Tubo bem que hoje é Dia das Mães e tudo o mais, mas tem coisa que não se faz.
Olha só, eu participo de um grupo do WhatsApp criado recentemente visando marcar uma festa par reunir todo um povo que trabalhou junto trinta anos atrás! Por mais aguerridos que todos sejam, principalmente no que diz respeito à política, desde o começo já ficou combinado que esse grupo seria bem específico, para matar as saudades, descobrir por onde andam estas ou aquelas pessoas e combinar o dia do evento. E só.
E, ressalvadas raras exceções, o povo até que vem se comportando bem, vá lá. Às vezes um aniversariante daqui, uma dica dali, uma lembrança acolá, e assim vai. Pessoal ajuizado, da velha guarda e na época em que trabalhamos juntos eu mal tinha trinta anos de idade.
Mas gente, mesmo sendo um dos “caçulas” do grupo, eu já passei do meio século de vida!
Já faço parte da turma que é mais convidado para funerais do que para casamentos, meus grupos de amigos tendem mais a diminuir do que aumentar, tenho reservado no guarda-roupa uns conjuntos de “pretinhos básicos” conforme seja a pompa e circunstância da ocasião, até mesmo meu celular já conecta automaticamente na rede wi-fi do crematório local!
Ou seja, fora dos dias e horários comerciais, muito pela manhã ou já à noite, quando toca o alerta do meu celular avisando que chegou mensagem, caramba, isso me gela a alma! NINGUÉM vai te escrever de madrugada dizendo que está com saudades, ou tarde da noite para te convidar para uma festa, ou, ainda, no meio de um domingo modorrento para tratar de algum trabalho pendente. Quando isso acontece, invariavelmente é desgraça ou desgraça. A gente já corre para o telefone pensando em quem morreu, quem foi preso, qual foi o acidente com o carro de quem, se alguém se machucou e assim por diante.
O chegar da idade pode ser, sim, terrível, mas ainda é melhor que a alternativa.
Então, com todo respeito aos mais bem intencionados integrantes desse grupo do qual faço parte, por caríssima e extremíssima gentileza, tenham em mente que SEIS HORAS DA MANHÃ DE DOMINGO NÃO É HORÁRIO PARA COMEÇAR A ENVIAR MENSAGEM DE FELIZ DIA DAS MÃES !!!
Em 08/05/23 morreu a Rainha do Rock, o que fiquei sabendo sabendo somente no dia seguinte pela amicíssima Nydia, num grupo de Zap-Zap do qual participamos. Eu sabia que ela andava bem ruinzinha (prestenção: a Rita, não a Nydia), mas não tanto assim. E daí para descobrir que ela já tinha 75 anos! Acho que talvez essa tenha sido a surpresa maior…
Num primeiro momento pensei em dar uma compilada na biografia dela e compartilhar aqui com vocês. Doce ilusão. Muita gente já escreveu sobre isso – inclusive ela própria – e, compilado ou não, bem melhor do que eu teria capacidade. Mas, ainda assim, ficou uma pulguinha atrás da orelha, uma vontade de não deixar essa passagem passar em branco.
Isso porque comecei a curtir as músicas dela lá no finalzinho da década de setenta, quando lançou as maravilhosas músicas Doce Vampiro e, sobretudo, Mania de Você. E cá entre nós, no caso desta, nunca consegui encontrar nenhuma outra cuja letra ou música conseguisse esbanjar tanto tesão e sensualidade de uma só vez.
Então fui dar uma conferida nas catacumbas de meu computador e constatei que só tinha alguns dos álbuns mais famosos dela e daí, bicho fuçador que sou, fui dar um jeito de procurar nos cantões da Internet para baixar a discografia completa. Fuça daqui, fuça dali, finalmente encontrei uma alma abençoada que disponibilizou isso na rede.
Antes de chegar onde quero chegar, vamos abrir um parênteses neste nosso causo. No mesmo disco dessas duas músicas que citei, tinha também, lá no final, a música Arrombou a Festa número 2. Pois sejam benevolentes consigo mesmos, deem um “play” aí embaixo e acompanhem a letra logo a seguir. Já, já eu volto.
Ai, ai, meu Deus O que foi que aconteceu Com a música popular brasileira? Quando a gente fala mal A turma toda cai de pau Dizendo que esse papo é besteira
Na onda discothéque da América do Sul Lenilda é miss Lene, Zuleide é Lady Zu Pra defender o samba contrataram Alcione É boa de pistom mas bota a boca no trombone
No meio disso tudo a Fafá vem dar um jeito Além de muita voz, ela também tem muito peito E a música parece brincadeira de garoto Pois quando ligo o rádio ouço até Cauby Peixoto Cantando: “Conceição…”
Ai, ai, meu Deus O que foi que aconteceu Com a música popular brasileira? Quando a gente fala mal A turma toda cai de pau Dizendo que esse papo é besteira
O Sidney Magal rebola mais que o Matogrosso Cigano de araque, fabricado até o pescoço E o Chico na piscina grita logo pro garçom: “Afasta esse cálice e me traz Moet Chandon”
Com tanto brasileiro por aí metido a bamba Sucesso no estrangeiro ainda é Carmem Miranda E a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa Pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa!
Ziri, ziriguidum Skindô, skindô, lelê Sai da frente que eu quero é comer
A música popular brasileira Lady Laura A música popular Parabéns a você Parabéns para a música popular
Música popular Oh, eu te amo Ah, eu te amo, meu amor Ai, Sandra Rosa Madalena Ah, ah, ah, ah O meu sangue ferve pela Música popular
Oh, fricote, eu fiz xixi Fricote, eu fiz xixi Na música popular brasileira
Corre que lá vem os “homi”!
Muito bom, né?
O que me encantou nessa música foi o fato de ela brincar com outros artistas, outras músicas e até mesmo outros ritmos, misturando e fervendo tudo num bem humorado caldeirão – e ainda assim sem deixar de ser crítica!
Aliás, uma das curiosidades dessa música é que ela teve como coautor um tal de Paulo Coelho, antes mesmo de se meter a escrever livros. Mas, para mim, o que me incomodava de verdade era o tal do “número dois” do título da música. CUMASSIM??? E o que seria então a “número um”? Até na própria letra ela deixa isso bem claro: “E a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa / Pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa!”.
Olha que eu fucei. Durante um bom tempo fucei e escarafunchei pra tudo quanto é canto, mas foi como procurar uma palha num agulheiro. Neca de pitibiriba. Chegou um ponto em que desisti e deixei arquivado na minha mente na pastinha assuntos a resolver que nunca vou dar um jeito.
Até hoje.
Acontece que aquela alma abençoada que citei antes, dentre todos os discos da Rita Lee também disponibilizou algumas “Pérolas” raras, e uma delas foi justamente a música Arrombou a Festa, originariamente cantada ao vivo no álbum Refestança, em parceria com o Gilberto Gil, lá nos idos de 1977 e, do mesmo jeitão que sua sucessora, essa música brinca com os sucessos da época. Então ponham novamente os fones de ouvido (ou não) e brindem-se com essa raridade!
Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu Com a música popular brasileira? Todos falam sério, todos eles levam a sério Mas esse sério me parece brincadeira
Benito lá de Paula com o amigo Charlie Brown Revive em nossos tempos o velho e chato Simonal Martinho vem da Vila lá do fundo do quintal Tornando diferente aquela coisa sempre igual
Um tal de Raul Seixas vem de disco voador E Gil vai refazendo seu xodó com muito amor Dez anos e Roberto não mudou de profissão Na festa de arromba ainda está com seu carrão “Parei pra pesquisar…”
Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu Com a música popular brasileira? Todos falam sério, todos eles levam a sério Mas esse sério me parece brincadeira
O Odair José é o terror das empregadas Distribuindo beijos, arranjando namoradas Até o Chico Anísio já bateu pra tu batê Pois faturar em música é mais fácil que em tevê
Celly Campello quase foi parar na rua Pois esperavam dela mais que um banho de lua E o mano Caetano tá pra lá do Teerã De olho no sucesso da boutique da irmã
Bilú, bilú fafá, faró, faró tetéia Severina e o filho da véia A música popular brasileira
A música popular Sou a garota papo firme que o Roberto falou Da música popular O tico-tico nu, o tico-tico cu, o tico-tico pá rá rá rá Música popular Olha que coisa mais linda, mais cheia de… Música popular Mamãe eu quero, mamãe eu quero Mamãe eu quero a música popular brasileira
Pega, mata e come!
Enfim, pode ser que esta não seja a “revelação do ano” para vocês, pode ser até que nem se interessem por este post depois de tanto tempo sem postar, pode ser o que for que seja, mas o que não pode ser é deixar passar essa data em branco.
E não passou.
E que sua música crítica e sincera continue arrombando os arrombados de sempre!
Bem, mais uma vez vou esclarecer: o termo “bodas” vem do latim. Significa promessa – no caso, os votos matrimoniais, feitos no dia do casamento. Assim, a cada ano que passa, comemoramos o aniversário de bodas, o aniversário daquela promessa feita um para o outro. Em sua origem comemorava-se apenas a de Prata (25 anos) e a de Ouro (50 anos), mas com o tempo foram surgindo outras simbologias para os demais anos.
E cá chegamos nós aos 24 anos de casado – e sem gracinhas, aí no fundo, que eu tô ouvindo… O vigésimo quarto ano de casado é simbolizado pela pedra preciosa Opala. Não há uma cor definida para essas bodas, pois essa pedra possui uma grande variação de cores, parecendo um verdadeiro arco-íris. Ela é constituída de um material muito resistente, que para chegar até essa condição passa por diversas fases, da mesma forma que acontece em um casamento que dura tantos anos. Afinal, não é nada fácil permanecer por mais de duas décadas com alguém do seu lado, mantendo o sentimento forte o bastante para continuarem na caminhada juntos!
Mas, particularmente, ainda prefiro a definição de Ailin Aleixo, na orelha do livro Balde de Gelo, de Daniela Macedo & Marco Aurélio: “A vida a dois não é complicada. Complicado é sambar em descida. A vida a dois é um milagre, isso sim. Só vivendo pra entender o que é aguentar maus humores, parentes, cachorro pentelho, ciúmes, amigos intrometidos. Mas também é só vivendo que se compreende a delícia de chegar em casa depois de um dia corno e encontrar quem se ama, receber cafuné assistindo filme, soltar pum sem precisar pedir desculpa. E (…) todos esses ingredientes misturados com graça, leveza e humor – atributos indispensáveis para a sobrevivência de qualquer relação. E de qualquer um.”
Já contei a minha história com a nossa querida, amada, idolatrada, salve, salve Dona Patroa (com direito a muitas fotos) por mais de uma vez aqui neste nosso cantinho virtual, em especial nos textos “Bodas de Marfim”, “Bodas de Louça” e “Bodas de Palha” – é só dar uma fuçada básica no blog e pronto!
Mas sempre me divirto ao recordar da seguinte passagem, lá dos idos do dia 12/12/1998, nas dependências do restaurante rural Coelho e Cabrito, quando formalizamos nossa união perante os homens e perante Deus. Aliás, logo após a cerimônia civil e sem que tivesse chegado o pastor que faria um culto ecumênico (pois ele se perdeu no caminho lá no meidumatu…), chamamos todos os convidados para que se sentassem e começassem a se servir. Então, quando todos já estavam acomodados, eis que o pastor chegou. Pediu desculpas aos presentes e falou suas palavras. O que rendeu o inesquecível comentário do Luisinho, nosso padrinho:
“O melhor casamento que eu já fui foi o da Mieko e do Adauto. Enquanto o padre falava a gente estava lá, sentadão, com o copo de cerveja na mão!”
E para não perder a oportunidade, pois sei que quem me conhece já deve estar esperando a “piada pronta”, NÃO, as Bodas de Opala do nosso casamento não tem nada a ver com o MEU Opala, mais conhecido como Titanic – a Lenda. Até porque, entre nós, estamos apenas nas Bodas de Cristal… 😉
Invariavelmente tenho o costume de, após o café da manhã, ir para a varanda para tomar um “café preto” e soltar umas baforadas. Como a casa foi construída acompanhando um morro, então tenho a garagem no nível da rua e, em cima, uma varanda com uma mureta para me recostar e acompanhar o movimento dos carros, dos pedestres, das bicicletas, dos caminhantes e outros quetais.
Temos duas árvores defronte, uma grande, com 18 anos (sei disso porque plantei-a logo após o nascimento de meu caçula) e outra pequena, resquício de uma anterior que caiu sozinha de velhice, fungos e podreira.
Na árvore maior, enganchada numa de suas forquilhas mais baixas, uma latinha de cerveja. “Que raios! E nem fui eu que tomei.” Ali mesmo já pensei em, após terminar meu café, descer, recolhê-la e colocá-la junto com o restante do lixo reciclável.
Mas eis que, antes disso, me surgiu de passagem um caboclo em andrajos, carregando duas madeiras num ombro e com a outra mão, quase que arrastando, um saco cheio de latinhas de alumínio. Bem, do ponto onde fico os transeuntes não têm ideia que estão sendo observados, de modo que fiquei aguardando se ele iria ver e recolher a bendita da latinha.
Mas ele vinha cabisbaixo, não que procurando por algo, mas simples com um evidente ar de desalento. E passou reto. “Bem, paciência. Daqui a pouco eu mesmo desço e recolho a bendita da latinha.” Mas eis que o sujeito para e fica acocorado, observando alguma coisa no chão. Cutuca o que quer que seja que estivesse cutucando e fica observando.
“Uai?…”, pensei.
Então, com nítido cuidado, ele pega seu objeto de observação e volta para a árvore em frente de casa. Daí eu pude ver o que estava em sua mão: uma cigarra. Com delicadeza ele estica o braço e a acomoda no tronco da árvore. Só então percebe a latinha ali enroscada. Dá um sorriso, arranca a latinha da forquilha, enfia no saco, se certifica que a cigarra está bem acomodada (talvez intimamente agradecendo a sorte por tê-la encontrado e lhe feito encontrar mais uma latinha) e vai embora cantarolando baixinho uma canção que não consegui identificar.
Embevecido, por esse momento de ternura, não pude deixar de sorrir.
Taí um sujeito castigado pela vida, numa fria manhã de domingo, de bermuda e chinelo de dedo, procurando “tesouros” no meio do lixo alheio para sua própria sobrevivência. Ainda assim, diante de um ser ainda mais frágil, que no meio da calçada poderia ser pisoteado a qualquer momento por um caminhante desavisado (e que provavelmente ainda iria se indignar por ter sujado a sola do calçado), esse rapaz tem a preocupação de resgatá-lo e devolvê-lo para seu próprio meio, para viver sua própria vida, longe daqueles que poderiam feri-lo.
Penso comigo se ele mesmo não gostaria de também receber esse tipo de tratamento…
Isto é, na atual sociedade ele está ali, frágil, na calçada do viver, podendo a qualquer momento ser pisoteado e esmagado pela falta de condições mínimas de sobrevivência. Alimento. Saúde. Abrigo.
E mesmo assim teve humanidade suficiente para se preocupar com quem está em situação ainda mais frágil que a sua própria!
Pois é. Quando falamos em políticas públicas em prol da sociedade, diferente do que pensam alguns (idiotas), não é“ficar dando condições pra vagabundo”, mas sim paea dar condições mínimas de subsistência para que os mais desafortunados possam ter, no mínimo, a oportunidade de ascender e disputar em igualdade de condições vagas de estudo e de trabalho com aqueles que não precisam ter essa diuturna preocupação com sua própria sobrevivência.
Mas como fazer isso se não tiver o que comer?
Mas como fazer isso se não tiver saúde?
Mas como fazer isso se não tiver onde morar?
E não, este não é um “texto político” (apesar de que a vida em sociedade, em si mesma, é política), mas simplesmente meras reflexões e divagações deste Velho Causídico que vos tecla diante de uma situação que acabei de presenciar. Sinceramente não me importaria se o partido A, B ou C estivesse no poder, ou se o governante fosse fulano ou beltrano. Desde que quem estivesse à frente da nação tenha um mínimo de solidariedade, compaixão e até mesmo de misericórdia para olhar por este povo que (sobre)vive em precárias condições, estaria tudo bem. Mas, diante do recente caos político que passamos, incomodou-me sim – e muito – toda a óbvia cortina de fumaça lançada para deixar a Casa Grande cada vez mais intocável e distante da Senzala. Mas, queira Deus, esse reinado cruel está próximo do fim.
E quando eu falo de “solidariedade, compaixão e misericórdia” entendam que não é meramente uma questão política. E muito menos religiosa. Até porque, na minha nada humilde opinião, religião e política deveriam obrigatoriamente trilhar caminhos separados. É uma questão de humanidade.
Aliás, recentemente o Padre Julio Lancellotti disse algo muito interessante: “A solidariedade, a compaixão, a misericórdia, a empatia não são dimensões religiosas, são dimensões humanas. Até porque os ateus também podem ser compassivos, misericordiosos e os que não têm religião, também.”
Enfim, meus caros, todo esse devaneio dominguístico-matinal surgiu tão somente porque tive olhos para ver (e enxergar) um momento de humanidade de alguém para outro alguém que sequer humano era.
E acho que é isso que anda faltando em nossa sociedade.
Sair da cama depois das dez é um ato libertário, subversivo e anticapitalista
Antonio Prata
A luta contra o racismo não é, absolutamente, “vitimismo”. A luta contra o machismo, a homofobia e todas outras formas de opressão, tampouco. Tais considerações, porém, não nos impedem de reconhecer, para além das causas urgentes e legítimas, carcado no espírito do tempo, certo pendor para a autocomiseração. Hobsbawm, em sua tumba, deve estar murmurando: “Ah, era do mimimi!”.
Parece que nada mais é válido se não vier da dor. Você vai ver um “Chef’s Table” da vida e o cozinheiro diz que foi a separação dos pais que o fez prestar atenção na beterraba, que a beterraba o salvou da depressão, e, portanto, seu borsch é um consolo para a nossa sofrida humanidade — aí ele chora sobre a sopa. A CEO explica num TED Talk que enquanto presa nas ferragens, depois de um acidente, bombeiros serrando o carro, desenvolveu um método de pensamento positivo capaz de revolucionar as vendas on-line no varejo da pesca esportiva — e na moda íntima LGBTQIA+ no mercado de luxo do leste europeu.
Licença, Raul: já que “agora pra fazer sucesso/ Pra vender disco de protesto/ Todo mundo tem que reclamar// Eu vou tirar meu pé da estrada/ E vou entrar também nessa jogada/ E vamos ver agora quem é que vai guentar”: desde criança, sou vítima da opressão brutal do horarismo. Você talvez nunca tenha escutado o termo (afinal, o inventei na frase anterior), mas é um mal onipresente, insidioso e discreto, cujo objetivo é desacreditar os milhões que, como eu, acordam tarde. “Deus ajuda quem cedo madruga” está para o horarismo como “Direitos humanos para humanos direitos” para o bolsonarismo.
( Raul Seixas – Eu também vou reclamar )
Durmo todo dia às três ou quatro da manhã, acordo 11 ou meio-dia. Não interessa se entre a meia-noite e as quatro eu encontre a cura pra caspa ou acabe com a chaga da água no ketchup, aos olhos da sociedade, meus olhos inchados no horário de almoço revelarão sempre um vagabundo. Um preguiçoso. Improdutivo.
Se hoje, aqui, aceito a dor da exposição, assumindo-me um acordatardista, é para despertar os outros que sofrem em silêncio (ou roncando). Precisamos denunciar a opressão. Mais do que isso, precisamos mostrar que aquilo visto como vício, na verdade, é virtude. Sair da cama depois das dez é um ato libertário, subversivo e anticapitalista.
Certeza que dá pra puxar alguma frase do Foucault para dar embasamento. “A microfísica do poder opera no adestramento dos corpos, preparando-os para a exploração do capital, a partir do panóptico de pulso, i. e., o relógio”. (A frase não é do Foucault, mas ninguém precisa saber, precisa?).
Citei Raul, mas nosso hino, que bradaremos de peito aberto aonde quer que formos (das 11 em diante), será com esses versos do Chico Buarque (representante fundamental, ao lado do Caetano, dos acordatardistas): “Eu faço samba e amor até mais tarde/ E tenho muito sono de manhã/ Escuto a correria da cidade, que arde/ E apressa o dia de amanhã// De madrugada a gente ainda se ama/ E a fábrica começa a buzinar/ O trânsito contorna a nossa cama, reclama/ Do nosso eterno espreguiçar// No colo da bem-vinda companheira/ No corpo do bendito violão/ Eu faço samba e amor a noite inteira/ Não tenho a quem prestar satisfação.”
A cada eleição, um bombardeio de informações falsas e já refutadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) chega até o eleitor pelos diversos meios de comunicação existentes atualmente. Por isso, é necessário saber o que é fato ou boato por meio de fontes seguras. Para começar, é importante entender que os votos em branco e os nulos não possuem valor algum. Eles são descartados do processo de apuração e considerados apenas como estatística.
Regra
Vale lembrar que a Constituição brasileira é que estabelece as “regras do jogo”. E nela está escrito que o candidato eleito é aquele que obtiver a maioria dos votos válidos, excluídos os em branco e os nulos, que são considerados inválidos. Portanto, apenas os votos válidos, aqueles destinados a um candidato ou a um partido, entram na contagem.
Fato ou Boato?
Os votos para cada cargo são independentes. Se o eleitor votar apenas para presidente da República e optar por votar em branco para os outros cargos, o voto para presidente vai valer do mesmo jeito. Muitas fake news afirmam que, neste mesmo exemplo, o voto para presidente deste eleitor seria anulado, pois seria considerado um “voto parcial”. Mas isso simplesmente não existe.
Um dos principais mitos do processo eleitoral se refere a uma suposta interferência dos votos em branco e dos nulos no resultado da eleição. Como são considerados inválidos, esses votos em nada interferem, tampouco beneficiam quaisquer candidatos. Isso não passa de um boato.
Mais um mito
Se a maioria dos eleitores anular o voto ou votar em branco, a eleição inteira deve ser anulada? A resposta é não. Muitos já receberam essa falsa informação, porém o caso é o mesmo do item anterior. Apenas os votos válidos são considerados no pleito.
Essa desinformação que, vira e mexe, volta a circular nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens, afirma que, segundo o artigo 224 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965), se mais de 50% dos votos de uma eleição forem nulos, o pleito deverá ser anulado.
No entanto, na verdade, o dispositivo prevê a necessidade de marcação de nova eleição se a nulidade atingir mais de metade dos votos do país em decorrência da constatação, pela Justiça Eleitoral, de fraude no pleito, como, por exemplo, eventual cassação de candidato eleito condenado por compra de votos. Todos esses falsos conteúdos já foram desmentidos várias vezes pelo TSE, por outros órgãos da Justiça Eleitoral e por veículos de comunicação de credibilidade, além de agências de checagem.
Por isso, para votar consciente, não caia na desinformação e consulte fontes confiáveis.