Qual deles?

No início do ano de 1997 eu comecei a advogar de fato e fazia parte, juntamente com outros amigos, de uma sociedade de advogados aqui da cidade. Nesse início éramos em dez ao todo: cinco advogados recém formados, os “agregados” (eu entre eles), e cinco advogados já com larga experiência no mercado, os “sócios” (Luís Henrique e Luiz Arnaldo entre eles).

E a secretária.

Se não me engano, a primeira dentre várias que ainda viriam.

Mocinha simpática, moreninha, bem magrinha, bonitinha até!

Mas que até hoje não sei dizer se se possuía um senso de humor único, uma perspicácia além da conta ou se era, digamos, “limitadinha” mesmo…

E este causo aconteceu pouquinho tempo após a inauguração do escritório.

Ela lá, impávida na recepção, sempre com um sorrisinho estampado no rosto e que raramente se apagava. Chegou um sujeito, assim meio que com cara de perdido, encarou-a, também sorriu e foi falando:

– Por gentileza, eu gostaria de falar com um advogado.

– Tudo bem. Qual deles?

– Ah, tá. Lógico. Tem um monte de advogados aqui… É com o Dr. Luiz.

– Tudo bem. Qual deles?

– Ué? Tem mais de um Luiz aqui? Tá certo. É um nome comum, né? É um assim alto, bem magrinho.

– Tudo bem. Qual deles?

– Tá, tá… Esse é um tipo até comum. É um bem clarinho, quase loiro.

– Tudo bem. Qual deles?

– Pôxa, é o que antes tinha escritório no edifício aqui pertinho, no Vip Center.

– Tudo bem. Qual deles?

– Menina, eu o vi entrando aqui agorinha há pouco. Ele está com uma camisa branca e terno preto.

– Tudo bem. Qual deles?

– Caramba! É o que tem um carro da Fiat… Qual mesmo? Ah, é: um Tempra preto.

– Tudo bem. Qual deles?

– Ô louco! Os dois têm Tempra, é? Pois bem, é um que tem uma criança pequena, não sei que idade.

– Tudo bem. Qual deles?

– Você não tá tirando uma com a minha cara não, né menina? A esposa dele se chama… Deixa eu ver… Ah é! Cíntia! É o que é casado com a Cíntia!

– Tudo bem. Qual deles?

– Ah, não! Agora você tá de gozação! Só pode estar! Não é possível! É o que tem bigode, tá bom? É o que tem bigode! Sabe o que é um bigode? Sabe? É o que tem bigode!!!

– Ah! Então é o Dr. Luiz Arnaldo! Por que o senhor não disse antes?…

Deixarei para que a profícua mente destes incautos leitores possa imaginar – somente imaginar – qual o rol de impropérios que, ainda que não tenha manifestado em alto e bom tom, certamente passou pela cabeça desse indivíduo enquanto se dirigia para a sala do advogado…

Procura-se coerência

Roubartilhei lá da página virtual do jornal Oi diário… Mas entendo PERFEITAMENTE os sentimentos do juiz! O que não é mérito nenhum… :-/

Juiz ‘esculacha’ procuradores de Justiça em Mogi

15 de fevereiro de 2016

O Jornal Oi teve acesso na sexta-feira a uma decisão da Justiça de Mogi que não foi nada interessada para procuradores da prefeitura mogiana que recorreram ao Judiciário para resolver questões que deveriam ser tratadas internamente e não levadas as barras do tribunal. Leia a seguir o despacho bem ‘direto e reto’ do juiz Bruno Miano que é do fórum de Mogi.

A impetrante, APAMAT, ajuíza este mandado de segurança coletivo, pretendendo uma série de informações que não obteve na via administrativa, com base na Lei de Informações. Segundo a impetrante, seu pedido recebeu o nº 52142/15 e, devendo a resposta ser dada até 28 de dezembro de 2015, foi fornecida apenas em janeiro deste ano, sem a suficiência dos informes postulados.

É o relatório. Passo a decidir.

Primeiro e antes de tudo: o Judiciário não é o palco para tricas e futricas entre os senhores procuradores municipais. Que fique consignado – até para caso de haver recurso – que a situação na Procuradoria Jurídica de Mogi das Cruzes passou de insustentável a ridícula, por conta do comportamento infantil e intransigente de alguns de seus profissionais. Profissionais que comparecem no Gabinete deste Magistrado, trazendo “informações” contra colegas. Profissionais que aqui vêm, para lutar contra o projeto de lei que culminou por criar a própria Procuradoria como órgão autônomo. Profissionais que deram pareceres absurdos – enquanto o prédio da Prefeitura estava em reforma – porque “não conseguiam pensar com tanto barulho, pois parecia haver um helicóptero em suas cabeças”. Profissionais que se recusam a conversar com a Procuradora Chefe, mesmo em se tratando de caso de reintegração de posse de área com grande repercussão social, deixando a cargo do Magistrado telefonar ao Prefeito para resolver o impasse!! Profissionais com um pensamento burocrático, que pensam que uma estagiária é o busílis da Administração Pública, a pedra de toque de toda eficiência, a salvação da lavoura!!!

Ora!!

Este Juízo, repito, não é palco, nem servirá de teatro, para que tais profissionais venham, sob falso pretexto de “desrespeito a direitos”, fazer vendeta pessoal, perseguição aos chefes.

Isso é um absurdo! Usar o Judiciário para fustigar os demais colegas, porque não concordam com posturas de chefias, é um atentado à Cidadania, que precisa do Judiciário desafogado para agir no que de fato importa. Se as chefias não agradam, conversem! Mas se elas não infringem preceitos disciplinares, conformem-se!! Repito: se houvesse algo de fato ilegal, a macular as condutas dos chefes da Procuradoria Jurídica do Município (PJM), este Juízo seria o primeiro a invalidá-las, nos termos da lei. Mas o que se vê são picuinhas, e nada mais!!! As informações tinham que ser prestadas em 28 de dezembro (época pior, parece não haver), mas o foram em janeiro. Qual o prejuízo? NENHUM. E foram prestadas conforme a fundamentação feita pela própria impetrante: basta ler as folhas 30/32.

Destaco:

“(…) a associação buscava uma solução para o impasse de substituição da estagiária de uma das procuradoras. Segundo o subprocurador este fato era sem importância para que a associação intervisse. Contudo, antes de assumir o cargo sempre foi ferrenho defensor da estruturação da carreira. Não se entende agora o que pode ter ocorrido para mudar tão repentinamente.

(…)

Portanto, é de suma importância sim que os procuradores de Mogi das Cruzes tenham o apoio necessário para a realização de suas funções e esta associação envidará todos os esforços para que isso ocorra.”

O assunto, pois, era saber todos aqueles dados para confrontar com a falta do estagiário. Se os informes se relacionavam com esse assunto, e se o estagiário foi contratado (se exclusivo ou não, isso nem mesmo é objeto do pedido), não havia mais nada a informar. Houve perda do objeto! Não há direito líquido e certo em atrapalhar a Administração Pública com pedidos de informações, quando já se obteve o que queria. Estamos, repito, diante de mais um capítulo da eterna briga entre os grupos da Procuradoria Jurídica. Com o uso indevido e incorreto do Poder Judiciário. Por isso, ausente qualquer direito líquido e certo, INDEFIRO ESTA INICIAL E JULGO EXTINTO ESTE PROCESSO, com base no art. 267, I, do CPC.

Com a palavra os procuradores responsáveis pela ação extinta pelo juiz mogiano.

O que esperar

Estava lá o caboclo navegando furiosamente em seu celular buscando encontrar sabe-se lá o quê.

– Adautô!

– Chora.

– Diga lá: você sabe o que significa a sigla “TRT”?

– Fácil.

– Ah é?

– É. TRT significa “Tribunal Regional do Trabalho”.

– …

– Que foi?

– Acho pouco provável que seja isso, considerando que eu estou fazendo uma pesquisa num site de venda de passagens de ônibus para minha esposa. Mais provável que seja “Terminal Rodoviário do Tietê”.

– Então, não importa.

– Como assim, não importa???

– Uai, eu tava certo.

– Lógico que não.

– Lógico que sim. Você perguntou para um advogado o que significa TRT e fiz exatamente o que se espera de qualquer advogado: lhe forneci uma resposta cem por cento correta e cem por cento inútil…

Em briga de mulher com mulher…

Descubram por si mesmos, por conta desta pitoresca sentença…

JUSTIÇA DE PRIMEIRO GRAU – COMARCA DE DIVINÓPOLIS/MG
3º JUIZ DA UNIDADE JURISDICIONAL DO JUIZADO ESPECIAL

Processo: 0123815-24.2011.8.13.0223
Parte autora: M.J.C.
Parte ré: E.P.S.

EMENTA: Briga de mulher por causa de homem. Invasão de domicílio. Surra com muitas escoriações, unhadas, socos, puxões de cabelo e ameaças posteriores. Fato provado nos mínimos detalhezinhos sórdidos. Agressor que mesmo na presença dos policiais, após o quiproquó, disse que ainda não terminou o serviço e que vai continuar a agredir a vítima, se ela tentar roubar seu namorado. Sujeito do desejo ardente das duas mulheres que afirma em juízo ser solteiro, amante das duas, mas que não pretende compromisso sério com nenhuma delas e que saiu de fininho, quando a baixaria começou, pois não queria rolo para o seu lado. Tempos modernos. Indenização por danos morais devida. Recomendação que se faz ao agente disputado, em razão do aspecto pedagógico das sentenças. Pedido julgado procedente.

SENTENÇA

Vistos etc.
A M.J.C. procurou a Justiça para reclamar da E.P.S.. Disse ter levado uma surra da requerida, com puxão de cabelo e unhada e tudo o mais que a gente imagina de briga de mulher briguenta, dentro de sua própria casa, invadida por ela só porque ela estava com o Nilson, no bem bom, fato que desagradou a agressora. Quer seus “danos morais” e não tem conversa de conciliação não. Chega de perda de tempo.

A E.P.S., esperta, veio acompanhada de advogada porque percebeu que a coisa não está boa para ela não. E a Doutora advogada já despejou logo uma preliminar de inépcia da inicial e citou muita doutrina e jurisprudência para demonstar queno mérito a autora não tem razão, porque houve agressões recíprocas e veio até citando ensinamentos de Ada Pelegrini Grinover e Maria Helena Diniz e Clayton Reis e Carlos Alberto Bittar e Yussef Said Cahali e S. J. de Assis Neto e de um outro tantão de Desembargadores mineiros e gaúchos. Gente graúda de sapiência que costuma escrever tratados de dano moral, de três ou quatro volumes de mil páginas cada um, ensinando a gente como resolver problemas de mulheres briguentas, de puxões de cabelo, de unhadas etc. A defesa mesma é verdadeira compilação da enciclopédia brasileira do dano moral. E fez pedido contraposto, porque triângulo amoroso gera descontentamento, desgraça e amargura… O lado de lá do triângulo é que deve suportar esse ônus.

Na Audiência de Instrução e Julgamento sobrou espinho pontiagudo e venenoso pra tudo que é lado, menos pro lado do Nilson, que veio sorridente, feliz da vida, senhor das moças lá do Halim Souki. Os olhos das duas se encheram de alegria e esfuziante contentamento com a chegada dele na sala. Dava gosto de ver os olhos delas duas. Ninguém nem queria ouvir o magistrado, que só queria trazer um pouco de paz na vida das moças. Todo mundo só esperando acabar os depoimentos para ouvir a sentença.

Então, passo a julgar o causo da disputa pelo Nilson, que foi mesmo na unhada.

Inépcia da inicial eu não vi não, muita data venia da doutora advogada de E.P.S.. A M.J.C. disse para o atermador da justiça o que aconteceu e pediu o que achou o que é de direito dela. Tudo muito bem explicadinho, nos seus mínimos detalhes… Dizer que a “exordial não é clara” só porque não especificou os vocábulos técnicos, a descrição das agressões, não tipificou unhada como lesão ou vias de fato, ah isso é exigir o que a Lei não exige dos atermadores, tão caprichosos no seu mister. Exigir que uma pessoa explique no nome do vocábulo técnico que se dá quando uma pessoa entra na casa da outra, sem ser convidado e para acabar com a festa, o nome técnico que se dá para o puxão de cabelo, a unhada, o soco na cara e o porquê que tudo isso causa sentimento de humilhação, constrangimento e transtorno é o mesmo que pedir que uma pessoa explique porque o fogo queima, a luz ilumina, a chuva molha. Cientista físico até sabe, mas a gente que vem na justiça sem ser cientista não precisa de saber. E isso não é inépcia. Afinal, pra quê tanto enciclopedismo inútil nos processos dos Juizados?

Afasto a preliminar insólita, como insólitas são as brigas de mulheres por causa de homem.

No mérito, o pedido merece prosperar, porque baixaria como se viu não pode ficar sem danos morais.

É que no dia dos fatos o Nilson estava lá na casa da M.J.C., “arrumando uma boia” (sic), quando a E.P.S. ligou para ele, mas ele, nem pra dizer que estava numa pescaria com os amigos! Foi logo entregando que estava com a rival. Êta sujeito despreocupado! Também, tão disputado que é pelas duas moças, que nem se alembrou de contar uma mentirinha dessas que a gente sabe que os outros contam nessas horas só pra enganar as namoradas. Talvez porque hoje isso nem mais seja preciso, como era no meu tempo de pescarias. Novas Leis de mercado. Foi logo dizendo na bucha, na cara limpa mesmo, como fez na audiência, que estava lá com a M.J.C., mas só “arrumando uma boia dela”. E a E.P.S. não gostou da história e foi lá tirar satisfação com a ladrona de namorado, pois isso não é coisa que se faça. E foi logo abrindo o portão da casa da ladrona de namorado, puxando seu cabelo, dando unhada e soco e sei lá mais o quê. O Nilson disse na audiência que só viu as duas se atracando e rolando pelo chão do terreiro, mas ele mesmo saiu de fininho, pois ão queria se meter em encrenca não. Briga de mulher é melhor não meter a colher! Disse pra polícia e pro Juiz que é solteiro, se relaciona com as duas, mas que não quer compromisso com nenhuma delas, isso ele não quer não.

Na hora das perguntas para tirar o compromisso do Nilson foi um Deus nos acuda. Eu tinha de perguntar pra ele se ele tinha “amizade íntima” com alguma das partes do processo. Tá na lei que o juiz deve de fazer essa pergunta, então eu fiz. E ele logo respondeu que namora com a E.P.S., mas que com a M.J.C. ele só tem um… A M.J.C. gritou lá da sua cadeira: Vai negar…? E antes mesmo que ela completasse a frase, aí não deu jeito, aí eu tive que intervir, lembrar que não era “Programa do Ratinho”. Dei duro na M.J.C., que era para ela respeitar. E a E.P.S. riu…

Aí o Nilson se sentiu mesmo o rei da cocada, mais desejado que bombom brigadeiro em festa de criança. “Seu juiz, eu sou solteiro, gosto das duas, tenho um caso com as duas, namoro a E.P.S., mas não quer compromisso com nenhum delas não senhor”. Estava tão soltinho na audiência , com a disputa das duas, que só faltou perguntar: “tô certo ou errado?”

Depois que o Nilson saiu da sala de audiências não vi mais alegria alguma nos olhos das duas em disputa. A M.J.C. ainda resmungando da surra que levou ainda chamou a rival de “esse trem”. Aí for preciso novamente intervenção enérgica deste Juiz, pois “esse trem”, dito assim, se referindo a uma pessoa, no caso a E.P.S., isso é xingamento, pode dar dano moral também, e isso não pode ocorrer na audiência. Dei outra dura nela. Disse que ela não pode xingar os outros na sala de audiências. Ela pediu desculpas. Mas só por causa disso eu resolvi abaixar um pouco o valor da condenação. Ela ia ganhar R$4.000,00 de dano moral. Mas porque chamou a E.P.S. de “esse trem” eu vou abaixar o valor para R$3.000,00.

A outra testemunha trazida pela autora, a Christiana, essa também relatou ter visto a requerida invadindo a casa da M.J.C. e lhe dando uma gravata, pelas costas e que depois do entrevero, dos socos e unhadas e puxões de cabelo a autora ficou mesmo com muitos hematomas.

E não foi só isso que foi provado. Também ficou provado que depois de tudo isso a requerida ainda disse para os policiais que não havia terminado o serviço, que ainda acertaria contas com a M.J.C.. Mas o Nilson não tem nada com isso. Ele deixou claro que não se mete nessas coisas das duas.

Conquanto a parte criminal do causo já tenha sido objeto de transação penal, segundo a culta advogada da E.P.S., podemos tipificar a conduta da requerida em pelo menos três dispositivos do Código Penal, sem medo de errar: invasão de domicílio, ameaça e lesões corporais leves. Tudo isso bem provadinho, tim-tim por tim-tim. E nem se diga que não houve lesões, mas vias de fato, porque isso não é verdade não. Vias de fato não dói. É o empurrãozinho, a cusparada, trequetê. Mas puxão de cabelo e unhada dói muito. Unhada, Deus me livre; dói demais da conta…

Diz o art. 333, do CPC, que ao autor incumbe a prova do fato constitutivo do seu direito; e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

A invasão de domicílio, as agressões e ameaça posterior foram provadas.

Para mim, só a invasão de domicílio já bastaria para fundamentar a condenação, pois a inviolabilidade do domicílio é direito fundamental previsto no inciso XI do art. 5º da Constituição Federal, e somente pode ser violada com o consentimento do morador, “salvo em flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. Mas, além dela, ainda restaram as agressões e a ameaça, e todas devem ser objeto de valoração negativa da conduta da E.P.S.. Veja-se a propósito o que dizem os doutores nesse assunto de brigas, xingamentos, ameaças, baixarias e agressões:

(…)

Com relação ao valor pleiteado a título de danos morais, fixo a condenação em R$3.000,00. Ia fixar em R$4.000,00, mas como a M.J.C. desrespeitou a E.P.S., chamando-a de “esse trem”, durante a Audiência de Instrução e Julgamento, acho que ela também deve ser punida por esse fato. E ela também não é santa não, deve ter retrucado as agressões. Mas a culpa maior foi da E.P.S., que foi lá na casa dela tirar satisfação. Assim, a condenação é só de R$3.000,00.

Quanto ao Nilson, considerando o aspecto pedagógico das sentenças judiciais, caso ele tome conhecimento da sentença, recomendo que ele tome juízo. Quando estiver na casa de uma e a outra ligar para ele, ao invés de falar a verdade, recomendo que ele diga que está na pescaria com os amigos. Evita briga, litígio, quiproquó e não tem importância nenhuma. Isso não é crime. Pode passar depois lá no “Traíras” e comprar uns lambarizinhos congelados, daqueles de rabinhos vermelhos, e depois no ABC, comprar umas latinhas de Skol e levar para a outra. Ela vai acreditar que ele estava mesmo na pescaria. Trouxe até peixe. Além disso, ainda sobraram algumas latinhas de cerveja da pescaria… E não queira sair de fininho da próxima vez, se tudo der em fuzuê ou muvuca. Isso é feio, muito feio. Fica esperto: da próxima vez que você fizer isso você poderá ser condenado por danos morais. Qualquer advogado vai achar alguma jurisprudência nesse sentido, isso vai. Tem jurisprudência pra tudo! Isso não se faz, não senhor. Ao invés de sair de fininho, como se nada estivesse acontecendo, vê se bota ordem no banzé das moças.

Em face do exposto, julgo procedente o pedido formulado na inicial e condeno E.P.S. a pagar para a M.J.C. a quantia de R$3.000,00, a título de indenização por danos morais, valor este que deverá ser devidamente corrigido pelos índices oficiais adotados pelo Poder Judiciário, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da publicação desta sentença.

(…)

Defiro a assistência judiciária para ambas as partes. Elas são pobres mesmo, em todos os aspectos. E ainda têm que brigar até por homem. Coitadas. E, além disso, na semana passada foi Dia Internacional da Mulher. Elas merecem pelo menos esse tipo de assistência.

Sem custas e honorários em 1º grau de jurisdição.

Publique-se; registre-se; intimem-se.

Divinópolis/MG, 16 de março de 2012.

C.R.L.
Juiz de Direito

Um homem, um barril e a gravidade da situação

Explicações de um operário português sinistrado à Companhia Seguradora que estranhou a forma como o acidente ocorreu. A transcrição abaixo foi obtida através de uma cópia do arquivo da Companhia Seguradora. O caso foi julgado no Tribunal de Justiça da comarca de Cascais.

Exmos. Senhores.

Em resposta ao pedido de informações adicionais informo:

No quesito nº 3, da participação de sinistro mencionei: “Tentando fazer o trabalho sozinho” como causa do meu acidente. Disseram na vossa carta que deveria dar uma explicação mais pormenorizada pelo que espero os detalhes abaixo sejam suficientes.

Sou assentador de tijolos. No dia do acidente estava a trabalhar sozinho no telhado dum edifício novo de 6 (seis) andares. Quando acabei meu trabalho, verifiquei que haviam sobrado 250 (duzentos e cinquenta) tijolos, com cerca de 1 (um) quilo cada. Em vez de os levar a mão para baixo, decidi colocá-los dentro dum barril com a ajuda de uma roldana, a qual felizmente estava fixada num dos lados do edifício ao 6º andar.

Desci e atei o barril com uma corda, fui para o telhado, puxei o barril para cima e coloquei os tijolos dentro. Voltei para baixo, desatei a corda e segurei-a com força de modo que o barril com os 250 (duzentos e cinquenta) quilos de tijolos descessem devagar (de notar que no quesito nº 11 indiquei que meu peso é de 80 (oitenta) quilos.

Devido a minha surpresa por ter saltado repentinamente do chão perdi a minha presença de espírito e esqueci-me de largar a corda. É desnecessário dizer que fui içado a grande velocidade. Na proximidade do 3º andar, embati no barril que vinha a descer. Isto explica a fratura no crânio e a clavícula partida (conforme laudo médico anexo).

Continuei a subir a uma velocidade ligeiramente menor, tendo parado somente quando os nós dos dedos de minha mão direita ficaram entalados na roldana, ante o que soltei a corda (vide laudo médico anexo). Felizmente já tinha recuperado a minha presença de espírito e, antes que caísse, consegui, apesar das forte dores, agarrar novamente a corda com a mão esquerda.

Mais ou menos ao mesmo tempo o barril com os tijolos atingiu o solo e o fundo partiu-se fazendo com que os tijolos ficassem no chão. Vazio o barril pesava aproximadamente 25 (vinte e cinco) quilos.

Como podem imaginar, comecei a descer rapidamente (refiro-me novamente ao meu peso indicado no quesito nº 11), e próximo ao 3º andar encontro o barril que vinha a subir. Isto justifica a natureza dos tornozelos partidos e das lacerações nas pernas, bem como da parte inferior do corpo. O encontro com o barril diminuiu a minha descida o suficiente para minimizar meu sofrimento, de modo que ao cair em cima dos tijolos esparramados no chão felizmente só fraturei 3 (três) vértebras.

Lamento no entanto informar que, encontrando-me caído por sobre os tijolos, sofrendo terríveis dores e incapacitado de me levantar, ao ver o barril pendurado acima de mim, perdi novamente a presença de espírito e larguei a corda. O barril pesava mais que a corda, de modo que desceu e espatifou-se sobre mim, partindo-me as pernas.

Espero ter dado as informações solicitadas do modo como ocorreu o acidente.

Manuel Eduardo de Araujo

( Publiquei originalmente no e-zine CTRL-C nº 02, de março/2000 )

Pamonhas peticionais

Advogado escreve receita de pamonha na petição pra provar que
juiz não lê os autos

Li o causo lá no Direito e Trabalho e fui conferir lá no Não Entendo Direito. Achei divertido…

Entretanto, na minha opinião, o “efeito bombástico” do título não é lá tudo isso, pois, como bem disse o Jorge, “A mensagem que ele incluiu o foi dentro de um texto que parecia ser uma jurisprudência e que tinha uma parte em negrito que, se não houvesse a alteração, seria um resumo do seu conteúdo.”

Ou seja, a receita estava bem escondidinha – ainda que à vista de todos!

Mas não muda o fato que os nobres causídicos de hoje em dia ainda têm o péssimo costume de despejar jurisprudências aos borbotões dentro de suas petições, como se as mesmas fossem aquilatadas por metro linear. Desculpem-me, mas deixemos a medição de lições por comprimento somente para os pergaminhos de Hogwarts, ok? Se algo não for visceralmente essencial para provar seu ponto de vista, então utilize seu próprio bom vocabulário para exercer todo seu poder de convencimento, ou, ao menos, limite-se às citações curtas…

Se o seu texto for claro e objetivo o suficiente, não comportando controvérsias, desnecessários serão os penduricalhos jurisprudenciais. Afinal, “da mihi factum, dabo tibi jus”¹, não é mesmo? Hein? Não entenderam? Ora, isso é latim, pessoal! Fica bem bonitona uma petição toda recheada de latinório, não fica não?

Pode até ficar. Mas, certamente, perdeu um pouco de sua objetividade…

Não, não sou contra o uso do latim, não! Mas somente sou daqueles que acredita que seu uso deve estar no lugar certo dentro do texto certo e no momento certo de ser lido. Simples assim.

Afinal, se já reclamamos o suficiente da morosidade do Judiciário, entupir nossas peças com textos repetitivos e jurisprudência inútil não vai melhorar isso em nada. Só estaríamos tomando ainda mais tempo dos juízes que poderiam se dedicar a coisas mais úteis. Ainda que fosse a busca de uma simples receita de pamonha…

Enfim, ultimamente tenho tentado encarar – quase que tudo – através de uma das filosofias de Steve Jobs: “O simples pode ser mais difícil que o complexo. Você precisa se esforçar muito para conseguir clarear o pensamento o suficiente a ponto de fazer o que é simples.” Acho que é bem por aí. Construir algo simples dá um trabalho fenomenal. E não são aquelas toneladas de jurisprudências que vão conseguir mudar isso!

Aliás, confiram o original vocês também:

Clique na imagem para ampliar!

¹ “Dá-me os fatos, dar-te-ei o direito.”