Falando sozinho

[ Prólogo: Estava eu buscando a correta fonte para uma determinada citação quando, totalmente sem querer, encontrei o blog do Eduardo Marcondes. Jornalista de Campinas, fã declarado de Fernando Sabino (particularmente prefiro Rubem Braga e Mário Prata), manteve seu blog de 2009 a 2018, com textos leves e agradáveis, porém cada vez mais esparsos – o link tá aí do lado, em Gente Legal – e que, sinceramente, recomendo a leitura! Dá um certo frescor aos pensamentos ler bons textos neste mundo cada vez mais minimalista que o tal do Facebook acabou por nos impor… ]

Fernando Sabino

Certa ocasião, um professor amigo meu resolveu estudar o comportamento das pessoas que falam sozinhas. Desde então o assunto passou a me interessar.

Frequentemente me surpreendo falando sozinho. Ainda há pouco fui retirado da preguiça de escrever e posto diante desta máquina por uma ordem peremptória, expressa através de minha própria voz: vai trabalhar, vagabundo! Várias vezes ao dia me vejo, ou me ouço, dizendo coisas para mim mesmo – em geral palavras de advertência a que respondo com pedidos de contemporização (“por favor, assim também não há tatu que aguente”), autoelogios (“até que eu não sou dos piores”), queixumes e justificações (“ninguém é de ferro”, “no fim dá certo”, “deixa correr frouxo”). E estabeleço comigo mesmo um diálogo bem distraído – pelo menos na medida em que me distrai das obrigações.

O próprio ato de escrever não é senão um modo de falar sozinho, segundo aquela definição do gordo Alexander Woolcott, para quem o escritor é um homem que passa a vida inteira conversando consigo mesmo, e cujo único consolo é que a conversa com o correr dos anos fica cada vez mais interessante.

Falando sozinho, no papel ou em voz alta, tenho pelo menos o cuidado de evitar o testemunho de quem possa ver nisto rachões de sobra para fazer-me hóspede do Pinel. Os que atraíram o interesse do professor são malucos mais declarados: os que saem pelas ruas discutindo com alguém cujo único inconveniente é o de não existir. Ou, pelo menos, de não estar presente à discussão: um marido a acertar as contas com a mulher, um empregado pedindo aumento ao patrão – empenhados, em geral, numa reivindicação qualquer que não tem condição de fazer senão quando sozinhos.

Estimulado pela ideia do professor, resolvo, durante uma volta pela cidade, fazer também as minhas observações sobre o assunto. Descubro, assombrado, que o número de pessoas que falam sozinhas é muito maior do que eu imaginava. Discutem, gesticulam, riem, se exaltam, como se estivessem acompanhadas. Logo de saída passa por mim um velho, resmungando:

– Comigo é assim. Se não gostar, paciência.

Chego a pensar que esteja falando comigo. Sigo um e outro, detenho-me quando se detém, mais de uma vez me ocorre pensar se o maluco não sou eu. Tenho a impressão de que se saísse pela rua falando em voz alta tudo o que me vem à cabeça, ninguém me daria a menor atenção. Basta parar um instante em local mais movimentado, e surge logo um matusquela em animada conversa consigo mesmo:

– É isso aí, meu velho. Eu bem que avisei. Agora aguenta as pontas.

Mais adiante dou com um jovem pálido, magro, que segue à minha frente a gesticular energicamente, e passo a ouvir o que ele diz:

– Como é que é? Você vai ou não vai fechar o negócio? Estou perdendo a paciência, rapaz. Não posso esperar mais.

O tom veemente e autoritário de sua voz e os gestos decididos contrastam com a modéstia de sua aparência. Ele se detém junto ao meio fio, como para dar mais força às palavras:

– Se você não cumprir o que prometeu, vamos resolver isso na raça.

E sorri, satisfeito, porque “o outro”, amedrontado, não ousa responder nada. Ao voltar-se, dá comigo a observá-lo. Encabula-se, passa sem transição da insolência à humildade, dirigindo-se a mim com voz mansa:

– Estava acertando aqui uma escrita… Será que o senhor pode me arranjar um trocado para a condução?

Alguns, entretanto, buscam apenas distrair-se e matar o tempo. Como aquele português, cujo caso uma amiga do professor recolheu para o seu estudo. Tomavam diariamente o mesmo ônibus, pois moravam no mesmo bairro e os horários coincidiam. Ela já havia notado que o homem passava a viagem inteira falando e gesticulando sem parar. Sua expressão fisionômica ilustrava o monólogo, ora se fazendo alegre, ora compenetrada, ora indiferente. Um dia, sentada no banco de trás, viu que ele falava, falava, e de repente dava uma boa gargalhada. Logo em seguida recomeçava a falar e fazia um gesto de enfado, como a pedir a si mesmo que mudasse de assunto. Ela acabou não resistindo e abordou-o:

– Não me leve a mal, mas tenho notado que o senhor se distrai falando consigo mesmo. E ora ri, ora se impacienta….

O português acolheu com simpatia a sua curiosidade:

– E me distraio mesmo, senhorita. Acontece que este percurso é muito longo e muito cacete. Como tenho de fazê-lo todos os dias, já que não posso ler porque o ônibus sacode muito, me distraio contando anedotas a mim mesmo.

E concluiu com esta explicação, que em si mesmo é uma anedota:

– Quando é uma que eu já conheço, não acho graça nenhuma, nem acabo de contar. Mas quando é uma que não conheço ainda, costumo dar boas gargalhadas.

A vingança contra as operadoras de telemarketing será maligna

Eberth Vêncio
27/12/2020

— Alô?

— Boa noite, senhor.

— Boa.

— O senhor teria alguns minutinhos para podermos estar conversando a respeito da Palavra do Senhor?

— Minha palavra? Como assim? Quem é que está falando? Você é do fisco?

— (risos) O senhor não entendeu. Meu nome é Sara. Represento a Igreja do Quadrangular Final do Campeonato Ecumênico da Fé Cega e da Faca Amolada. Será que podemos estar conversando um pouquinho a respeito da Palavra?

— Palavra de honra. Agora, não vai dar. Estou ocupado.

— Mas, vai ser rapidinho, senhor.

— Quem te passou o meu número, criatura?

— Foi o pessoal da administração. Na verdade, cada obreira recebeu uma lista contendo cem números para a gente poder estar ligando, aleatoriamente.

— Por que vocês metem gerúndio em tudo quanto é verbo? É isso o que eu não entendo.

— Desculpe, senhor. Ainda não li o Gerúndio. No momento, estou estudando o Levítico, com o meu grupo de jejum e oração.

— Ô vontade de comer um cu, viu…

— Como?

— Como, sim. Moça, já é tarde da noite, o que você quer de mim?

— Queria poder estar conversando com o senhor a respeito do evangelho.

— Como é mesmo o seu nome, menina?

— Sara. Meu nome é Sara. Sara Whisper.

— É um belo nome, Sara Whisper. Não me leve a mal, mas, no momento estou fazendo justiça com as próprias mãos, o popular cinco-contra-um, se é que me entende; então, não consigo falar com você nesse instante. Homem é diferente de mulher, entenda, não conseguimos fazer duas coisas ao mesmo tempo.

— Só vai levar um minutinho. Eu prometo. Qual é mesmo o nome do senhor?

— Deus do céu…

— Deus do céu?!

— Isso é força de expressão, minha filha. Estou apenas resmungando. Não foi você mesma quem me ligou? Como é que você telefona para uma pessoa, à essa hora da noite, sem sequer saber o nome dela?

— Sinto muito, senhor. Na lista que me passaram só constam os números. Não têm os nomes das pessoas. O pastor me disse que não fazia muita diferença, desde que ligássemos com fé para todo mundo, antes do final da quaresma.

— Isso é ridículo.

— A culpa não é da gente. Missão dada à obreira é missão cumprida.

— Essa história tá ficando comprida. Preciso desligar, Sara Whisper. Estou quase ejaculando.

— O senhor poderia estar me informando o seu nome?

— (silêncio)

— Alô? O senhor ainda está aí?

— Judas. O meu nome é Judas Iscariotes da Silva.

— Caramba! Posso estar chamando o senhor de Sr. Silva? Judas me dá calafrios, um troço ruim por dentro…

— Que seja.

— Qual a religião do senhor, Sr. Silva?

— Música.

— Não entendi.

— Música. Minha religião é a música, Sara Whisper.

— Música sacra? Cantos gregorianos? Gospel?

— Nada disso. Eu sigo uma doutrina mais politeísta, se é que me entende.

— Politeísta?

— Sim. Isso mesmo. Eu venero os deuses do rock. Algo bem profano. Tipo, Elvis. Chuck Berry. Hendrix. Lennon & McCartney. Raul Seixas. Vocês tocam Raul na sua igreja, certo?

— Receio que não, senhor.

— Toquem Raul, minha filha. Toquem Raul. Vocês não vão se arrepender.

— O senhor é casado?

— Isso é um convite, Sarinha?

— O senhor entendeu errado.

— Não. Não sou mais casado. Matei a minha mulher faz uns vinte anos.

— O senhor matou a sua mulher? Jesus!

— Silva. Pode me chamar de Silva. Nessa época eu era muito jovem, trabalhava para traficantes, estava com a cabeça a mil…

— Traficantes?

— Matei ela com um sossega-leoa. Tentei me desfazer do cadáver, mas, deu ruim. Fui preso antes de jogar o corpo no Rio do Choro.

— Sangue do cordeiro!

— Peguei pena máxima, mas, acabei puxando só oito anos, por causa do bom comportamento, da progressão de pena, artimanhas da justiça, sabe como é…

— O senhor matou outro ser humano? Pelas chagas do messias!

— Matei, mas, isso já é coisa do passado.

— Meu Deus! Um assassino na linha…

— Se preferir, podemos encerrar a conversa aqui. Por mim, tudo bem.

— De jeito nenhum. Minha missão é prosseguir até o fim, com fé no Altíssimo.

— Parece insensato.

— Qual a profissão do senhor?

— Escritor.

— Como assim?

— Escritor. Eu escrevo histórias.

— Eu nem sabia que existia a profissão de escritor. Pensei que vocês escrevessem nas horas vagas, só para se divertir, para desanuviar a mente…

— Escrever é meio parecido com trabalhar numa operadora de telemarketing, sabe? Há que se ter perseverança. Vai que, um dia, a coisa toda cola e alguém acaba lendo.

— Entendo. Qual o estilo do senhor?

— Escrevo roteiros para filmes.

— Uau! Que máximo!

— Pois é. Vidão mesmo…

— Para que tipo de filmes o senhor escreve os seus roteiros?

— Filmes pornográficos.

— Desculpe. Não entendi.

— Filmes de sacanagem. Eu escrevo roteiros para filmes nos quais os atores tiram a roupa e fazendo sexo por dinheiro.

— Meu Deus! O senhor deve estar me tirando…

— No fundo, eu queria poder estar te incluindo, Sara Whisper, mas, o meu gerundismo é péssimo. Eu nunca mentiria para uma missionária que me ligasse numa noite de sábado para conversar sobre assuntos eclesiásticos.

— Não sei se Deus aprovaria esse tipo de atividade, Sr. Silva.

— Também não aprovo muitas coisas que ele faz. Ouça: eu ganho muito bem para escrever picardias. Não é preciso ser nenhum Paulo Coelho, se é que me entende. Preciso de todo dinheiro que puder ganhar até conseguir me livrar desse vício em punheta.

— Heim?

— (risos) Tô brincando, Sara Whisper.

— O senhor usar drogas, senhor?

— Sim. Uso. Socialmente. Não sou um viciado.

— Graças a Deus.

— Pois é. Deus é bom, mas, hidroxi-cloroquina… Hummm… Nem te conto.

— O senhor é usuário de hidroxi-cloroquina?

— Sim. Começou como uma gripezinha, daí, foi evoluindo. Mas, consigo me controlar bem. Hoje em dia, só uso quando preciso transar com outros homens.

— Transar com outros homens? Como assim? O senhor é homossexual?

— Sim. Um pouco. Não. Quer dizer, mais ou menos. Só faço esse tipo de coisa quando a grana encurta. Eu gosto mesmo é de mulher.

— Só Jesus na causa…

— Aliás, eu me amarro em obreiras quadrangulares. Fico doido quando elas me amarram.

— Valha-me, Santíssimo!

— Pois é.

— Isso é muito vulgar, senhor.

— Vulvar?

— Vulgar. Eu disse “vulgar”. O senhor deve ter sérios problemas psicológicos.

— Era o que eu pensava.

— Isso não pode ser normal.

— Pois é.

— Tantos pecados numa só pessoa. Que horror.

— Estou abrindo o meu coração para você, minha cara. Sempre digo a verdade quando estou bêbado.

— Ainda por cima, o senhor bebe?

— Comeria, se fosse sólido.

— Pelos pregos da cruz!

— O ser humano é estranho, Sara.

— Preciso desligar, Sr. Silva.

— Demorou. Nunca tinha me confidenciado com uma operadora de telemarketing. Você está fazendo um trabalho e tanto, Sara Whisper.

— Isso não é um negócio, senhor. Isso é missão de fé. Não ganho nada pra fazer o que eu faço.

— Trabalha de graça para a igreja? Deixa de ser boba.

— Já falei pro senhor que não considero isso um trabalho. É gratificante compartilhar o evangelho. Pelo menos, era, até eu falar com senhor esta noite. Estou chocada.

— Não a culpo por isso. Eu também não ligaria pra mim, numa noite de sábado, para tentar uma conversão.

— O senhor está doente, Sr. Silva.

— Essa nossa conversa vai virar um texto.

— Não autorizo. O senhor deveria procurar um médico.

— Não confio em médicos.

— Credo e cruz! O senhor me dá nojo.

— Pagam cinquentinha por uma boa história.

— Vá se tratar, homem.

— Me passa o seu telefone, Sara Whisper.

— Adeus, senhor.

— Foi um prazer falar contigo. Me liga amanhã, na Hora do Fantástico.

— Vai pro inferno!

Estrogonofe sem censura

Desde o começo desse absurdo bélico entre Rússia e Ucrânia muita bobagem tem sido dita – principalmente pelos próprios meios de comunicação. O amigo virtual Jarbas Novelino, lá do Boteco Escola, em sua conta do Facebook fez uma avaliação cirúrgica, lembrando que a cobertura midiática dessa guerra é de “uma pobreza jornalística que dá dó”, principalmente pelo simples fato de que não há correspondentes in loco. Os assim chamados “correspondentes internacionais” não estão nem na Rússia, nem na Ucrânia, mas sim confortavelmente instalados em seus estúdios em Londres, Nova Iorque, Genebra ou seja lá onde for, limitando-se a ser mera caixa de ressonância dos veículos noticiosos mais encorpados.

Independentemente disso, temos ainda a questão de que, por discordar da atitude da Rússia, muitos países impuseram embargos, sanções e boicotes contra o país. E o que significa isso? São ações que visam, principalmente, afetar a economia interna, impondo situações que possam afetar tanto a importação quanto a exportação de produtos, bem como retaliações em outras esferas àqueles que coadunam com essa guerra.

Agora vamos ao desatino da coisa – que é, justamente, a especialidade deste nosso cantinho virtual: diversos restaurantes brasileiros, em “boicote econômico” à Rússia, resolveram tirar do cardápio o estrogonofe. Sério. Gente, cada vez mais acho que o FEBEAPÁ está fadado a se tornar eterno neste nesse Brasilzão véio sem portêra, pois em meio aos horrores de uma guerra este nosso povo resolve tomar uma atitude que não afeta em nada o que está acontecendo lá fora! Provavelmente só pelo afã de demonstrar que estariam “antenados” com o resto do mundo…

Ora, façam-me o favor!

Enfim, toda essa introdução serviu para resgatar um post lá de 31/10/2014 publicado pelo Daniel Rodrigues no (quase) finado Deitando o Gato na Grelha, um blog pra lá de bem-humorado que, segundo ele próprio, é de “Receitas de churrasco como ele tem que ser. Sem frescura e sem rodeios. Porque homem que é homem esquenta a barriga na churrasqueira e esfria na geladeira de cerveja.” E garanto-lhes que as receitas dele são ótimas!

Divirtam-se!

Strogonoff, uma pérola da culinária soviética

Sou um cara das antigas. No meu tempo, a Rússia era apenas uma província da URSS, que respondia pelo pomposo, vistoso e lustroso nome de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Aliás, não respondia não, porque tinha uma tal guerra fria pegando, todo mundo com medo da bomba atômica, do MIG 29 (quem nunca assistiu Top Gun que atire o primeiro F-16), da estação MIR e da cadela Laika. E eles não respondiam nem pros Ianques, pra quem todo mundo respondia, então quem sou eu de falar que eles respondiam por alguma coisa…

Naquele tempo, os nossos camaradas, além de beber vodka, mandar foguete com cachorro pra lua e infernizar os americanos, se alimentavam alegremente com um delicioso prato que responde pelo nome de строганов.

Entendeu? O prato se chama строганов. строганов é uma coisa que se come. Não se fala, mas se come. A menos que você tenha feito parte da KGB num passado remoto (e se fez eu tenho medo de você), imagino que não consiga pronunciar o nome do prato. Cтроганов não é como feijão, arroz… Ou até mesmo Feijoada, que qualquer gringo sabe falar. Eles vão no boteco, falam “Feixoara” e o prato vem. Se eu ou você, ou nós dois juntos, formos à Rússia (prefiro chamar de União Soviética, mais charmoso) e pedirmos um строганов, ou ficamos com fome; ou levamos um cacete.

Imaginemos um tal de Sr. Dimitri Vladivostok (joguei muito War na adolescência).  Camarada Dimitri estava a largar a URSS querida e lançar-se ao mar rumo ao Brasil, como tantos fizeram nos tempos pós-segunda-guerra. Munido de toda a vodka que conseguia carregar, o Camarada Dimitri aportou nesta terra onde se plantando tudo dá, e começou sua pacata vidinha numa igualmente pacata cidadela deste nosso Brasil varonil. Solícito com os amigos e vizinhos, o simpático Camarada sempre convidava a todos a saborearem sua deliciosa строганов, receita cuidadosamente passada de mamuska em mamuska pela sua família, há séculos. E ninguém comparecia.

Rápido como uma Perestroika, Dimitri logo percebeu que as pessoas não iriam querer saborear um alimento do qual não entendiam uma única letra do nome. Ok, todos sabemos que строганов começa com C, mas essas línguas são muito loucas e de repente o C tem som de Y, ou de 9. Então ele colocou o Wladimir e o Mikhail Tico e o Teco pra funcionarem e numa bela tarde ao som de Raul Seixas… ele, que já passou pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho, que ele lhe falou: STROGONOFF é a alcunha da sua oferenda, meu caro Dimitri.

Não seria nada incompreensível como строганов, não abandonaria as suas raízes bolcheviques, não lhe faria um traidor de Stalin, mas ao mesmo tempo era uma palavra que todo mundo  conseguiria pronunciar. Pois foi assim que o nosso destemido filho da Mãe Rússia saiu pelas ruas da pacata cidadela do nosso Brasil varonil gritando aos quatro ventos “Venham comer o meu Strogonoff!!!”. E foi um sucesso. Alguns estavam curiosos com o alimento, outros com pensamentos impuros em relação ao nosso camarada, mas como este estava com os cornos cheios de vodka, o resultado final é que todo mundo saiu feliz.

Agora vamos parar com essa enrolação e mãos à obra preparar essa verdadeira delícia da culinária Moskovita.

Por falar em Moskovita (R$6,90 aqui no Super Vizinho, mercadinho perto de casa), abra logo uma dose de vodka e façamos um brinde ao som das trombetas. Cantando comigo:

С помощью транслитератор из букв латинского алфавита получаются буквы кириллицы, иврита, белорусского, греческого, или украинского алфавитов. Этот транслитератор задумывался как сервис для русскоязычных жителей стран , находящихся за границей и желающих переписываться на родном языке. Если кто-нибудь говорит “Я пользуюсь транслитом”, то всем понятно – речь идет. Еще его называют просто

«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!

Cantou? Então bebe logo essa vodka e comecemos a nos embriagar com mais uma receita com o padrão de falta de qualidade Gato na Grelha:

A primeira coisa que você vai precisar é de um bom pedaço de carne e uma faca afiada. Mas que carne? Você pode preparar um strogonoff maneiro com vários tipos de carne (patinho, acém, alcatra…). Fuja das carnes muito gordurosas, que vão fazer do seu strogonoff um poço de banha, e fuja daquelas carnes que têm muita fibra, como o contra-filé. Na verdade, quem vai definir que tipo de carne você vai usar é o seu bolso. Patinho é barato, alcatra já nem tanto mas também não é uma fortuna, enfim. E como estamos falando do SEU bolso e não do meu, vou logo chutar o balde e te deixar cheio de carnê do açougue pra pagar: hoje vamos de filé-mignom, parceiro.

Sou muito fã desse corte. Eu e a torcida do curintia, do framengo e do parmera, né? É uma carne muito macia, muito saborosa, e que mantém o sabor e maciez mesmo sob condições extremas. E vamos colocar nossa carne sob condições marromeno extremas. Então é bom ela aguentar o tranco.

Nada disso de chegar no açougue e pedir aquele picadinho pronto pra strogonoff. Ali eles cortam do jeito que querem, pedações grandes, e você nunca vai saber se tem um filé de gato ali no meio. Então larga mão de preguiça e bora lá picotar nosso filé mignom. Pra nossa receita, uma peça de meio quilo já é o suficiente. Principalmente porque o FM (dá muito trabalho ficar digitando o tempo todo, então vamos chamá-lo de FM) é uma peça muito limpa, praticamente sem nervos ou gorduras, então você vai aproveitar praticamente 100% desse meio quilo.

Aí, merrmão.. o processo é o seguinte: afia a tua faca, concentra no que tá fazendo e picota a carninha até obter meio quilo de pequenos pedaços do tamanho de meio polenguinho. Teve infância, compana? Então você sabe do que eu tou falando. Picota mesmo, sem técnica, sem critério. Se você já esquartejou uma pessoa, saberá como fazê-lo. Se não esquartejou uma pessoa, também saberá. Foca na miopia e polengo na mente que você consegue.

Agora é hora de temperar o FM picado. Você ainda tem uma trabalheira pela frente, e aí a tua carne vai pegando gostinho do tempero, o que fatalmente vai se transformar em mais amor no teu prato.

ATENÇÃO: isso foi uma PIADA. JAMAIS coloque sazon num filé-mignon!!! Nem fora dele. Não gosto desses temperos de gultomato monossódico, não. Enfim, gosto pessoal. Se você quiser colocar sazon, coloca. Mas não me conta que a gente perde a amizade.

Você pode temperar o seu FM como quiser. Pelas experiências que eu já tive, recomendo apenas um pouquinho de uma pimenta tipo tabasco, pimenta do reino e sal.

Não recomendo usar temperos liquidos em abundância, porque você vai ter que fritar essa carne depois. Muito liquido pode miar a sua fritura e você acabar cozinhando a carne. Também não recomendo temperos com folhas. Uma vez eu usei orégano. O sabor até ficou legal, mas o orégano soltou da carne, obviamente, e ficou boiando pelo strogonoff, dando um aspecto meio esquisito. Nem pimentas em fruta, pelo mesmo motivo. Uma biquinha, por exemplo, vai ficar boiando no molho depois… Estranho. Vai de sal, pimenta do reino e tabasco que é sucesso.

Agora vai mexendo até o chão na boquinha da garrafa tudo aí e deixa o FM quietinho. Vamos à próxima.

Aproveita que a faca tá afiada, que você ainda tá sóbrio (eu acho) e que a animação tá te contagiando e tome mais uma dose de vodka picote uma cebola. Picota pequeno, compadre. Lembra sempre com essa sua cabeça de vento que você está fazendo um strogonoff de FILÉ MIGNON, e não um strogonoff de cebola. Pega duas panelas, e divide essa cebola picada em duas partes. Uma pra cada panela.

Aí o mais fino, elegante e sincero leitor desse blog me pergunta: “Mas por que duas panelas, meu caro escriba?”

E eu respondo: “Научиться пользоваться еще проще с помощью, наглядной!”, o que significa: “Para fazermos um belo e saboroso arroz branco, camarada!”. Mas aí surge um problema daqueles capazes de ruborizar o mais sem-vergonha dos leitores: Sim, eu sei fazer arroz. Sim, eu sei cozinhar coisas saborosas, elaboradas e elas costumam ficar deliciosas…. Menos o meu arroz. Meu arroz é péssimo. Em todos esses anos nessa indústria vital, eu nunca consegui fazer um arroz que não ficasse uma papa. Daqueles que você puxa um grão e vem a panela toda, sabe? Então. Por este motivo não tem nenhuma receita de arroz aqui no blog (tem algumas, mas tem migué. Lê que você vai entender). E por isso eu sempre pulo a confecção deste alimento nas minhas receitas. Assim como o farei novamente. Agora. Faça o arroz como quiser, ok?

Por favor, aceito dicas inbox.

Voltemos à panela do strogonoff, que é a única que nos interessa hoje. Aproveitando essa picotagem toda, picota bem pequeno E CUIDADO COM ESSE DEDO AÍ um dentinho de alho, daqueles que não são nem minúsculos, nem imensos. Nem o dente de leite do seu filho, nem o sabre do mamute. Você entendeu.

Vodka. Tome vodka. Se for balalaika, tome um pouco menos.

Tomate, chegou tua hora. Pode te preparar pra sofrer a mais desumana das torturas. Embora o tomate não seja humano. Mas ele é um vegetal que na verdade é uma fruta, e como tem muito humano que também é fruta, considero sim o tomate um humano e bora pra tortura.

Sabe tirar a pele do tomate? Não, você não vai descascá-lo como a uma laranja. Isso aí não tem a menor graça e a gente tá aqui pra ver tomate sofrer. Então pega uma panela, enche de água e bota pra ferver. Quando estiver a pino, jogue, sarcasticamente, o tomate lá dentro. Delicie-se com os seus gritos e súplicas de dor. Mas fica de olho, esses tomates são muito espertinhos e derretem rápido. E ainda vamos judiar um pouco mais. Tá de olho? A pele do tomate já fez algum rasgo? Isso mesmo, a pele do nosso prisioneiro vai abrir em algum ponto. Quando isso acontecer, tira ele da água quente. Agora olha que cruel: deita ele na sua tábua e vai arrancando cuidadosamente a pele, enquanto ele te conta toda a verdade. A pele se solta rapidinho e neste momento você terá um tomate sem pele. E sem vida.

Então pára de maldade, picota o tomatinho e guarda em cima da tábua mesmo.

Recapitulando:

1 – Picotamos uma linda peça de FM e temperamos. Ela tá em algum lugar da sua cozinha esperando por você. Pode ser em qualquer lugar, menos dentro da panela, ok?
2 – Picotamos meia cebola, esta sim está dentro da panela.
3 – Deixamos um alho banguela e o resultado está picotado dentro da panela.
4 – Temos um tomate sem pele, sem vida e sem dignidade picotado em cima da tábua.

Perfeito. Agora a coisa vai começar a cheirar bem…

Regue a cebola e o alho com azeite até cobrir o fundo da panela (tou acreditando que você pegou uma panela compatível com meio quilo de carne, certo?) e acenda, finalmente, o fogo debaixo dela.

O refogado é um dos momentos mais sublimes da culinária. Por isso, enquanto a cebola chia dentro da sua panela, tome mais uma vodkinha. Não sei você, mas eu já estou começando a ficar meio bebum. Bola pra frente.

Quando a cebolinha começar a ficar amarelinha, parecendo meio transparente, é a hora do FM entrar no jogo. Taca lá pra dentro todo o FM que você picotou. Dá uma mexidinha pra ele fritar legal.. Com o tempo, a carne vai começar a soltar um líquido e fazer daquilo um caldo com um cheiro delicioso. Pra saber se a carne tá no ponto… Tira uma e come, ué. A carne não pode estar mal-passada de jeito nenhum, porque a partir de agora, não vai mais ter fritura. Quando estiver no ponto, joga lá dentro o tomate. Dá uma mexidinha e deixa. O tomate tende a se dissolver, ou a ficar bem molinho.

Ah, esqueci de um cara importante: o Champignon. Sabe aqueles vidrinhos pequenos que vende no mercado, com campignon já picado? Então, taca um dele pra dentro. Se não estiver picado, pique. É importante ele ser pequeno. Só toma cuidado e não deixa aquela água da conserva cair dentro da sua carne. Ela é salgada e cheia de conservantes, vai estragar a receita. Cuidadaê!

Agora um toque que eu, particularmente, gosto muito: vai na geladeira, pega aquele catchup que você tem lá e manda uma golada de responsa pra dentro. É  mais ou menos a quantidade de catchup que você colocaria num X-Salada inteiro. Você vai saber o quanto.

Se você tem um catchup de qualidade na sua geladeira, tanto melhor. Se não tem, dá uma busca aqui no blog que tem uma receita maneiríssima de catchup da melhor qualidade.

Mexe. Tá ficando com um molho vermelhinho? É disso que eu tou falando, meu compana. Se você achar que o teu molho não tá lá muito vermelho, tá meio esquisito, pode jogar um pouco de molho de tomate pra ajudar. Imagina que você vai jogar uma lata inteira de um treco branco lá dentro, e o resultado final do strogonoff é uma cor meio laranja. Então bota essa palheta de cores pra funcionar e corrige o quanto julgar no molho.

Se você for daltônico, pensa que teu molho tem que estar com um azul bem maneiro, e o resultado final do strogonoff é um negócio meio amarelo-limão. Aí você pega aquele molho de tomate bem lilás que tem na sua geladeira e boa sorte aí pra ir corrigindo as cores. Enfim.

Mas que treco é esse que vamos colocar? É Creme de Leite, meu caro amigo… Aquele que sai do peitinho da vaca, que passou por um processo show de bola que eu não sei qual é, mas no final o que era pra ser comida de bezerro vira um treco bem cremosinho…

Só que você não pode simplesmente sair jogando creme de leite pelo mundo assim. Tem que tomar alguns cuidados antes. O creme de leite pode talhar com a temperatura, o fogo aceso, etc… Então desliga o fogo, joga o creme de leite lá dentro, mexe e pronto.

Tá feito o seu Strogonoff!

Emenda à Inicial: Acerca da “verdadeira origem” do prato, existem várias versões. A mais aceita é que teria origem por volta do ano de 1700 no seio (e vê se para de pensar bobagem aí!) da família Stroganov, uma rica família russa e de linhagem nobre. Os franceses teimam em afirmar que o prato não é russo, pois seria uma adaptação local de um prato deles – o que até faz sentido, afinal as famílias nobres russas costumavam ter um chef francês para servi-los.

Pois bem. Reza a lenda que o Conde Grigory Alexandrovich Stroganov – ou simplesmente ригорий Александрович Строганов – estava com problemas dentários e para que pudesse comer o chef do palácio adaptou o fricassé de carne (fricassé de boeuf), cortando em pequenas tiras e misturando a carne com um creme de leite tradicional russo. Tudo para facilitar a ingestão da comida. O acompanhamento era um caldo de legumes. Como foi feito para o Conde, o prato foi batizado com o nome da família.

Num livro de 1861 publicado por Elena Molokhoivets foi incluída uma receita de bife stroganoff com mostarda. Entretanto a receita original russa foi levada para a França pelo filho do Conde, Alexander, tendo sido publicada pelo chef Charles Brière por volta de 1891. O prato foi evoluindo e em 1912 Pelagia Alexandrova-Ignatieva acrescentou nova textura à receita, tendo incluído cogumelos, cebolas e molho de tomate, além de servir com batata cozida.

A Revolução Russa, de 1917, indiretamente exportou o prato para o exterior. E, na China, para onde alguns emigrantes nobres russos fugiram, o prato passou a ser servido com arroz – e foi essa “versão asiática” que foi adotada pelos americanos.

(Informações roubartilhadas daqui.)

Moral conservadora: perguntas que podem revelar a hipocrisia

J. C. Guimarães

Costumes conservadores são baseados na ideia de família tradicional, homem e mulher, com nuclearidade na figura masculina; na monogamia; na heteronormatividade, combinando os dois sexos opostos; no judaísmo-cristianismo enquanto sistema de crenças transcendentais (do qual a Bíblia seria o código), com forte componente racial de superioridade dos brancos. Têm sido a ideologia hegemônica no Brasil desde os tempos coloniais, quando aqui teve início a exploração econômica, sexual e racial de nativos e africanos, pelos conquistadores portugueses. São a ideologia do governo atual porque são, também, a ideologia das classes dominantes e, até, das classes dominadas, que, reconhecidamente, tendem a reproduzir convicções estranhas aos seus interesses.

Não é preciso valer-se dos conceitos clássicos (de Morgan, Mauss, Malinowski etc.) para saber que essas representações mentais são estruturantes em sistemas culturais complexos. Legítimas, têm a função de dar significado e coesão a grupos que nelas se reconhecem. Sem elas, perdem-se as referências que mantêm a noção de ordem, fundamental para a manutenção cósmica. São, nesse sentido, verdadeiros nortes existenciais, em que se baseiam o equilíbrio comunitário e individual. Daí a violenta reação a tudo que ameaça o conservadorismo, como aqueles grupos em ebulição — as chamadas “minorias” — aos quais se contrapõe. Conviver com as diferenças não é fácil, pela simples razão de que todos os grupos humanos buscam não apenas a própria identidade e afirmação, mas também a universalização de seus valores. É a hegemonia que está em jogo e o temor de extinção de uns pelos outros, o que tenciona o conjunto social e leva ao confronto aberto. A sociedade brasileira chegou a esse estado de polarização, a partir de 2015. Desde então, costumes e valores viraram guerra declarada.

Convém perguntar: os tabus conservadores são integralmente levados a sério por seus aderentes? Analisados ponto a ponto, será verdade que os conservadores são fiéis ao conservadorismo? Serão eles, na vida privada, leais seguidores das normas de conduta publicamente exortadas e defendidas? Talvez nos decepcionemos ao entrar sorrateiramente nesta “honrada” casa, onde, ao que parece, nem tudo deve ser tão harmonioso. Pode ser que aquele elenco de ideias do início desse artigo seja ilusório — de fato, apenas ideologia —, falseando práticas comportamentais contraditórias que o desmentiriam, em parte ou no todo. Estudos antropológicos e sociológicos poderiam, com mais eficácia, revelar a imensa hipocrisia que nós, enquanto observadores, suspeitamos existir por entre as quatro paredes dessa casa. Uma série de questões bastante polêmicas se impõe, aos seus moradores.

O patriarcalismo apoia-se, inclusive, no Novo Testamento, e boa parte das mulheres aprecia a ideia de submissão a seus maridos. Mas em que porcentagem isso é escolha livre delas e não produto de repressão? É verdade que os casais, nas famílias tradicionais, estão mutuamente seguros da fidelidade dos seus parceiros? A monogamia é um fato social no Brasil. Significa que a fidelidade é, de fato, observada pelos conservadores ou a traição é mais comum do que se admite, entre eles? E, tendo em vista a traição, as esposas conservadoras têm a mesma chancela social que os maridos, para “pularem a cerca”? Elas estariam de acordo com uma provável desigualdade de tratamento? Casais conservadores restringem, realmente, suas relações sexuais entre marido e mulher ou, além de eventualmente se traírem, transgridem de forma associada, buscando práticas “corruptas” como o swing? Nesses jogos eróticos as trocas são entre sexos diferentes ou, eventualmente, ocorrem manifestações homoeróticas?

A homossexualidade é, de fato, raríssima ou comum entre os conservadores, incluindo seus líderes? Tudo isso não é nada conservador e levanta sérias questões morais, nos termos da moralidade que pretende se impor ao Brasil. Mas precisa ser respondido pelos conservadores, a fim de se estabelecer a coerência entre seu discurso e sua prática. Pública, inclusive.

Opções de arranjo familiar e escolhas sexuais interessam à religião, mas nunca foram agenda para o Estado laico, praticamente único no Ocidente e no Brasil. Somente em países comunistas, como a Coreia do Norte, e teocráticos, como o Irã, o governo controla a vida privada dos cidadãos. Agora, o governo brasileiro, que vocifera contra o Comunismo — regime “autoritário”, que “acabaria com a liberdade das pessoas”, e por isso “é preciso armá-las” — é o mesmo governo que se infiltra nas casas dos brasileiros para impor a visão de mundo de um grupo: os conservadores. Não precisamos, então, temer os comunistas, pois a principal missão da extrema-direita é, justamente, violar nossos muros para acabar com nossa liberdade. Pensando bem, aqui não há contradição, porque apenas comprova seu próprio autoritarismo, fascista. O que será contraditório é se, ao avançarmos das instituições públicas para os recintos domésticos desses novos moralistas, descobrirmos práticas que não recomendam. Será que não temem responder às perguntas mencionadas acima, expondo-se a um grave problema moral: a hipocrisia?

O conservadorismo, enquanto fenômeno público, é bem conhecido e assentado. Um estudo íntimo dele, porém, poderia surpreender a todos nós. E até escandalizar os menos liberais.

Pequeno dicionário cínico das palavras da moda

Ademir Luiz

O jornalista, editor e escritor Ambrose Bierce compilou ao longo de 25 anos os verbetes e poemas que formariam o “Dicionário do Diabo”, um dos livros mais hilariantes de todos os tempos. Os primeiros verbetes apareceram em 1881, publicados esparsamente em diferentes jornais. Bierce não aprovava dicionários, definindo-os como um “maligno instrumento literário para limitar o crescimento de um idioma e torná-lo duro e inelástico”. Justamente por isso atribuiu esses escritos ao próprio Diabo, que estaria zombando das pretensões e hipocrisias humanas. Cinismo é a melhor palavra para definir verbetes como “crítico: pessoa que se vangloria de ser difícil de agradar porque ninguém tenta agradá-lo” ou “lixo: material sem valor, como religiões, filosofias, literaturas, artes e ciências das tribos que infestam as regiões ao sul do Polo Norte”. Ambrose Pierce teve um fim misterioso, desaparecendo em 1914 enquanto cobria as ações dos rebeldes liderados por Pancho Vila durante a Guerra Civil Mexicana. Mas, como ensinou Baudelaire, “o truque mais esperto do Diabo é convencer-nos de que ele não existe”. Alguém sempre assume a pena. Neste espírito endiabrado, preparei um breve compilado de palavras da moda que, provavelmente, Ambrose Bierce incluiria em seu possesso dicionário.

Action figures: hominhos para marmanjos com dinheiro para gastar.

Ambientalismo: nova religião secular.

Amor líquido: boa sacada de filósofo sério que queria ficar pop e vender livros. Autoajuda para intelectuais.

Anonymous: militantes ateus anarquistas quem usam como símbolo a máscara de um conspirador católico.

Apropriação cultural: prática enriquecedora que gerou magníficas trocas de experiências culturais entre diferentes grupos humanos, responsável por criações como o rock and roll, o futebol e o hábito de consumir sushi em praças de alimentação de shoppings centers mundo afora.

Arte contemporânea: arte moderna batida no liquidificador, mas sem aura.

Astrólogo: tratamento positivo se for Fernando Pessoa. Negativo se for Olavo de Carvalho.

Ativismo judicial: forma legal de tornar normas constitucionais ilegais.

Atrasados do ENEM: atração turística anual. Desculpa perfeita para parecer empático recriminando quem se diverte abertamente. Pessoas que perderam a desculpa do horário de verão.

Baixar: leituras futuras que nunca chegam. Vídeos consumidos instantaneamente.

Black Blocs: revolucionários que não arrumam o próprio quarto. Indivíduos que acreditam que entendem mais de Marx do que Engels, Fidel Castro, Mao Tsé-Tung, Stálin, Leandro Karnal, o namorado da Fátima Bernardes e o próprio Marx. Esperam que lançamento de latas de lixo à distância se torne esporte olímpico.

Bullying: darwinismo escolar.

Caetanear: fazer coisas muitooooo lindas e maravilhosas.

Cancelar: maneira mais fácil de achar que venceu uma discussão sem ter argumentos.

Censura nas redes: (conteúdo retirado por conter informações imprecisas, manipuladas ou que podem induzir ao erro.)

Cerveja artesanal: cerveja sem ISO 9001. A regra social exige que, em qualquer caso, seja considerada melhor que o produto industrializado.

Chef: cozinheiro com camisa xadrez, barba de lenhador e coque de samurai. Produz cerveja artesanal.

Ciclista: bicicleteiro com consciência social.

5G: espionagem. Pornografia que não trava.

Comuna: liberal conservador antes de ser assaltado.

Comunidade: favela em novelas do horário nobre e relatórios da ONU.

Coach: guru com roupa de moletom. Modelo socialmente aceitável de exercício ilegal de diversas profissões. Alguém que acredita ser um sábio porque possui a sabedoria e a humildade de se saber um sábio. Profissional que um dia vai escrever um livro ou, em casos extremos, um dia vai ler um livro.

Crossfiteiro: mercado futuro para consultórios de ortopedia.

Cult: filme, livro ou banda que apenas você e seu amigo esquisito conhecem.

Desconstrução: padrão ético autolimpante. Rebute automático de todas as postagens que poderiam ser usadas como provas contra você.

Discurso de ódio: qualquer coisa que eu não concorde.

Disruptivo: o que o vinil foi um dia.

Doutrinação: falar sobre algo no qual acredito e acho que deve ser difundido ao mesmo tempo em que nego terminantemente estar fazendo isso.

Easter egg: micro orgasmo nerd.

Edição especial comemorativa definitiva em capa dura: a mesma coisa de antes gourmetizada.

Educação a distância: estratégia pedagógica que visa o fomento da não aprendizagem caseira em detrimento da não aprendizagem em ambiente escolar.

Empatia: autopromoção embalada em pretensa responsabilidade social.

ENEM: todas as opções acima.

Esquerdomacho: esquerdista feministo que fuma, mas não traga.

Estado democrático de direito: fórmula mágica para começar e terminar discursos.

Esteticista: manicure que usa tesouras, lixas e alicates levados pelas clientes.

Fake news: antigamente era chamado de mentira ou boato. Algumas vezes são fatos que comprovam de maneira definitiva o que você considera discurso de ódio.

Fitness: quem faz exercícios físicos e dieta por vontade própria.

Gabarito do ENEM: tudo que parecia óbvio antes do candidato entrar na sala de provas.

Gatilho: cenas, temas e frases que pagam o aluguel de seu psicólogo.

Geeks: nerds que sabem formatar o computador.

Gênero: todas as letras do alfabeto sem ordem alfabética.

Genocidas: pessoas que visitam parentes e amigos, frequentam restaurantes, praias e praças, além de comemorar feriados.

Geração canguru: espectador de todas as temporadas de Malhação.

Geração floco de neve: pessoas que nasceram depois da transformação dos chinelos Havaianas em marca de sucesso.

Geração nem nem: jovens que não estudam e não trabalham. Esse verbete não contém ironia.

Glúten: substância contida em diversos alimentos que foram consumidos durante muito tempo sem apresentar maiores problemas, mas que agora podem te matar.

Gospel: Reforma Protestante gourmetizada.

Gourmetizar: maquiavélica tática capitalista para inflacionar preços.

Google assistente: sexo virtual consensual.

Google: biblioteca frequentada por jovens.

Gratidão: obrigado para pessoas com deficiência cognitiva.

Gratiluz: obrigado para pessoas com deficiência cognitiva severa.

Hacker: pessoa que vê seus nudes sem você enviar.

Hater: pessoa que você não adicionou em sua rede social. Variação: pessoa que você adicionou em sua rede social.

Influenciador: vítima preferencial do cancelamento. Desempregado. Efeito colateral da difusão das mídias sociais e facilitação de acesso à tecnologia celular.

Lacaniano: forma de ser freudiano sem ser freudiano e sem, necessariamente, ter entendido o texto.

Lockdown: vertente contemporânea da medicina medieval.

Mudanças climáticas: solução semântica encontrada pelos defensores da teoria do aquecimento global diante de evidências científicas ruins para os negócios.

Negacionismo: ver Discurso de Ódio.

Perfil fake: espionagem social.

Performance: qualquer coisa.

Piriguete: personagens de Shakespeare e Jane Austen adaptados para dramaturgia contemporânea.

Politicamente incorreto: tudo que passava na Sessão da Tarde na década de 1980.

Pronome neutro: alternativa ao necessário e exaustivo estudo dos pronomes pessoais na norma culta. Humor involuntário.

Rachadinha: equivalente ideológico ao desvio bilionário de recursos públicos.

Reaça: liberal conservador depois de ser assaltado.

Redes sociais: solidão compartilhada. Exercício de criação de universos ficcionais. Funil de vida.

Subcelebridade: alguém famoso apenas na internet.

Teoria da conspiração: interpretação criativa da realidade.

Terra plana: ideia antiga vendida como nova.

Tuitar: ver Tretar.

Tretar: revelar verdades inconvenientes.

Vegano: pessoas obrigadas a consumir fontes alternativas de proteína. Consideram os vegetarianos indivíduos cruéis com peixes e ladrões de leite. Os puros. Fonte de proteína se estiverem perdidos em uma savana africana.

O que sabemos sobre as vacinas… até agora.

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Edição especial: o que sabemos sobre as vacinas… até agora

Se o gerenciamento da vacinação contra a Covid-19 no Brasil está nos ensinando algo é que nada está garantido até que tenha acontecido. Uma das poucas certezas é que amanhã, dia 17, a diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vai se reunir para autorizar ou não o uso emergencial de duas vacinas, a CoronaVac, da chinesa SinoVac em parceria com o Instituto Butantan, e a da Universidade de Oxford/AstraZeneca com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Na segunda-feira termina o prazo de dez dias estabelecido pela própria Anvisa para dar uma resposta aos pedidos de uso emergencial.

Passada a única certeza – a data limite da Anvisa –, começa um emaranhado de dúvidas que envolve até mesmo qual vacina estará disponível para os brasileiros. No momento em que este texto é escrito, a exportação para o Brasil de dois milhões de doses da vacina de Oxford fabricadas na Índia está vetada pelo governo indiano, e o Ministério da Saúde brasileiro requisitou todo o estoque da CoronaVac em poder do Butantan, seis milhões de doses.

Como não é possível responder às questões futuras, vamos procurar esclarecer as dúvidas presentes sobre as vacinas que estão sendo utilizadas e desenvolvidas para combater a mais grave pandemia a atingir a Humanidade, desde a Gripe Espanhola, há pouco mais de cem anos.

Quantas vacinas estão em desenvolvimento ou em uso hoje?

Segundo levantamento do New York Times68 vacinas estão sendo testadas em humanos, incluindo as que já estão em uso, e pelo menos outras 90 estão em fase de experimentos em animais.

Como são feitos os testes?

Primeiramente, os laboratórios realizam experiências com animais, verificando se a vacina tem efeitos colaterais e se, após injetarem o vírus, funcionam. Se tudo certo, começam as fases de testes em humanos. A primeira, com um pequeno grupo de adultos saudáveis, analisa se a vacina é segura. A segunda, com centenas de pessoas, incluindo integrantes de grupos de risco, aprofunda a análise da segurança e já começa a verificar a eficácia. Finalmente a fase três pega um universo de milhares de pessoas dos mais variados grupos para testar a eficácia em “condições” normais.

Somente após o sucesso da fase três uma vacina pode receber autorização de uso emergencial e registro definitivo. Há ainda a fase quatro, a análise do resultado de um amplo programa de vacinação ao longo dos anos. Só aí se pode saber, por exemplo, se a imunidade oferecida pela vacina é permanente ou não.

O desenvolvimento dessas vacinas foi apressado?

Apressado, não; acelerado, sim. Normalmente uma vacina leva anos para ser desenvolvida, com as fases acontecendo em sequência ao longo de mais tempo, e os trabalhos de infraestrutura e fabricação começando quase no momento da aprovação. Porém, a gravidade da pandemia exigiu adaptações nesses processos, com as fases um e dois acontecendo quase simultaneamente, a infraestrutura sendo montada desde os testes com animais e a fabricação acontecendo em plena fase três – se a vacina fosse um fracasso, bilhões de dólares seriam perdidos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), todos os protocolos de segurança foram obedecidos. Neste caso, rápido não é sinônimo de mal feito.

Como as vacinas funcionam?

Embora busquem o mesmo objetivo, fazer com que o organismo produza anticorpos contra a doença, as vacinas o fazem por métodos diferentes. As duas que estão em análise pela Anvisa, por exemplo, usam de forma diversa o mesmo princípio: injetar o vírus (ou bactéria, dependendo da doença) no corpo para que este desenvolva defesas. Mas quando se diz “injetar o vírus”, não se trata de pegar um Sars-Cov-2 em toda sua força e botá-lo no organismo do indivíduo.

A CoronaVac, por exemplo, usa o sistema mais comum, o chamado vírus inativo. O laboratório cultiva uma grande quantidade do vírus e depois, por meios físicos e químicos, o torna incapaz de transmitir a doença, o mata, por assim dizer. Mesmo assim, quando o vírus é injetado no corpo, nosso sistema imunológico o reconhece como uma ameaça e cria defesas. A mesma técnica é usada na vacina da indiana Bharat Biotech, que empresas brasileiras querem comprar.

As grandes vantagens dessa técnica são que ela já foi amplamente testada em outros imunizantes e é inofensiva para pacientes com problemas no sistema imunológico (imunocomprometidos). Por outro lado, são necessárias mais doses para garantir a imunidade.

Já a vacina de Oxford/AstraZeneca usa o vetor viral, o vírus vivo. No caso um adenovírus, que provoca, esse sim, uma gripezinha. O adenovírus recebe uma informação genética do Cov-Sars-2, geralmente da membrana que o envolve, e é injetado no organismo. Nosso corpo começa então a reagir à informação do coronavírus e desenvolve os anticorpos antes que ele possa agir. Para tornar o processo mais seguro a AstraZeneca usou adenovírus de macacos, dificultando ao vírus se adaptar ao novo hospedeiro.

Além de também já ser usada em dezenas de outras vacinas, essa técnica permite uma imunidade mais duradoura. Entretanto, pessoas imunocomprometidas correm o risco de não desenvolverem anticorpos a tempo e acabarem contaminadas por uma eventual reativação do vírus. O armazenamento desses dois tipos de vacinas requer temperaturas entre -2º e -8º C, obtidas com equipamentos convencionais.

Mas essas são as vacinas em análise no Brasil. Americanos e britânicos estão tomando imunizantes da Pfizer/BioNTech e da Moderna feitos com uma técnica recente e radicalmente diferente, a imunização gênica. Nela, os cientistas injetam em nosso organismo o código genético do vírus para que nosso RNA, a macromolécula que transmite as informações genéticas do DNA, o inclua em nossas células. Assim, o próprio organismo cria a proteína do Sars-Cov-2, sem o vírus, e aciona o sistema imunológico.

Por não requerer a cultura de grandes quantidades do vírus em laboratório e sua inativação ou atenuação, as vacinas gênicas têm um custo muito menor e podem ser produzidas mais rapidamente. Seu grande problema é que exigem temperaturas de -70ºC, o que cria um imenso problema logístico de transporte e armazenamento.

Como é uma técnica nova e está sendo usada pela primeira vez numa vacina para humanos, foi alvo dos mais disparatados boatos, inclusive que alteraria o DNA humano. Isso não é verdade.

Existem outros métodos, mas esses são os que estão predominando no combate à Covid-19.

O que é a eficácia?

Um dos termos menos compreendidos quando se fala de vacinas é “eficácia global”, interpretada pelo público em geral como “se a vacina funciona”. Não é isso. Primeiramente, é preciso entender como se calcula a eficácia de uma vacina. Durante os testes com pessoas, metade dos voluntários recebe a vacina de verdade e a outra metade um placebo, uma substância sem qualquer efeito – e espera-se para ver quem fica doente. É estabelecido um número x de infecções, e, quando ele é atingido, compara-se a quantidade de casos nos dois grupos. A eficácia global é a diferença percentual entre os casos nos que tomaram a vacina e nos que tomaram o placebo.

Para a OMS e a Anvisa, uma vacina funciona quando sua eficácia global fica acima de 50%. Mas isso não é tudo. É preciso avaliar a eficácia da vacina diante dos diversos níveis de gravidade da doença. Nesta semana, o anúncio de que a CoronaVac tinha eficácia global de 50,38% provocou surpresa e até deboche.

Para os leigos, parecia que só metade dos vacinados desenvolvia anticorpos. Não é isso. Todos desenvolvem, mas a eficácia varia. A vacina é 78% eficaz nos casos moderados da doença, quando é necessária internação, e 100% eficaz nos casos graves, nos quais o paciente precisa ser intubado.

Mas, se a vacina serve para evitar que se tenha a doença, como se chegou a esses números? Simples. De todos os voluntários que tomaram a CoronaVac, nenhum teve um caso grave (100% de eficácia), 22% tiveram casos médios (78% de eficiência) e 49,62% tiveram casos leves, tratáveis em casa (50,38% de eficiência). Ou seja, ela pode reduzir pela metade o número de novas infecções e impedir novas mortes. O que é muito bom.

O que os especialistas ressaltam é que, com a eficácia menor, torna-se mais importante a ampla cobertura, com a vacinação do maior número possível de pessoas, de forma a criar um cordão de imunidade.

Tomar apenas uma dose é eficiente?

Não. Todas as vacinas que já estão em uso requerem ao menos duas doses para garantia de imunidade. Entretanto, estamos em uma situação de calamidade global. Diversos países, incluindo Reino Unido, onde a vacinação já está em andamento, e Brasil, onde não sabemos quando começará, estudam atrasar a segunda dose de forma a aplicar a primeira no maior número possível de pessoas. A OMS admite que o intervalo entre as doses possa chegar a seis semanas em situações extremas, mas diz que o ideal é que a segunda seja aplicada entre três e quatro semanas após a primeira.

Quantos países já estão vacinando?

Até o momento, 52 países já iniciaram campanhas de vacinação, e a Oceania é o único continente onde ainda não houve imunizações. Em termos absolutos, Estados Unidos e China lideram, com 12,2 milhões e 10 milhões de vacinados. Já em termos percentuais, Israel já imunizou 25,34% da população.

Quando e como será a vacinação no Brasil?

“Quando” é a pergunta de um milhão de dólares. O Ministério da Saúde pretendia fazer uma cerimônia no dia 19 e iniciar a campanha no dia 20, mas o imbróglio com a Índia fez o evento ser adiado, mas não se sabe se a vacinação começará mesmo no dia 20 com os imunizantes requisitados ao Butantan.

Já o “como” é razoavelmente conhecido. As doses serão repassadas aos estados e municípios, responsáveis pela aplicação de acordo com o critério de prioridades. A fase 1 abrangerá profissionais de saúde, maiores de 75 anos e maiores de 60 que vivam em instituições de longa permanência. Na fase 2 serão imunizadas pessoas entre 60 e 74 anos. Na 3, portadores de comorbidades agravantes de Covid, como diabetes, hipertensão e obesidade. Finalmente, na 4, professores, profissionais das forças de segurança e salvamento, funcionários do sistema prisional e detentos. Só depois virá a população em geral. Confira a íntegra do plano nacional de vacinação.

Ainda há perguntas cujas respostas só virão durante e após a vacinação, mas o fundamental é ter em mente que a vacina é nossa melhor arma contra essa doença. Tome-a tão logo seja possível.

Por Leonardo Pimentel


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Só para complementar: obviamente este vídeo a seguir sobre “Rambo e a Vacina” não faz parte de nenhuma edição do Meio; recebi pelo Facebook e – sinceramente – ri litros! Até porque a dublagem ficou perfeita… Confiram! 😀