Eu juro que tento ser legal… Mas nem sempre acho que consigo…
Autor: Adauto Andrade
Tio Alemão
Meu pai, atualmente com 85 anos, é o mais velho de doze irmãos, sendo eles: José Bento (Zé Bento), Fé, Roberto (Alemão), Esperança, Caridade, Luiza, Felisberto (Dinho), Jorge, Geraldo (Gêra), Maria Madalena (Máda), Pedrina (Pêdra) e Laura. Destes já se foram Luiza, que aos poucos meses faleceu de coqueluche, em 1947, Fé, em 1987, Jorge, em 2007, e o Gêra, em 2014.
O Roberto, mais conhecido na família como “Tio Alemão”, nunca se casou e outrora foi o único dos irmãos que continuou com a “lida” na roça, cuidando de sítios, vendendo cavalos e outros quetais.
E para encerrar este introito faltou somente esclarecer que a genética de minha família pelo lado paterno é bem “forte”. Mesmo atravessando gerações somos, de um modo geral, todos mais ou menos parecidos – conforme já contei lá no blog no causo O passado bate à porta (II).
Ah, e mais um último detalhe: a maioria de minhas tias tem uma capacidade assustadora de lembrar a data de aniversário de praticamente todos os membros da família!
Agora vamos ao causo.
Tempos atrás, ainda antes do advento da pandemia, numa de suas andanças minha tia Madalena encontrou uma amiga que há muito tempo não via.
– Nossa, Madalena, há quanto tempo!
– Pois é, menina, já faz mais de ano, né?
– Ô, se faz! Muito mais! Mas Máda, me diga uma coisa.
– O quê?
– O Alemão. Ele tá com quantos anos?
– O Roberto? Deixa eu ver… Ele é de 1940, então ele já está com 79 anos.
– Tudo isso? Puxa vida, que bênção, hein? É que eu vi que outro dia você publicou uma foto dele com sua sobrinha e eu fiquei impressionada: NOSSA, COMO ELE ESTÁ CONSERVADO!
– Ah, mas aquele lá não é o Alemão, não. Aquela foto é do Adauto, filho do Bento.
– Sério? Nossa, mas eu podia jurar que era o Alemão! E esse Adauto, quantos anos ele tem?
– O Adauto? Deixa eu ver… Ele é de 1969, então está com 50 anos.
– Cinquenta anos? Só? NOSSA, COMO ELE ESTÁ ACABADO!
…
Ou seja, na minha vida nada muda, é sempre a mesma coisa: sósifôdo!
Evangélico, eu?
Comecemos pelo princípio. Minha querida, amada, idolatrada, salve, salve Dona Patroa faz parte de um Pequeno Grupo da igreja evangélica que ela frequenta e, para fins de estudar a Bíblia, praticamente todas as sextas feiras eles se reúnem – e não me venham com críticas, pois em tempos de pandemia a reunião é virtual, tá o seus incréus!
Dia desses o foco do estudo foi a oração do Pai Nosso. Aqueles que a conhecem poderiam perguntar: “mas o que há para estudar numa oração tão curtinha que todo mundo já sabe de cor e salteado?”… Para de perguntar, ô criatura! Eu vou chegar lá. E a questão, na minha opinião, é exatamente essa. Esse Pequeno Grupo realmente se preocupa em compreender o conteúdo daquilo que professam.
Diferentemente da igreja católica, que acabou promovendo um Grande Cisma em decorrência principalmente das bulas papais – a história na realidade é bem mais complexa, mas basicamente essas bulas seriam “cartas de graças ou indulgências” por atos meritórios ($$$) -, as igrejas evangélicas de um modo geral parecem seguir mais o conteúdo dos Evangelhos do que o rastro do dinheiro.
E entendam que quando falo de igrejas evangélicas estou me referindo àquelas que verdadeiramente estão preocupadas e voltadas aos ensinamentos de Cristo e não aquelas reuniões caricatas para “expulsão do demo” ou para venda de canetas e vassouras “consagradas” pela bagatela de mil reais a unidade. Isso, para mim, juridicamente tem outro nome. E moral e pessoalmente tem um ainda pior, mas este aqui continua sendo um blog de família e me recuso a transcrever palavras (muito) chulas neste nosso espaço virtual.
Mas, para variar, estou perdendo o foco. Estávamos falando da oração do Pai Nosso. Comecei a pensar nisso tudo ao me pegar ainda hoje, quase dormitando, naqueles últimos momentos de sanidade enquanto o sono vai nos inebriando e começando a tomar conta da gente e que, no modo “piloto automático”, fiz minhas preces – que se resumem a recitar mentalmente as orações da Ave Maria e do Pai Nosso. É um hábito que adquiri há muito, muito tempo, da época de adolescência em que ainda era frequentador da igreja católica.
E então tive um momento de lucidez (e lá se foi o sono pelo ralo abaixo!) e perguntei para mim mesmo: “mim mesmo, qual é o porquê disso?”, quero dizer, por que repetir mecanicamente determinadas “fórmulas” e acreditar que nisso aí estaria a salvação? No fundo, no fundo, como eu disse, é mais um hábito que uma convicção, pois na prática – ainda que participe e comungue da fé de muitas – não frequento nenhuma igreja ou grupo religioso, pois ainda prefiro um bom proseio sem intermediários (como já lhes contei aqui e aqui)…
E isso me fez lembrar que as “novas bulas papais” já estão inseridas no contexto da igreja católica há tempos, na forma dos confessionários e a nova moeda seria a quantidade de reza e não a qualidade da oração. Pecou? Ora, não se preocupe! Seus problemas acabaram! Vá até o confessionário, ouça um entediante sermão e retire seu boleto de rezas! Mentiu? Dez ave marias! Roubou? Cinquenta pai nossos! Traiu? Trinta terços completos e suba de joelhos os 382 degraus da Escadaria da Penha! E pronto! Tá tudo resolvido, pois lavou, tá novo: a alma tá limpinha e novinha em folha para os próximos pecados!
Tá, é exagero, eu sei, mas eu sou assim mesmo, fazer o quê? “Vocês sabem que não posso resistir ao dramático”… Aliás, disso tudo o terço me parece ainda mais inócuo agora que parei para pensar. Você recita dezenas de vezes as mesmas fórmulas sem se ater a uma só palavra do que está repetindo! Isso é reza, não é oração… Lembro-me de uma vida que já não mais me pertence que das diversas vezes que já participei de novenas, minha boca se mexia em consonância com todas as demais, mas a minha alma e pensamentos divagavam em outras plagas bem distantes de onde eu estava.
Antes de encerrar, quero que entendam que não vim aqui para ofender nenhuma igreja, religião, grupo, congregação ou seja lá como for que se autodenominem. Este texto simplesmente traduz meu modo de ver as coisas e não tem nada do que escrevi que já não seja do conhecimento e entendimento até mesmo do reino mineral…
E mesmo que eu esteja falando do Evangelho, também é bom deixar claro que na verdade nenhum livro, qualquer que seja, teria a capacidade de trazer um “manual para a vida”. Não existe “receita de bolo”. Temos, sim, que pensar muito, interpretar muito, compreender seu conteúdo e ter o tirocínio pessoal acerca de sua aplicabilidade ou não nesta nossa existência terrena. E conviver com as consequências de nossas decisões.
Enfim, o que eu estou tentando lhes dizer é que acho incrível a atitude desse grupo de pessoas que dedicou mais de uma reunião para estudar uma oração que pode ser repetida em menos de um minuto (cerca de sete segundos se for rezando o terço), pois eles não estão preocupados em simplesmente seguir o conteúdo do Evangelho, mas sim em compreender as palavras de Cristo.
E creio que talvez seja nisso que estaria o que realmente diferencia esse Pequeno Grupo dessa longeva dicotomia assimétrica que tanto caracteriza a distinção entre católicos e evangélicos, pois eles não se enquadram em nenhuma “definição clássica” para nenhum desses grupos, pois eles são simplesmente o que são: cristãos.
Simples assim.
E após todas essas elucubrações mentais que me vieram à tona (e acabaram com meu sono), para que não digam que mesmo nestes tempos de pandemia não lhes deixei uma mensagem de Páscoa, então lá vai! 😁
31 de Março: 57 anos desde o Golpe Militar
Mais uma por hoje. Esta é pelo Paulo Bicarato…
País do Futuro?
“Estamos outra vez
No fundo do buraco.
Você não tem vergonha
E eu já não tenho saco!”