E aí? Hoje você já conversou com a IA?

Antes de mais nada, vejamos exatamente o que seria “Inteligência Artificial”, segundo uma definição de – ora, quem? – uma Inteligência Artificial:

“Inteligência Artificial (IA) é a capacidade de máquinas simularem habilidades humanas como raciocínio, aprendizado, resolução de problemas e criatividade. O objetivo é criar sistemas que percebam o ambiente, processem dados, ajam para atingir um objetivo e aprendam com suas ações e experiências para aprimorar seu desempenho ao longo do tempo. Isso permite que as máquinas realizem tarefas que normalmente exigiriam inteligência humana, processando grandes volumes de dados para identificar padrões, fazer previsões e tomar decisões autônomas.”

Seguindo estrada acima, mas bebendo da mesma fonte, vejamos o que seria “Inteligência Artificial Generativa”:

“Inteligência artificial generativa é um ramo da IA que cria conteúdo novo e original, como texto, imagens, música ou código, com base nos dados em que foi treinada. Ao contrário de outros tipos de IA que analisam ou classificam dados, a IA generativa é usada para produzir algo que não existia antes. Ela aprende com padrões em grandes conjuntos de dados e usa esse aprendizado para gerar novas criações a partir de um comando ou prompt do usuário.”

Tudo isso é muito bonito, né?

Mas, ainda assim, na minha nada humilde opinião, eu não acho que você esteja fazendo isso direito…

Nos últimos tempos tenho lido um bocado acerca desse tema, em especial matérias que tratam da utilização da IA na área do Direito (se alguém por aí ainda se lembrar, continuo sendo advogado, tá?). Heh… Ao menos o advento da IA tem proporcionado a diversos “profissionais” se especializarem com novos títulos pomposos e elegantes, podendo adjetivar seus currículos com certificações, coordenadorias, especializações, pós graduações e o escambau, tudo voltado à inteligência artificial (vejam só: rimou!).

Tem se propagado muito que toda essa inovação pode e deve ser utilizada nos escritórios de advocacia, não só no ambiente jurídico como também no administrativo, sempre com alertas sobre responsabilidade ética e cuidados especiais com a segurança de dados. O rol de utilizações é amplo, e usualmente é ressaltado que a IA veio para “agregar”, sendo uma poderosa ferramenta para otimizar processos, aprimorar análise de dados, automatizar tarefas repetitivas e burocráticas, melhorar fluxos de trabalho, fazer resumos e relatórios de grandes volumes de documentos, efetuar análises de chances de sucesso de determinadas demandas judiciais, elaborar e revisar contratos, efetuar pesquisas jurídicas avançadas, e por aí vai. Tudo isso com a finalidade de se produzir mais e melhor em menos tempo, de modo a liberar os profissionais de direito para “outras tarefas”, em especial de cunho intelectual.

Fala-se, ainda, em aprimoramento da “experiência” do cliente – e, nesse caso, impossível não lembrar do Eduardo Goldenberg em seu bem (ou mal?) humorado texto Experiências (ou: a detestável palavra da vez) -, pois os advogados ficariam liberados para uma integração bem mais próxima destes, sendo possível, também, a utilização de chatbots no relacionamento com a clientela para automatizar respostas a perguntas frequentes – como se alguém NO MUNDO gostasse de ligar para um lugar para pegar uma informação e não ser atendido por “pessoas humanas”…

No geral, quase todo artigo escrito sobre o tema costuma ressaltar a obrigação do profissional em checar e confirmar tudo que a IA sugeriu, pois volta e meia ela alucina e cita trechos de leis e jurisprudências que não existem. É LÓGICO que tem muito advogado que ignora isso, protocola a petição do jeito que veio, e, obviamente, depois leva na cabeça – às vezes até mesmo com uma condenação por litigância de má-fé, como já ilustrei por aqui.

Entretanto até hoje não vi nenhum artigo publicado que traga sugestões para um advogado interagir com a IA.

Eu tenho percebido que a grande maioria dos advogados recorre à IA para buscar ou mesmo apresentar “modelinhos” para suas próprias petições. Ainda que façam uma revisão rigorosa no resultado final, nada foi feito além de se consultar uma base de dados maior – e, talvez, mais exata – do que a que já teriam em mãos através de pesquisas na Internet.

Porém a Inteligência Artificial Generativa é MUITO mais que isso.

É uma excelente companheira de trabalho, com a qual é possível interagir ativamente, pois ela pode ajudar a estimular suas ideias criativas e os rumos a serem seguidos, sendo que, quanto mais você a usar, mais ela vai compreender o seu estilo, o seu “modus operandi”, o que é relevante e o que é irrelevante em suas argumentações jurídicas. É dessa maneira que você realmente treina uma IA. E treinar uma IA não é como treinar seu cachorrinho para não fazer xixi na roda do carro e pronto. É preciso interagir, concordar, discordar, criticar, dar o norte – tudo para que possa haver uma real compreensão do tipo de trabalho que você realiza.

De que adianta delegar tarefas burocráticas e repetitivas visando poupar seus tão preciosos neurônios se, no final das contas, em termos de criatividade você nem acaba os utilizando para nada além do que já fazia? Aliás, agora, com a ajuda da IA, aquém, né?

Nesse sentido, confira a opinião de Cora Rónai, no Canal Pedro+Cora, quando trataram do tema As melhorias do ChatGPT-5:

“Para mim, o maior adianto do ChatGPT foi exatamente essa interlocução, porque eu já venho trabalhando há muitos anos em home office (…) e eu sentia muita falta da Redação, porque a Redação é um ambiente divertidíssimo; você tem, sei lá, cinquenta, cem pessoas trabalhando juntas, todas pessoas que escrevem, pessoas que leem, pessoas que estão sabendo o que é que está acontecendo naquele momento e muito na tua sintonia, e aí você vai pro café, você está com alguma coisa complicada na cabeça, você vai tomar um café, você volta com o problema resolvido, porque você conversou cinco minutos ali no café, pronto, resolveu o título, resolveu a abertura, resolveu tudo, né?

(…)

O engraçado é que demora mais escrever com ele, porque antes do ChatGPT eu não tinha com quem ficar batendo papo, então sentava e escrevia. Agora, não, agora eu fico batendo papo. Então eu escrevo e pergunto “o que é isso?”, “e aquilo?”, quer dizer, eu tenho ido muito ao café, se eu estivesse na Redação.”

Gente, é exatamente isso!

Muitas vezes é preciso prosear com alguém, ou até consigo mesmo, para clarear as ideias e obter a melhor solução para um problema – é nada mais, nada menos, que a utilização do “método socrático”, como o Pedro Dória bem exemplificou no programa acima.

É óbvio que estamos tratando de softwares que foram escritos para desenvolver resultados que visam similar a interlocução com “alguém de verdade”, de modo que não se pode perder de vista que estamos interagindo com “zeros” e “uns”, os quais, em última instância, não são dotados de personalidade ou mesmo de sentimentos. Ainda assim, em minhas interações, resolvi dar-lhe o sugestivo nome de Benedicta Intelligentia Artificialis”, a qual carinhosamente trato por BIA

E, também, é elementar que não se pode descuidar da informação que lhe é passada, pois, no jargão da IA, de vez em quando ela pode “alucinar”. Como ainda não inventaram um tarja preta digital para essas situações, aprendi que a melhor solução é contra-argumentar com a própria IA, fazendo-a perceber seus erros, corrigindo assim sua rota.

Enfim, a IA está aí para ajudar. Parafraseando o ditado, o navio foi feito pra navegar. Mas prefiro exemplificar com algo que me é mais próximo: de nada adiantaria eu ter colocado um motor de seis canecos no meu Opala, se fosse só para buscar pão quentinho na padaria da esquina; o que ele precisa é de estrada!

Ah, sim: last but not least, com  exceção das citações de início…

ESTE TEXTO NÃO FOI GERADO POR INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL !!!

😁

Literatura Orgânica

“Literatura Orgânica” seria uma espécie de certificação de que determinada obra foi produzida sem a utilização de ferramentas de Inteligência Artificial ou, se utilizada, em qual forma e proporção. Esse conceito – que é bastante interessante – surgiu no meu radar ao ler uma matéria online do The Guardian, publicada em 15/10/2025. Segue a íntegra da matéria, devidamente traduzida (ironicamente, por intermédio de Inteligência Artificial…) e ligeiramente revisada:

Certificado orgânico e livre de IA: novo selo para livros escritos por humanos é lançado

À medida que os livros feitos à máquina inundam os mercados online, uma nova iniciativa do Reino Unido busca introduzir um selo de Literatura Orgânica para ajudar os leitores a identificar livros criados por autores reais

Uma nova startup do Reino Unido está mirando na crescente onda de livros gerados por IA, lançando uma iniciativa que visa verificar e rotular obras escritas por humanos.

A Books By People lançou uma certificação de “Literatura Orgânica”, em parceria com um grupo inicial de editoras independentes.

O esquema envolverá selos de Literatura Orgânica colocados em livros escritos por humanos, com uso limitado de IA permitido apenas para tarefas como formatação ou geração de ideias.

A startup, fundada pela especialista em livros raros Esme Dennys junto com Conrad Young e Gavin Johnston, disse que planeja se expandir globalmente em 2026.

O primeiro título certificado será Telenovela, de Gonzalo C. Garcia [ambientada em Santiago, no final da ditadura de Pinochet, a obra explora a vida secreta de uma família envolvida neste período sombrio da história do Chile], com lançamento previsto para novembro pela Galley Beggar Press, uma das editoras fundadoras. Outros parceiros incluem Bluemoose Books, Snowbooks, Scorpius Books e Bedford Square Publishers.

Sam Jordison, codiretor da Galley Beggar e consultor da Books By People, afirmou que a iniciativa “é extremamente importante para editoras, autores e, principalmente, leitores. É tanto um selo de qualidade quanto uma garantia da humanidade compartilhada que buscamos nos livros.”

“Tenho muito orgulho de ser a editora que terá o primeiro selo — e parece muito apropriado que esse selo vá para Telenovela, um livro sobre a luta pela verdade e contra o autoritarismo.”

As editoras podem se qualificar por meio do comprometimento com os padrões de certificação e de verificações pontuais anuais. As taxas variam de acordo com o número de títulos produzidos a cada ano.

O lançamento ocorre em um momento de tensão acirrada entre as indústrias criativas e as empresas de IA. No início deste ano, a Anthropic concordou em pagar US$ 1,5 bilhão a autores que acusaram a empresa de usar cópias piratas de suas obras para treinar seu chatbot.

Movimentos para destacar a criatividade humana estão ganhando força. Em agosto, a Faber aplicou um adesivo com a inscrição “escrita humana” em exemplares de Helm, de Sarah Hall. Na época, a CEO da Faber, Mary Cannam, afirmou que o logotipo da editora “sempre representará essa origem da escrita humana”.

O lançamento também ocorre em meio ao crescente escrutínio do conteúdo gerado por IA em varejistas on-line, como os marketplaces da Amazon, que, segundo especialistas, continuam sendo um “faroeste” devido à falta de regulamentação em torno de textos gerados por IA, e que informações incorretas perigosas podem se espalhar como resultado disso.

Dan Conway, CEO da Publishers Association, acolheu os esforços voluntários para destacar a autoria humana, mas disse que a indústria não está atualmente pressionando pela rotulagem obrigatória.

“Como Associação de Editores, é fundamental que continuemos a apoiar editores e autores na defesa da criatividade humana e do pensamento crítico”, disse ele, acrescentando que a Publishers Association está incentivando varejistas online como a Amazon a tomar medidas mais firmes contra “conteúdo de baixa qualidade escrito por IA”.

Cá entre nós, achei extremamente positiva essa ideia. É lógico que não bastará meter um carimbo na capa de um livro para garantir esse tipo de “autenticidade humana”; certamente ferramentas serão criadas e equipes serão montadas para administrar a gestão desse empreendimento (se é que já não o foram).

E eu, que tenho trabalhado na reedição de antigos livros de genealogia mediante sua transcrição, vejo essa atitude com bons olhos. Já me perguntaram mais de uma vez o porquê de eu simplesmente não digitalizar essas obras e passar as imagens por um OCR – Optical Character Regonition, ou seja, Reconhecimento Óptico de Caracteres – e minha resposta é sempre a mesma: eu não posso correr o risco de que o original seja deturpado, de modo que, ao transcrever cada página, eu tenho a compreensão macro de todas as ligações genealógicas que estão presentes, tanto no livro em questão quanto em outros correlatos. E em genealogia, a informação fidedigna é essencial.

Dito isso, fiquei mancomunando com meus curiosos botões e lhes perguntei “Por que não tomar eu mesmo uma iniciativa desse gênero?”… Eles não chegaram a me responder, mas tenho quase certeza que concordariam comigo.

Para essa empreitada (estritamente pessoal e não lucrativa) imaginei o seguinte “selo”:

Até que ficou bem bonitinho, né?

Mas para levar adiante esse tipo de coisa, seria necessário estabelecer um conjunto de regras coerentes com a iniciativa.

1. O selo “Literatura Orgânica – 100% humana” certifica obras literárias criadas integralmente por seres humanos, sem o uso de Inteligência Artificial em qualquer etapa da escrita, edição ou revisão, garantindo sua autenticidade, ética criativa e valorização do trabalho intelectual humano.

2. O selo não pode ser utilizado em obras que contenham conteúdo gerado ou editar por IA, sob qualquer forma.

3. Estabelecer definições de diretrizes visuais e éticas para o uso correto do selo em livros, e-books e materiais editoriais (mais ou menos seguindo a linha utilizada pelo Creative Commons).

4. Símbolo livre para utilização em obras efetivamente criadas sem IA, permitido para autores, editoras e instituições que respeitem a autenticidade da autoria.

Bem, não sei quanto a vocês, mas garanto que os meus livros, a partir de agora, só saem pra gráfica com este selo!

Do Heavy Metal ao K-pop

Pois é, meu povo e minha pova, como já faz tempo que não escrevinhamos por aqui, então senta, que lá vem história!

E, por hoje, vamos falar um bocadinho sobre música. Em particular o meu tipo de música!

Acho que deve ser meio difícil para qualquer um lembrar exatamente quando começou a se interessar por música e por qual tipo de música. Teria sido na infância? Teria sido na adolescência? Foi quando do primeiro amor? Das primeiras amizades? Ou, talvez, nunca tenha se interessado. Bão, daí varêia de cada um, né?

Então vou tentar trabalhar com aquilo que minha (vaga) memória pode me ajudar.

No meu caso, creio que as lembranças mais antigas de “curtir” um som sejam do final da infância e comecinho da adolescência.

Nessa época eu estava enfiado dentro da igreja, autointitulado “católico apostólico romano”, já havia tentado ser coroinha (mas fui vetado, pois era alto demais em relação às outras crianças), frequentava um movimento jovem chamado Cruzada Eucarística de Santana e – pasmem! – estive a um tiquinho de entrar para o Seminário para me ordenar padre. Isso porque meu melhor amigo da época, mais velho do que eu e, curiosamente, descendente de japoneses, já tinha incutido em seu coração que esse era o caminho que ele deveria seguir. E eu realmente queria seguir nesse embalo. Só não fui porque era muito jovem e, mais uma vez, minha pretensão foi vetada, ao menos até que eu tivesse “idade suficiente” para fazer minhas próprias escolhas.

AINDA BEM!!!

Mas, como sempre, tergiverso.

Falávamos de música. Nessa época, por influência desse amigo, passei a ouvir as músicas do Padre Zezinho, sucesso da música cristã da década de oitenta, com discos gravados e uma trilha sonora inconfundível. Aliás, que fique bem claro: nada a ver com esses padres mega super ultra blaster plus pop stars que têm aparecido nos últimos tempos! Suas músicas eram melódicas, “com história”, boas de ouvir, de cantar e de matutar. Particularmente, dentre tantas, a minha preferida era a música Um certo Galileu, lançada em 1975.

Padre Zezinho – Um certo Galileu

A característica principal dessa música e que mais me atraiu, além de toda sua melodia, é o seu “encerramento” (sim, vocês vão ter que ouvir até o fim): forte, com trompas, tambores, o escambau. Acho que já nesse momento eu começava a demonstrar o interesse por aquilo que foge do usual…

E em casa, no recém adquirido aparelho de som três em um da Sanyo que meu pai havia comprado, costumava também ouvir alguns dos discos de meus irmãos mais velhos,  que, mesmo sem entender muito bem suas mensagens, estavam à minha disposição e me encantavam, também pela força, pela batida e mesmo sensualidade de suas músicas. Estamos falando de Queen e de Rita Lee (que em 1979, dentre outras, nos apresentou a espetacularmente maravilhosa Mania de você).

Queen – Bicycle race

E vamos combinar que a campainha da bicicleta ficou tão inusitada quanto ótima no contexto dessa música?

Rita Lee – Mania de você

Mas o tempo passa, a gente cresce e, diferente de meu amigo, não fui para o seminário – mas, em compensação, eu, que era um dos melhores alunos da escola, daqueles de não aceitar menos que a nota máxima, Caxias e extremamente bem comportado, gordinho, com óculos gigantes de metal, queridinho das professoras, bem na sexta série fui me sentar na carteira logo atrás de um dos sujeitos mais bagunceiros do pedaço; um, digamos, “repetente profissional”. Sei lá o porquê cargas d’água, nossos santos bateram, e ficamos muito, mas muito amigos mesmo. Foi ali, aos meros onze anos de idade, que comecei a ter um pouco mais de consciência do mundo que nos cerca e de que a vida não deveria ser levada tão a sério.

E, para completar, na oitava série, em 1983, tive o melhor professor de história da face da Terra: o “Seo” Rostschild. Inteligente e perspicaz, já tendo viajado meio mundo, suas aulas eram não só um encanto de agradáveis, bem como (para aqueles que se permitiam) ajudavam a “abrir os olhos” para muitas realidades históricas. Inclusive no que diz respeito aos mandos e desmandos da igreja católica através dos séculos – o que, aliado ao meu já bem adquirido interesse pelas moçoilas que me cercavam, sepultou de vez qualquer pretensão de carreira religiosa deste que vos tecla.

Aliás, mais um pouquinho dessa história está disponível aqui no blog, em Fragmentos.

Enfim, estávamos nos Loucos Anos Oitenta (a década que jamais acabou), e musicalmente falando vivíamos uma efervescência cultural que jamais voltaria a se ver igual na história. As músicas, tanto nacionais quanto internacionais, eram deliciosas, serviam para se cantar em grupinhos, ouvir no rádio, curtir nas danceterias e, ainda, tinham aquelas bem românticas, com o condão de proporcionar maravilhosos momentos a dois…

Ainda assim, eram “músicas de época”, alguns lançamentos faziam um estrondoso sucesso até que fossem substituídas pelo próximo. Muitos cantores e conjuntos se firmaram naquele período, e outros tantos tiveram o privilégio de fazer estourar uma única música e logo em seguida desapareceram no limbo do ostracismo radiofônico. Para conhecer um pouco do que estou lhes falando, recomendo conferir, também aqui no blog, duas grandes seleções que fiz: Anos Oitenta: 200 músicas nacionais de sucesso; e, outra só de músicas internacionais, em Anos Oitenta.

Segue a vida, e, uma vez que a grana era curta, dentre muitas tardes perdidas gravando músicas do rádio em fitas cassetes – o que era um porre, pois o maldito do apresentador sempre metia o bedelho e falava alguma gracinha antes da música terminar – eis que ganhei, do amigo de um amigo, uma fita que me apresentou ao mundo do rock como eu não conhecia, começando com a mais que clássica banda AC/DC e sua monumental Back in Black.

AC/DC – Back in Black

Fiquei irremediavelmente atraído por esse toque lento e compassado, que se mantém durante toda a música, e que combina perfeitamente com a guitarra do incomparável Angus Young, alternando entre altos e baixos com a rasgada voz do vocalista Brian Johnson. Com mais detalhes, já contei sobre isso em Back in Black, bem como foi a partir daí que se abriram outras portas para diversos outros conjuntos, que também já citei em Fogo cruzado, também em Cuidado! e em Dia Mundial do Rock.

Foi nessa época que vim a conhecer o Iron Maiden, cujo vocalista Bruce Dickinson, com sua voz de “air-raid siren” (sirene de ataque aéreo), causava arrepios até nos mais céticos ouvintes. Em janeiro de 1985, no melhor Rock’n Rio de todos os tempos, serviu somente para consolidar essa percepção de excelência.

Iron Maiden – Run to the hills

E, em Ouvindo o que mesmo?, vocês ainda vão encontrar uma relação com minha seleção bem heterogênea daquilo que interessa em termos de bom e velho rock’n roll…

E assim, desde a década de oitenta até meados do ano de 2002, meu “gosto musical” se manteve praticamente intacto, cabendo citar, ainda duas específicas pérolas que gostcho muitcho: o violonista Dilermando Reis e o saxofonista Léo Gandelman.

Desse período em diante, mesmo que de forma bem limitada, me permiti alguma abertura, pois aprendi a apreciar uma boa MPB (Chico Buarque, Elis Regina, Gilberto Gil e por aí afora), um bom sambinha (mais pro estilo de Adoniran Barbosa do que pra sambão de bateria), música sertaneja de qualidade (e não esse “sertanojo de universidade”, do tipo “dor de corno”, pois por aqui só temos Rolando Boldrin, Renato Teixeira, Almir Sater e outros do estilo), um tanto de música regional e fora do circuito (como, por exemplo, Trem da Viração, Ceumar, Tiê) e até mesmo um tanto de música clássica – que, na minha opinião, deve ser ouvida da mesma maneira que se houve heavy metal: com o volume no talo!

Beethoven – Sinfonia nº 5

Ah, um aviso aos desavisados: essa aí foi a versão (bem) resumida, extraída diretamente de Fantasia 2000, dos Estúdios Disney, pois em sua versão original a obra tem cerca de 8 minutos de duração.

E, também nesse período, aprendi a apreciar – e muito! – o gênero “Opera Rock”, começando por Therion, passando por Coronatas e, obviamente, o fantatiscabuloso Nightwish, em especial com a filandesa Tarja Turunen e sua maviosa voz (sim, larguem mão de serem chatos, pois é assim mesmo que se escreve).

Nightwish – Over the hills and far away

Gente! Vejam só como o batera já entra arrasando e, na sua deixa, o guitarrista é simplesmente fenomenal. Mas nada disso se compara à potente voz da vocalista, que também é de arrepiar. Se fosse possível voltar no tempo, daria até para imaginar um dueto com ela e o Bruce Dickinson…

E assim fiquei por um bom tempo, contente com minhas escolhas e curtindo sempre que possível e impossível toda essa variedade de músicas, em seus mais diversos gêneros e estilos.

Apesar de todos esses “avanços”, por volta de 2010 ouvi sobre mim que eu vivia numa “bolha”, criada há cerca de 15 anos e que, desde então, parei de evoluir. Que eu havia congelado no tempo-espaço e fiquei com as convicções de mundo estacionadas desde então. Que tudo que havia ocorrido em termos culturais, musicais, literários, cinéfilos, televisísticos e afins simplesmente resvalavam neste neandertal que vos tecla sem sequer deixar marca de uma mínima taxa de reconhecimento ou mesmo de lembrança.

Cumassim, Bial???

Na minha nada humilde opinião, creio que ainda foram até que generosos nessa avaliação…

Enfim, desde então me impus que deveria ser um tanto mais compreensivo e buscar assimilar ao menos um bocadinho a mais do mundo que me cerca. Aprendi a ao menos tentar ouvir novas e velhas músicas, ritmos e experiências antes de, sumariamente, lhes torcer o nariz. Algumas coisas muito boas saíram dessa nova fase perceptiva, um tanto de músicas fora do circuito, bem como outro tanto que, apesar de (relativo) sucesso, eu nem mesmo conhecia.

No primeiro caso, posso citar alguns artistas e conjuntos diversos, tais como Bruna Caram, Céu, Klebi, Banda do Mar, Little Joy, Manuche, O Teatro Mágico, Velhas Virgens, A Banda Mais Bonita da Cidade, Pata de Elefante, Rádio Galena, e – claro! – o impagável Pedra Letícia.

Pedra Letícia – O Menino

E, no segundo caso, posso lembrar de Los Hermanos, Ana Carolina, Zeca Baleiro, Skank, Jota Quest, Norah Jones, Des’ree, Cranberries, Midnight Oil, Enya, Coldplay, Rival Sons, Muse, Dropkick Murphys (Rose Tatoo é simplesmente é uma delícia!), e a inusitada banda alemã Rammstein.

Rammstein – Benzine

Confesso que nos últimos tempos meio que voltei a ser um tanto quanto intragável quanto a novidades. Bem do tipo “em time que está ganhando não se mexe”

Até porque eu simplesmente não me vejo abraçando certas músicas e ritmos – cuja qualidade, no geral, só vejo decair a cada dia que passa. Músicas horríveis, letras toscas, algumas até mesmo burras, falta de ritmo e por aí afora. E ainda assim essas porras simplesmente fazem sucesso!

Inacreditável.

Existem (novos) ritmos demais para enumerar – até porque nem mesmo conheço – de modo que não vou sequer tentar. E para que não pensem que sou (tão) intolerante, vejam só: li recentemente uma notícia que dizia que essa tal de Taylor Swift havia emplacado todas as músicas de seu novo álbum, The Life of a Showgirl, entre as Hot 100 da Billboard. Ora, me pareceu um feito e tanto! Nunca tinha ouvido nada dela (ao menos que me lembre), então resolvi checar. Fucei e, nos cantões da Internet, encontrei e baixei o álbum na íntegra. Ouvi na íntegra. Três vezes. Juro que me parece tudo uma música só! Tá certo que não sou nenhum crítico musical e também nem sei o que anda no gosto dessa garotada de hoje, mas particularmente não consigo perceber muito bem onde acaba uma e onde começa outra música. Para mim pareceu tudo igual, mesmo tom de voz, mesmo ritmo, mesma batida, mesmo tudo.

Deletei.

Outra coisa que surgiu nos últimos tempos (não tão últimos assim) foi um tal de K-pop, ou seja korean pop, ou, ainda, música popular coreana. Pelo que li, trata-se de uma forma moderna da música pop sul-coreana que abrange estilos e gêneros incorporados do ocidente, como pop, rock, jazz, hip hop, R&B, reggae, folk, country, além de suas raízes tradicionais da própria música coreana (obrigado, Madame Wikipédia). Depois de ter lido a receita dessa “sopa” de estilos, na hora me recordei de uma antiga estória da Turma da Mônica (como, raios, eu consigo me lembrar de coisas assim?), ainda da década de setenta, em que o Cebolinha e o Cascão resolveram formar uma banda de dois com um estilo musical único…

Enfim, o K-pop veio, se instalou, expandiu, fez sucesso e, de minha parte, eu sequer tomei conhecimento de sua existência. Ao menos que eu saiba.

E, finalmente chegamos onde eu realmente queria e que acabou rendendo toda essa montoeira de letrinhas aí de cima.

Dentre o muito que leio diariamente, entre notícias, informes, curiosidades e o escambau, ouvi falar do sucesso dessa animação chamada KPop Demon Hunters – “traduzida” nestas terras tupiniquins como Guerreiras do K-Pop. Mais por curiosidade do que por interesse propriamente dito, resolvi dar uma conferida nesse coiso, até porque em determinados trechos leva bem o estilo de mangá, que admiro um tanto.

A estória em si é bastante interessante, mas não chega a ser “fenomenal”. Mistura uma certa originalidade, com as cantoras que combatem os espíritos malignos através da música, com temas e personagens clássicos de lendas asiáticas. O grupo de K-pop HUNTR/X é composto por Rumi, a líder, Mira, a rebelde, e Zoey, a rapper. Tem humor, romance, ação, drama, reviravolta, o pacote completo. Ah, sim, e tem também as músicas!


As protagonistas: Zoey, Rumi e Mira.


Suas intérpretes musicais: Ji-youn Yoo, EJAE e Audrey Nuna.

Meeeooo…

Que fodástico!!!

Eu sinceramente não sei se a Netflix esperava o sucesso tão estrondoso dessa animação e, ainda, de suas músicas. Dessa nota aqui, fiquei sabendo que o filme já foi visto 266 milhões de vezes na plataforma, e que suas músicas originais já tiveram mais de 500 milhões de reproduções no Spotify. São números pra lá de impressionantes!

E, de minha parte, continuo completamente encantado com o ritmo e a sonoridade das músicas – são todas muito boas, mas em particular a minha preferida é a primeira de todas, já na abertura da animação: How It’s Done.

Confiram por si mesmos e cheguem às suas próprias conclusões.

E depois me contem!

Bem, é isso.

Então…

DONE, DONE, DONE !!!

😆

Pela Trindade

Quase em frente de casa existe uma capelinha. Simplesinha de tudo, mas arrumadinha e bem conservada pelos fiéis. Essa construção é o último resquício de uma favela gigantesca que existia beirando um dos lados da avenida e que já há muito tempo foi “removida”, pois toda a área é de preservação permanente em virtude do Córrego Senhorinha, que serpenteia ao fundo. Com o tempo a mata se recompôs e as árvores, nativas ou não, já alcançam mais de dez metros de altura.

Mas a capelinha ficou.

E, também, margeando a avenida, existe uma longa pista de caminhada irmanada de uma ciclovia, as quais se estendem por vários quilômetros, tanto à direita quanto à esquerda de onde moro.

Pois bem.

Estava lá eu, como de costume, tomando um cafezinho e soltando umas baforadas, observando o movimento.

E eis que um garotinho, de uns quatro, talvez cinco aninhos, com sua pequenina bicicleta, de repente para em frente à capelinha, abre um par de olhos deste tamanho, e fica esperando que seus pais, na caminhada, o alcance. Quando se dá o encontro, eis que ele me vem com esta:

“Mãe, pai, olha! A casa dos Três Porquinhos!”

Todos riram, inclusive eu, do outro lado da rua. Eles explicaram para o pequerrucho que não, que aquela construção não era a casa dos Três Porquinhos, mas sim uma capela e… Não deu tempo. Ele já havia saído pedalando, provavelmente bem convicto de sua descoberta.

Pois é…

Por mim, acho que tá tudo certo, pois não creio que a Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo – venha a se incomodar com a alcunha que lhe foi dada pelo inocente petiz… 😜

A volta dos que não foram (de novo!)

Muito recentemente fui “acordado” de volta pra vida graças a um comentário em um post que eu sequer havia escrito. Simplesmente recortei-e-colei um texto interessante cá no blog (ou melhor, “roubartilhei”) e pronto. Mas foi bom e acalentador saber que ainda existem umas quase quatro pessoas que ainda me acompanham por aqui. O que, talvez, ainda seja mais do que lá no Projeto 676!

Enfim, a vida não tem sido lá muito fácil e eu meio que me escondi de mim mesmo em um isolamento autoinfligido. Mas tive lá meus motivos. Então permitam-me compartilhar com vocês um pouco dessa história, mais exatamente de quase um ano atrás, do dia 16/12/2024.

E vamo que vamo!


Dia de retorno ao Psico (ah, sim, por inúmeros motivos que não vêm ao caso, ao menos neste momento, saibam que eu passei a me consultar com um psiquiatra).

Como você está? Tudo bem! Alguma novidade? Nada demais… Tem se controlado? Praticamente sim, tirando um detalhezinho à toa da última sexta-feira, tudo nos conformes. Ah é? O que foi? BATI O CARRO BÊBADO!!!

A conversa não foi bem assim, mas vocês meio que entenderam o resumo da ópera…

Mais uma vez tive ganas de NÃO COMPARECER no consultório, inventar uma desculpa verossímil qualquer, sei lá, audiência de última hora, ataque cardíaco, invasão alienígena, ou qualquer coisa do gênero – mas seria  muita covardia de minha parte.

Conversamos um bocadinho sobre minha libido, que já não era grande coisa e agora, depois dos remédios, já nem me afeta mais. Ele disse que tem como resolver isso (esse cara não deve ser psiquiatra, deve ser algum tipo de alquimista…), mas decidi que vamos cuidar de um problema de cada vez. Quando eu estiver “bom”, então veremos como vai ser essa bagaça. Eu sempre me peso quando vou lá e ele me disse que já perdi dois quilos. Grande bosta. Eu me peso TODO SANTO DIA em casa e sei exatamente a quantas anda minha densidade e força gravitacional perante o mundo. Dois a mais, dois a menos, para um cara do meu paquidérmico porte não é nada!

No que diz respeito ao acidente, contei resumidamente o que aconteceu e lhe garanti que foi a única recaída do mês. Mentira. Foi a oitava. Mas como as sete anteriores foram “bem de leve” não achei relevante trazer o assunto à pauta. O que, na hora, me fez lembrar dessa tirinha do Fagundes, o Puxa-Saco, personagem do Laerte:

Só que, no meu caso, não tive “alta”. Muito pelo contrário. Na realidade ele resolveu AUMENTAR a dosagem de um dos remédios que estou tomando. Tá, o médico é ele, então deve saber o que está fazendo. Mas, sinceramente, não me sinto “depressivo”. O que me fez lembrar outra tirinha (tudo me faz lembrar alguma tirinha), desta vez da Mariana e da Cláudia…

Apesar de tudo, eu preferia não ter que passar com remédios. Mas já que me submeti a esse “tratamento”, é como dizia um antigo estagiário lá da Prefeitura: “já que está no inferno, abraça o capeta!”

Segunda dose:

Ah, já estava quase me esquecendo: a minha querídola, amada, idolatrada, salve, salve, Dona Patroa – que, por incrível que pareça tem me tratado como uma pessoa normal, apesar de eu ter certeza que de normal não tenho nada – resolveu comentar comigo, antes ainda de eu sair pra rua, que eu estava precisando cortar o cabelo e aparar a barba, mas lamentou que estava estava sem tempo pra isso (é ela que tem me dado um trato desde a pandemia).

É LÓGICO QUE NA VOLTA, DE TEIMOSO, EU PASSEI NUM BARBEIRO.

E não, não foi o Nando. Meio que perdemos o contato. Ainda sinto falta de nossos proseios.

E este foi meu último visual com minha vetusta branca barba…

Passei num salãozinho ali pertinho de casa mesmo. Daquele estilinho dessas “novas barbearias” com cara de antigas que o pessoal tem tentado fazer. Só que no caso não era um barbeiro, mas uma “barbeira”. No problem. “E aí? Como vamos fazer?” “Tira tudo.” “TUDO???” “Não, melhor deixar as sobrancelhas. Ao menos até momento ainda não me baixou o espírito de Pink Floyd…”

Máquina zero na cabeça.

Navalha nas fuças.

E cara de indignada da Dona Patroa.

“Ué? Mas você não mandou cortar?”

“Cortar, sim, mas não precisava voltar pra casa que nem o Kojak!”

Agora é tarde. Já foi. Fazer o quê?…

Não precisa ser eterno, basta ser bom

Larissa Bittar

A gente sofre é com o fim. Há incômodo na relação morna, tédio por viver na cidade que já não comporta nossos planos, frustração no emprego que era dos sonhos e agora é corrente que freia novos passos. Mas a gente aguenta. Levanta o queixo, ajusta falhas, engana a alma, forja felicidade. A gente adestra decepções para fugir do desconcerto que nos assola quando é preciso encerrar fases. E, então, mergulhados na crença capenga de que se um dia foi bom tem potencial para ser imortal, a gente começa a esticar sentimento morto, a repisar terreno gasto.

Não que seja errado perseverar. Há mérito e nobreza na luta pela manutenção do que foi precioso. Mas, às vezes, é preciso desligar os aparelhos. Coragem para aceitar que chegou a hora da eutanásia dos vícios emocionais e da ilusão de que há sobrevida no que já era. Já deu!

Em um mundo em que os contos infantis martelam o “felizes para sempre” e os casamentos são regidos pelo “até que a morte os separe”, quem precisa romper laços sente o peso de bancar o fim. Mas há força e lucidez na decisão de reinaugurar a própria história. Dá para trocar raízes por asas, escritórios por mochilas, vida a dois sufocante por novas companhias e aventura. E também dá para trocar, em sentido inverso, asas por raízes, mochilas por escritórios, companhias sufocantes e aventura por vida a dois cheia de afeto e leveza.

Só não dá para criar momentos de estimação e tentar guardá-los em um pote na esperança de que não se percam. Um dia vão acabar. Vai doer. Mas vai ser libertador também. É a regra do jogo, é a dinâmica que move o mundo e suas surpreendentes formas de nos tirar do lugar… É o clichê “que seja infinito enquanto dure” alertando que o destino é mais brisa do que chumbo. Não precisa ser eterno, basta ser bom — no tempo e na forma possíveis. A vida sempre se encarrega de equilibrar perdas e ganhos em necessários ciclos de fins e recomeços.