

CUMASSIM “MEU NOME NÃO LHE É ESTRANHO”?????

Arre!

Essa era uma das amigas que NUNCA esqueci e que NUNCA mais encontrei. Uma daquelas lembranças de adolescência que sempre pairavam, com carinho, na minha memória, volta e meia repintando-lhe as cores para que não esmaecesse com o tempo, como todo o resto. Triste saber que deixamos de existir para pessoas que ainda existem para gente.

Mas o alívio veio através de um comentário, agora no próprio grupo, algumas horas depois:

Rosele Adautoooo lembrei de você!!! Hehehehehehehe. Feliz!

Heh…

Feliz fico eu.

Ao menos voltei a existir…

Os Barbeiros

Cabelo é um negócio complicado…

E, no caso das mulheres, é uma complicação elevada à enésima potência! As que têm cabelos lisos, querem cacheados, as cacheadas alisam, as de cabelo longo vivem ensaiando cortar, enquanto as de cabelo curto não veem a hora de crescer, as morenas ficam loiras, as loiras ficam morenas, enquanto que as ruivas… Ah, as ruivas…

Desculpem aí. Se perdi.

Enfim, à parte desse complicado mundo feminino, não pensem que o mundo masculino é lá tão fácil. Não por toda uma eventual metrossexualidade implícita (ou explícita) deste ou daquele, mas porque cabelo de homem é foda. Ou, melhor dizendo, o MEU cabelo é foda. Apesar de, numa longínqua infância, já ter sido loiro e com cabelos lisos, meu cabelo hoje é meio que uma capina roçada pelo vento, onde cada haste resolve crescer para um lado. E se já não bastasse essa complicação, um rodamoinho perdido e um tufo do lado esquerdo teimam em sempre dar as caras. Por isso, no meu caso, não basta cortar: tem que saber cortar.

Durante muitos e muitos anos havia um cabeleireiro no centro da cidade que “acertou a mão” comigo. Mas o desinfeliz resolveu voltar pra terrinha dele e eu fiquei no vácuo. Daí, próximo ao trabalho, na cidade ao lado, fiz algumas tentativas num e noutro cabeleireiro somente para chegar à fatídica conclusão: não ia rolar. Ainda que espécime em extinção, decidi procurar um barbeiro. Barbeiro de verdade. Não iria novamente expor minhas madeixas ao alvedrio de quem achava que sabia o que fazer – só que não.

Mas a vida – a vida! – é uma caixinha de surpresas! E numa bela manhã de sol, passando distraidamente em frente a uma porta de vidro, algo me chamou a atenção. Uma cadeira de barbeiro. De barbeiro! Naquele momento não tinha ninguém naquele salãozinho de espartanas instalações. Dei uma filmada: na bancada um pincel de barba dentro de uma cumbuquinha, apenas duas tesouras num pote, uma navalha repousava ao lado dessas tesouras, um grande espelho em frente à cadeira, um pequeno pendurado a um canto e mais um armário de duas portas noutro. E só. Pensei comigo mesmo: “comigo mesmo, esse é o cara”.

Voltei noutra hora e conheci o dono do local, o grande Barbeiro (sim, Barbeiro com “bê” maiúsculo): “Seo” Titico. E, apesar do tamanhinho desse senhor, o nome dele é esse mesmo. Ou melhor, sobrenome. Pensando um pouco no assunto, creio que isso tudo aconteceu já tem uns dez anos. E, desde então, nunca mais deixei de frequentar a barbearia do único cara que conseguiu acertar o corte do meu cabelo, a um preço camarada e um proseio de primeira. Até recentemente…

É que o Seo Titico, por melhor pessoa que seja – e É -, também é daqueles senhorzinhos que adoram um proseio. Até aí, tudo bem, eu também. Mas, vejam bem, o proseio dele é daqueles que ao lembrar de um causo ou um fato curioso, simplesmente para o que está fazendo, dá um passinho pra trás e começa a contar a trama. O que eleva o tempo de corte de uns 20 minutos para pelo menos uma hora e meia. E, invariavelmente, meu tempo disponível para cortar o cabelo sempre foi o curto horário de almoço, sempre no meio de uma agenda pra lá de atribulada. Deixar o corte para os finais de semana também seria difícil, pois implicaria em ter que ir para outra cidade só pra isso. E o que era bucólico e até mesmo divertido, começou a ficar complicado. Tanto quanto meu cabelo.

Então, eis que há coisa de uns 4 ou 5 meses, li em algum lugar (jornal, tv, Twitter, Facebook, site de notícias, agregador de blogs – sei lá o quê!) acerca de dois sujeitos que teriam montado uma barbearia no estilo “das antigas”, até mesmo com um visual meio retrô – e, melhor ainda, perto de casa! De cara já me interessei, pois já há algum tempo eu vinha acompanhando esse movimento de “resgate” a esses locais destinados a um público masculino, tendo como exemplo a Barbearia Corleone, em Sampa. Resolvi descobrir um pouco mais e, fuçando daqui e dali, principalmente nos Facebooks da vida, consegui levantar algumas imagens do local: decoração de primeira, com esmero nos detalhes, ao fundo – vejam só! – uma mesa de bilhar e um freezer com cerveja gelada! Agora sim estávamos falando o mesmo idioma!

Com um pouco de custo encontrei o local (maldita reportagem que não deu o endereço!) e, lá chegando, conheci os dois desbravadores da Zona Sul: Fred e Nando. Proseamos um bocado – até porque, como fazia pouquíssimo tempo que tinham inaugurado, praticamente não tinham muita clientela – ambos passaram os primeiros dias de portas abertas, mas, sem trabalho, ficaram se aprimorando na bela arte do bilhar de boteco…

Mas, como era de se esperar, mesmo sem uma “propaganda formal”, graças ao excelente serviço (sim, eu também testei e aprovei) e, creio eu, às redes sociais, a fama foi crescendo de maneira diretamente proporcional à clientela. Cabeludos, estilosos, barbados e barbudos, bem como hipsters dos mais diferentes estilos começaram a frequentar essa barbearia com o sugestivo nome de “Sr. Barba“. Assim como eu.

E o mais interessante, além mesmo do estilo e da técnica, é que são eles é que dão o tom diferencial. Ambos também com suas esmeradas barbas, tatuagens das mais diversas, mas com um proseio leve e sempre bem humorado – mesmo quando estão reclamando de alguma coisa! Somente os dois é que cuidam de tudo, desde o abastecimento da geladeira, passando pela limpeza, compra de produtos, administração, etc. E ainda trabalham pra cacete! Já pensaram? Ficar nunca menos de oito horas ali, em pé, sem folga, dando o melhor de si e ainda mantendo o bom humor? É por isso mesmo que não tem como não ser um ambiente “do bem”, lugar onde é gostoso estar e participar. Mais que uma barbearia, aquilo é uma verdadeira comunidade, onde se encontram as mais diversas pessoas dos mais diversos locais, dos mais diversos níveis econômicos e/ou sociais. Ainda ontem estive lá e enquanto esperava minha vez matei as saudades dos velhos tempos e joguei algumas partidas de bilhar com alguns ilustres desconhecidos (de cinco, ganhei quatro…), tive ótimos proseios, dentre outros, com um sujeito que é instrutor para pilotos de motos de velocidade e um militar lá de Caçapava, daqueles em que a conversa flui leve e solta. Tudo isso, lógico, acompanhado de um ótimo rock ao fundo, bem como algumas boas e geladas brejas…

E levou apenas umas duas ou três horas para que eu fosse atendido! Como? Tudo isso? Não, vocês não estão entendendo… Foi isso… É que quando você está num ambiente desses as horas simplesmente passam voando, mal se percebe! É como diz aquele velho ditado: “Terapia pra quê? Vai pro bar!” Ou, no caso, pra barbearia… (Ai!)

Agora creio que vocês devam estar se perguntando o porquê deste texto… Propaganda? Publicidade? Jabaculê? Nada disso. Simplesmente, como sempre fiz, estou neste nosso cantinho virtual compartilhando aquilo que acho que é bom, aquilo que acho que é Legal. Se isso ajudar a arranjar mais um ou dois clientes para eles, zuzo bem. Fico feliz.

Mas mais do que isso, devo confessar que minha motivação foi outra… Acontece que um infeliz foi lá na página do Sr. Barba, no Facebook, e fez uma “avaliação” alegando uma “falta de respeito” com a clientela, que “esperou mais de uma hora” pra ser atendido e desistiu e que (isso não foi ao ar) estava com o pai no hospital e não poderia esperar. Por tudo que eu já escrevi aí em cima vocês já puderam notar que não é nada disso – o sujeito não compreendeu e sequer assimilou a boa energia que emana do lugar. Mas, disso tudo, dois pontos são gritantes na minha opinião. Primeiro: a “mais de uma hora” dele foram cravados 22 minutos e, sendo o primeiro da fila, não teve a mínima paciência de aguardar todo o procedimento que envolve abrir um comércio logo pela manhã, entre destravar portas, arrumar equipamentos, cuidar da limpeza básica. E, segundo: carái, véi, se seu pai tá no hospital, que é que você tá fazendo numa barbearia? Cuidando da aparência? Preparando-se para uma selfie com o velho no leito hospitalar? Pessoas normais estariam o tempo todo do lado da cama e não buscando sarna pra se coçar e botando defeito na casa dos outros!

Contudo é assim mesmo. Sempre tem que ter um pra aporrinhar. E até que é legal, pois imaginem se fosse sempre uma unanimidade? Que coisa chata! Não ia ter assunto nem pra falar mal, nem mesmo pra escrever um texto como este!

Então, caríssimos Fred e Nando, creiam-me: vocês estão, sim, fazendo um excelente serviço nessa excelente comunidade que criaram e que está singelamente disfarçada de uma barbearia com o nome de Sr. Barba

Continuem assim.

Sempre!

Emenda à Inicial: Já estava quase esquecendo daquele pouquinho de cultura inútil que teimo sempre em buscar… Até meados do século XIX, os barbeiros faziam não somente os serviços de corte de cabelo e barba, mas também tiravam dentes, cortavam calos, realizavam até mesmo pequenas cirurgias, dentre outras coisas. Por não serem profissionais, seus serviços não raro deixavam marcas insanáveis nos pacientes, quando não lhes tiravam a própria vida! A partir de então passou-se a denominar todo e qualquer “serviço ruim” através da nada gentil expressão “coisa de barbeiro”. Mas esse termo é original de Portugal, pois a associação de “motorista barbeiro”, ou seja, um mau motorista, é tipicamente brasileira…

Professorinha Paz & Amor

Nesta data especial, apenas compartilhando a homenagem já de um tempinho do copoanheiro de sempre à sua amada, idolatrada, salve, salve, professorinha do coração – e, também, minha afilhada!

E chegou o momento de a Professorinha se aposentar. Mais de 30 anos de labuta diária, muitas vezes com jornadas duplas ou triplas, encarando os queridos *monstrinhos* — numa conta-de-padaria, foram algumas dezenas de milhares de alunos. No fecebúqui, ela faz um pequeno post-registro, que gera mais de 350 curtidas e um outro tanto de comentários.

Todos carinhosos, como hão de ser, já marcados pelas saudades que a *professorinha paz&amor* vai deixar nas salas de aula — *vamos viajar de Kombi e curtir a vida de hippie*, promete-e-cobra uma aluna, enquanto outra ameaça: *eu quero a minha professora de volta AGORA!*.

O estereótipo *paz&amor* gerou carinhosamente, por parte dos alunos, o apelido *hippira*, ou *hippie-caipira*, e até um flashmob com um grupo de alunas à caráter [ver aqui] — sim, a própria Professorinha emprestou seu guarda-roupa pras meninas…

Mas, muito além do visual, o *paz&amor* é de caráter, e um exercício diário, que a garotada reconhece: *que continue ensinando às pessoas aquilo que todos devem saber, afinal esse é o seu dom e não precisa estar só numa sala de aula para ensinar ou aprender*, diz outra aluna.

E, conferindo os comentários que não param de chegar, se emocionando com todos, de repente ela pára em um e se derrama em lágrimas. É de um garoto dizendo que a ama e agradece por ter tido a Professorinha em sua vida, fazendo coro a praticamente todos os outros comentários. Mas ela me explica as lágrimas, provocando também as minhas: o garoto é do tipo problemático, *tranqueirinha*, que já se envolveu com drogas e otras cositas…

A cena ilustra o que sempre moveu a Professorinha: todos os seus anos de trabalho foram cumpridos como uma *missão*, no maior sentido da palavra, voltada aos mais carentes e necessitados. De todos os comentários, é exatamente o de um garoto mais carente (o que o levou a se envolver com drogas etc.?) o que mais a comove.

Isso, entre inúmeras outras qualidades, resume o porquê de eu amar a Professorinha Rose. ‘Brigado, minha querídola.