Em 08/05/23 morreu a Rainha do Rock, o que fiquei sabendo sabendo somente no dia seguinte pela amicíssima Nydia, num grupo de Zap-Zap do qual participamos. Eu sabia que ela andava bem ruinzinha (prestenção: a Rita, não a Nydia), mas não tanto assim. E daí para descobrir que ela já tinha 75 anos! Acho que talvez essa tenha sido a surpresa maior…
Num primeiro momento pensei em dar uma compilada na biografia dela e compartilhar aqui com vocês. Doce ilusão. Muita gente já escreveu sobre isso – inclusive ela própria – e, compilado ou não, bem melhor do que eu teria capacidade. Mas, ainda assim, ficou uma pulguinha atrás da orelha, uma vontade de não deixar essa passagem passar em branco.
Isso porque comecei a curtir as músicas dela lá no finalzinho da década de setenta, quando lançou as maravilhosas músicas Doce Vampiro e, sobretudo, Mania de Você. E cá entre nós, no caso desta, nunca consegui encontrar nenhuma outra cuja letra ou música conseguisse esbanjar tanto tesão e sensualidade de uma só vez.
Então fui dar uma conferida nas catacumbas de meu computador e constatei que só tinha alguns dos álbuns mais famosos dela e daí, bicho fuçador que sou, fui dar um jeito de procurar nos cantões da Internet para baixar a discografia completa. Fuça daqui, fuça dali, finalmente encontrei uma alma abençoada que disponibilizou isso na rede.
Antes de chegar onde quero chegar, vamos abrir um parênteses neste nosso causo. No mesmo disco dessas duas músicas que citei, tinha também, lá no final, a música Arrombou a Festa número 2. Pois sejam benevolentes consigo mesmos, deem um “play” aí embaixo e acompanhem a letra logo a seguir. Já, já eu volto.
Ai, ai, meu Deus
O que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Quando a gente fala mal
A turma toda cai de pau
Dizendo que esse papo é besteira
Na onda discothéque da América do Sul
Lenilda é miss Lene, Zuleide é Lady Zu
Pra defender o samba contrataram Alcione
É boa de pistom mas bota a boca no trombone
No meio disso tudo a Fafá vem dar um jeito
Além de muita voz, ela também tem muito peito
E a música parece brincadeira de garoto
Pois quando ligo o rádio ouço até Cauby Peixoto
Cantando: “Conceição…”
Ai, ai, meu Deus
O que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Quando a gente fala mal
A turma toda cai de pau
Dizendo que esse papo é besteira
O Sidney Magal rebola mais que o Matogrosso
Cigano de araque, fabricado até o pescoço
E o Chico na piscina grita logo pro garçom:
“Afasta esse cálice e me traz Moet Chandon”
Com tanto brasileiro por aí metido a bamba
Sucesso no estrangeiro ainda é Carmem Miranda
E a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa
Pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa!
Ziri, ziriguidum
Skindô, skindô, lelê
Sai da frente que eu quero é comer
A música popular brasileira
Lady Laura
A música popular
Parabéns a você
Parabéns para a música popular
Música popular
Oh, eu te amo
Ah, eu te amo, meu amor
Ai, Sandra Rosa Madalena
Ah, ah, ah, ah
O meu sangue ferve pela
Música popular
Oh, fricote, eu fiz xixi
Fricote, eu fiz xixi
Na música popular
brasileira
Corre que lá vem os “homi”!
Muito bom, né?
O que me encantou nessa música foi o fato de ela brincar com outros artistas, outras músicas e até mesmo outros ritmos, misturando e fervendo tudo num bem humorado caldeirão – e ainda assim sem deixar de ser crítica!
Aliás, uma das curiosidades dessa música é que ela teve como coautor um tal de Paulo Coelho, antes mesmo de se meter a escrever livros. Mas, para mim, o que me incomodava de verdade era o tal do “número dois” do título da música. CUMASSIM??? E o que seria então a “número um”? Até na própria letra ela deixa isso bem claro: “E a Rita Lee parece que não vai sair mais dessa / Pois pra fazer sucesso arrombou de novo a festa!”.
Olha que eu fucei. Durante um bom tempo fucei e escarafunchei pra tudo quanto é canto, mas foi como procurar uma palha num agulheiro. Neca de pitibiriba. Chegou um ponto em que desisti e deixei arquivado na minha mente na pastinha assuntos a resolver que nunca vou dar um jeito.
Até hoje.
Acontece que aquela alma abençoada que citei antes, dentre todos os discos da Rita Lee também disponibilizou algumas “Pérolas” raras, e uma delas foi justamente a música Arrombou a Festa, originariamente cantada ao vivo no álbum Refestança, em parceria com o Gilberto Gil, lá nos idos de 1977 e, do mesmo jeitão que sua sucessora, essa música brinca com os sucessos da época. Então ponham novamente os fones de ouvido (ou não) e brindem-se com essa raridade!
Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Todos falam sério, todos eles levam a sério
Mas esse sério me parece brincadeira
Benito lá de Paula com o amigo Charlie Brown
Revive em nossos tempos o velho e chato Simonal
Martinho vem da Vila lá do fundo do quintal
Tornando diferente aquela coisa sempre igual
Um tal de Raul Seixas vem de disco voador
E Gil vai refazendo seu xodó com muito amor
Dez anos e Roberto não mudou de profissão
Na festa de arromba ainda está com seu carrão
“Parei pra pesquisar…”
Ai, ai, meu Deus, o que foi que aconteceu
Com a música popular brasileira?
Todos falam sério, todos eles levam a sério
Mas esse sério me parece brincadeira
O Odair José é o terror das empregadas
Distribuindo beijos, arranjando namoradas
Até o Chico Anísio já bateu pra tu batê
Pois faturar em música é mais fácil que em tevê
Celly Campello quase foi parar na rua
Pois esperavam dela mais que um banho de lua
E o mano Caetano tá pra lá do Teerã
De olho no sucesso da boutique da irmã
Bilú, bilú fafá, faró, faró tetéia
Severina e o filho da véia
A música popular brasileira
A música popular
Sou a garota papo firme que o Roberto falou
Da música popular
O tico-tico nu, o tico-tico cu, o tico-tico pá rá rá rá
Música popular
Olha que coisa mais linda, mais cheia de…
Música popular
Mamãe eu quero, mamãe eu quero
Mamãe eu quero a música popular brasileira
Pega, mata e come!
Enfim, pode ser que esta não seja a “revelação do ano” para vocês, pode ser até que nem se interessem por este post depois de tanto tempo sem postar, pode ser o que for que seja, mas o que não pode ser é deixar passar essa data em branco.
E não passou.
E que sua música crítica e sincera continue arrombando os arrombados de sempre!
VALEU, RITA LEE !!!